Discurso durante a 56ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas às ocupações do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em diversas partes do país. Considerações sobre as preocupações do General Augusto Heleno com relação à soberania nacional. Homenagem ao aniversário de Brasília.

Autor
Kátia Abreu (DEM - Democratas/TO)
Nome completo: Kátia Regina de Abreu
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INDIGENISTA. SOBERANIA NACIONAL. REFORMA AGRARIA. POLITICA FUNDIARIA. HOMENAGEM.:
  • Críticas às ocupações do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em diversas partes do país. Considerações sobre as preocupações do General Augusto Heleno com relação à soberania nacional. Homenagem ao aniversário de Brasília.
Aparteantes
Adelmir Santana.
Publicação
Publicação no DSF de 19/04/2008 - Página 10195
Assunto
Outros > POLITICA INDIGENISTA. SOBERANIA NACIONAL. REFORMA AGRARIA. POLITICA FUNDIARIA. HOMENAGEM.
Indexação
  • APOIO, DECLARAÇÃO, GENERAL DE EXERCITO, ADVERTENCIA, NECESSIDADE, ATENÇÃO, DEMARCAÇÃO, RESERVA INDIGENA, ESTADO DE RORAIMA (RR), FRONTEIRA, BRASIL, SIMILARIDADE, GRUPO ETNICO, INDIO, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, GUIANA, COMENTARIO, ORADOR, PROBLEMA, HIERARQUIA MILITAR.
  • QUESTIONAMENTO, EXTENSÃO, TERRITORIO, RESERVA INDIGENA, SUPERIORIDADE, PERCENTAGEM, ESTADO DE RORAIMA (RR), COMPARAÇÃO, DIMENSÃO, TERRAS, DESTINAÇÃO, AGRICULTURA, PECUARIA, REFORMA AGRARIA, AREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL, APRESENTAÇÃO, DADOS, DEFESA, DESNECESSIDADE, AMPLIAÇÃO, TERRAS INDIGENAS.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DECLARAÇÃO, PRESIDENTE, MOVIMENTO TRABALHISTA, SEM-TERRA, ACUSAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DESCUMPRIMENTO, ACORDO, CRITICA, REFORMA AGRARIA, GOVERNO FEDERAL, INSUFICIENCIA, ASSISTENCIA, ASSENTAMENTO RURAL, PREJUIZO, ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL, QUESTIONAMENTO, SUPERIORIDADE, DESTINAÇÃO, RECURSOS, MINISTERIO DO DESENVOLVIMENTO AGRARIO, COMPARAÇÃO, ORÇAMENTO, MINISTERIO DA AGRICULTURA PECUARIA E ABASTECIMENTO (MAPA).
  • CRITICA, ATUAÇÃO, MOVIMENTO TRABALHISTA, SEM-TERRA, INVASÃO, PATRIMONIO PUBLICO, PATRIMONIO, EMPRESA PRIVADA, PROPRIEDADE PARTICULAR, DESRESPEITO, DIREITO DE PROPRIEDADE.
  • QUESTIONAMENTO, ATUAÇÃO, OUVIDOR, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA), MINISTERIO DO DESENVOLVIMENTO AGRARIO, RECOMENDAÇÃO, POLICIAL MILITAR, IMPEDIMENTO, REINTEGRAÇÃO DE POSSE, FAVORECIMENTO, SEM-TERRA, ACUSAÇÃO, ORADOR, VIOLAÇÃO, DIREITO DE PROPRIEDADE, DEMOCRACIA.
  • QUESTIONAMENTO, LEGISLAÇÃO, DESAPROPRIAÇÃO, PROPRIEDADE RURAL, VIABILIDADE, ASSENTAMENTO RURAL, ESPECIFICAÇÃO, FRONTEIRA, BRASIL, MOTIVO, ERRO, CRITERIOS, PRODUTIVIDADE.
  • EXPECTATIVA, DECISÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), AÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE, DERRUBADA, LEI FEDERAL, CRIAÇÃO, QUILOMBOS, ENTREGA, TITULO DE PROPRIEDADE, TERRAS.
  • ELOGIO, CONDUTA, GOVERNADOR, ESTADO DO TOCANTINS (TO), DEFESA, DIREITO DE PROPRIEDADE, CUMPRIMENTO, REINTEGRAÇÃO DE POSSE.
  • SAUDAÇÃO, POPULAÇÃO, DISTRITO FEDERAL (DF), ADELMIR SANTANA, SENADOR, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, CAPITAL FEDERAL.

