Discurso durante a 65ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro da importância do lançamento do livro "Guia do Eleitor Cidadão para as eleições de 2008". Referências à matéria publicada no jornal do Conselho Federal de Medicina intitulada "SOS, o SUS pede socorro". Registro de encontro do Príncipe Charles com Governadores da Amazônia. Considerações sobre a matéria do jornal O Globo, intitulada "Governo Federal terceiriza a ONGs política indigenista do país".

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES. SAUDE. POLITICA EXTERNA. POLITICA INDIGENISTA.:
  • Registro da importância do lançamento do livro "Guia do Eleitor Cidadão para as eleições de 2008". Referências à matéria publicada no jornal do Conselho Federal de Medicina intitulada "SOS, o SUS pede socorro". Registro de encontro do Príncipe Charles com Governadores da Amazônia. Considerações sobre a matéria do jornal O Globo, intitulada "Governo Federal terceiriza a ONGs política indigenista do país".
Aparteantes
Demóstenes Torres, Heráclito Fortes, Tasso Jereissati.
Publicação
Publicação no DSF de 30/04/2008 - Página 11047
Assunto
Outros > ELEIÇÕES. SAUDE. POLITICA EXTERNA. POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • ELOGIO, PARCERIA, SENADO, TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL (TSE), LANÇAMENTO, MANUAL, ELEITOR, AUXILIO, ELEIÇÃO MUNICIPAL.
  • COMENTARIO, PUBLICAÇÃO, JORNAL, CONSELHO FEDERAL, CONSELHO REGIONAL, MEDICINA, DENUNCIA, PRECARIEDADE, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), COBRANÇA, RESPEITO, SAUDE PUBLICA.
  • ANUNCIO, RENOVAÇÃO, VOTAÇÃO, REGULAMENTAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, FINANCIAMENTO, SAUDE, MOTIVO, ERRO, REDAÇÃO, EXPECTATIVA, APROVAÇÃO, AUSENCIA, LOBBY, GOVERNO, DERRUBADA.
  • COMENTARIO, VISITA, GOVERNADOR, ESTADOS, REGIÃO AMAZONICA, PRINCIPE, PAIS ESTRANGEIRO, GRÃ-BRETANHA, PROPOSTA, AUXILIO, PRESERVAÇÃO, FLORESTA AMAZONICA, QUESTIONAMENTO, ORADOR, INTERESSE.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), DENUNCIA, TERCEIRIZAÇÃO, FUNDAÇÃO NACIONAL DO INDIO (FUNAI), POLITICA INDIGENISTA, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), INEFICACIA, ATUAÇÃO, DESVIO, FUNDOS PUBLICOS, EFEITO, ABANDONO, VIOLENCIA, DESNUTRIÇÃO, COMUNIDADE INDIGENA, ALEGAÇÕES, PRESERVAÇÃO, CULTURA, REGISTRO, DADOS.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, CORREIO BRAZILIENSE, DISTRITO FEDERAL (DF), PERIODICO, ISTOE, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), QUESTIONAMENTO, CONVENIO, UNIVERSIDADE DE BRASILIA (UNB), FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAUDE, ATENDIMENTO, TRIBO YANOMAMI, PROTESTO, LOBBY, CONSELHO INDIGENISTA, IGREJA CATOLICA, ERRO, DEMARCAÇÃO, RESERVA INDIGENA, ESTADO DE RORAIMA (RR), DENUNCIA, ORADOR, MANIPULAÇÃO, EXCLUSIVIDADE, CONSELHO, RECEBIMENTO, VERBA, GOVERNO FEDERAL, REPUDIO, INCENTIVO, APARTHEID, GRUPO ETNICO, EXPECTATIVA, DECISÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), REVISÃO, NOTICIARIO, INTERFERENCIA, CONSUL, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA.
  • EXPECTATIVA, RETIRADA, AREA, MUNICIPIOS, ESTADO DE RORAIMA (RR), DEMARCAÇÃO, TERRAS INDIGENAS, ATENDIMENTO, PROPRIEDADE RURAL, ANTIGUIDADE, TITULO, GARANTIA, PRODUÇÃO, ARROZ, SOBERANIA, FAIXA DE FRONTEIRA.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco/PTB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Mão Santa, que preside esta sessão, Srªs e Srs. Senadores, eu gostaria hoje de vir a esta tribuna para falar exaustivamente sobre uma grande iniciativa do Senado Federal em parceria com o Tribunal Superior Eleitoral que foi o lançamento deste importante e, até certo ponto, simples livrinho intitulado Guia do Eleitor Cidadão para as eleições de 2008. Mas não vou fazê-lo hoje. Quero apenas fazer o registro da importância desse gesto.

