Discurso durante a 44ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas à operação realizada pela FUNAI e Polícia Federal na reserva indígena Raposa/Serra do Sol, em Roraima. Leitura de carta dirigida ao Presidente Lula e ao Ministro da Justiça defendendo uma saída pacífica para o conflito.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INDIGENISTA. SOBERANIA NACIONAL.:
  • Críticas à operação realizada pela FUNAI e Polícia Federal na reserva indígena Raposa/Serra do Sol, em Roraima. Leitura de carta dirigida ao Presidente Lula e ao Ministro da Justiça defendendo uma saída pacífica para o conflito.
Aparteantes
Augusto Botelho.
Publicação
Publicação no DSF de 05/04/2008 - Página 8028
Assunto
Outros > POLITICA INDIGENISTA. SOBERANIA NACIONAL.
Indexação
  • REGISTRO, ENTREGA, GOVERNADOR, ESTADO DE RORAIMA (RR), DOCUMENTO, SUBSCRIÇÃO, DEPUTADO FEDERAL, DEPUTADO ESTADUAL, VEREADOR, DESTINAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), SOLICITAÇÃO, SUSPENSÃO PROVISORIA, OPERAÇÃO, POLICIA FEDERAL, RESERVA INDIGENA, EXPECTATIVA, DECISÃO JUDICIAL, SOLUÇÃO, PROBLEMA, DEMARCAÇÃO, TERRAS.
  • QUESTIONAMENTO, CONDUTA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PREJUIZO, ESTADO DE RORAIMA (RR).
  • LEITURA, TRECHO, CARTA, AUTORIA, ORADOR, ENCAMINHAMENTO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), CRITICA, DEMARCAÇÃO, SUPERIORIDADE, EXTENSÃO, RESERVA INDIGENA, ILEGALIDADE, RETIRADA, FAMILIA, PRODUTOR RURAL, ARROZ, HABITAÇÃO, REGIÃO, AUSENCIA, TOTAL, PAGAMENTO, INDENIZAÇÃO, ASSENTAMENTO RURAL, DESCONHECIMENTO, SUGESTÃO, RELATORIO, COMISSÃO EXTERNA, CAMARA DOS DEPUTADOS, SENADO, CORREÇÃO, HOMOLOGAÇÃO, RESERVA, REGISTRO, DISPOSIÇÃO, MINISTRO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), AGILIZAÇÃO, APRECIAÇÃO, PROCESSO, CESSAÇÃO, OPERAÇÃO, POLICIA MILITAR, EXPECTATIVA, PARECER, PROCURADORIA GERAL DA REPUBLICA.
  • CRITICA, IMPEDIMENTO, ENTRADA, GENERAL DE BRIGADA, SENADOR, DEPUTADO FEDERAL, RESERVA INDIGENA, ESTADO DE RORAIMA (RR), ADVERTENCIA, EXCESSO, AUTONOMIA, TERRITORIO, LEITURA, TRECHO, DOCUMENTO, EXERCITO, ESCLARECIMENTOS, FORÇAS ARMADAS, LIBERDADE, ATUAÇÃO, TERRITORIO NACIONAL, AUSENCIA, NECESSIDADE, AUTORIZAÇÃO.
  • CRITICA, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE BOA VISTA, ESTADO DE RORAIMA (RR), ACUSAÇÃO, PRODUTOR RURAL, ARROZ, TENTATIVA, IMPEDIMENTO, DESOCUPAÇÃO, RESERVA INDIGENA, SOLICITAÇÃO, REFORÇO, CONDUTA, POLICIAL.
  • COMENTARIO, ASSINATURA, GOVERNO BRASILEIRO, DOCUMENTO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), GARANTIA, DIREITOS, INDIO, ACUSAÇÃO, ORADOR, INCONSTITUCIONALIDADE, ARTIGO, PROIBIÇÃO, ENTRADA, FORÇAS ARMADAS, RESERVA INDIGENA, AUSENCIA, AUTORIZAÇÃO, ADVERTENCIA, POSSIBILIDADE, TENTATIVA, ENTIDADE, AMBITO INTERNACIONAL, EMANCIPAÇÃO, TERRITORIO.
  • REGISTRO, APROVAÇÃO, COMISSÃO DE RELAÇÕES EXTERIORES E DEFESA NACIONAL, REQUERIMENTO, DESIGNAÇÃO, ORADOR, ACOMPANHAMENTO, OPERAÇÃO, ESTADO DE RORAIMA (RR).
  • LEITURA, OFICIO, AUTORIA, ORADOR, APRESENTAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REIVINDICAÇÃO, POPULAÇÃO, ESTADO DE RORAIMA (RR), REPASSE, TERRAS, AMBITO ESTADUAL, EQUIPARAÇÃO, REMUNERAÇÃO, SERVIDOR PUBLICO ESTADUAL, SERVIDOR PUBLICO CIVIL, PRORROGAÇÃO, PRAZO, RETIRADA, FAMILIA, PRODUTOR RURAL, RESERVA INDIGENA, AQUISIÇÃO, UNIÃO FEDERAL, CENTRAIS ELETRICAS DE RORAIMA S/A (CER), IMPLANTAÇÃO, AREA DE LIVRE COMERCIO, AUTORIZAÇÃO, IMPORTAÇÃO, COMBUSTIVEL FOSSIL, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, EXTINÇÃO, COMITE, GESTÃO, ORGÃO PUBLICO, AMBITO NACIONAL, REGIÃO, CRIAÇÃO, ESTABELECIMENTO DE ENSINO, ENSINO SUPERIOR, COLEGIO MILITAR.
  • DEFESA, REPASSE, TERRAS, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA), AMBITO ESTADUAL, RESPEITO, NORMAS, CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
  • ADVERTENCIA, INTERESSE, INTERNACIONALIZAÇÃO, REGIÃO AMAZONICA, COLABORAÇÃO, GOVERNO BRASILEIRO.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Mão Santa, Srªs e Srs. Senadores, brasileiros e brasileiras, que nos assistem pela TV Senado e que nos ouvem pela Rádio Senado, hoje, quero fazer um relato de mais um grande capítulo da novela da reserva indígena Raposa/Serra do Sol, no meu Estado.