A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Muito obrigada, Sr. Presidente. É exatamente por isto que, muitas vezes, usamos a tribuna na sexta-feira: para não incomodar os demais colegas com assuntos mais polêmicos e demorados no debate, podendo dar condições aos Senadores e às Senadoras de fazerem seus apartes.

Sr. Presidente, hoje, vou falar sobre dois pontos importantes que estão na mídia nacional, pontos que já conhecemos e com que convivemos há muito tempo: soberania nacional e direito de propriedade.

Registro minha admiração ao General Heleno pela sua coragem. Sei que ele foi ao seu limite, para dar nitidez à gravidade da situação. Se houve erros ou críticas, não quero aqui discordar do Senador Arthur Virgílio, mas tenho a certeza de o General Heleno agiu como muitos brasileiros, não apenas das Forças Armadas, que, indignados com as atrocidades que vêm ocorrendo no País, às vezes, ultrapassam seu limite para demonstrar a gravidade do que está ocorrendo, já que muitas das vezes ninguém nos ouve.

Quem é especialista em soberania nacional são as Forças Armadas, Sr. Presidente. Quem é especialista em escrever artigos, colunas e matérias são os jornalistas. Assim, as profissões e suas características devem ser respeitadas e ouvidas. Mas, para as Forças Armadas, não há ouvidos, Sr. Presidente. Os recursos do Orçamento Geral da União para a Marinha, para a Aeronáutica e para o Exército... Nossa Marinha já foi a segunda do mundo em 1902, e não sei nem em que lugar ela se encontra hoje na América Latina.

Estamos crescendo, nosso País está se desenvolvendo, mas não podemos deixar à margem a questão da soberania. As críticas do Senador Arthur Virgílio merecem consideração, mas é muito mais importante neste momento nós nos abstrairmos da crítica ao General Heleno e nos atermos ao conteúdo do que ele disse, como se estivesse pedindo socorro para a soberania nacional, ultrapassando toda a rigidez do comportamento militar, todo o silêncio que as Forças Armadas são obrigadas a respeitar. Ele não conseguiu segurar sua voz, tamanha a preocupação com o Brasil! E ninguém vai duvidar de que outro interesse possa ter tido em sua atitude, a não ser a defesa nacional.

Sr. Presidente, Roraima é um Estado importante para o Brasil, como muitos outros, como o meu Estado, o Tocantins. É um Estado fortemente prejudicado em seu progresso econômico. A questão Raposa Serra do Sol é polêmica nacional. Hoje, isso se dá em Roraima, mas acontece também em Mato Grosso do Sul, em Mato Grosso, no Pará, e, daqui a pouco, pode ser que ocorra no meu Tocantins. Nós, brasileiros, temos de estar atentos a todos os problemas nacionais, sem sermos como um caracol, como um caramujo, olhando apenas para dentro de nossas cidades e do nosso próprio Estado. O Brasil tem de ser visto como um todo, numa visão holística, de um país inteligente.

Em Roraima, há 18 mil índios e 1,7 milhão de hectares de área contínua, com várias etnias. O que o General quer dizer é que esses 1,7 milhão hectares de reserva indígena estão na divisa com a Venezuela, que também possui uma reserva indígena do outro lado, com a mesma etnia, com os mesmos familiares ianomâmis. Trata-se de área contínua não apenas brasileira, mas que se estende para as Guianas e para a Venezuela. É essa possibilidade, é esse perigo que o General Heleno quer mostrar para o Brasil.

Hoje, o Estado de Roraima, que é mais ou menos do tamanho de São Paulo - não me lembro bem se um pouco mais ou um pouco menos - está comprometido, com 93% de sua área como reserva indígena e como unidade de conservação ambiental, restando à população apenas 7% para a produção agrícola e industrial.

