Discurso durante a 49ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Premência da discussão e aprovação de medidas capazes de frear a violência praticada por jovens.

Autor
Sérgio Zambiasi (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RS)
Nome completo: Sérgio Pedro Zambiasi
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CALAMIDADE PUBLICA. SEGURANÇA PUBLICA. LEGISLAÇÃO PENAL.:
  • Premência da discussão e aprovação de medidas capazes de frear a violência praticada por jovens.
Aparteantes
Cristovam Buarque.
Publicação
Publicação no DSF de 11/04/2008 - Página 9068
Assunto
Outros > CALAMIDADE PUBLICA. SEGURANÇA PUBLICA. LEGISLAÇÃO PENAL.
Indexação
  • SOLIDARIEDADE, POPULAÇÃO, ESTADO DA PARAIBA (PB), VITIMA, INUNDAÇÃO, REGISTRO, ALTERAÇÃO, CLIMA, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), SITUAÇÃO, SECA.
  • GRAVIDADE, AUMENTO, VIOLENCIA, DELINQUENCIA JUVENIL, REGISTRO, CRESCIMENTO, MENOR, PARTICIPAÇÃO, HOMICIDIO, SEQUESTRO, ASSALTO, TRAFICO, DROGA, DEFESA, DEBATE, SENADO, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO, BUSCA, REDUÇÃO, CRIME, EFICACIA, PUNIÇÃO, RECUPERAÇÃO, INFRATOR, AMBITO, RESPEITO, DIREITOS HUMANOS.
  • COMENTARIO, OCORRENCIA, SUPERIORIDADE, NUMERO, HOMICIDIO, AUTOR, ADOLESCENTE, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), CERTEZA, IMPUNIDADE, ANALISE, BIOGRAFIA, FAMILIA, CRIMINOSO, FALTA, LEGISLAÇÃO, REPRESSÃO, DELINQUENCIA JUVENIL.
  • JUSTIFICAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, AUTORIA, DEMOSTENES TORRES, SENADOR, SITUAÇÃO, CRIME, PARCERIA, ADULTO, REDUÇÃO, LIMITE DE IDADE, IMPUTABILIDADE PENAL, EXPECTATIVA, URGENCIA, VOTAÇÃO, SENADO, OPORTUNIDADE, DEBATE, MAIORIDADE.

O SR. SÉRGIO ZAMBIASI (PTB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Agradeço a V. Exª, Presidente Efraim Morais.

As minhas primeiras palavras são de solidariedade para com o povo da sua terra, pela enchente que está passando e sendo vítima; situação inversa pela qual, neste momento, passa o meu Estado, Rio Grande do Sul. Nós, que estamos acostumados a chuvas muito generosas, estamos passando por um princípio de seca. Mais de 100 Municípios já estão enfrentando o problema de falta de água, de seca, de terra seca, o que seria comum lá, no seu sertão. Passa-se, infelizmente, a inverter o processo, e a seca passa a ser comum no nosso Rio Grande, onde o clima é bem mais temperado.

O SR. PRESIDENTE (Efraim Morais. DEM - PB) - Agradeço, em nome do povo da Paraíba, a solidariedade de V. Exª e, com certeza, em nome do povo gaúcho.

O SR. SÉRGIO ZAMBIASI (PTB - RS) - O tema que trago a esta tribuna para reflexão, Presidente Efraim Morais, apesar de árido, é recorrente e exige uma resposta eficaz, para que pelo menos se amenize o problema. Trata-se do avanço da delinqüência juvenil.

No Rio Grande do Sul, um adolescente de 16 anos confessou à polícia agora, no final do mês de março, ter matado 12 pessoas no Vale dos Sinos, na Região Metropolitana de Porto Alegre. Ele assumiu a autoria de todos esses crimes - sete dos quais já confirmados - com frieza e sem demonstrar o menor remorso. E esse, infelizmente, não é um caso isolado. Há dezenas de outros para nos mostrar o crescente envolvimento de menores em assassinatos, seqüestros, assaltos e no tráfico de drogas.

Diante disso, entendo que esta Casa deve discutir e aprovar medidas capazes de frear a violência praticada por jovens. É urgente que o Senado ofereça à sociedade alternativas para reduzir a criminalidade juvenil, ao mesmo tempo em que garanta meios para a efetiva punição e recuperação desses infratores, respeitando-se sempre os fundamentais direitos humanos.

Sr. Presidente, o jovem matador gaúcho, apesar de ter confessado o assassinato de 12 pessoas num espaço de apenas alguns meses, não é considerado um serial killer no sentido exato da expressão - atestam-no a polícia, psicólogos e psiquiatras que analisaram o caso. Trata-se, segundo esses profissionais, de alguém que não dá nenhuma importância à vida alheia e que praticou a maioria dos assassinatos tão-somente por vingança. Tal atitude mostra não apenas seu grau de crueldade, mas, principalmente, sua total falta de valores sociais.

