Discurso durante a 77ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

A escalada inflacionária dos alimentos básicos.

Autor
Antonio Carlos Valadares (PSB - Partido Socialista Brasileiro/SE)
Nome completo: Antonio Carlos Valadares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA.:
  • A escalada inflacionária dos alimentos básicos.
Publicação
Publicação no DSF de 15/05/2008 - Página 14153
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • REGISTRO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, AUMENTO, PREÇO, ALIMENTOS, ARROZ, FEIJÃO, MILHO, PREVISÃO, PREJUIZO, AMBITO INTERNACIONAL, ESPECIFICAÇÃO, AMERICA LATINA, POPULAÇÃO, BAIXA RENDA.
  • COMENTARIO, RELATORIO, COMISSÃO ECONOMICA PARA A AMERICA LATINA (CEPAL), ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), ADVERTENCIA, AUSENCIA, PROPORCIONALIDADE, CONSUMO, POPULAÇÃO, PRODUÇÃO AGRICOLA, ESPECIFICAÇÃO, AMERICA LATINA, APRESENTAÇÃO, DADOS, COMPARAÇÃO, CONTINENTE, ASIA, AFRICA.
  • DEFESA, EMPENHO, GOVERNO ESTRANGEIRO, PAIS, AMERICA LATINA, CONTENÇÃO, INFLAÇÃO, PREÇO, ALIMENTOS, GARANTIA, SUBSISTENCIA, POPULAÇÃO, BAIXA RENDA.
  • COMENTARIO, EDITORIAL, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ADVERTENCIA, NECESSIDADE, REDUÇÃO, GASTOS PUBLICOS, TAXAS, JUROS, CRIAÇÃO, OBSTACULO, CAPITAL ESPECULATIVO, APOIO, PRODUTOR, CAMPO, MERCADO INTERNO, SIMPLIFICAÇÃO, REGIME TRIBUTARIO, GARANTIA, AUSENCIA, CRISE, BRASIL.

            O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Agradeço a V. Exª, Sr. Presidente.

            Sr. Presidente, o noticiário recente tem nos trazido o alerta sobre o problema da escalada inflacionária dos alimentos básicos. Aumentou o preço do feijão, do milho, do trigo, do arroz, além de outros produtos da cesta básica. E aqui estamos tratando de um processo ou uma tendência que vem acontecendo em escala mundial.

            Em vários cantos da terra, em especial na América Latina, o preço da cesta básica disparou e, evidentemente, a população mais empobrecida é sua vítima principal.

            Segundo alerta da ONU, que quero tomar como eixo deste pronunciamento, o que está em risco é o esforço, nos últimos sete anos, de vários governos no sentido de diminuir o estoque de pobreza no mundo. Segundo a Comissão Econômica para a América Latina - Cepal, agência da ONU, todo aquele esforço, todas as políticas de distribuição de renda podem vir a ficar comprometidas diante dessa crescente onda de inflação dos alimentos.

            A própria ONU, Sr. Presidente, admite abertamente que não dispõe de nenhuma receita para evitar que a pobreza aumente na América Latina. Isto é, o caso da América Latina pode tornar-se gravíssimo. E, se não houver mudança no atual modelo, já se fala, nos próximos dez anos, em uma crise chamada “crise do choque alimentar”. Esse choque seria uma crise alimentar em grande escala, na qual milhões de pessoas podem mergulhar na esfera da fome aguda. Em tudo isso existe uma grande contradição, e a própria ONU, através da já citada Cepal, em seu mais recente relatório, chamou a atenção para ela. A contradição é que a América Latina está entre os principais produtores de alimentos do mundo. Nem a África, nem a Ásia estão nessa condição de principais celeiros de alimentos do Planeta.

            O grande problema reside justamente aqui. A América Latina, apesar dessa produção colossal de alimentos, está se encaminhando, em marcha batida, para uma violenta crise no consumo popular de alimentos se nenhuma medida estratégica for tomada.

            A expressão atual desta crise nós já estamos vivendo: é a inflação, a disparada dos preços dos alimentos básicos.

            O que está em questão, portanto, segundo relatório da ONU, é o crescente abismo entre o volume da produção de alimentos e o nível de consumo da população mais pobre. Isto é, há mais alimentos e menos consumo. Isso fica por conta, sem dúvida, da distribuição de renda injusta que existe em todo o mundo.

            O próprio Estado de S. Paulo, em edição do dia 6 de maio último, registrou o seguinte:

            Segundo o levantamento do governo americano, a diferença entre o que a América Latina produz em alimentos e o que é consumido pela classe mais pobre cresce ininterruptamente, apesar do cultivo recorde no continente. (...) A diferença entre oferta e demanda seria três vezes maior na América Latina do que na Ásia ou na África.