Toda a polêmica dos arrozeiros, que estiveram comigo na primeira hora, na primeira liminar que conseguiram na Justiça, diz respeito a apenas 14 mil hectares. O que eles reivindicam é menos de 1% - se não me engano, 0,68% - da área de 1,7 milhão de hectares. Será que é tanto assim?

Muitos índios não querem sequer a demarcação, porque lá trabalham e são parceiros dos arrozeiros. São 14 mil hectares que se transformam em 24 mil hectares, porque são duas safras anuais. Talvez, seja o único segmento organizado e produtivo daquele Estado, que é menos de 1% da reserva indígena, e ainda o querem expulsar da região.

Existe ainda uma área contígua - a São Marcos - com mais de um milhão de hectares de reserva indígena. Isso significa que, no Brasil, como um todo, para cada índio, não para cada família - independentemente da idade, se é idoso ou bebê -, há 250 hectares. Para a reforma agrária, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) estabelece um módulo rural para a família toda, que compreende o pai, a mãe e, às vezes, três, quatro, cinco, até dez filhos. Um módulo rural varia por Estado, mas o maior do País é o de Mato Grosso, com 100 hectares. Em meu Estado, o Tocantins, são 80 hectares, e há menores módulos em outros Estados. O módulo máximo é o de 100 hectares para uma família inteira, mas 250 hectares são destinados a cada índio, não a cada família indígena. Não pretendo discutir o mérito, se é muito ou se é pouco. A única coisa que discuto é se há realmente necessidade de ampliação das reservas indígenas do País.

Muitos se enganam, acreditando que o Brasil é retalhado por grandes propriedades rurais. Há cinco milhões de propriedades rurais no País - cinco milhões! - e um milhão de propriedades comerciais. Se unimos o Canadá, os Estados Unidos, a Austrália e a Argentina, os quatro países juntos têm 2,7 milhões de propriedades rurais. Então, a média da propriedade rural brasileira é menor do que a destinada a cada índio brasileiro.

Sr. Presidente, em assentamentos espalhados por todo o Brasil, há 77 milhões de hectares distribuídos; em reservas indígenas, 108 milhões de hectares; em unidades de conservação, 176 milhões de hectares, num total de 361 milhões de hectares destinados à preservação ambiental, às reservas indígenas e aos assentamentos. Mas quero também lembrar aqui que a agricultura temporária, a agricultura permanente, como a fruticultura, e as florestas cultivadas, essas três atividades juntas ocupam 77 milhões de hectares do País. É quase a metade do que é destinado à unidade de conservação. Vou repetir: para assentamentos, são 77 milhões de hectares; para reservas indígenas, são 108 milhões de hectares; para unidades de conservação, são 176 milhões de hectares; para agricultura perene e temporária e para florestas plantadas, são 77 milhões de hectares; e para pastagens, são 172 milhões de hectares. E, neste País, há um total de 850 milhões de hectares.

As invasões a que estamos assistindo, neste abril vermelho, deixam-nos indignados e escandalizados, como também toda a imprensa nacional, todos os jornais deste País. Essas invasões são antecipadamente comunicadas ao Governo e à imprensa: “Vamos atacar as propriedades rurais, vamos praticar a desordem e o descumprimento da Constituição”. E ninguém se previne, ninguém tenta fazer nada. Esse ninguém é o Governo Federal.

E, ainda, o amigo do Presidente Lula, o líder do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), João Pedro Stédile, talvez pela intimidade que há entre eles e pela liberdade que ambos têm - isso está hoje na Folha de S. Paulo -, disse, em São Paulo, que o Governo Lula precisa criar vergonha na cara, para cumprir acordos feitos com ele. Quem disse isso não foi a Oposição, foi o amigo do Presidente Lula, João Pedro Stédile, que costuma ser recebido pelo Presidente no Palácio do Planalto, como diz fazer todo democrata.

