Discurso durante a 192ª Sessão Especial, no Senado Federal

Homenagem à memória de Ernesto Che Guevara.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA INTERNACIONAL.:
  • Homenagem à memória de Ernesto Che Guevara.
Publicação
Publicação no DSF de 24/10/2007 - Página 36925
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA INTERNACIONAL.
Indexação
  • HOMENAGEM, ERNESTO CHE GUEVARA, VULTO HISTORICO, REVOLUÇÃO, SOCIALISMO, AMERICA LATINA, REPRESENTAÇÃO, IDEOLOGIA, SOLIDARIEDADE, JUSTIÇA SOCIAL.
  • ELOGIO, FILME, DIRETOR, BRASIL, BIOGRAFIA, JUVENTUDE, VULTO HISTORICO, CONHECIMENTO, PRECARIEDADE, CONDIÇÕES DE TRABALHO, SAUDE, POPULAÇÃO, AMERICA DO SUL.
  • EXPECTATIVA, DECISÃO, GOVERNO ESTRANGEIRO, EXTINÇÃO, BLOQUEIO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), CUBA, CIRCULAÇÃO, ECONOMIA, CULTURA, POPULAÇÃO, RESPEITO, SOBERANIA.
  • COMENTARIO, CARTA, AUTORIA, ORADOR, ATLETA PROFISSIONAL, DESTINATARIO, PRESIDENTE DE REPUBLICA ESTRANGEIRA, SOLICITAÇÃO, AUTORIZAÇÃO, ATLETAS, PAIS ESTRANGEIRO, CUBA, PARTICIPAÇÃO, CAMPEONATO MUNDIAL, PERDÃO, OCORRENCIA, JOGOS PANAMERICANOS, BRASIL.
  • LEITURA, OBRA LITERARIA, AUTORIA, POETA, HOMENAGEM, ERNESTO CHE GUEVARA, VULTO HISTORICO, DEFESA, LIBERDADE, AMERICA.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Prezado Presidente, Senador José Nery, caro Pedro Mosquero, Embaixador de Cuba no Brasil, Senador João Pedro, prezado Dr. Tirso Sáenz, quero também prestar minha homenagem a Che Guevara no momento em que lembramos os quarenta anos de sua morte.

Ernesto Che Guevara inspirou e continua inspirando jovens idealistas e pessoas de toda e qualquer idade, como eu próprio, além de pessoas que até os seus últimos dias de vida tiveram sempre nele a imagem de uma pessoa inteiramente desprendida, com um espírito de solidariedade formidável, que tem sido reverenciada pelos povos de todo o mundo, especialmente pelo povo cubano. Não é à toa que, de todos os personagens da História, ele é aquele cujo rosto é mais freqüentemente estampado nas camisetas dos jovens.

Eu também gostaria de aqui enaltecer o cineasta Walter Salles, que, em Diários de Motocicleta, mostrou, de uma maneira tão bela, o sentido importante da viagem que, juntamente com Alberto Granado, fez Ernesto Che Guevara, saindo de sua terra, Buenos Aires, na Argentina, para atravessar toda a América Latina, pelos Andes, conhecendo de perto, no Chile, as condições de trabalho dos que estavam em minerias de cobre. Ele pôde testemunhar as condições difíceis de trabalho a que muitos estavam submetidos em toda a região da América Latina, percorrendo os Andes. O filme mostra também aqueles dias em que Ernesto Che Guevara e seu amigo Alberto Granado trabalharam ajudando, voluntariamente, ele como médico, na colônia de pessoas com hanseníase, aquela doença tão terrível. Seria muito importante que nós estivéssemos sempre seguindo sua aspiração de justiça, de maior igualdade, de liberdade.

Eu gostaria, também, como muitos dos meus colegas que me precederam, inclusive a Deputada Vanessa Grazziotin, de expressar minha concordância com respeito à aspiração do governo cubano, ainda expressa no último artigo do Presidente Fidel Castro Ruz, que disse o quão importante é que os Estados Unidos da América, que o Governo do Presidente George Walker Bush decida, de uma vez por todas, acabar com o bloqueio econômico, cultural e de pessoas. Não faz sentido, prezado Dr. Tirso Sáenz e caro Embaixador Pedro Mosquera, que o Canadá, um país que tem uma relação tão próxima de amizade e de vizinhança com os Estados Unidos da América, tenha relações tão intensas com Cuba e o mesmo não aconteça com os Estados Unidos. Eu mesmo, nas duas vezes que visitei Cuba, pude ver o número tão significativo de cidadãos canadenses que visitam Cuba com muita freqüência. Se o Canadá tem relações comerciais e de investimento, de exportação e importação, e, sobretudo, de trânsito de seres humanos, por que a nação de maior poderio econômico no planeta Terra, vizinha de Cuba, separada apenas pelas águas do Caribe, estando a uma distância de 90 a 100 milhas, sendo que já teve uma relação tão próxima com Cuba, por que, afinal de contas, o Governo dos Estados Unidos não decide que há que se iniciar um processo de interação com Cuba de tal maneira que possam todos os norte-americanos que desejam, inclusive, conhecer a experiência de construção do socialismo de Cuba, a implementação, ali, dos ideais de Che Guevara e de seus companheiros, visitar aquele país? Nos Estados Unidos, por exemplo, há muitos jovens que gostariam de conhecer a forma de organização socioeconômica e política de Cuba.

