Discurso durante a 22ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Análise da conjuntura econômica onde a crise chegou mais tarde, está no rumo certo e deverá dela sair mais cedo que os demais países. (como Líder)

Autor
Aloizio Mercadante (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Aloizio Mercadante Oliva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • Análise da conjuntura econômica onde a crise chegou mais tarde, está no rumo certo e deverá dela sair mais cedo que os demais países. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 11/03/2009 - Página 4370
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • ANALISE, CRISE, ECONOMIA INTERNACIONAL, DETALHAMENTO, OCORRENCIA, MERCADO IMOBILIARIO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), FALTA, CONTROLE, SISTEMA FINANCEIRO INTERNACIONAL, NEGLIGENCIA, GOVERNO ESTRANGEIRO, COMPROVAÇÃO, INEFICACIA, LIBERALISMO, ECONOMIA, GRAVIDADE, BAIXA, PRODUTO INTERNO BRUTO (PIB), ASIA, UNIÃO EUROPEIA, LESTE EUROPEU, DESEMPREGO, REDUÇÃO, VOLUME, COMERCIO EXTERIOR, CRITICA, PROVIDENCIA, AUMENTO, PROTECIONISMO, AVALIAÇÃO, VANTAGENS, BRASIL, SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL, RESERVAS CAMBIAIS, MELHORIA, DIVIDA PUBLICA.
  • OPOSIÇÃO, REPRESALIA, PROTECIONISMO, PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA, MOTIVO, AMPLIAÇÃO, CRISE, PERDA, ESTABILIDADE, REGIÃO, APOIO, POLITICA EXTERNA, GOVERNO BRASILEIRO, ACORDO, GOVERNO ESTRANGEIRO, URUGUAI, ANUNCIO, INVESTIMENTO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), CONSTRUÇÃO, PONTE, INTEGRAÇÃO, AUMENTO, FUNDOS, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), COMBATE, DESIGUALDADE REGIONAL, DEFESA, ORADOR, ABERTURA DE CREDITO, REAL, FINANCIAMENTO, ESTADOS MEMBROS, IMPORTAÇÃO, PRODUTO, BRASIL.
  • SAUDAÇÃO, INAUGURAÇÃO, AGENCIA, BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES), PAIS ESTRANGEIRO, URUGUAI, RESPOSTA, CRISE, BUSCA, INTEGRAÇÃO, PARCERIA, COLABORAÇÃO, RECEBIMENTO, BRASIL, ELOGIO, ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMERCIO (OMC), IMPRENSA, AMBITO INTERNACIONAL.
  • ANALISE, HISTORIA, CRISE, ECONOMIA, EFEITO, NACIONALISMO, AUTORITARISMO, SEGUNDA GUERRA MUNDIAL, EXPECTATIVA, ORADOR, ALTERAÇÃO, DIRETRIZ, ATUALIDADE.
  • JUSTIFICAÇÃO, PROVIDENCIA, BRASIL, APOIO, INDUSTRIA AUTOMOTIVA, REDUÇÃO, IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS (IPI), MOTIVO, MOVIMENTAÇÃO, PRODUTIVIDADE, ARRECADAÇÃO, DEFESA, PROGRAMA, FINANCIAMENTO, ONIBUS, PREFEITURA.
  • DEFESA, REDUÇÃO, GASTOS PUBLICOS, CUSTEIO, BUROCRACIA, AMPLIAÇÃO, INVESTIMENTO, POLITICA SOCIAL, REFORÇO, MERCADO INTERNO, ESPECIFICAÇÃO, CONSTRUÇÃO CIVIL.
  • DEFESA, ATUALIZAÇÃO, POLITICA MONETARIA, REDUÇÃO, JUROS, ANUNCIO, VISITA, PRESIDENTE, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), COMISSÃO DE ASSUNTOS ECONOMICOS.
  • REGISTRO, TRAMITAÇÃO, PROJETO, OBRIGATORIEDADE, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), PRESTAÇÃO DE CONTAS, SENADO, TRIMESTRE.
  • PREVISÃO, RECUPERAÇÃO, ECONOMIA NACIONAL, CONCLAMAÇÃO, BUSCA, PARCERIA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, metade do tempo que foi concedido ao Líder da Oposição estaria muito bom para o debate. Ouvi aqui a intervenção do Líder da Oposição, falando como Líder, por uma hora e meia, discutindo a crise, mas, de qualquer forma, vou buscar ser mais objetivo, apesar da complexidade do tema.

O SR. PRESIDENTE (Gilvam Borges. PMDB - AP) - Mas, quando V. Exª necessitar de tempo, a Mesa também fará a concessão devida.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Está ótimo! Muito obrigado, Sr. Presidente.