Ontem, o Governador do meu Estado, de posse de um documento assinado pelos Deputados Federais, pelos Deputados Estaduais, pelos Vereadores, enfim, por autoridades significativas do Estado, de todos os setores, trouxe esse documento, intitulado “A Carta de Roraima”, dirigida ao Presidente Lula, e a entregou ao Ministério da Justiça, pedindo, em síntese, o quê? Que a operação - eu li esta “Carta de Roraima”, ontem -, que esta sendo executada pela Polícia Federal em meu Estado, por requisição da Fundação Nacional do Índio e por determinação do Presidente Lula, fosse suspensa, temporariamente, e o assunto fosse judicializado, ou seja, aguardasse decisão judicial das diversas ações que lá estão, ações movidas por entidades indígenas daquela região, que não aceitam essa forma de demarcação, por centenas de moradores que há séculos habitam aquela região e também pelos arrozeiros. O que a imprensa noticia é que os arrozeiros é que estão atrapalhando a questão, que estão criando a confusão para que a reserva seja desocupada, o que é mentira. São quatrocentos e poucos proprietários. Seus bisavós e avós lá viveram, e eles, com seus filhos e netos, estão sendo expulsos de suas terras, por decisão do Governo brasileiro.

Eu disse ao Governador que não iria a essa audiência com ele porque já fui enganado muitas vezes pelo Presidente Lula, nesta e noutras questões com relação a Roraima. Desde pequeno, apreendi que não apenas o homem, mas principalmente o homem, tem que ter palavra. Mulher também tem que ter. Aliás, minha mãe sempre foi uma mulher de muita palavra. Minha avó, que ficou viúva cedo, foi a matriarca que fez as vezes, portanto, de pai e de mãe, tinha muita palavra. Não tinha essa história de dizer uma coisa e fazer outra.

Não tinha essa história de dizer uma coisa hoje e não fazer amanhã.

E o Presidente Lula, desde 2003, desde, portanto, o primeiro ano do seu mandato, vem enganando o povo de Roraima com esta e outras questões que vou dizer aqui. Mas esta é a agonia da vez. O que está acontecendo, Senador Mão Santa, é que hoje está em Roraima um contingente de policiais federais, armados até os dentes, indo para os restaurantes com metralhadoras, estacionando seus carrões nas calçadas, causando um clima de terror em uma cidade pacata, de um povo ordeiro.

E o que estão fazendo lá? Combatendo traficantes? Combatendo contrabandistas? Combatendo bandidos? Não. Estão lá em uma missão truculenta, para tirar de suas terras brasileiros que lá vivem há séculos e que pagam para ser brasileiros naquela fronteira inóspita com a Venezuela e com a Guiana.

Portanto, eu disse ao Governador: “Eu não vou a essa audiência porque não acredito mais neste Governo”. Como o atual Governador assumiu recentemente, em razão da morte do Governador titular, eu ainda disse a ele: “O senhor tem razão de ir, de tentar pacificar, de tentar uma solução harmoniosa”.

Senador Augusto Botelho, para me precaver, escrevi uma carta, tanto para o Presidente da República como para o Ministro da Justiça, com o mesmo teor.

Ao Presidente da República, disse o seguinte:

Em 2003, o Senado Federal e a Câmara dos Deputados, por orientação do Líder do Governo na Câmara, Deputado Aldo Rebelo, depois Ministro das Relações Institucionais, por intermédio de Comissões Temporárias Externas (a do Senado presidida por mim), produziram relatórios circunstanciados, após visita e discussões locais, sugerindo uma demarcação justa e harmoniosa para a Reserva Raposa Serra do Sol.

Isto é, nós não sugerimos que não se demarcasse a área. Sugerimos como demarcar de maneira correta. É aquela história, Senador Mão Santa, que nós, médicos, conhecemos: a questão de dosagem. Você pode fazer um tratamento, depende da dosagem do medicamento que usa ou da cirurgia que faz. Estou dizendo isso, e por acaso há mais um outro médico na platéia, que é também do meu Estado, o Senador Augusto Botelho.

E prossigo na minha carta ao Presidente Lula:

Em 2005, Vossa Excelência, ignorando ambas as Comissões e seus relatórios, homologou a demarcação administrativa da Reserva de forma diferente, contrariando a opinião de mais de 500 (quinhentas) famílias não índias (a maioria miscigenada), bem como a maioria das etnias lá residentes.

Ontem, vi aqui o Senador João Pedro pedindo a realização de uma audiência em uma reserva ecológica em seu Estado, demarcada pelo Presidente João Figueiredo. Interessante. Por que o PT não adotou o mesmo método nessa reserva? Por que não houve audiência pública com os índios? Não vou nem dizer com os não-índios. Porque se tivessem feito um plebiscito entre os índios de lá, sabe qual seria o resultado, Senador Mão Santa? Não era para demarcar desse jeito. Acontece que existe um núcleo comunistóide, socialista e estatizante neste Governo que domina o Incra, o Ibama e a Funai. Não interessa a eles ouvir quem tem opinião diferente. Portanto, não foram ouvir os índios, que pensam de forma diferente, e resolveram impor uma fórmula que, de acordo com a cartilha deles, é a correta.

Prossigo:

Ainda em 2005, foi constituída, mediante o Requerimento nº 349, de 2005-SF, uma CTE do Senado Federal, por mim presidida e composta pelos Senadores Augusto Botelho [aqui presente], e Wirlande da Luz, que percorreu a região e avaliou os reflexos do Decreto Presidencial [que homologou a Reserva] aconselhando a sua revisão.