            Gostaria, também, Senador Mão Santa, de falar hoje sobre esse tema que está aqui no verso do jornal do Conselho Federal de Medicina que diz, com a imagem da luz de uma ambulância: “A classe médica alerta: a saúde pública precisa urgentemente ser tratada com respeito”. Na capa do jornal, em vermelho, está aqui: “SOS, o SUS pede socorro”.

            Gostaria muito de me aprofundar nesse tema hoje. V. Exª, que também é médico, sabe da veracidade e da importância desse assunto, que, aliás, é repetido pelo informativo do Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio Grande do Sul, que diz: “SUS - chegamos ao limite.”

            É preciso efetivamente que o Governo encare essa questão com seriedade. A Emenda nº 29, que aprovamos aqui, terá de ser votada de novo, por questão de um equívoco na aprovação de uma emenda apresentada. Espero que o Governo não coloque aqui a sua maioria para derrubar essa emenda e agravar ainda mais a questão do SUS, porque a Emenda nº 29 é a que garante os recursos para a saúde sem malandragem de CPMF, de tirar depois uma parte para uma coisa e outra parte para outra coisa, assaltando o bolso do cidadão.

            Gostaria também de falar sobre um evento interessante que está ocorrendo hoje e amanhã em Londres, Senador Renan Calheiros. O Príncipe Charles, da Inglaterra, convidou os Governadores da Amazônia para conversar e discutir sobre a Amazônia e ver como a trataremos, inclusive dispondo-se a ser interlocutor e a financiar a permanência das florestas. Ora, esse é um assunto que a mim, como homem que nasceu na Amazônia, efetivamente da Amazônia, me arrepia. É aquela história de que, quando a esmola é grande, o santo desconfia. Não dá para entender que os ingleses sejam tão bonzinhos. Eles serão tão bonzinhos como foram na época de Dom João VI, protegendo-o para vir para cá, porque não queriam que a França tomasse Portugal, mas, chegando aqui, Dom João VI abriu os portos e se endividou com a Inglaterra de maneira astronômica? É preciso pensar nisso.

            Mas não tenho tempo para falar nisso hoje. Quero falar hoje, Sr. Presidente, sobre o tema que está na primeira página do jornal O Globo do dia 27, anteontem: “Governo terceiriza a ONGs política indigenista do país”. Quer dizer, o Governo entregou para ONGs a política de cuidar dos índios do País. E diz mais: “A Funai administra 488 reservas que ocupam 12% do território nacional”. Para cuidar, portanto, de 740 mil índios e de reservas que ocupam 12% do território nacional, a Fundação Nacional do Índio (Funai), o Governo Federal entregou a incumbência às organizações não governamentais, que não dão conta dos problemas. Aliás, não foram feitas para deles dar conta, não, Senador Mão Santa; foram feitas para roubar. Essas ONGs foram feitas para roubar mesmo.