Esse jovem foi preso por agentes da Delegacia de Polícia de Novo Hamburgo, no Vale dos Sinos, Região Metropolitana de Porto Alegre, como falei, por suspeita de assassinato de um comerciante numa vila daquele Município. Ao ser ouvido, ele surpreendeu os policiais: além de confirmar o assassinato do comerciante, contou que matara outras 11 pessoas. Os crimes, de acordo com o próprio autor, foram praticados a partir do segundo semestre do ano passado, o que deixou ainda mais estarrecida a população gaúcha.

Ao falar sobre as razões que o levaram a matar o comerciante, que o teria agredido com um tapa no rosto e proibido-o de entrar em seu estabelecimento, o jovem confirmou o desprezo pela vida alheia: “Ele se achava o machão da vila. Me deu na cara. Aí voltei e dei 20 tiros nele”, disse o adolescente.

Srªs Senadoras e Srs. Senadores, a frase é emblemática, de quem não mede conseqüências e tampouco reflete sobre seus atos, ignorando os mais elementares princípios da convivência social. Ela também está impregnada pela certeza da impunidade com que agem muitos de nossos jovens criminosos. Em certa medida, não deixa de refletir a própria ausência de leis capazes de inibir a delinqüência juvenil e de políticas públicas que consigam impedir que esses jovens trilhem o caminho do crime.

Mais surpreendente ainda é outra descoberta feita pela imprensa gaúcha em relação a esse jovem matador. Na edição do último domingo, em matéria assinada pelo jornalista Humberto Trezzi, o jornal Zero Hora revela que o adolescente, ao contrário do que muitos imaginavam assim que ele confessou os crimes, tinha um bom comportamento na escola, onde era considerado um aluno normal e de boas relações sociais.

Na ficha escolar do menor, constava - ou consta - a seguinte descrição, segundo o Zero Hora:

“Lê com fluência e demonstra plena compreensão da leitura, relata histórias e reportagens lidas com êxito. Atinge os objetivos, é bem integrado ao grupo, bem relacionado, respeita colegas e professores. É entusiasmado com informática e domina o computador”.

Como explicar, então, que esse adolescente tenha se transformado num matador que passou a aterrorizar, nos últimos meses, os moradores da Vila Kephas, em Novo Hamburgo, onde morou boa parte da sua vida? Há algumas circunstâncias que podem ajudar a decifrar, em parte, essa explosão de violência que tornou o rapaz um terrível assassino.

Filho de mãe condenada por tráfico de drogas e hoje em liberdade provisória, ele também tem outros familiares envolvidos em roubos e em outros crimes. Além disso, segundo a polícia, teria sido cooptado por uma quadrilha de ladrões, que lhe alcançou a primeira arma com a qual começou a praticar a série de assassinatos. Bastou que desse o primeiro tiro, sem qualquer punição, para que o jovem se sentisse livre para seguir atirando e passasse a matar; enfim, para que mostrasse seu total desajuste psicológico e começasse a se vingar daqueles que julgava tê-lo humilhado algum dia, ou para que se envolvesse em assaltos e, conforme a polícia, ajudasse a torturar uma jovem, uma de suas vítimas, até a morte.

Mais isso, por si só, não explica por que esse jovem, agredido na infância e que começou a freqüentar a escola apenas aos nove anos, virou um matador.

As razões são várias, indo desde problemas psicológicos, desestruturação familiar e, reitero, falta de uma legislação menos complacente com a delinqüência juvenil.

Sr. Presidente, é preciso lembrar que o País já assistiu ao envolvimento de menores em outros crimes bárbaros. Entre eles, a morte de João Hélio Fernandes, de seis anos, ocorrida no início de fevereiro do ano passado, na cidade do Rio de Janeiro. Vítima de assalto, João Hélio foi arrastado por um carro pelas ruas do subúrbio do Rio, num trajeto de cerca de sete quilômetros, até morrer e ter o corpo abandonado por uma quadrilha que tinha entre seus integrantes um adolescentes de 16 anos.

Quem não se recorda também do casal de jovens assassinado em São Paulo, a sangue frio, pelo assaltante Champinha, que, à época do duplo homicídio, também era menor de idade?

Sr. Presidente, pela atual legislação, o jovem matador gaúcho ficará recluso, no máximo, três anos. Esse período pode ser abreviado se ele tiver uma boa avaliação dos profissionais que acompanharão seu comportamento durante sua permanência numa casa de recuperação.