            O quadro da América Latina é tão grave que ele se reflete em alguns dados que chamam a atenção. Por exemplo, o Haiti. A ONU apelou a vários governos no sentido de que ajudassem a alimentar o Haiti, que vive crise aguda de fome e, no entanto, só conseguiu recolher 13% dos mais de 100 milhões de dólares que ela solicitou aos vários governos da região para alimentar 1,7 milhões de pessoas que passam fome naquele país. Em El Salvador, a população, hoje, só consegue comprar metade dos alimentos que conseguia comprar há pouco mais de um ano e meio. É uma crise em agravamento.

            Na Nicarágua, o preço da tortilla sofreu um aumento de 54% em um ano. Na Guatemala, aumentou 17%. E a alta é conseqüência da inflação de 100% que atingiu o preço do milho em toda a América Central. Nós sabemos que o milho é um ingrediente básico da tortilla, uma espécie da massa de pão, que é base da culinária daquela região. O feijão, alimento básico da região, também é um outro problema, já que seu preço encontra-se em alta.

            O governo da Índia está propondo a suspensão do mercado futuro de alimentos em seu país e enfrenta a disparada nos preços das commodities. Os países árabes analisam criar um fundo de emergência para que as nações mais pobres da região enfrentem a inflação de alimentos. Na Somália, uma semana atrás, cinco manifestantes foram mortos em conflito com a polícia, durante um protesto contra a inflação e a alta dos alimentos.

            Diante deste quadro, Sr. Presidente, quadro de inflação, de carestia do milho, do feijão e do arroz, temos que apelar aos governos para que ajam antes que o problema se coloque de forma aguda. É um problema em escala continental e que cobra soluções continentais.

            No caso do Brasil, é verdade que o Governo tem comemorado o fato de o nosso País ter sido considerado pelos investidores internacionais como um lugar seguro para se investir, atingiu o grau de investimento. No entanto, O Estadão, em um editorial do dia de 6 de maio recente, acompanhando a mesma linha de raciocínio de alguns ministros, alerta ser necessário ter cautela com este dado. E lembrou que vários países alcançam esse índice, mas não conseguiram mantê-lo. E, por si só, é um indicador problemático.

            O alerta do editorial de O Estado de S.Paulo (intitulado “Promessas de seriedade”) é no sentido de que se faz urgente resolver questões pendentes como a das contas públicas.

            É necessária uma ofensiva para diminuir o endividamento público, simplificar o regime tributário, por meio da reforma já em tramitação na Câmara dos Deputados, diminuir a taxa de juros e criar barreiras contra o capital especulativo, por exemplo. E apoiar o produtor do campo, voltá-lo para o mercado interno. São medidas simples e ao mesmo tempo estratégicas que, se forem tomadas a tempo, poderão evitar o desastre.

            O Brasil não está imune à crise. Prova disso são os aumentos: segundo levantamento do IBGE, desde junho passado até abril deste ano, os preços do feijão, arroz, carne, macarrão, leite, pão, biscoitos e óleo de soja sofreram um reajuste de cerca de 40%, reduzindo o poder de compra das camadas mais pobres da população, em especial do universo das 11 mil famílias beneficiadas pelo programa Bolsa-Família.

            Antes de finalizar, Sr. Presidente, quero ainda chamar a atenção para um problema que raramente é mencionado nessa questão da alta dos preços dos alimentos. Quando se fala que o feijão ficou mais caro - ou o pão -, o primeiro raciocínio de muita gente é o de que o produtor de feijão ou de trigo é quem está ganhando com esse aumento. Se observarmos mais de perto, a coisa não é bem assim.

            Fertilizantes, insumos agrícolas e crédito bancário - fertilizantes, insumos agrícolas e crédito bancário, repito - são muito mais responsáveis por essa escalada inflacionária, a qual, no final de contas, vai engordar os lucros de multinacionais e de bancos, enquanto os produtores, sobretudo os pequeno e os da agricultura familiar, vivem à míngua. O produtor não pode ser culpado por essa carestia que sequer o beneficia.

         Por isso, Sr. Presidente, é preciso que tenhamos muito cuidado, nesta hora, para não fazermos comemorações indevidas em virtude de o Brasil ter atingido a classificação de grau de investimento. É preciso que tenhamos o cuidado de fazer uma reforma tributária condizente com a realidade nacional, favorecendo a sociedade, reduzindo o custo Brasil.

            Essa reforma tributária, que já foi tentada tantas vezes, daqui a pouco chega ao Senado Federal. E haveremos de arregaçar as mangas no sentido de oferecer ao Brasil uma reforma tributária que não venha castigar tanto a empresa brasileira, a empresa nacional, e não venha prejudicar tanto o consumidor, principalmente o consumidor mais pobre.

            Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/05/2008 - Página 14153