Em 31 de agosto de 2007, ante a ameaça de operação da FUNAI (UPATAKON III)...

Senador Mão Santa, Upatakon, na linguagem macuxi, quer dizer “nossa terra”. Só que eu não sei de quem é essa nossa terra, porque, com certeza, não vai ser nossa. Não vai ser nossa nem no sentido de que vai ser dos índios, do jeito que está aqui. Eu vou chegar ao final para dizer isso.

..com uso da Polícia Federal, fui designado pela Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, do Senado Federal, para vistoriar a área e auscultar os proprietários a serem excluídos da Reserva demarcada. [Isto é, para saber como estava a situação deles.]O trabalho foi realizado em conjunto com uma Comissão da Assembléia Legislativa do Estado de Roraima e o relatório encaminhado, em versão preliminar, a Vossa Excelência [estou me dirigindo ao Presidente da República], registrando, segundo dados da FUNAI, a existência de 348 propriedades a serem desocupadas...

Vejam bem: 348 propriedades. E, infelizmente, o Governo coloca para a imprensa que são apenas oito arrozeiros que estão criando problemas. Não menciona as outras 348 propriedades, de pessoas pobres, modestas, pequenos criadores, pequenos agricultores que lá estão há séculos. E conforme dados do Incra, dessas famílias, apenas 198 foram indenizadas, mal e porcamente, mas foram, e 131 foram reassentadas, e de novo mal e porcamente.

Prossigo:

Considerando que os proprietários, a maioria deles famílias centenárias ali residentes, ou foram indenizados injustamente (com laudos feitos unilateralmente [pela Funai]), a maioria não recebeu indenização e os que receberam não estão reassentados ou o foram de forma indigna e desumana [temos isso fotografado e filmado], solicitamos àquela época a sustação da OPERAÇÃO UPATAKON III a ser realizada pela Polícia Federal, até que todas as situações fossem resolvidas dentro da Lei e do respeito à dignidade humana.

Agora - portanto, em 2008 -, o Governo Federal, lamentavelmente, começou, de maneira truculenta, a referida operação.

Ontem, o Governador de Roraima, José de Anchieta Júnior, deveria ter-se encontrado com o Ministro da Justiça - e não foi o Ministro da Justiça que recebeu o Governador, mas um funcionário do segundo escalão - para tentar uma solução pacífica, até que haja o julgamento final pelo Supremo Tribunal Federal.

Embora descrente da sensibilidade deste Governo em relação ao meu Estado, endosso a tentativa do Governador em buscar uma saída digna e pacífica para aqueles brasileiros e brasileiras que têm pago um alto preço por guardarem as nossas fronteiras com seus próprios recursos, sua saúde e suas vidas.

Encaminhei e protocolei esse documento dirigido ao Presidente da República. Sabe qual foi o resultado da reunião, Senador Mão Santa, Srs. Senadores - o Senador Augusto Botelho acompanhou o Governador -? Simplesmente funcionários de terceiro escalão da Funai, da Procuradoria não sei de que disseram: “Não, nós não vamos parar a operação e vamos tirar todo mundo mesmo, e não tem conversa não”. E o Governador saiu de lá com essa resposta.

De lá, fomos ao Supremo Tribunal Federal, para falar com o Ministro Carlos Ayres Britto, que é o relator de inúmeras ações que estão lá faz anos, para que não se tivesse chegado a esse ponto. São ações das entidades indígenas, do Governo do Estado e dos proprietários pequenos, ações minhas, do Senador Augusto Botelho, que estão sem decisão. O Ministro nos prometeu pautar imediatamente, em face da situação, aguardando apenas, segundo ele, parecer da Procuradoria-Geral da República. Enquanto isso, a Polícia Federal está pintando e bordando lá. Está pintando e bordando, como se lá fosse um faroeste qualquer.

Sr. Presidente, vamos ver como essas coisas têm certos contornos. Há uns dias, há algumas semanas, o Ministro Mangabeira Unger, a fim de subsidiar seu projeto, que ele chama de Amazônia do Futuro ou Amazônia Sustentável, esteve no meu Estado. Fui, inclusive, convidado por ele pessoalmente, para ir. Não tive oportunidade de ir por questões superiores, mas o Senador Augusto Botelho e o Deputado Márcio Junqueira foram. E o Comandante do Exército, General-de-Brigada Eliezer Monteiro, foi junto com a Ministra, no helicóptero do Exército, com pessoas do Exército, para dar não só a logística, mas também a segurança ao Ministro.

Pois, chegando lá a determinada vila, ele recebeu a informação de que o General não poderia ir para a reunião dos índios do Conselho Indígena de Roraima, dentro do território nacional; e que também não poderiam ir os Parlamentares, nem o Senador, nem o Deputado Federal.

Isso, Senador Mão Santa, o que é? Já é um nítido ato de autonomia territorial, de decisão de uma etnia - porque não aceito que ninguém diga que existe o povo indígena tal, mas o povo brasileiro, que tem etnias indígenas, negras, até européias. Existe apenas o povo brasileiro.

Mas quero ler aqui a nota de esclarecimento do Exército em relação a essa questão de o General ter sido barrado de entrar naquela reunião.

Em relação ao noticiário na imprensa, sobre a visita do Ministro Extraordinário para Assuntos Estratégicos, Roberto Mangabeira Unger, informamos que o Exército Brasileiro (EB) está presente em Roraima, cumprindo missão constitucional, quer seja em operações de presença ou de patrulhamento da fronteira, quer seja na realização de obras, ou na orientação educacional para a prática salutar da cidadania, dever de todos os brasileiros.

Conforme o art. 142 da Constituição de 1988, somos destinados à defesa da Pátria, o que nos obriga a estar presente em todos os pontos do Território Nacional.