A lei que trata da punição para menores infratores é alvo freqüente de manifestações de setores da sociedade que defendem um tratamento mais rigoroso para os delinqüentes juvenis.

Quero lembrar que tramita nesta Casa a PEC nº 12, cujo Relator é o Senador Demóstenes Torres, que prevê a redução da maioridade penal em situações especiais.

Esse é um aspecto sobre o qual quero chamar a atenção para que não haja uma confusão sobre a generalização da maioridade penal.

Senador Cristovam Buarque, V. Exª solicita um aparte? (Pausa.) Vou concedê-lo, com muito prazer, daqui a pouco.

Sr. Presidente, tramita nesta Casa a PEC nº 12, que trata do assunto e que prevê a redução da maioridade penal em situações especiais, nas quais estejam envolvidos menores de 18 anos e maiores de 16 anos em crime de tortura, homicídio, tráfico, terrorismo e os definidos como hediondos.

Concedo, com muito prazer, o aparte ao Senador Cristovam Buarque.

O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Senador, quero primeiro cumprimentá-lo pela análise geral e por trazer para cá um problema que a gente não está dando a atenção devida, que é o descaminho da juventude e a violência contra as crianças no Brasil. Se a gente olhar os jornais nessas últimas semanas, é inacreditável a quantidade de crianças que foram mortas de diferentes maneiras. Ontem ou anteontem, O Globo colocava que, se não me engano, a cada dez minutos uma criança é assassinada no Brasil. Desculpe-me, não sei se são dez minutos, se são dez horas, mas não importa.

O SR. SÉRGIO ZAMBIASI (PTB - RS) - Dez minutos, eu li.

O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - O senhor leu. Isso merecia que a gente parasse de trabalhar por um dia para discutir o assunto. O que é que estamos fazendo com as nossas crianças? O que estivermos fazendo com as nossas crianças, estaremos fazendo com o futuro do País, porque o futuro do País são essas crianças. Ao mesmo tempo que morrem, estão jogadas fora das escolas, estão abandonadas, e os jovens desencaminhados. Alguns desencaminhados por eles, e outros desencaminhados pelos assassinos deles. Então, esse assunto trazido pelo senhor eu gostaria de vê-lo debatido algum dia, independentemente, especificamente, da proposta que V. Exª menciona, a PEC nº 12. Sobre a PEC nº 12, eu também - embora defensor radical do Estatuto da Criança e do Adolescente - estou de acordo que tem de haver exceções. Estou de acordo, V. Exª tem razão. Poderemos discutir quem define a exceção: é um juiz, é um colégio de juízes, são psicólogos, é um colégio de psicólogos? Vamos discutir quem define o tratamento diferenciado para alguns meninos e meninas que, embora não tenham 18 anos, representam, sim, um perigo se ficarem fora. Com isso estou de acordo. Apoio o senhor ao trazer esse assunto, mas sobretudo o parabenizo por não haver ficado apenas no assunto, trazendo-nos a história dessas últimas semanas e meses no Brasil, no que se refere ao descaminho da juventude brasileira.

O SR. SÉRGIO ZAMBIASI (PTB - RS) - Senador Cristovam Buarque, quero agradecer a sua oportuna manifestação, o seu aparte, porque entendo que, realmente, esta Casa precisa produzir algumas ações que reflitam os anseios da sociedade, que está nos acompanhando neste momento. E uma delas é trazer para este plenário, por exemplo, a votação da PEC nº 12, que está na fila para ser votada. Trazê-la como prioridade, trazê-la para o plenário, chamar para o voto, promover a discussão, acompanhar inclusive as manifestações da sociedade em relação ao nosso voto.

Há muita confusão na discussão em relação à redução da maioridade penal, porque é um tema realmente de profunda aridez. Mas algo precisa ser feito, e com urgência.

Sei que nós todos - sociedade - somos responsáveis. Uma boa escola, uma boa atenção à comunidade automaticamente é um freio em relação à delinqüência juvenil. Mas, enquanto deixarmos esses jovens à mercê dos adultos, exatamente por que induzem o jovem a sentir-se protegidos pela própria lei na prática do crime... Isso não pode mais acontecer. O jovem tem de refletir e pensar que se envolver em um crime hediondo pode lhe impor uma severa punição também, Senador Mão Santa.

Creio que esta é uma nova oportunidade para que voltemos a discutir esse assunto. No mínimo isso, tamanha é a gravidade dos crimes envolvendo menores, ou como vítimas, ou como praticantes em todo o País.

Estou convencido de que não podemos mais adiar a busca de alternativas para atender ao clamor da sociedade brasileira e, ao mesmo tempo, evitar que alguns jovens sigam praticando crimes, muitas vezes orientados por adultos amparados na certeza da impunidade.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/04/2008 - Página 9068