            Fico muito feliz de ver um jornal do tamanho e da importância de O Globo dedicar, numa edição, sua primeira página e sua terceira página inteira, com fotografias, a esse assunto. Está aqui: “ONGs dominam política indigenista”; “Governo repassa centenas de milhões para organizações e está ausente das aldeias”; “Abandono à porta da Funai”. Aqui, mostram-se índios passando fome em Brasília, mendigando coisas na Funai. Depois, na página seguinte, o jornal diz: “Guaranis-caiuás enfrentam violência e desnutrição”.

            Então, Sr. Presidente, primeiramente, quero pedir que V. Exª autorize a transcrição, na íntegra, dessa matéria do jornal O Globo como parte integrante do meu pronunciamento. Não vou ler toda a matéria e peço que os brasileiros e as brasileiras que me assistem pela TV Senado e que me ouvem pela Rádio Senado tenham o cuidado de lê-la, pois é muito importante. Tenho a certeza de que, se formos aprofundá-la, vamos ver a que ponto chegamos: 12% do território do Brasil - não é pouca coisa, são 12% para 740 mil índios -, na verdade, foram levantados, delimitados e demarcados por ONGs, inclusive internacionais. E o que faz o Governo, Senador Mão Santa? Repassa, a cada ano, cada vez mais dinheiro.

            Tive a curiosidade de fazer um levantamento ainda preliminar - e vou-me aprofundar nisto. Em 2003, no primeiro ano do Governo Lula, foram repassados do Orçamento para a política indigenista R$184.588.522,00 - vejam bem! -, para atender a menos de 0,5% da população brasileira. Entregaram esses recursos para ONGs. Se ainda fossem entregues para os índios, eu diria que tudo bem. Mas não! Foram entregues para ONGs R$184 milhões no ano de 2003.

            Sabe quais foram os programas, Senador Mão Santa? Etnodesenvolvimento das sociedades indígenas. O que é etnodesenvolvimento? É o desenvolvimento das etnias. Mas que etnia foi desenvolvida por meio de algum trabalho de ONG? Não, eles estão é desescrevendo a história. Índio que nunca usou uma tanga agora está usando; índio que nunca usou um cocar agora está usando; índio que nunca se pintou de guerra agora está-se pintando. É esse o etnodesenvolvimento no qual o Governo gastou, em 2003, R$184 milhões?

            Para território e cultura indígena, foram destinados R$36 milhões. Território e cultura indígena!? Mas que cultura indígena? Respeito que aqueles que ainda têm realmente uma cultura, como os Yanomamis e poucos outros, querendo, preservem, mas, se quiserem evoluir no sentido de se integrar à sociedade, que também tenham o direito de fazê-lo. Mas não concordo que alguém, que alguns “ongueiros” queiram lhes impor como devem viver.

            Há mais outro item interessante que eu não havia visto: ensino profissional diplomático para os índios. Ensino profissional diplomático para os índios!? Gastou-se nesse item até que pouco: foram R$50 mil em 2003.

            Vamos em frente. O mais interessante, Senador Mão Santa, é que, quando se passam essas quantias para os Estados, elas não são grandes. E quando isso é passado nacionalmente? Vou citar, por exemplo, os Estados. Pernambuco recebeu R$137 mil; o Rio de Janeiro, R$204 mil. Mas, no âmbito nacional, foram R$184 milhões em 2003. Vamos em frente. Em 2004, pulou de R$184 milhões para R$208 milhões o Orçamento para as ONGs que cuidam dos índios, porque a Funai, a cada dia que passa, está sendo desmantelada. Não há concurso para compor o quadro de funcionários da Funai, não há concurso para formar pessoas encarregadas e habilitadas para cuidar dos índios. Há terceirização, como diz o jornal O Globo, para entidades que não têm capacitação e que são, no fundo, no fundo, apenas gigolôs de índios. Vamos em frente.

