Discurso durante a 59ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com as áreas fronteiriças do Brasil. Defesa da manutenção do Tratado de Itaipu, que rege o aproveitamento hidrelétrico do rio Paraná pelo Brasil e Paraguai.

Autor
Fernando Collor (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/AL)
Nome completo: Fernando Affonso Collor de Mello
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SOBERANIA NACIONAL. POLITICA EXTERNA.:
  • Preocupação com as áreas fronteiriças do Brasil. Defesa da manutenção do Tratado de Itaipu, que rege o aproveitamento hidrelétrico do rio Paraná pelo Brasil e Paraguai.
Aparteantes
Paulo Paim.
Publicação
Publicação no DSF de 24/04/2008 - Página 10604
Assunto
Outros > SOBERANIA NACIONAL. POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • APREENSÃO, FALTA, ESTABILIDADE, FAIXA DE FRONTEIRA, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, GUIANA, COLOMBIA, PARAGUAI, AGRAVAÇÃO, SITUAÇÃO, DEMARCAÇÃO, RESERVA INDIGENA, ESTADO DE RORAIMA (RR), FUGA, PARTICIPANTE, GRUPO, GUERRILHA, BUSCA, PROTEÇÃO, TENTATIVA, GOVERNO ESTRANGEIRO, ALTERAÇÃO, TRATADO, ITAIPU BINACIONAL (ITAIPU).
  • EXPECTATIVA, GOVERNO BRASILEIRO, ITAMARATI (MRE), EFICACIA, ENTENDIMENTO, AUSENCIA, ALTERAÇÃO, TRATADO, ITAIPU BINACIONAL (ITAIPU).

O SR. FERNANDO COLLOR (PTB - AL. Pela Liderança. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Papaléo Paes, Srªs e Srs. Senadores, o que me traz a esta tribuna na tarde de hoje é mais uma vez a preocupação com o nosso entorno, começando na região da Venezuela e da Guiana, onde há um grau de inflamação grande na área de Esequibo, que a Venezuela reivindica como sua área, pertencente ao seu território. Além disso, os fatos recentes da demarcação da reserva Raposa Serra do Sol também ajudam a criar esse clima de instabilidade, já que fica localizada na fronteira desses dois países: Guiana e Venezuela.

Temos a questão recorrente da Colômbia, que, com o sucesso do governo daquele país no combate às Farc, faz com que os integrantes dessa organização procurem outros países para se abrigar, o que, em relação ao Brasil, é somente atravessar o rio para que eles aqui tentem se homiziar, o que não conseguem, mas criam problemas e trazem instabilidade.

A questão do Equador é conhecida. Apesar da crise recentemente vencida pela competência com que a OEA se houve no processo, esse clima de inflamação nas relações entre os dois países continua a existir.

Na Bolívia, o problema é talvez dos mais sérios. Há um movimento autonomista do lado de províncias como Santa Cruz de La Sierra, Tarija, Pando; em contrapartida, a autonomia de províncias indígenas vem sendo concedida pelo atual Presidente da República, criando um clima extremamente conflituoso naquele País. Ao mesmo tempo, fez parte da campanha do Presidente eleito a saída para o mar, recuperando o território de Antofagasta, perdido para o Chile na Guerra do Pacífico, no meio do século XIX.

Temos agora a questão do Paraguai. O discurso do Presidente eleito foi sempre no sentido de mostrar o Brasil como um país imperialista, disseminando não somente ele, mas outros também, nesse nosso entorno, essa posição que nós nunca quisemos, nós nunca adotamos e não nos interessa, em momento algum, tê-la, como império neste nosso subcontinente.

O Brasil, pela sua extensão territorial, pela sua capacidade de empreender e desenvolver, simplesmente ocupa posição invejável no concerto das nações hoje como uma das dez maiores economias do mundo. Mas nunca exercitamos aquilo que qualquer Estado imperialista costuma exercitar: em momento algum passou pela cabeça do Brasil ter supremacia no nosso subcontinente. E preocupou-me o tema de antibrasil contra os “brasiguaios” que ali estão instalados na nossa fronteira e contra o Tratado de Itaipu.