Sr. Presidente, Senadoras e Senadores, dispomos de três instrumentos oficiais e legais para fazer a reforma agrária. Não quero aqui discutir o mérito dessa reforma, se é positiva, se é negativa; estou discutindo a legislação. Há três instrumentos para fazer a reforma agrária: as terras públicas devolutas do Incra, que somam quase 170 milhões de hectares, que estão disponíveis ao Governo, sem que se tenha de gastar um centavo de indenização, e que poderão ser destinadas à reforma agrária; o crédito fundiário, que é um subsídio, um empréstimo feito pelo Governo a um grupo de sem-terra que se reúne para comprar determinada propriedade e pagá-la no prazo de 30 anos; e a desapropriação por improdutividade, que é a mais antiga, ou seja, o Incra visita a propriedade rural, para verificar se é produtiva ou não, e, não o sendo, o Incra a desapropria, indeniza o proprietário e a entrega para a reforma agrária.

Não sei do que reclamam tanto, Sr. Presidente! Não entendo essas invasões abusivas, principalmente neste mês. Para se ter uma idéia, o Ministério do Desenvolvimento Agrário, no Orçamento de 2007, gastou R$3 bilhões apenas em custeio e em investimento, enquanto o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, que é responsável por um terço do Produto Interno Bruto (PIB), por um terço das exportações brasileiras, por um terço do emprego, gastou R$2 bilhões. São R$2 bilhões do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e R$3 bilhões do Ministério do Desenvolvimento Agrário, sendo que, dos R$2 bilhões do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, R$1 bilhão é destinado à compra da produção da pequena propriedade, transformando-a em cesta básica, num programa que se chama Compra Direta Local.

Não há distorção em que pesem as considerações econômicas dos dois Ministérios, mas quero demonstrar aqui que não há justificativa para essas invasões, para essas agressões que têm sido feitas pelo Brasil afora. O mais importante, Sr. Presidente, não é só assentar os nossos companheiros brasileiros, precisamos emancipá-los. Quando se forma um assentamento num Município, quando se anuncia que um Município vai receber um assentamento - o que era motivo de alegria no passado para Prefeitos e Vereadores, porque ali poderiam ser empregadas 100, 150 ou 200 pessoas, e 50 pessoas teriam seu pedaço de chão -, hoje isso é motivo de transtorno. E é motivo de transtorno, Sr. Presidente, não por causa das pessoas ou dos assentados, mas porque, depois do assentamento instalado, jogam esses seres humanos nesses assentamentos sem a devida estrutura, e aí sobram para os cofres do Município crédito, casa, energia, água, estrada, algo que o Governo não complementa. Sobra todo o ônus para o Município, que recebe apenas 16% do bolo da União, enquanto o Governo Federal, de tudo que é arrecadado no País, fica com 55%. O Governo faz os assentamentos, leva a fama de fazer a reforma agrária e joga o ônus para os Prefeitos do Brasil, que, com razão, têm de ficar socorrendo as famílias que lá são jogadas e que não recebem sua casa, nem alimento, nem luz, nem água. Os assentamentos acabam se transformando em verdadeiras favelas rurais.

O que queremos é que o Governo regularize todos esses assentamentos e emancipe esses cidadãos brasileiros, para que possam ser independentes. O assentamento tem de ter uma porta de entrada, mas também uma porta de saída, para que os assentados sejam inseridos no agronegócio brasileiro, tenham sustentabilidade, incorporem-se ao processo produtivo deste País.

Sr. Presidente, o MST perdeu totalmente o foco. Não existe mais foco. Sua antiga causa, sua causa no verbo, na palavra, não coincide com suas operações, que são totalmente divergentes, e o Governo brasileiro não está vendo isso. Quem quer terra não invade prédio público; quem quer terra não invade empresas importantes, como tem acontecido no Brasil, como se houvesse um movimento contra o progresso, como se esse movimento muito mais indicasse um desejo contra o desenvolvimento. Isso ocorre não só no campo, não só na zona rural, pois o MST se estende para as cidades e cria também os sem-teto nos centros urbanos, invadindo terrenos e agredindo brutalmente o direito de propriedade no Brasil.