            Em 2004, há algo interessante, de novo: Estados como o meu receberam zero real, mas, em âmbito nacional, foram R$207 milhões. Aí é onde se embute, Senador Renan, o dinheiro pago ao Conselho Indígena de Roraima, à Comissão para Criação do Parque Yanomami (CCPY), à Urihi, que roubou R$60 milhões só em um ano.

            Vamos para o ano de 2005: foram R$261 milhões. Aí de novo vêm os itens: identidade étnica e patrimônio cultural dos povos indígenas, R$209 milhões; proteção das terras indígenas, gestão territorial e ecodesenvolvimento, R$39 milhões; ensino profissional diplomático...

(Interrupção do som.)

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Isso significa que já se estão criando nações mesmo. Então, precisa-se de uma diplomacia para formar os futuros embaixadores dessas nações futuras.

            Este é outro item: saneamento rural, R$11 milhões. Nunca vi saneamento rural em nenhuma comunidade indígena. E olha, Senador Renan, que andei em Rondônia, em Mato Grosso do Sul, em Roraima, onde conheço todas elas, e não conheço uma com saneamento rural. Entendo que saneamento rural deve ser saneamento básico: fossas assépticas, instalações para água encanada, etc.

            Em 2006, Senador Mão Santa, foram R$346 milhões; em 2007, R$362 milhões. Senador Mão Santa, se realmente esse dinheiro fosse aplicado e revertido em favor da educação, da saúde, da proteção do ser humano índio, adulto, jovem e velho, eu, como médico, estaria aplaudindo - como brasileiro, eu aplaudiria mais e, como amazônida, mais ainda -, mas isso não é verdade. Tanto isso não é verdade, que, agora, o jornal Correio Braziliense publica: “Pente fino em convênios”. Aqui, o jornal se refere ao convênio com a editora da Universidade de Brasília (UnB). A UnB tinha um convênio com a Fundação Nacional de Saúde para dar assistência à saúde aos índios Yanomamis no oeste de Roraima e do Amazonas. Ora, qual é a lógica de contratar a UnB se há uma universidade federal em Roraima? Por que não se contrata essa universidade, se ela tem curso de Medicina e já formou vários médicos? Por que não se contrata essa universidade? Poderia contratar o Estado. Mas, se se suspeitava do Estado, que se contratasse a universidade! Por que não se contratam os militares que estão lá com dois pelotões dentro da área indígena Yanomami? Por que não os contrata?

            Quem é brasileiro é suspeito, mas ONGs transnacionais não são suspeitas. É por isso, é por essas e por outras, Sr. Presidente, que quero aqui dizer a V. Exª, Senador Renan, que, na demarcação da reserva Raposa Serra do Sol - e V. Exª sabe disso, porque foi Ministro da Justiça -, houve pressão dessas ONGs comandadas - não tenho medo de dizer - pelo Conselho Indigenista Missionário, que é um braço da Igreja Católica, que criou, em Roraima, o Conselho Indígena de Roraima e que plantou em Roraima, numa aldeia chamada Maturuca, um padre chamado Jorge Dal Ben, que nunca rezou uma missa, mas que passou toda a sua vida, mais de década, dentro dessa aldeia Maturuca, fazendo de lá um QG para fazer essa demarcação em área contínua, inclusive usando pressão internacional. Isso é verdade. Isso foi publicado pela revista ISTOÉ, e tenho o exemplar da revista.

            Não sou um parlamentar que ouviu dizer não. Não sou um parlamentar que apenas fui eleito por Roraima. Não, eu nasci em Roraima. Eu, como médico, andei aquelas comunidades todas, atendendo a todos eles. E o que eu vejo hoje na Raposa Serra do Sol, Senador Renan? Um grupo étnico comandado pelo CIR, Conselho Indígena de Roraima, que é só quem recebe dinheiro! Interessante: é só o CIR que recebe dinheiro do Governo Federal, só ele. A Sodiur, que é a Sociedade dos Índios Unidos do Norte de Roraima, não recebe, não tem convênio com o Governo Federal. A Alidici não tem convênio com o Governo Federal. A seleção para receber o convênio é feita pela Igreja Católica.