Em relação às Terras Indígenas, o Decreto Presidencial nº 4.412, de 07 de outubro de 2002, estabelece que as Forças Armadas têm liberdade de trânsito e acesso às mesmas, sem depender de autorização. É claro que os militares respeitam estritamente as leis vigentes e o estado de direito.

Antes da visita da comitiva, foi informado pelo Chefe de Gabinete do Ministro que nenhuma autoridade estadual ou federal poderia participar da reunião com as lideranças no Surumu [uma vila, no Município de Pacaraima, dentro dessa área Raposa/Serra do Sol]. Tal fato causou estranheza não apenas aos militares do EB, mas também a alguns dos principais líderes políticos locais que haviam demonstrado interesse em participar.

O Comando da Brigada acredita que os assuntos a serem tratados naquele momento seriam de interesse do EB. A exclusão foi uma atitude equivocada, cabendo-nos lamentar, uma vez que nos parece própria de pessoas descompromissadas com o Brasil.

Maior repulsa causou essa decisão, ao sermos informados por moradores indígenas da região de que estrangeiros representantes de ONG participaram de outras reuniões realizadas no mesmo local.

Estivemos presentes, sim, na Vila Surumu, com tropa em missão de segurança de vôo da autoridade de um Ministro de Estado e de uma aeronave militar do Exército brasileiro.

Finalmente, o Exército brasileiro é composto por todos os segmentos representativos da sociedade, independente de raça, credo ou cor, e um fiel cumpridor de sua missão constitucional.

EXÉRCITO BRASILEIRO

BRAÇO FORTE, MÃO AMIGA.

            Sr. Presidente, veja o nível em que a coisa está: um grupo, que é o mais influente, diz que não pode entrar o Senador, o Deputado Federal, o comandante militar do Estado. Então, estamos diante de uma autonomia, do tipo da de Kosovo, naquela região que o Governo brasileiro demarcou e em que está usando a força para tirar os moradores brasileiros - como usou o regime soviético antigamente, como usou o regime nazista no passado.

E, mais grave ainda: aqui há uma nota publicada no jornal Folha de Boa Vista, que diz o seguinte: “CIR [Conselho Indígena de Roraima] diz que arrozeiros só não saem se não houver policial macho”.

Vejam vocês! Quer dizer, nessa região existem cinco entidades indígenas; essa é, vamos dizer assim, a menina-dos-olhos desse núcleo comunistóide socialista estatizante que comanda a Funai, o Incra e o Ibama.

A nota diz que só não saem se não tiver policial macho. Está, inclusive, exigindo ou incitando os policiais a retirarem os moradores. Aqui, a birra é com os arrozeiros, mas, na verdade, há os outros 340 proprietários que estão lá.

Sr. Presidente, para se ver como a coisa é séria, recentemente, na ONU, foi aprovada a Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas, e o Brasil assinou. O Governo brasileiro assinou um conjunto de artigos - vou ler aqui apenas o art. 30, mas existem vários outros - que são nitidamente inconstitucionais.

Diz o art. 30, Senador Augusto Botelho:

Artigo 30

1. Não se desenvolverão atividades militares nas terras ou territórios dos povos indígenas, a menos que as justifiquem uma razão de interesse público pertinente, ou que as aceitem ou solicitem livremente os povos indígenas interessados.

2. Os Estados celebrarão consultas eficazes com os povos indígenas interessados, para os procedimentos apropriados e, em particular, por meio de suas instituições representativas, antes de utilizar suas terras ou territórios para atividades militares.

            Ora, Senador Mão Santa, não é preciso nem ser muito inteligente para perceber que a ONU já está preparando - está tudo certo aqui - a criação de uma região, no mínimo, autônoma dentro do Brasil, quiçá não seja uma nova nação.

Coincidentemente, nessa reserva indígena, existe muito mais minério do que índios - e minérios de terceira geração, como urânio, titânio, nióbio, além do ouro, do diamante, da cassiterita. É evidente! Quem manda na ONU? São os países mais ricos, o G7 mais a Rússia.

Isso tudo aqui não é preocupação com o índio, não. Não é preocupação com o índio, não! É preocupação, sim, com a reserva mineral que está aqui. O índio aqui é apenas, digamos, a bandeira para encobrir o verdadeiro interesse desses países, que sempre foram colonizadores, que sempre sugaram a riqueza dos países mais pobres.

Quero, inclusive, chamar a atenção, Sr. Presidente - e aqui está um mapa para se perceber -, para como é delicada a situação do meu Estado. Nesta linha vermelha - por coincidência, em vermelho - está a reserva indígena Raposa Serra do Sol, na fronteira com a Guiana e com a Venezuela; o Brasil está despovoando essa área, numa região onde há conflito entre a Venezuela e a Guiana. Do outro lado, temos uma extensa área que é dos ianomâmis, e se está demarcando uma outra área para unir as duas. Então, quer dizer, todas as fronteiras do extremo norte do País estarão, portanto, preparadas para serem nações independentes ou, no mínimo, territórios autônomos, geridos pelos boinas azuis da ONU. Só não enxerga quem não quer. E, aí, os capitalistas, os donos do capital do mundo utilizam alguns inocentes esquerdistas, que acham que estão defendendo a sua ideologia de maneira correta, mas estão prestando um serviço ao capital internacional, transnacional, de maneira muito competentemente elaborada.

E, aqui, Sr. Presidente, eu trouxe também a relação, e vou pedir que V. Exª considere como lida e como parte integrante do meu pronunciamento, de todos os proprietários daquela região, para que não fique essa mentira que está sendo dita à Nação de que são apenas oito arrozeiros que estão naquela região. É mentira! Se tirassem os oito arrozeiros, ainda restariam 342 pessoas para serem retiradas; e estão sendo retiradas - porque não têm sequer condições de pagar um advogado - de maneira arbitrária. E, agora, eu lamento.