Estamos atravessando a mais grave crise econômica e financeira - eu diria - desde 1929. Comecei a estudar Economia na Universidade de São Paulo (USP) em 1973 e, nesses 37 anos, seguramente, não assisti a nada próximo do que a crise que atingiu as principais economias do planeta ao longo desse último período.

A rigor, essa crise se inicia em fevereiro de 2007. Em fevereiro de 2007, a crise no setor imobiliário já estava presente. O Banco HSBC já anunciava um prejuízo de US$10 bilhões. Os indicadores de desaceleração da economia começavam a se manifestar. Os economistas mais atentos já advertiam para bolha imobiliária e para a bolha no mercado de capitais. Essa crise foi se aprofundando sem resposta adequada especialmente do Governo americano, sobretudo com o fundamentalismo de mercado, com a ausência de mecanismos de prudência, de regulação e de controle do Sistema Financeiro e com uma política monetária totalmente permissiva por parte do Banco Central americano.

Aqui, faço uma advertência: se o Senado americano tivesse sido historicamente mais exigente com o FED, com o Banco Central, com a gestão de Alan Greenspan, teríamos outro cenário internacional. Essa tese de os burocratas do mercado financeiro e do Banco Central terem um pretenso saber que não permite o debate democrático seguramente não é um bom caminho para a história econômica. E o que estamos vivendo já é uma das lições importantes.

Havia a ideia de que o mercado se autorregulava, de que não eram mais necessários os mecanismos de prudência de Basiléia, de que a alavancagem dos bancos não precisava ter limite por que eles tinham capacidade de autorregulação com novos instrumentos, como os derivativos. Ora, só de derivativos são quase 800% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial. Oito vezes mais do que o planeta produz é o volume de papéis que essa indústria financeira jogou no mercado, muitas vezes sustentado pela agências de risco, que davam garantia total ao credor. Mas, evidentemente, não havia lastro nenhum na base produtiva, na economia real, na vida concreta de quem produz um pé de sapato, um parafuso ou um quilo de milho. A dinâmica, a financeirização da economia foi ganhando proporções que fogem à capacidade dos Estados nacionais de administrarem, por meio dos instrumentos tradicionais da política econômica, a crise que aí está.

Olhem alguns indicadores. Os Estados Unidos já demitiram 4,5 milhões de pessoas - são 4,5 milhões de trabalhadores desempregados, 600 mil a cada mês. O índice de desemprego vem crescendo mês a mês. A economia americana produzia um milhão de veículos; está produzindo 500 mil. A queda foi de 50% no prazo entre setembro e agora. Exatamente em 15 de setembro, quando o Banco Central americano permite a quebra do Lehman Brothers, com uma moratória de US$630 bilhões, gera-se um pânico, instala-se a crise de confiança, e a crise muda de patamar: vira uma crise financeira global, vira uma crise econômica global e atinge o Brasil. O Brasil, que estava preservado até agosto, o Brasil, que não se envolveu com subprime, o Brasil, que tinha mecanismos de prudência bancária mais rigorosos, o Brasil, que não estava exposto a essa instabilidade financeira, a essa irracionalidade econômica, como boa parte da economia mundial, é atingido a partir de 15 de setembro.

A recessão se instala na economia americana, não só no desemprego, na queda de produção, mas, sobretudo, na insolvência dos grandes bancos. O Citibank, o maior banco do mundo, valia US$250 bilhões em agosto do ano passado; na sexta-feira passada, valia US$4 bilhões, num cenário em que o governo americano já comprou 40% das ações do banco. O segundo investidor, o segundo controlador tem 7%. E é um banco extremamente pulverizado. O Citibank já foi nacionalizado. Na realidade, já está sob o controle do governo americano, apesar de não ser assumido nessa condição. Isso demonstra a gravidade da crise.

Uma empresa como a General Motors (GM), que, durante 90 anos, foi a maior empresa de automóveis do mundo, já declarou a possibilidade da falência. Os auditores já apontaram a inviabilidade da empresa nas condições do volume de débito e da capacidade dela de gerar caixa para superar essas condições.

Portanto, é uma crise de grandes proporções. Só nos Estados Unidos, o PIB já caiu 6,2%; e, no Japão, 5%. O índice da Ásia começa a se aproximar desse patamar. Praticamente todos os países do leste europeu já estão batendo às portas do Fundo Monetário Internacional (FMI), que não tem recursos disponíveis para abrigar o volume de países que precisarão de socorro financeiro. A União Européia, na semana passada, pediu para dobrar o aporte de recursos ao FMI de US$250 bilhões para US$500 bilhões, e, hoje, o Fundo já pede mais US$500 bilhões. Por quê? Porque esses países do leste europeu estavam profundamente endividados, não tinham reservas cambiais em caixa e, portanto, não têm resposta no momento da crise especialmente por que são economias prioritariamente voltadas para exportações. O comércio mundial caiu 45% ao longo desse período.