            Aliás, quando eu quero falar em Igreja Católica, eu quero ressalvar aqui: eu sou católico. Não vamos confundir a fé católica, a religião católica com padres, bispos e cardeais que, às vezes, cometem, como cometeram no passado, muitas atrocidades dizendo ser em benefício da fé. Está aí a Inquisição, estão aí as Cruzadas, está aí o ódio que eles suscitaram nos muçulmanos até hoje, está aí o que estão fazendo no meu Estado: um grupo de índios brigando contra outros índios. E eu convido o Senador João Pedro, que tem falado sobre isso aqui, bem como o Senador Nery, para irem lá conhecer de perto, conversar com os índios. Não conversem com os não-índios, não; conversem só com os índios, já que para V. Exªs não existem direitos humanos iguais para todos. Conversem com os índios, com todos eles lá, de todas as comunidades, sozinhos; conversem com eles sem a interferência de ninguém e vejam se o que estamos plantando lá não é verdadeiramente um apartheid intra-étnico dentro daquela reserva, para não dizer as outras coisas, um apartheid intra-étnico, sim, porque estão separando pessoas que são casadas com índios, que têm filhos e netos lá.

            O caso mais emblemático, Senador Renan, foi o de uma senhora índia que tem um filho de pele clara. Ela agora está impedida de ir para a comunidade e levar o filho. Está documentado, a Assembléia Legislativa do Estado está entrando com uma ação no Ministério público. É uma barbaridade! Essas coisas não são observadas; ou para eles não há direitos humanos também? Que direito humano que é só para um ou para uns? É aquela história do slogan desse Governo: Brasil, um País de todos. Mas que todos? Que todos? Todos? Todos os brasileiros ou todos os companheiros? Todos os brasileiros mesmo? Índios, não-índios, brancos, negros, ou apenas aqueles que são os escolhidos?

            Eu quero aqui dizer que vou gastar todo o tempo que dispuser, até a decisão do Supremo, para trazer esse tema reiteradas vezes. Eu já fiz quatro missões àquela região. Primeiro, uma Comissão Temporária Externa do Senado, onde nós sugerimos ao Presidente Lula... Aliás, uma Comissão Temporária Externa do Senado, cujo Relator foi um Senador do PT. Sugerimos uma demarcação que não seria problemática. Depois, uma comissão temporária externa sugerindo uma retificação do decreto, assim como duas viagens pela Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional. E não vale o relatório da Comissão Temporária Externa, não vale o que nós constatamos? Vale o quê? Vale o que um grupo de iluminados ligados a esse núcleo comunistóide pensa.

            Quero ouvir, primeiramente, o Senador Tasso Jereissati, que já havia pedido. Em seguida, ouvirei o Senador Demóstenes Torres.

            O Sr. Tasso Jereissati (PSDB - CE) - Senador Mozarildo, gostaria de congratular-me com V. Exª pela oportunidade, pela percepção e pelo constante acompanhamento de um problema para o qual V. Exª, com muita perseverança, vem há muito tempo chamando a atenção. Na verdade, pouca gente presta atenção à questão. Hoje, só depois que vem à tona a gravidade do problema, todas as suas conseqüências, a pouca pertinência, a falta dos devidos cuidados, o exagero das reservas que foram criadas com um intuito aparentemente demagógico, com um intuito de responder aos anseios de determinados grupos, criou-se uma situação de verdadeiro caos e quase uma pequena guerra civil localizada em uma área de seu Estado. V. Exª foi o primeiro - e durante muito tempo o único - a chamar a atenção para essa questão. As autoridades não lhe deram atenção, não lhe deram ouvidos. Nós mesmos, aqui no Senado Federal, ouvíamos, mas não demos a importância ao alerta que V. Exª fazia. Quero penitenciar-me e congratular-me com V. Exª pela percepção e pelo alerta que V. Exª fez nesta Casa há muito tempo.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Muito obrigado, Senador Tasso Jereissati.