Sempre tenho dito que existem quatro instituições neste País que realmente pensam no Brasil com patriotismo, pensam na soberania do País e que são nacionalistas: são as três Forças Armadas e a Polícia Federal. Agora, a Polícia Federal ser usada para esse tipo de trabalho, eu lamento muito. Como brasileiro, como nacionalista, eu lamento muito. E sei que muitos deles que estão lá estão contrariados, porque têm que cumprir ordem, é tarefa da função deles.

Por isso mesmo, Sr. Presidente, requeri ontem, e foi aprovada, na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, na qualidade de Presidente da Subcomissão da Amazônia, que é ligada a essa Comissão, a minha designação para ir para lá e acompanhar de perto o que está sendo feito com os meus conterrâneos, com essas pessoas humildes. Não com os arrozeiros. Os arrozeiros podem, efetivamente, se defender, mas também com eles. Porque eles foram para Roraima - gaúchos, paranaenses - para colaborar com o desenvolvimento daquela região, e respondem por 25% do PIB do Estado. Mas eu estou preocupado muito mais com as cerca de 340 famílias que estão aí sendo maltratadas e, ao modelo soviético e nazista antigo, expulsas das suas terras e desterradas para lugares onde não querem ir.

Antes de conceder um aparte ao Senador Augusto Botelho, a quem teria muita honra em ouvir, quero dizer que as maldades do Presidente Lula com o meu Estado não se resumem somente a isso. Naquele episódio da votação da CPMF, tamanhas eram as pressões para que eu mudasse de posição, porque eu, por convicção, defendia um ponto de vista contrário à permanência da CPMF. Do que serviu a CPMF nos 14 anos? O que melhorou no serviço de saúde pública no Brasil? É epidemia de dengue, de febre amarela, hospitais sucateados, postos de saúde que não existem... Cadê o dinheiro da CPMF que era para a saúde? Foi uma enganação! Como era uma enganação dizer que o pobre não pagava imposto. Pelo menos, de janeiro para cá, quem recebe o seu dinheiro no banco não precisa mais pagar imposto para retirá-lo, não precisa mais pagar esse imposto. Esses quarenta e tantos bilhões de reais que iam para as mãos do Senhor Lula estão nas mãos do povo, e o povo faz o que quer do próprio dinheiro. Tenho certeza de que as donas de casa, os pais de família estão sabendo utilizar muito melhor esse dinheiro do que se utilizou durante esse tempo todinho e que não se fez nenhum bem à saúde.

Quero ler aqui, Senador Augusto, porque fizeram uma série de propostas, disseram que atenderiam a todas as reivindicações de Roraima, e eu disse que as formalizaria. Protocolei, no dia 5 de dezembro, ofício ao Presidente da República. Será possível que o Presidente Lula não tomou conhecimento disso? Será que, de novo, ele não sabia de nada? Sabia, porque essas coisas eu as levei pessoalmente a ele, junto com o ex-Governador de Roraima, que morreu, Ottomar Pinto. Sabia, porque antes do Governador Ottomar Pinto, com o Governador Flamarion, que mudou de partido - foi para o PT para resolver esse problema -, entregamos na mão do Presidente. Ele sabia e sabe de tudo. Mas eu queria lembrar, registrar, e botei somente oito pontos, Senador Augusto Botelho, para ele resolver:

1) Decreto passando todas as terras do INCRA para o Estado;

         O que é isso? Quando éramos Território Federal, o Governo Federal registrou as terras em nome do INCRA. Estava correto, éramos Território Federal. Passamos a Estado. Fui constituinte e escrevemos um artigo muito claro, que dizia que o Estado seria composto pelas áreas compreendidas dentro dos limites geográficos do ex-Território. Não precisava dizer mais nada: tudo que estava dentro desse limite era do Estado. Mas o Governo Federal continua até hoje com essas terras registradas em nome do INCRA e não passa para o governo do Estado. E o Supremo não resolve essa questão, que é um conflito federativo. Lamento muito dizer isso.

2) Decreto equiparando os vencimentos e vantagens dos servidores civis e militares do ex-Território Federal de Roraima aos servidores do Distrito Federal.

Há poucos dias, votou-se aqui uma MP para melhorar o salário dos PMs e bombeiros do Distrito Federal. Eu me retirei, porque, embora justa, não voto mais nenhuma medida provisória enquanto não se resolver esse rito de encaminhamento de medidas provisórias. Não vou ser conivente com a paralisação do Congresso Nacional por causa de medida provisória. Mas não houve o decreto de equiparação dos vencimentos e vantagens. Mandaram uma medida provisória para resolver o problema do Distrito Federal. Por que não mandaram uma medida provisória para resolver o problema dos funcionários do ex-Territórios: Rondônia, Roraima e Amapá? O quadro desses ex-Territórios está em extinção, o que significa que não entra mais ninguém e só sai de lá por aposentadoria ou por morte.

O que acontece é que o Ministério do Planejamento e Gestão considera que o que está em extinção são os funcionários, eles é que estão em extinção. Então, não dá aumento para eles, não dá a mesma equiparação de vantagens que dá para os outros servidores federais, inclusive do Distrito Federal que é semelhante. E fica por isso. Então, coloquei a resolução dessa questão.

3) Decreto prorrogando até o final de 2008 a retirada dos proprietários da Reserva Raposa Serra do Sol e adoção do Relatório da Comissão Temporária Externa do Senado Federal, criada pelo Regulamento nº 529, de 2005, revisando indenizações e assentando as famílias condignamente. Portanto, suspendendo a operação da FUNAI/Polícia Federal de expulsão dos mesmos de suas propriedades com o uso da força;

E está aqui o que está acontecendo.

4) Decreto efetivando a federalização da Companhia Energética de Roraima S.A - CER.

