Discurso durante a 19ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Expectativas de que a CPMI irá investigar a fundo as despesas realizadas por intermédio dos cartões corporativos do Governo.

Autor
Rosalba Ciarlini (DEM - Democratas/RN)
Nome completo: Rosalba Ciarlini Rosado
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), CARTÃO DE CREDITO.:
  • Expectativas de que a CPMI irá investigar a fundo as despesas realizadas por intermédio dos cartões corporativos do Governo.
Aparteantes
Gerson Camata.
Publicação
Publicação no DSF de 29/02/2008 - Página 4010
Assunto
Outros > COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), CARTÃO DE CREDITO.
Indexação
  • IMPORTANCIA, AMPLIAÇÃO, INVESTIGAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, CARTÃO DE CREDITO, EXECUTIVO, BUSCA, MELHORIA, SISTEMA, SUPRIMENTO DE CAIXA, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, ATENDIMENTO, URGENCIA, DESPESA, NECESSIDADE, ESCLARECIMENTOS, ABUSO, DESVIO, OBJETIVO, FALTA, DEFINIÇÃO, CRITERIOS, AUTORIZAÇÃO, OPERAÇÃO, DEBITOS, CARTÃO MAGNETICO, PERDA, CONTROLE, INCENTIVO, ILEGALIDADE, ESPECIFICAÇÃO, EXCESSO, GASTOS PUBLICOS, PRODUTO SUPERFLUO, DISPENSA, LICITAÇÃO, AUSENCIA, PRESTAÇÃO DE CONTAS, OCULTAÇÃO, FISCALIZAÇÃO, PROTESTO, ORADOR, ALEGAÇÕES, SIGILO, SEGURANÇA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PARENTE.
  • COMENTARIO, NOTICIARIO, RESPONSABILIDADE, SERVIDOR, ABUSO, GASTOS PUBLICOS, NECESSIDADE, INVESTIGAÇÃO, MANDANTE, BENEFICIO.
  • DEFESA, BUSCA, SOLUÇÃO, AMPLIAÇÃO, PUBLICIDADE, FISCALIZAÇÃO, GASTOS PUBLICOS, CONCILIAÇÃO, EFICIENCIA, AGILIZAÇÃO, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA.

A SRª ROSALBA CIARLINI (DEM - RN. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - A permuta, Sr. Presidente, foi com o Senador Mário Couto. Eu já havia permutado anteriormente com o Jayme Campos. Em seguida, falará o Senador Mário Couto.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, desde o primeiro instante, manifestei-me a favor da investigação, pelo Congresso, das despesas feitas com os cartões corporativos do Governo. E porque de logo expressei minha posição sobre a questão, assinei o requerimento para a instalação da Comissão de Inquérito que vai tratar desse problema.

Penso ser do meu dever, Sr. Presidente, porque sou a favor da investigação desde o primeiro instante, tecer algumas considerações, chamando a atenção do Senado para determinados aspectos da controvérsia que se instala e advertir a todos acerca da necessidade de termos um propósito positivo e construtivo na investigação que está prestes a se iniciar.

O interesse público envolvido nessa investigação parlamentar é extremamente relevante e, mais que isso, prepondera, por sua essência e pelas conseqüências danosas de sua eventual frustração, sobre pessoas acaso envolvidas e sobre proveitos políticos a serem obtidos.

De fato, o que está em jogo como objeto de nossa fiscalização não são propriamente as pessoas, mas os gastos, as despesas, o uso do dinheiro público.

Por essa ótica, a CPMI tem o dever de investigar tudo e completamente, não para buscar primeiramente culpados no cenário político, mas para indicar ao Congresso Nacional, soberano fiscal da execução do Orçamento e dos gastos públicos, se o sistema adotado é o mais adequado, conforme as melhores e mais saudáveis práticas de administração pública.

Os cartões de crédito e débito passaram a ser usados pelos órgãos públicos com o razoável e pertinente propósito de evitar que, para despesas de extrema emergência, ou em circunstâncias muito especiais, houvesse suprimento de fundos em dinheiro vivo pelo Tesouro ao servidor, ao qual incumbiria a realização das despesas. Esses gastos eram poucos e bem restritos no universo das obrigações públicas. Tenho conhecimento de causa, Srªs e Srs. Senadores, por ter sido Prefeita de Mossoró por doze anos, contando já a minha cidade com uma máquina administrativa de razoável complexidade e extensão.

Mas essas despesas, mesmo no âmbito federal, não seriam mais que as referentes ao combustível em viagem fora da sede, aos gastos com alimentação e hospedagem de servidores em viagens freqüentes e demoradas e sem pouso determinado com antecedência. O sistema de suprimento de fundos era usado nas situações em que, nada obstante as diárias concedidas previamente para hospedagem e alimentação, servidores de escalão inferior fossem incumbidos de prover quanto à segurança e a um mínimo de conforto de autoridades em viagens, sendo justificável que pequenas quantias, em tais circunstâncias, não se submetessem aos rigores de empenho prévio e liquidação contábil, antes do pagamento, como na prestação de contas formal e usual do serviço público.