Senadoras e Senadores, a Ouvidoria do Incra, a Ouvidoria Agrária Nacional, do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), fez uma reunião com representantes dos policiais militares de todo o Brasil e determinou regras para a reintegração de posse. A Ouvidoria do Incra, do MDA, está querendo dar aula à Polícia Militar sobre como fazer uma reintegração de posse. Está publicado no dia 28 de fevereiro esse parecer da Ouvidoria Agrária, que, com as recomendações dadas às Polícias Militares de todos os Estados, praticamente impede a reintegração de posse. Anular-se-á o mandado judicial de reintegração de posse, se as Polícias Militares cumprirem esse parecer da Ouvidoria Agrária, do MDA.

Sr. Presidente, esse parecer atenta diretamente contra o direito de propriedade e contra a democracia. Sinto - e todo o Brasil hoje tem tal lucidez - que essa organização, o MST, e todos os invasores de terra são uma organização política que quer implantar um socialismo autoritário; que quer transformar o País em Cuba ou na Venezuela; que pretende, em todos os momentos, relativizar o direito de propriedade.

O direito de propriedade não pode ser relativizado, o direito de propriedade é um dos pilares mais importantes dos países que se desenvolveram. Quando eu digo o direito de propriedade, não é apenas o direito da terra, mas é o direito da sua casa, é o direito do seu carro, é o direito dos seus contratos, é o direito dos compromissos cumpridos, é o direito trabalhista.

Tudo isso é segurança jurídica, Sr. Presidente. Tudo isso são direitos que têm que ser cumpridos neste País. Se nós não respeitarmos esses direitos, nós estaremos fadados... Se nós abandonarmos uma cláusula pétrea da Constituição Federal, nós estaremos fadados a ser um País continuamente em desenvolvimento.

Perdeu o foco o MST. As suas causas não são mais as mesmas, porque a sua prática é outra. Por que fazer isso com a Vale do Rio Doce? Uma empresa importante para o desenvolvimento e o crescimento do País. Por que invadir a Aracruz Celulose? Por invadir a Monsanto? Por que invadir a Syngenta? O que essas empresas têm a ver com a política do Governo de reforma agrária? Elas não são responsáveis por promessas feitas pelo Governo e não ter cumprido por, simplesmente, não ter caixa, não ter tesouro para fazer o tanto de assentamentos que foi prometido nas campanhas anteriores.

E culpam, invadem essas empresas, que podem ser estrangeiras ou nacionais. Não me interessa quem são as empresas e nem me interessam os donos. Interessam-me os empregos que estão nessas empresas, os trabalhadores e as trabalhadoras que lá trabalham e recebem seus salários. É isso que nós temos que preservar.

Nós lutamos pelas empresas para diminuir os impostos no Brasil, a carga tributária exorbitante. Alguns, de propósito, com malícia, acham que nós estamos defendendo os ricos. Mas eu pergunto a esses maledicentes e maliciosos: se nós não protegermos as empresas, onde eles vão colocar os trabalhadores deste País? Para trabalhar onde? Nas prefeituras? Nos governos de estado? Na União, onde há um limite de empregabilidade que a lei autoriza? A lei não permite que um Município, o Estado ou o Governo Federal possa contratar mais gente do que um percentual determinado pela lei.

Sr. Presidente, hoje nós temos uma medida provisória que foi editada no Governo anterior. Na crise das invasões que se proliferavam pelo Brasil, antes da edição da medida provisória contra a invasão, nós tínhamos uma média de 502 invasões por ano. Após a edição da medida provisória, que dizia o seguinte: “Terra invadida não pode ser desapropriada”; Invadiu, perdeu a chance de aquela terra virar um assentamento. Depois dessa medida provisória, as invasões foram reduzidas, em 2002, de 502 invasões a 103. E agora, Sr. Presidente, no ano passado, de 2007, de 103 invasões de 2002, nós estamos, em 2007, com 298 invasões em propriedades rurais deste País. Apenas nessa primeira quinzena de abril, do “abril vermelho” do MST, já se calculam, apenas nessa quinzena, 50 invasões espalhadas pelo Brasil todo, num movimento ordenado, organizado, propositado e não enxergamos em nenhum momento uma ação firme, dura do Governo, no sentido de coibir não o legítimo direito de manifestação, do direito à terra, do direito à saúde, do direito à casa, pois nós vivemos numa democracia e temos que permitir que as pessoas se expressem da maneira que quiserem, mas não agredindo a Constituição, não trazendo a desordem, não contra a lei, porque vivemos em um país pacífico, ordeiro, onde existe um Congresso Nacional e onde as leis têm que ser respeitadas.