O que quer dizer isso? O Governo Federal federalizou todas as companhias estaduais de energia. Quanto à de Roraima, ele federalizou o filé e deixou com o Estado a carne de pescoço. O que quer dizer isso? A geração e produção de energia na capital, que dão dinheiro, ficaram com o Governo Federal; a geração e distribuição de energia no interior, que não dão dinheiro, mas prejuízo, ficaram com o Estado. Aí, nós estamos pedindo o quê? Que se federalize também a parte que não dá lucro, porque, somando com a que dá lucro, vai terminar com saldo positivo. Também não fez.

5) Decreto efetivando a implantação das ALCs [áreas de livre comércio] de Bonfim e de Pacaraima;

         Essas áreas de livre comércio foram mandadas para o Congresso pelo Presidente Sarney, sancionadas pelo Presidente Collor. Isso está na mesa do Presidente Lula até agora, e ele não as implanta.

6) Decreto autorizando importação de combustíveis da Venezuela com isenção do Imposto de Importação;

         O que é isso? Vou traduzir para os brasileiros que me ouvem, porque o povo de Roraima sabe muito bem. A gasolina na Venezuela - do outro lado, colado em Roraima, a 200 quilômetros da capital do Estado - custa mais ou menos um décimo do valor da gasolina do lado brasileiro. E a Petrobras não abre mão de, ela mesma, importar a gasolina para vender a preços diferenciados para a população de Roraima. Fomos à Venezuela, o Governador Ottomar e a bancada federal, e o Presidente Hugo Chávez disse: “Vendo agora. Estou fazendo isso para vários países, para a Colômbia [país com que se não se dá bem], para Estados vizinhos da Venezuela, estou fazendo para o Equador, para Guatemala, para Cuba. Faço agora”. Levamos isso ao Presidente Lula: “Não, mas se abrir essa exceção, o pessoal que é vizinho à Argentina vai querer, o pessoal que é vizinho ao Paraguai vai querer”. “Presidente, Roraima está lá no extremo Norte. Para chegar lá, são muitos e muitos quilômetros. Não há o menor perigo de alguém ir para lá contrabandear gasolina.”

O que está acontecendo hoje de fato? É contrabando de gasolina a toda hora. As reservas indígenas, ao longo da BR-174, a estrada que nos liga à Venezuela, transformaram-se em depósitos clandestinos de gasolina; são verdadeiras bombas prestes a explodir. Mas o Governo faz de conta que não está acontecendo. E, aí, aqui e acolá, a Polícia Federal e a Polícia Rodoviária Federal fazem uma operação e prendem meia dúzia de coitados que estão sobrevivendo, até, por causa do Governo, dessa situação, mas o Governo não resolve.

7) Decreto extinguindo o Comitê Gestor criado pelo Decreto s/n de 15 de abril de 2005, que “institui Comitê Gestor para coordenar a implementação das ações de competência dos órgãos federais no Estado de Roraima...”;

O que é isso? O Governo Federal, depois de criar um grupo de trabalho para resolver esses problemas que levamos e de ter chegado a uma conclusão, criou um Comitê Gestor para implementar as ações do Governo Federal junto ao Estado de Roraima. Na prática, nomeou um interventor federal para Roraima, o Sr. Nagib, que é do PT, que vai lá dizer o que vai fazer e o que não vai fazer. E, até agora, não fez nada. Só está ganhando dinheiro para ser interventor. É um interventor, digamos, não-oficial, mas é um interventor. Então, é inacreditável. Eu pedi para extinguir o comitê.

8) Aprovação da PEC nº 75, de 2003 (CD), nº16, de 2002 (SF) que trata de recursos para as instituições federais de ensino superior da Região Norte...

Veja bem, Sr. Presidente. Sabe o que é isso? É tirar 0,5% - meio por cento - do que o Governo arrecada com o Imposto de Renda e com o IPI para destinar às universidades e aos Cefets da Região Norte, para que possam investir em pesquisa, em extensão, em melhoria dos seus laboratórios, em aperfeiçoamento dos seus professores.

Foi aprovado no Senado. Está na Câmara. Não é aprovado por quê? Porque o Governo não quer. Porque a equipe econômica não quer abrir mão de meio por cento do que arrecada com o IPI e com o Imposto de Renda. Está lá. Eu pedi, e o Presidente sequer deu bola.

...e do PL nº 4.428, de 2004 (CD), PLS nº 211, de 2002(SF) [que foi aprovado no Senado e está na Câmara] de criação do Colégio Militar de Boa Vista.

Ora, Sr. Presidente, nem resposta tive. Eu lamento, porque, vejam bem. Poderá haver quem diga o seguinte: Ah, mas em face de agora o Senador Mozarildo ter tomado essa posição de votar contra a CPMF; de estar contra agora o Governo Lula; de ter sido tirado da CCJ pela Senadora Ideli Salvatti, porque disse que iria votar contra a CPMF, agora a gente não atende às reivindicações de Roraima.

Então, não vale o voto do Senador Augusto Botelho, que é do PT, que foi para o PT para resolver os problemas de Roraima? Não vale o voto do Senador Romero Jucá, que é Senador eleito por Roraima, embora não seja de Roraima, e que é Líder do Governo? Não vale? Dois votos são a favor do Lula sempre. Eu mesmo fui a favor do Lula até me convencer de que o que ele quer mesmo é enganar as pessoas. O que ele quer mesmo não é resolver coisa nenhuma relacionada aos interesses do Estado.

Diante desse quadro todo, o que vejo, Sr. Presidente, é que temos de continuar resistindo. Espero que o Presidente Lula entenda, aprenda - já que V. Exª sempre gosta de dizer isso - que discordar, fazer oposição, não é ter raiva. Discordar, apontar erros, não é ser rebelde. É o meu papel, como representante do meu Estado, defender o meu Estado; e, para obter as coisas que são de direito do meu Estado, eu não tenho de vender a minha dignidade e a minha alma. Eu não tenho.