            Quero dizer a V. Exª que Fernando Henrique Cardoso, quando Presidente da República, sofreu muitas pressões para demarcar essa reserva, muitas. Eu já era Senador e fui muitas vezes conversar, juntamente com o Governador do Estado, e o então Presidente não demarcou, não demarcou. Embora o procedimento da Funai e do Ministério da Justiça estivesse concluído, ele não demarcou, porque soube se aconselhar e viu que não era apropriado demarcar. Portanto, não demarcou.

            Agora, o Presidente Lula, apesar de ter conversado com diversos Governadores, com o Governador Flamarion Portela, que foi para o PT para tentar resolver essa questão e outras das terras de Roraima; com o Governador Otomar Pinto, do seu Partido; e agora com o Governador Anchieta. Apesar de tudo isso, o Presidente Lula demarcou ouvindo apenas uma pessoa, entre outras, o Ministro Thomaz Bastos, que inclusive fez uma molecagem jurídica para induzir o Supremo a derrubar as ações que havia contra a portaria anterior, a Portaria nº 820.

            Então, quero dizer a V. Exª que a coisa não se restringe a demarcar ou não uma reserva indígena. E não é uma reservazinha indígena simples, qualquer, não. É uma reserva indígena complexa. Lá em Roraima não temos do que reclamar, porque mais da metade do Estado é reserva indígena, sem nenhuma lógica, porque somos o terceiro em população indígena e somos, disparados, o Estado que têm mais reservas indígenas demarcadas. A reserva Ianomâmi eram várias reservas separadas que foram unidas em uma só e abrange o meu Estado e o Estado do Senador João Pedro. Então, não estamos reclamando por causa de uma reserva indígena. Lá, já há 35 reservas indígenas demarcadas.

            O que queremos agora é não deixar que esse absurdo se concretize. Espero que o Supremo reveja essa questão e vá a fundo, inclusive in loco, para ver essa questão.

            Pois não, Senador Demóstenes.

            O Sr. Demóstenes Torres (DEM - GO) - Senador Mozarildo, V. Exª faz um pronunciamento contundente e correto. Semana passada, iniciei uma discussão aqui a este respeito. Não pude falar o tanto que queria, até por uma questão regimental.

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Mas hoje V. Exª fala o tempo que quiser.