Tratado é para ser respeitado. Pacta sunt servanda, os pactos ou tratados existem para serem cumpridos, um dos princípios do Direito Público Internacional Privado. O tratado é, portanto, imutável, e não permite, em momento algum, que se caia na tentação de modificar uma vírgula sequer. Toda delimitação das nossas fronteiras e toda conquista da integridade territorial brasileira foi graças ao trabalho do Visconde de Rio Branco e aos tratados assinados pelo Estado brasileiro. Mexer num tratado significa colocar em risco a própria integridade territorial brasileira, porque abre um seriíssimo precedente.

O Presidente eleito do Paraguai disse que o tratado não era válido porque havia sido assinado por dois ditadores, nos regimes autoritários. Eu perguntaria se o Tratado de Latrão, assinado por Mussolini, não poderia também ser, da mesma maneira, questionado, porque levava a assinatura do líder fascista que tanto infortúnio trouxe à humanidade na Segunda Grande Guerra. O Presidente eleito do Paraguai precisa entender que, da mesma forma que obedeceu ao princípio do Direito, especificamente ao Direito Canônico, quando se despiu das vestes eclesiásticas e abriu mão dos seus votos sacerdotais, também precisa seguir o Direito daqui de fora, o Direito Internacional.

Lamento que o Ministério das Relações Exteriores, antes mesmo de se iniciar uma negociação, já tenha começado a ceder, dizendo “sim, vamos tentar renegociar o tratado”. Uma negociação não se começa já cedendo ao outro. E essa negociação não pode passar, como disse anteriormente, pela modificação do tratado.

O Brasil paga o preço justo. Também o Ministro das Relações Exteriores disse, defendendo essa tese do novo governo paraguaio, que deveria ser pago o preço justo. Mas o preço que se paga é justo: US$45 o megawatt/hora, que é o preço internacional. A dificuldade talvez esteja na amortização do investimento feito para a construção de Itaipu, que foi majoritariamente de capital brasileiro, e que o Paraguai vem amortizando nos pagamentos feitos pela utilização dos 95% dos 50% da utilização das águas de Itaipu a que ele teria direito.

É preciso, portanto, que o Presidente da República tenha muita paciência - e tenho certeza que terá -, mas muita firmeza, muita prudência, como também sensibilidade para perceber que a paz e a solidariedade são a base que construiu o Mercosul, do qual faz parte o Brasil e o Paraguai. Paz e solidariedade. E a liga dessa paz e dessa solidariedade é a luta de todos que fazem parte do bloco pelo desenvolvimento econômico.

Tenho certeza que o Presidente da República se sairá muito bem desses entendimentos, que o nosso tratado continuará incólume, que alguma outra maneira o Governo brasileiro encontrará para ajudar o nosso país vizinho, nosso país irmão, nas dificuldades que atravessa para fomentar o desenvolvimento que ele tanto almeja e que já havia alcançado lá atrás também, no século XIX.

Tenho confiança de que o Governo brasileiro e o Ministério das Relações Exteriores saberão conduzir muito bem esse processo, lembrando sempre que ao Ministério das Relações Exteriores cabe traçar cenários futuros para não sermos mais reativos, e, sim, ativos diante de cada um desses problemas que porventura voltem a ocorrer no nosso entorno.

Era isso o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Sr. Presidente e Senador Collor de Melo, se me permitirem um aparte de um minuto... Sei que, inclusive, neste período não o é permitido, mas faço um apelo ao nosso Presidente Papaléo Paes...

O SR. PRESIDENTE (Papaléo Paes. PSDB - AP) - Permitido.

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - ...para fazer um aparte ao Senador Collor de Mello, ex-Presidente da República. Cumprimento o seu pronunciamento porque vai na linha de fortalecer o Tratado de Itaipu e, ao mesmo tempo, pedindo que a Diplomacia entre em campo, preservando os interesses do povo brasileiro, sem deixar de ter - e V. Exª foi muito feliz - a sensibilidade com o diálogo. Mas fiz questão de fazer o aparte para cumprimentar a forma diplomática, elegante e firme com que V. Exª fez esse pronunciamento, defendendo a nossa soberania e, ao mesmo tempo, o respeito aos contratos e fortalecendo o bom diálogo. Parabéns a V. Exª.

O SR. FERNANDO COLLOR (PTB - AL) - Muito obrigado, Senador Paulo Paim.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/04/2008 - Página 10604