É por isso que tem razão o Senador Garibaldi quando diz que muitos parlamentares no Senado e na Câmara pensam que têm sempre de votar com o Governo para ter as suas emendas liberadas e nomear amigo para certos cargos. Não foi para isso que eu me elegi. Eu me elegi a Deputado Federal e ajudei a transformar meu Território, na época, em Estado; apresentei uma lei que criou a Universidade Federal do meu Estado; uma lei que criou o Centro Federal de Educação Tecnológica do meu Estado. Eu trabalho no macro. No micro, nessa miudeza, eu não trabalho. Se o Presidente Lula gosta disso, eu não estou entre aqueles 300 picaretas que ele disse que existiam na Câmara, não. Eu não estou. Eu não sou parte desse time. Vou defender aqui, de maneira altiva, os interesses do meu Estado, documentando e brigando, aqui, no Poder Judiciário, onde puder. Se o Presidente Lula acha ruim ter quem fale a verdade contra ele, eu lamento, eu lamento muito, mas eu não estudei, eu não fui eleito parlamentar para aqui chegar e contrariar os princípios mais elementares da pessoa humana, que são a dignidade, a honradez e o respeito às coisas em que acredito.

Senador Augusto Botelho, eu ouço V. Exª com muito prazer.

O Sr. Augusto Botelho (Bloco/PT - RR) - Senador Mozarildo, é só para lembrar a V. Exª que, naquele mapa que V. Exª mostrou, onde tem a área dos inanomâmis, de nove milhões de hectares, aquele lá do Brasil, do lado da Venezuela tem uma área equivalente também. Então, aquilo que V. Exª falou, de querer criar uma nação, um país, um território autônomo, é uma coisa que está caminhando mesmo. Inclusive, o Príncipe esteve agora lá na Guiana e criou uma outra área lá contígua à área da Raposa Serra do Sol. V. Exª sabe dessa história.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - O Príncipe Charles.

O Sr. Augusto Botelho (Bloco/PT - RR) - O Príncipe Charles esteve lá e criou outra área na Guiana. Então, quer dizer, o negócio está ampliando, e o Brasil está contribuindo para isso também. Na hora em que resolverem fazer, não temos mais pulso, não temos mais nada. Quanto àqueles que estão na Raposa Serra do Sol para sair realmente, colocou V. Exª a relação deles aí, não é? Colocou o valor da indenização deles também?

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Está tudo aqui. A área da terra, o valor que a Funai estimou e a situação em que está. Quem recebeu e quem não recebeu, quem foi reassentado e quem não foi reassentado.

O Sr. Augusto Botelho (Bloco/PT - RR) - Quando se fala em indenização, o pessoal pensa em “indenização”! É indenização de R$1.500,00, R$3.000,00, porque são pessoas pobres que vivem lá com os indígenas. A extinção das vilas, o Surumu, Mutum Água Fria e Socó, não foi uma coisa correta dentro desse projeto, entre outras. Também tem isso, porque eram só as pessoas que viviam lá. Essas pessoas recebem três mil, quatro mil, cinco mil, dez mil, e lá em Boa Vista não têm como sobreviver dessa forma. Então, eu queria falar sobre isso para V. Exª. E também que o Presidente Lula prometeu mais uma vez que vai repassar as terras para Roraima. Inclusive, tem uma comissão do Incra estudando junto com a Secretaria de Planejamento para resolver esse problema. Eu tenho esperança de que essa solução virá, Mozarildo. Sou um homem sempre esperançoso, acredito nas pessoas, acho que vão transferir. E, transferindo a terra para Roraima, melhora a vida dos roraimenses. Esse ano voltaram R$150 milhões do FNO porque nós não temos bens para garantir os empréstimos. E R$150 milhões investidos em Roraima iriam criar quantos empregos? Então, isso que falamos toda hora aqui, V. Exª fala, todo mundo lá em Roraima sabe disso. Aliás, a Amazônia está nessa bagunça toda porque ninguém reconheceu a propriedade das pessoas que lá vivem. Quando criam essas reservas, expulsam as pessoas que lá vivem há muito tempo. E quem cria uma portaria do Ibama ou do Incra não faz essa discussão, como estão começando a fazer agora. Temos que fazer essa discussão. A criação de áreas indígenas e de reservas florestais tem que passar pela Assembléia Legislativa do Estado, pela Câmara e pelo Senado Federal. Não pode ser dessa forma, temos que mudar essa legislação. Como está, aumentará cada vez mais a instabilidade da Amazônia. Por que a Amazônia, como se diz, está sendo destruída, ocupada desordenadamente? Porque ninguém é dono lá. A pessoa que vive lá não é dona. A pessoa está há três gerações naquele lugar, chega um madeireiro potente e começa a destruir a floresta, e ele não pode fazer nada, porque não é dono. Então, acho que temos de regularizar a situação fundiária da Amazônia, especialmente no meu Estado.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Senador Augusto Botelho, conheço muito V. Exª e conheci seu pai, que foi para mim um mestre na Medicina e na política. Aliás, aprendi muito com ele e vi os sofrimentos que ele passou por ter coerência na política. Mas há algumas coisas, Senador Augusto Botelho, com as quais não podemos transigir.

         Ora, o Governo Federal repassar as terras que estão com o Incra para o Estado não é um favor que vai fazer para nós; é um dever que ele já deveria ter cumprido. Lamento que o Supremo Tribunal Federal não tenha ainda decidido isso, porque se trata de um conflito federativo. O Presidente Lula não vai merecer aplauso quando fizer isso, porque ele estará apenas cumprindo um dever dele. Não podemos aceitar que ele esteja fazendo um favorzinho depois de nos ter prejudicado violentamente com reservas indígenas desnecessárias - desnecessárias porque nem os índios vivem nelas. Repito: nessas reservas indígenas, há mais minério do que índios. Dizer agora que vai dar três milhões de hectares e esperar que fiquemos satisfeitos? Não, senhor! Se ele der, apenas estará cumprindo uma obrigação e não merecerá aplauso.