Mas o que servia para os propósitos a que me acabo de referir passou a ser usado abusivamente, ainda ao tempo do antigo sistema de suprimento de fundos, e, a pretexto de ser legal a prática, instalou-se o inchaço, onde se abrigaram então despesas que nada tinham de pequenas, nem de justificadas pela situação de imprevisibilidade. Os suprimentos de fundos foram sendo inflados e se tornaram cancro, corroendo a ética administrativa com artifícios, os ardis mais diversos, justificativas aparentemente legais para fraudar a lei.

Faço esse breve histórico, Srªs e Srs. Senadores, para que todos possamos perceber a origem da distorção e, percebendo-a, possamos corrigi-la.

Verificada a ruptura ética e a extrema vulnerabilidade do sistema de suprimento de fundos pelo Tesouro em dinheiro vivo, a instituição dos cartões corporativos pareceu um avanço. Sem dúvida, na medida em que o cartão de crédito, na respectiva fatura para pagamento, identifica o montante da despesa e o beneficiário do pagamento, isso foi, sim, um avanço.

Sr. Presidente, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, é conhecida a capacidade maliciosa dos que se animam a contornar a lei fingindo cumpri-la.

Não há dúvida de que o novo sistema avançava, mas duas graves distorções, que desde o início se anunciavam, não tiveram remédio quer pronto, quer adequado. O primeiro: a falta de critérios para a autorização das compras ou realização de serviços com cartão de crédito levou, por óbvio, aos mais rematados e perdulários dos despropósitos. O segundo: a permissão do uso também de cartões de débito, que manteve e agravou o já declaradamente caduco sistema de suprimento em dinheiro. Manteve o sistema porque o saque em dinheiro, na boca do caixa ou na máquina eletrônica, contra contas do Tesouro é rigorosamente o mesmo que receber dinheiro vivo na tesouraria do serviço.

Os males que acima apontei aqui se repetem, sendo rematada hipocrisia supor que quem saca dinheiro no caixa eletrônico será mais ético do que quem recebeu dinheiro do chefe de sua repartição.

E o vício se agravou porque, agora, deixou de existir o mínimo de controle prévio, pois o servidor, manuseando o cartão, não precisa de autorização de ninguém para sacar e gastar. E gastar, como no sistema anterior: sem critério algum.

O problema não está propriamente no mecanismo ágil, mas nas mãos ágeis dos desonestos, que, a pretexto de despesas de pequeno porte, vão de pronto escancarando o conceito de pequeno porte e de emergência para chegar às estonteantes cifras milionárias das quais, estarrecido, o País está tendo notícia.

Com isso, o urgente encobre o esbanjador, o necessário passa a justificar o supérfluo, e, mais grave, o legal se torna ilegal, quer por ser despesa não razoável no serviço público, quer porque, manipulados ao bel-prazer, os cartões se tornaram desgraçado pé-de-cabra para arrombar a regra geral das licitações e o dever de prestação de contas.

Esse sistema não pode continuar em prática. Não é possível que gastos com passagens aéreas e hospedagens se excluam do dever da licitação, a que acorram, em igualdade de condições e em busca do melhor preço, as empresas e agências especializadas. Não é lícito, razoável ou legal que as despesas com a manutenção corriqueira dos palácios e residências oficiais não possam prever suas necessidades com a antecedência necessária, de forma a possibilitar a licitação prévia. E é espantoso que uma ação governamental, de cuja essência é o planejamento e a metódica e inteligente busca de informações, qual seja a segurança de autoridades, não se faça com a previsibilidade de gastos e provedores.

Esse sistema não pode continuar também porque, em seu nome ou em sua defesa, além de se violar o dever geral de licitar, também se ocultam gastos à fiscalização universal, pública e irrestrita, sonegando-os ao dever, também geral, de prestação de contas. Nada justifica que um centavo sequer do dinheiro público seja subtraído à prestação de contas, não só por imposição ética inarredável, como porque todos os que têm a guarda do dinheiro público, sem exceção alguma, estão sujeitos ao dever de prestar contas, nos termos da Constituição.

O Sr. Gerson Camata (PMDB - ES) - Permite-me um aparte, Excelência?

A SRª ROSALBA CIARLINI (DEM - RN) - Pois não, Senador.