Aqui, Sr. Presidente, a própria Vale do Rio Doce se insurge, com razão, com revolta, com indignação, contra o Governo do Pará. Foram mais de cinco horas de comemorações no acampamento, posteriormente ao impedimento da ferrovia da Vale do Rio Doce, da mineradora. Manifestantes soltaram rojões e enfeitaram a locomotiva com faixas contra a Vale do Rio Doce, bandeiras vermelhas do movimento MST do Brasil, do Pará, e com a imagem de Che Guevara colada nos vagões da Vale do Rio Doce.

E a Vale, Sr. Presidente, responsabilizou a Governadora Ana Júlia Carepa, que começou a se insurgir contra essas invasões da tribuna desta Casa, das Comissões desta Casa, onde criticava e afrontava o direito à propriedade. Agora passou para o Executivo. Agora é Governadora. O discurso é outro, porque ela tem obrigação de manter a ordem em seu Estado, sob pena de intervenção pelo não-cumprimento das reintegrações de posse. E a Vale responsabiliza a Governadora Ana Júlia Carepa, do PT, pelo bloqueio da ferrovia.

Em nota, a mineradora disse que:

...não vai se calar diante das ameaças do MST ou da falta de responsabilidade dos governantes, em especial do Governo do Estado do Pará, que se omite diante de um crime há muito tempo anunciado e que, por incompetência ou conivência, estão assistindo a essa maré de crimes que, nos últimos dias, vem aterrorizando o País.

Essa é a nota da Vale do Rio Doce.

Sr. Presidente, nós precisamos ter uma reação. Não há mais possibilidades de continuarmos nesse ritmo em que não só o MST agride o direito de propriedade, mas em que o maior agressor tem sido a caneta do Governo Federal, que, por meio de instruções normativas e decretos assinados pela Presidência da República, tem afrontado, todos os dias, o direito de propriedade, começando pela Instrução Normativa nº 27A, do Incra, que muda todas as regras da vida de 10% da população dos municípios do Brasil que estão na faixa de fronteira. Esses brasileiros corajosos, há centenas de anos, foram lá colocados por uma questão de soberania e defesa nacional e estão lá desde o início deste País, garantindo a habitação nessa região de difícil acesso, que vem passando de pai para filho, de pai para filho.

E, hoje, o Incra desmancha a Instrução Normativa nº 27, que dispõe que, para ser titulado na faixa de fronteira, o proprietário rural tem que estar explorando 50% da área, nem lá precisa estar morando, e faz a IN nº 27A, impondo a esses cidadãos, que estão lá há mais de 50, 100, 200 anos em propriedades familiares, índices de produtividade de reforma agrária. Não há nada mais desonesto e injusto do que isso. Vou explicar o que isso significa.

Eu tenho uma regra que dispõe que, para eu ser titular de uma faixa de fronteira, onde estão 10% dos municípios do País, devo apenas comprovar minha produção em metade da área para receber o meu título. Recebo a minha escritura; a minha propriedade está garantida. Após isso, o Incra pode ir à minha propriedade e verificar se eu estou cumprindo os índices de GUT e de GEE, para dizer: “você é produtiva ou improdutiva e eu vou tomar sua terra e fazer dela um assentamento”.

O que vai acontecer nesse momento? A partir do momento em que o cidadão está titulado, o Incra é obrigado a pagar o valor da terra nua e as benfeitorias. Uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa. Eu disse isso para o Presidente Rolf Hackbart, do Incra.

Não pode misturar o reconhecimento e a posse de uma propriedade com a produtividade dela, ou não. Que venha após a posse verificar se ela é produtiva ou não.

Agora, Senadores e Senadoras, um debate importante para o País é sobre os índices de produtividade por cujas mudanças somos sempre ameaçados. Os índices de produtividade garantem se a terra será desapropriada, ou não.