Segunda coisa: V. Exª disse uma coisa muito certa: é inadmissível que o Governo Federal demarque reservas indígenas, reservas ecológicas, corredores ecológicos e áreas de quilombolas somente por decreto, que a Câmara e o Senado não sejam ouvidos.

Numa proposta de emenda constitucional que apresentei em 1999, propus duas coisas singelas. A primeira: que todos os decretos relativos à demarcação de terras fossem apreciados pelo Senado; e a segunda: que a concessão das florestas da tal Lei das Florestas passasse pelo Senado.

Nós não representamos os Estados, Senador Augusto Botelho? Como, então, aceitar que não sejamos ouvidos? Somos ouvidos quando se trata de concessão de rádio, concessão de TV, nomeação de embaixadores, nomeação de diretores de agências reguladoras, mas não somos ouvidos sobre as terras dos nossos Estados? Mas não se aprova o meu projeto. Por quê? Porque o Governo não quer, e a maioria que ele tem aqui não deixa, não deixa. Está lá engavetado na CCJ! Não adianta: chia, chia, mas não anda.

Chegamos a um ponto extremo, e V. Exª, a propósito, citou o Príncipe Charles, que está convocando governadores e parlamentares do Brasil para irem a Londres discutir o que fazer com a Amazônia. Então, a internacionalização da Amazônia não é mais uma coisa sonhada, é uma coisa que está sendo implementada, e com a colaboração do Governo brasileiro. Quem demarca essas áreas? Quem adota posturas como essa que está sendo adotada em Roraima, de mandar a Polícia Federal expulsar os brasileiros de lá? Por acaso é tropa estrangeira? Não, é tropa de brasileiros, é a Polícia Federal.

A dominação psicológica que exerce esse esquema internacional sobre nós é tão grande que basta ver o nosso dinheiro, Senador Mão Santa. O que tem nas nossas cédulas de dinheiro? Só bichos. Nada contra os bichos, sou até um admirador da natureza, mas não tem nenhum vulto histórico, nenhum. Da nota de um real à de cem reais só há animais.

Querem ver? Vou pegar algumas aqui para vermos. Dois reais: qual o bicho que aparece aqui? Uma tartaruga marinha. Dez reais: o que tem aqui? Uma arara. Vinte reais: o que tem aqui? Um mico-leão dourado. Pena que eu não tenha aqui uma de cem nem uma de cinqüenta, mas sei que elas também trazem bichos: a de cinqüenta traz a onça pintada; e a de cem, a garoupa.

Vejam bem: um País que, ele próprio, se avacalha a esse ponto, realmente não tem de quem reclamar. Não tem de quem reclamar! Nós não temos Dom Pedro I nas nossas cédulas, não temos o Marechal Deodoro, não temos Pedro Álvares Cabral, não temos ninguém, nenhum vulto histórico! Não temos Juscelino Kubitschek. Mas bicho temos à vontade.

Quem foi que fez isso? Será que foi o Bush que veio aqui e mandou imprimir as nossas notas? Não, fomos nós - nós, não; estou fora dessa. Foi o Governo brasileiro. Eu protesto contra isso, mas foi o Governo brasileiro.

O Senador Mão Santa lembra que a nota de cem cruzados tinha a figura de Juscelino Kubitschek. Na época do cruzeiro e do cruzado, apareciam vultos históricos; mas, quando passamos para o real, tiraram todos os vultos históricos. Nós não temos mais nenhuma personalidade a cultuar neste País.

Então, Sr. Presidente, quero terminar, porque já abusei da boa vontade de V. Exª, mas peço que estes documentos que li aqui sejam transcritos na íntegra, como parte de meu pronunciamento.

Renovo, porém, o meu protesto e digo ao meu povo de Roraima que estou indo para lá semana que vem. Vou ficar lado a lado com as pessoas que estão lá sendo, de maneira coercitiva, abusadas.

Quero fazer aqui um apelo ao Diretor-Geral da Polícia Federal, com quem quero conversar antes de viajar, por causa do que está sendo feito lá - recebi relato ontem sobre isso. Os policiais federais estão andando pela cidade armados com metralhadoras, com coletes a prova de balas. Estão indo para os restaurantes, onde estão as famílias com crianças, dessa forma; e estacionando seus carros nas calçadas dos restaurantes, de maneira acintosa. Por que eles não se aquartelam e não comem nos quartéis? Por que eles têm que fazer esse tipo de intimidação com pessoas de bem?

Eu não aceito isso, Senador Mão Santa. Acho que nós temos que exigir respeito. Vou falar com o Diretor-Geral da Polícia Federal para ele não dizer também, como o Presidente Lula, que não sabia, que não ouviu falar - aqui pegou esta moda agora: ou o camarada diz que não sabia ou, se admite que errou, justifica-se dizendo que errou porque o outro errou antes também e, então, não tem problema.

Não interessa se houve erro no passado. O que entendo é que esses erros não podem se repetir agora. Eu vou estar, a partir da semana que vem, lá, durante os quinze dias que a Comissão me determinou, para ficar ao lado dessas pessoas, do meu povo, contra essa arbitrariedade que o Governo brasileiro está cometendo, que atenta contra a dignidade humana e contra a soberania nacional, já que está desocupando uma fronteira com dois países que têm litígio, a Venezuela e a Guiana.

Que amanhã não se diga que ninguém sabia, porque eu já estou ficando rouco de tanto falar nisso. Estou ficando rouco, mas não vou parar de falar.

Muito obrigado.

 

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DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SENADOR MOZARILDO CAVALCANTI EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inseridos no termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

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Matérias referidas:

Requerimento à CRE;

notícia da Folha Web;

encarte Porantim;

ofício ao Presidente da República sobre o desenvolvimento de Roraima;

Relação de pessoas expulsas de suas terras.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/04/2008 - Página 8028