            O Sr. Demóstenes Torres (DEM - GO) - Muito obrigado, Senador Mão Santa. Tenho de concordar com V. Exª. Basta pegar o que pensava José Bonifácio de Andrada sobre a integração dos povos indígenas à civilização. É uma coisa centenária. É algo que quem tem bom senso prega e preconiza. O que estamos vendo hoje? A Funai gastando algo em torno de R$1,2 bilhão, incluindo gastos com saúde indígena; os indígenas com saúde precaríssima, numa situação educacional humilhante; e alguns caciques vivendo de forma nababesca. Tudo isso para dar azo a uma pseudo-antropologia instalada na Funai. Isso reverte em prejuízo sério para os indígenas. Favorece, como disse V. Exª, um apartheid social, como se os indígenas pudessem até passar a ser discriminados em razão desse absurdo que se tenta construir, quando os indígenas têm para a sociedade brasileira - eu trouxe até uma pesquisa - uma imagem das melhores, devido a um falso protecionismo. Quero até lembrar aqui o que disse o Presidente da FUNAI, numa platitude extraordinária. Ele disse que a política indigenista brasileira é reconhecida internacionalmente. Quantos índios tem a Suécia, Senador, para dar um palpite a respeito disso? É muito fácil tentar, simplesmente, explodir com as estruturas tradicionais do Brasil não para beneficiar. Se fosse para beneficiar, quem estaria aqui para contrariar essa determinação? Não. Mas para dar azo, dar vazão a uma filosofia de botequim implantada na Funai, que quer a todo custo implantar ali mais uma reserva, pegando fronteira de forma contínua, desprezando o que tradicionalmente existe ali, até a miscigenação, como preconizava o José Bonifácio. Nós vamos desconhecer o que existe ali dentro? Então, Senador Mozarildo, eu tenho confiança também no Supremo Tribunal Federal. O Supremo Tribunal Federal, mais uma vez, vai dar razão àquilo que é racional, vai dar a César o que é de César. E os apelos que V. Exª vem fazendo aqui, há muito tempo, vão encontrar agora ressonância no Supremo Tribunal Federal. Eu teria muito mais a dizer, Senador, mas, em respeito ao seu pronunciamento, fico por aqui, parabenizando V. Exª e lembrando, como disse o General Heleno, ali também é uma questão de sobrevivência do Brasil. Do outro lado da fronteira, nós temos um ditadorzinho que não obedece a regras, que não conhece lei, independentemente de quem for. Neste momento peculiar, eu quero fazer um elogio ao Ministro Nelson Jobim. Não tenho nada que elogiar o Ministro, mas o farei. A compra do material que o Exército e as Forças Armadas estão fazendo é capaz agora de fazer voltar à época em que a soberania nacional era prevalente, porque hoje as nossas Forças Armadas estão absurdamente sucateadas. Parabéns a V. Exª. Voltaremos ao tema, fazendo eco com o discurso.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Senador Demóstenes Torres, agradeço a V. Exª o aparte. Está na coluna do Cláudio Humberto de hoje - eu não a li ainda; portanto, não posso dizer em que termos está - que o Cônsul da Venezuela mandou um expediente para o Supremo aconselhando aquela Corte a como decidir sobre essa questão da Raposa Serra do Sol, defendendo a demarcação em área contínua, da forma como está.

            Olhem a que ponto nós chegamos: já há recomendação de um país sobre como deve proceder outro país numa região de reserva, de fronteira. Aliás, a Venezuela tem uma contestação com a Guiana. Todo mundo sabe que existe uma área que a Venezuela não reconhece como sendo da Guiana, que é uma zona de reclamação; e já está há décadas, inclusive, registrado na ONU formalmente o protesto. Portanto, a qualquer momento, o Presidente Chávez pode invadir aquela região; e isso não terá sido inventado por ele, porque está há décadas em contestação. Agora a Venezuela está dando palpites sobre como deve ser demarcada aquela região, que está justamente colada à região que a Venezuela contesta. Não sei se isso é verdade. Está na coluna do Cláudio Humberto.

            Mas há outros paradoxos. O que propusemos na Comissão Temporária Externa: retirar 320 mil hectares, Senador Renan, de 1,7 milhão do que foi demarcado. Trezentos e vinte mil hectares! Significava retirar o quê? As quatro pequenas cidades que se localizam lá na fronteira; quatro pequenas cidades. Retirar aqueles proprietários com títulos anteriores a 1934, quando Roraima ainda era do Estado do Amazonas, e retirar a área dos arrozeiros, que têm títulos anteriores a 1934.

            Agora, é até interessante: o Brasil está passando por uma crise de arroz, quer impedir a exportação de arroz. E, em Roraima, o Governo Federal quer acabar com os arrozeiros, que produzem 25% do PIB do Estado e até exportam arroz. Mas eu não estou só falando dos arrozeiros, não. Há 458 proprietários lá naquela região, quatro cidades, Senador José Agripino. E não é possível realmente, numa região de fronteira como essa, em que até a Venezuela dá pitaco, nós deixarmos acontecer tranqüilamente.