Quero, aqui, dar um exemplo importante que todos vão entender, todos que nos ouvem. O Brasil, que ouve a TV Senado; que assiste à TV Senado vai entender como funciona o índice de produtividade neste País.

Imagine que o Senador Mão Santa seja proprietário rural no Município do Tocantins e cumpra os índices de produtividade. Quais são os índices? O primeiro é o GUT. O fiscal do Incra chega na fazenda e diz ao Senador Mão Santa: “Qual o tamanho da sua propriedade?” Ele vai dizer: “Mil hectares.” “Quanto você tem que é de reserva legal?” “Está aqui.” A reserva legal está separada. No que sobrou para produção, se o Senador Mão Santa não estiver produzindo em 80% dessa área, vai ser desapropriado.

Mas imagine que o Senador Mão Santa esteja produzindo em 80% da propriedade. O fiscal do Incra vai ver os índices de produção - vamos imaginar que o Senador Mão Santa é um produtor de milho, e ele, corretamente, está atendendo também à determinação do Governo, que é 1.540 quilos de milho por hectare. O Senador Mão Santa passou na prova, o fiscal do Incra vai embora e vai à fazenda vizinha, da Senadora Kátia Abreu. E se lá chegar e não encontrar os 80% de área em produção, se tiver 79% produzindo apenas, 1% a menos, eu já sou imediatamente classificada para desapropriação, mesmo que, ao contrário do Senador Mão Santa, que estava produzindo 1.540 quilos por hectare, eu esteja produzindo 4.200 quilos por hectare. Por conta de 1% de área plantada, eu serei desapropriada, e ele não, mesmo produzindo menos do que eu.

Essa é a regra brasileira inteligente, que penaliza a produtividade, penaliza a tecnologia, penaliza a capacidade. Eu não tenho o direito, os produtores rurais deste País não têm o direito de agir de forma mercadológica, não podem recuar na sua produção porque o preço está ruim e são obrigados a plantar com prejuízo, porque, se não tiverem plantado em 80%, o Incra toma a terra; se não houver o número de vacas ou de bois por hectare, o Incra toma a terra.

Eu nunca vi fazer isso com fábrica de carro. Se uma fábrica que produz dois mil carros por mês achar que o mercado está ruim, ela dá férias coletivas, fecha a fábrica por 90 dias, ou reduz sua produção, e eu nunca vi ninguém ir lá e tomar a fábrica de alguém.

Agora, nós não. Muitos perguntam por que a produção agrícola está aumentando se os produtores rurais não têm produtividade e estão tendo prejuízo. Porque, literalmente, somos obrigados a produzir, pela reforma agrária, ou seremos retirados do nosso chão.

Sr. Presidente, chega ao absurdo! Dei aqui o exemplo do milho, mas vou dar o exemplo de vaca de leite: a obrigatoriedade é de dez vacas de leite por hectare. Não interessa a quantidade de leite que produzem. Imaginem que cada uma produza um litro. Serão dez litros. Se eu tiver cinco vacas que produzam o dobro do que o meu vizinho que está produzindo, com menos vacas serei desapropriada, e ele, não. O que conta é o número de pés de boi e pés de vaca, e não a quantidade de quilos de carne ou a quantidade de leite produzido.

Sr. Presidente, isso não é um país inteligente, isso não pode continuar, isso é uma aberração! A Constituição Federal é clara ao dizer que o cidadão produtivo não pode ser desapropriado, mesmo que ele esteja produzindo em 10%, 50%, 60%, 70%, 80% da sua produção. Mas, infelizmente, uma lei que foi aprovada nesta Casa confundiu os artigos da Constituição. Temos uma ADIN no Supremo Tribunal Federal para derrubar essa lei, a Lei nº 8.629, que altera a clareza da Constituição Federal nos seus arts 184, 185 e 186.

Espero que o Supremo Tribunal Federal possa nos ajudar a corrigir essa distorção. Usa a caneta contra nós, Sr. Presidente, quando faz um Decreto nº 4.857 que trata das comunidades quilombolas. Antes desse decreto, existiam no Brasil 90 a 100 comunidades quilombolas.