O Sr. Gerson Camata (PMDB - ES) - Quero cumprimentá-la, Senadora Rosalba Cialirni, pela oportunidade de sua fala, exatamente agora que começa a se instalar a CPI. Mas acho que nós aqui devemos começar a nos preocupar com o Senado, não com a CPI. Quando correm essas notícias de que está havendo um acordo por trás dos panos, para acobertar as denúncias que V. Exª faz agora, temos de nos preocupar com o Senado porque é o Senado que vai para a rua da lama com essas notícias, com essas insinuações. Acho que nós aqui devíamos fazer uma cruzada. O Senador que evita quebrar um sigilo bancário, o Senador que esconde um depoente que é chamado, Conselho de Ética nele. Ele está ferindo o decoro parlamentar porque está impedindo a Instituição de apurar um roubo. Mete esse Senador no Conselho de Ética, cassa o mandato dele para ele aprender a respeitar a Instituição da qual ele faz parte. Se a gente não ficar isso, essa CPI vai terminar com os burros n’água como tantas outras.

A SRª ROSALBA CIARLINI (DEM - RN) - Tomara que possamos fazer isso. Vamos nos somar para que não tenhamos mais uma pizza entre tantas outras que já aconteceram.

Penso, portanto, que nada nem a segurança do Presidente ou de pessoas de sua família, em grau de parentesco que não se identifica, justifica gastos absolutamente secretos.

(Interrupção do som.)

A SRª ROSALBA CIARLINI (DEM - RN) - Já vou terminar, Sr. Presidente.

Basta isso para impor à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito, que se vai instalar no Congresso, o dever de tudo investigar, sem limitação alguma, quer de matéria, quer de tempo, quer de pessoa. Esse dever a Constituição impõe ao Congresso, e é, repito, um dever e não um direito disponível de que, sem ofensa à ética, fosse possível abrir mão por qualquer conveniência política.

Ao referir-me há pouco às pessoas, devo ainda manifestar uma outra preocupação. As notícias mais escabrosas dão conta de que os servidores subalternos, de escalões bem inferiores, têm sido responsáveis pelos gastos milionários com os cartões corporativos.

É preciso que esses servidores mais humildes não sejam transformados nos grandes e únicos vilões, nem que seus atos sirvam de cortina para ocultar aqueles que ordenaram ou se beneficiaram da fraude do desvio dos recursos públicos.

É razoável que a manutenção e a segurança dos palácios, gabinetes e residências oficiais, com a necessária sobriedade, se faça às custas do Erário, mas isso não pode levar ao intolerável abuso de despesas pessoais serem pagas com recursos públicos. Todas as autoridades recebem subsídios para seus gastos particulares, e nada justifica, por exemplo, que confraternizações familiares ou festanças de fim de semana também sejam custeadas pelo povo.

Por isso, Sr. Presidente, embora tendo o dever de investigar tudo, a CPMI tem a meu sentir um dever maior. A Comissão precisa ser construtiva no sentido de não apenas indigitar culpados, mas de propor soluções.

Este não é um assunto a ser tratado pelo Poder Executivo nem pelo Poder Judiciário.

A Constituição atribui ao Congresso, com o auxílio do Tribunal de Contas, o irrestrito dever de fiscalizar todos os gastos públicos, e isso, obviamente, inclui a edição das regras necessárias ao exercício dessa fiscalização. Tais regras quanto aos cartões corporativos, a sociedade espera da CPMI e do Congresso.

É certo que a melhor forma de se fiscalizar é na origem, manter aberto tudo à possibilidade de fiscalização, tornando públicas todas as ações que envolvam despesas com recursos do Tesouro Nacional. Nesse sentido, não se pode deixar de louvar a publicidade dada pelo Governo aos gastos com os cartões corporativos, prática que deve ser alargada e incentivada.

Dessa publicidade, porém, nada pode ser sonegado. É estranho que razões de segurança estejam sendo opostas à publicação de muitas dessas despesas.

E mais estranho é que essas razões sejam alegadas de forma genérica, vaga, etérea e abstrata, sem que o País saiba que despesas são essas, que não têm nome nem motivação.

A publicidade, e publicidade imediata, será o grande freio inibidor do gasto perdulário, supérfluo e injustificável no âmbito do serviço público.

O País espera que a CPMI encontre caminhos que possam levar à compatibilidade desejada entre a agilidade do serviço público e sua transparência, entre o atendimento às necessidades imediatas das ações governamentais e a ética administrativa, entre a necessária segurança pessoal e o sóbrio conforto das mais altas autoridades e a moderação e comedimento no uso do dinheiro público.

Manifesto a convicção, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, de que essa será uma grande oportunidade...

(Interrupção do som.)

A SRª ROSALBA CIARLINI (DEM - RN) - Sr. Presidente, estou no último parágrafo.

Manifesto a convicção, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, de que essa será uma grande oportunidade para que o Congresso enfrente o vício pela raiz e não permita que o pretexto para ser ágil e eficiente dê ensejo à apropriação dos recursos do povo, pois a agilidade e a eficiência não são atributos só dos honestos. É com mãos ágeis e com práticas eficientes que atuam salteadores, aos quais regras claras e rígidas a serem propostas pela CPMI haverão de impedir acesso à administração pública, ao dinheiro público.

Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/02/2008 - Página 4010