Por outro lado, tenho a convicção de que, na medida em que houver liberdade para as empresas norte-americanas adquirirem e venderem todo e qualquer tipo de bem e serviço, transacionando, portanto, com maior liberdade com Cuba, na medida em que puderem os norte-americanos visitar Cuba e também os cubanos visitar os Estados Unidos da América, então, com o sentido de reciprocidade, haverá um caminho muito mais interessante e saudável na direção do que os próprios norte-americanos e o Governo dos Estados Unidos gostariam que acontecesse, respeitando, portanto, a soberania de Cuba, a sua integridade, a sua auto-determinação, mas abrindo caminhos.

Tenho conversado com o caro Embaixador Pedro Mosquero e gostaria de dizer algo relativo à carta que escrevi juntamente com o campeão de boxe Éder Jofre, nosso campeão de peso-galo de 1960 a 1965 e dos pesos-pena em 1963, considerado o melhor peso-galo de todos os tempos pelo Conselho Mundial de Boxe e o nono melhor pugilista de todos os tempos por The Ring. No dia 15 de julho, encaminhamos, por meio do Embaixador Pedro Mosquero uma carta ao Presidente Fidel Castro no sentido de que pudesse a autoridade esportiva cubana permitir que os pugilistas cubanos Guilhermo Rigondeaux e Erislandy Lara Santoya possam participar do campeonato mundial de boxe que se realizará em Atlanta, nos Estados Unidos, inclusive como uma forma de participarem, posteriormente, das olimpíadas de Pequim.

Quero aqui dizer, com muita amizade e franqueza, que, do ponto de vista que disse o Presidente Fidel Castro, em sua declaração recente sobre a importância de se acabar com o bloqueio econômico do Governo dos Estados Unidos, que tenho uma forte convicção, prezado Embaixador, de que o Presidente Fidel Castro, ao refletir, pode permitir aos pugilistas cubanos que estiveram no Brasil e nos jogos do Pan e tiveram um procedimento que eles próprios reconheceram e declararam como errado - e eu confio na declaração expressa deles, inclusive, a autoridades brasileiras, pois que estavam desejosos a voltar ao seu País, aos seus familiares, porque amam Cuba e querem estar lá - e ao ter, conforme dissemos Eder Jofre e eu mesmo naquela carta ao Presidente Fidel Castro um espírito de generosidade, de compreensão e de até perdão por aquele incidente, pode permitir, como grandes pugilista que são, até, novamente, representar Cuba. Acho que isso estaria muito dentro do espírito de ternura, do qual falou muitas vezes Ernesto Che Guevara.

E, Presidente José Nery, como recebi um poema de Lívio Oliveira, gostaria, se me permite, de concluir a minha homenagem com as palavras deste advogado público federal, escritor e poeta, que, em uma homenagem a Che Guevara, encaminhou-me o poema, sugerindo-me que aqui pudesse lê-lo. O Poema da Liberdade, por Lívio Oliveira

Declaro, em mim,

e aos ventos e mares de Cuba,

Toda a liberdade

E o homem livre já vive o céu.

Aqui, na terra, o homem verdadeiramente

livre

desenha os contornos de um céu

azul como o da África

ou dos sertões do Brasil.

Meu grito libertário já chegou à floresta da

Bolívia

e, ao contrário do que pensam alguns,

não cessou.

Meu punho está firme,

pronto e rijo.

Já penso no próximo combate.

Travarei esse combate entre as palavras

e a ignorância.

Travarei esse novo combate entre o pão

e a fome.

Travarei esse velho combate entre a luz

e a obscuridade.

Lutarei, desesperadamente, sem sentir

qualquer dor.

Os meus amigos e camaradas

irão curar minhas feridas

com o bálsamo da verdade

e da honra.

Desafiarei os perigos

e correrei montanhas e todos os riscos.

Minha guerrilha não cessará

enquanto houver um homem,

uma mulher,

um velho,

uma criança,

sem casa,

sem chão,

sem o arroz da ilha

ou o feijão do continente.

Não cessará minha batalha

enquanto eu ouvir a canção

da Latino-América.

A fadiga não me alcançará,

enquanto - nas madrugadas -

eu sorver o orvalho fresco

e a seiva

que escorrem sobre as folhas

das árvores imemoriais da paz

e sobre a minha fronte sangrando.

Não interromperei minha luta

e minha gargalhada ainda ecoará,

apavorando meus algozes,

enquanto existirem povos

sem olhos para ver

o rumo certo,

sem ouvidos para ouvir

o poema da liberdade,

sem língua para gritar

e buscar, no fundo do peito,

o espírito altivo e forte

da AMÉRICA INDEPENDENTE!

Eu gostaria, Sr. Presidente, em homenagem a Ernesto Che Guevara, aqui também de dizer, inclusive contra todo tipo de bloqueio econômico, que possamos logo nas Américas, do Alasca à Patagônia, não ver mais qualquer tipo de cercas, de muros, tais como os que hoje caracterizam a fronteira dos Estados Unidos, México e Canadá, que possamos logo ver a liberdade de os bens, os serviços e os seres humanos seguirem dos Estados Unidos para Cuba e para toda a América e possam os cidadãos das três Américas, se desejarem, também por elas transitarem livremente sem ter que passar por muros como aqueles que, infelizmente, contrastam com a história de liberdade dos Estados Unidos da América.

Minha homenagem, portanto, aos ideais de Ernesto Che Guevara por igualdade, liberdade e dignidade para todos os seres humanos.

Muito obrigado. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/10/2007 - Página 36925