A perspectiva do movimento depois do decreto são 5.500 comunidades quilombolas. Já temos 1.170 reconhecidas, ainda 3.500 comunidades sendo reivindicadas.

A Constituição é claríssima no seu art. 67 ao dizer que comunidade quilombola são os remanescentes de quilombos que merecem, com toda justiça, o seu pedaço de terra; que merecem ter o seu título; que merecem ter seu documento para produzir, como qualquer produtor rural neste País, quer seja do assentamento, quer seja na reserva indígena. Eles também têm seu direito.

A mudança do decreto, Sr. Presidente, coloca a autodeterminação - se sou ou não quilombola -, desvirtuando totalmente a Constituição. E muito mais do que isso, com uma “canetada”, regulamentando um artigo da Constituição com um decreto, Senador Mão Santa! Desde quando decreto presidencial pode regular artigo da Constituição? Sou nova nesta Casa, mas aprendi muito cedo que decreto presidencial não regulamenta artigo da Constituição.

A expectativa desses movimentos criados para insurgir cidadãos brasileiros quilombolas, nossos irmãos, a reivindicarem terras é de 25 milhões de hectares, sendo exatamente o tamanho de todo o Estado de São Paulo.

Sr. Presidente, peço a atenção dos nossos colegas para a responsabilidade que esta Casa teve e tem com o País, das coisas que estão acontecendo a todos os momentos, como num grito de socorro fez o General, que foi tão aplaudido por toda a sociedade, o General Heleno.

Errou? Pode ter errado, mas foi verdadeiro, foi sincero, colocou a realidade, deu seu grito de socorro. Quero aqui fazer voz a ele dando mais um grito de socorro ao direito de propriedade neste País, direito de propriedade urbano e direito de propriedade rural, quer seja de um pequeno cidadão, com poucas posses, quer seja aquele com posses de tamanho médio, quer seja aquele com posses de tamanho grande. Todos os brasileiros são iguais. A todos deve ser preservada a cláusula pétrea da Constituição no seu art. 5º, que é o direito de propriedade.

Concedo um aparte ao Senador Adelmir Santana, de Brasília, dos Democratas.

O Sr. Adelmir Santana (DEM - DF) - Senadora Kátia Abreu, eu estava me dirigindo ao Senado e tive oportunidade de ouvir parte do seu pronunciamento. Associo-me as suas colocações, principalmente no que diz respeito ao direito de propriedade. Todos sabemos que esse é um dos princípios que norteia o nosso sistema. Se fizemos a opção pelo regime capitalista, todos nós, há um princípio básico, elementar e basilar desse sistema, que é o respeito ao direito de propriedade. Portanto, quero me associar as suas palavras no que se refere à questão da Vale. Vinha ouvindo atentamente as suas colocações. Marcho nessa mesma direção. É preciso que tenhamos cuidado no respeito aos pilares da democracia, e entre eles encontra-se o direito de propriedade. Portanto, associo-me ao discurso de V. Exª e a cumprimento pelas colocações feitas.

A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - Muito obrigada, Senador. E encerro as minhas palavras dizendo que, graças a Deus, no Estado de Tocantins, nós não temos conflitos agrários, porque no Tocantins cumpre-se a lei. O Governador Marcelo Miranda cumpre imediatamente toda reintegração de posse determinada pela Justiça do meu Estado. Não existe uma reintegração de posse no Estado de Tocantins sem ser cumprida. E eu quero parabenizar o meu Governador Marcelo Miranda por essa atitude de disciplina, de respeito à ordem, de respeito à lei, mas, principalmente, de respeito ao cidadão tocantinense.

Muito obrigada, Sr. Presidente.

Quero também, Adelmir Santana, registrar o aniversário de Brasília, dia 21, segunda-feira. É a capital que você representa, mas é a capital de todos os brasileiros, pela qual todos os brasileiros têm muito carinho, onde se concentra o poder da República. É um poder que às vezes decepciona, um poder que às vezes alegra, mas a nossa cidade de Brasília merece ser aplaudida pelo seu aniversário.

Cumprimento a todos os candangos em seu nome, Senador Adelmir Santana, e também do Governador Arruda.

Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/04/2008 - Página 10195