            Eu tenho fé patriótica de que o Supremo vai rever essa questão e vai, com certeza, debruçar-se sobre o trabalho feito pelo Senado e também pela Câmara, que tinha uma comissão temporária externa. Vai rever, sim, inclusive dando oportunidade para corrigir as injustiças e ouvindo os índios. Eu fiz o convite aqui ao Senador João Pedro e ao Senador José Nery para irem lá, ouvir os índios. E vão ver que a realidade é bem outra.

            Eu quero, aqui, mais uma vez, dizer: eu estou aplaudindo a conduta do General Heleno, porque, realmente, o patriotismo e o compromisso com o País são maiores do que quaisquer conveniências ou ranços que impedem o militar de falar. O militar, antes de tudo, é um patriota.

            Senador Heráclito.

            O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - Senador Mozarildo, eu não poderia deixar de aparteá-lo neste seu pronunciamento. Aliás, V. Exª tem sido um Senador muito coerente nesta questão. Eu sou testemunha pelo que tenho ouvido em seus pronunciamentos e pelas ações não só aqui, mas também e principalmente na Comissão de Relações Exteriores. Se o Brasil tivesse ouvido V. Exª, teria evitado passar por algumas situações que ora passa. Eu me lembro quando V. Exª denunciou a invasão de helicóptero da Venezuela em território brasileiro exatamente nessa região. Quero dizer a V. Exª que, recentemente, só recentemente, recebemos as informações prestadas pelo Ministério a respeito do episódio. V. Exª, inclusive, tem feito o sacrifício de, com a autorização da Comissão, passar dias a fio na região do conflito, tentando mediar soluções. De forma que V. Exª tem tido uma atuação responsável como representante da sua região e, acima de tudo, do País. Há poucos minutos, encontrei-me com um cidadão de origem indígena, aqui no corredor, que é da região e me contava exatamente o que V. Exª traz hoje à tribuna, inclusive assustado com a atuação descontrolada de ONGs naquela região. De forma que não é isolada a voz de V. Exª. É preciso que o Governo veja o que foi denunciado pelo general. Se o general infringiu algum regulamento por ter tratado desse assunto em público é outra questão. A verdade é que o assunto tratado é sério e merece de todos nós cuidado, cautela e, acima de tudo, muita atenção. O general já vinha, há algum tempo, alertando as autoridades do País não só para a questão do conflito dos arrozeiros, mas também para a questão das ONGs na região amazônica. É preciso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que algumas medidas sejam tomadas. Os Anais do Senado estão à disposição de quem quiser. Pelo menos com relação a V. Exª, ninguém pode dizer que o Senador Mozarildo não sabia. Sabia, avisou e não foi ouvido. Que pena! Muito obrigado.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Eu agradeço, Senador Heráclito. Espero que agora sejamos ouvidos - nós todos, roraimenses - pelo Supremo Tribunal Federal, porque já estávamos sendo ouvidos. A Ministra Ellen Gracie tinha suspendido a demarcação. Mas o Ministro Thomas Bastos fez uma molecagem, revogou a Portaria nº 820, e baixou outra no mesmo dia, com outro número, com as mesmas bases da Portaria nº 820, e, com isso, fez com que o Supremo dissesse que estavam prejudicadas as ações contra a Portaria nº 820. Então, isso foi uma molecagem que o Ministro Thomas Bastos fez, o que levou o Supremo a corretamente declarar prejudicadas as ações contra aquela Portaria.

            Nós estamos, agora, combatendo essa nova Portaria e o Decreto do Presidente, porque eles estão eivados de vícios e de fraudes e não correspondem à realidade daquela região.

            Muito obrigado.

            Sr. Presidente, só reitero o pedido de transcrição das matérias do Jornal O Globo e dos dados do Orçamento.

 

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DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR MOZARILDO CAVALCANTI EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210 do Regimento Interno.)

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Matérias referidas: O Globo - “Governo terceiriza a ONGs política indigenista do País.

Execução Orçamentária da LOA - 2003 - Orçamento Indigenista


Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/04/2008 - Página 11047