Essa crise tem a dimensão da crise de 1929. Em 1929, o Presidente Hoover, não entendeu a natureza da crise americana, a natureza da crise internacional. E as primeiras medidas econômicas patrocinadas pelo governo americano foram especialmente o protecionismo. Quadruplicaram as barreiras de importação da economia americana. A resposta dos outros países do mundo foi exatamente aprofundar o protecionismo. Se há uma coisa que temos de aprender na vida pública é que, quando a gente cai no buraco como a economia mundial caiu agora, a primeira coisa é largar a pá, porque, se continuarmos cavando, vamos aprofundar a crise, como aconteceu em 1929.

Os sinais do protecionismo estão presentes no pacote de Obama, que é uma grande esperança de renovação política internacional, mas as medidas iniciais, apesar do tamanho do pacote, do esforço do governo, são absolutamente insuficientes para enfrentar essa crise. Não pode haver protecionismo econômico.

A Argentina é um país que tem um superávit comercial com o Brasil de US$4,3 bilhões, o segundo maior superávit comercial do Brasil hoje - o primeiro é o obtido com a Venezuela. Quando a Argentina começa a tomar medidas protecionistas com o Brasil, este não pode responder com retaliação imediata à Argentina. Por quê? Porque a pauta de exportações da Argentina é de 8%, os Estados Unidos representam 8% das exportações da Argentina. O Brasil representa 16%. O Brasil é duas vezes mais importante para a Argentina do que a economia americana. Se tomarmos medida de retaliação imediata, como pede a Fiesp, vamos agravar a crise argentina, vamos agravar a crise econômica do Brasil, vamos deixar de vender para a Argentina, que, seguramente, deixará de vender para o Brasil. Isso já está acontecendo. As nossas exportações caíram 20% nessa crise. A queda no comércio mundial foi de 45%. As nossas importações caíram 30%. Mas, para a Argentina, o que deixamos de vender e de comprar está próximo à queda no mercado mundial. Portanto, estamos aprofundando a crise em uma região em que nos interessa a estabilidade.

O Brasil precisa mudar de atitude, precisa pensar parceria, precisa pensar integração. A resposta à crise é mais integração. A resposta à crise é mais Mercosul. A resposta à crise eu vi hoje no encontro do Presidente Lula com o Presidente Tabaré Vázquez: R$100 milhões de investimentos do Brasil no Uruguai através da Petrobrás; a construção de uma nova ponte de integração entre os dois países em termos de infraestrutura; dobrar os recursos do Focem, que é esse fundo de compensação das assimetrias que existem no Mercosul, para diminuir a desigualdade entre o Brasil e os pequenos países, como Uruguai e Paraguai. Precisamos pensar linha de crédito em reais para que Argentina, Uruguai e Paraguai possam comprar os produtos brasileiros, porque são países que estão com grande dificuldade de financiamento e que não têm resposta econômica e os instrumentos que o Brasil tem.

Fico feliz de o Brasil estar inaugurando uma agência internacional do BNDES no Uruguai, de criarmos linhas de financiamento para poder aprofundar a integração econômica. A resposta à crise é mais integração, é mais parceria, é mais colaboração.

É evidente que nós precisamos ter instrumentos de defesa contra o comércio predatório, porque esse excedente de produtos da economia mundial viola regras do comércio que o Brasil não pode aceitar, não deve aceitar e tem amparo da Organização Mundial do Comércio para não aceitar.

Fico muito feliz quando vejo o Secretário-Geral da Organização Mundial do Comércio dizer: “O Brasil é um exemplo de atitude na crise”. Pascal Lamy diz: “O Brasil é a referência da atitude que nós esperamos da economia mundial”, porque o tempo nos dará razão, o protecionismo de 29 fez com que o comércio mundial, em quatro anos, fosse um terço do que era em 29. E não veio só o protecionismo em 29. Em 29, veio um nacionalismo exacerbado; veio a xenofobia daqueles que rejeitavam os estrangeiros, como começa a acontecer na Inglaterra, onde há manifestações dizendo “Emprego só para inglês”, “Fora os estrangeiros”; ou como no governo de Berlusconi... Impacta-me o silêncio nesta Casa daqueles que não enxergam parte dos problemas que nós temos! O governo Berlusconi acaba de aprovar uma lei em que os médicos italianos são obrigados a denunciar os imigrantes que não tenham a legalização. Que Medicina é essa? Que mundo eles esperam construir com essas atitudes?

Essas são as sombras de 29, porque a xenofobia e o nacionalismo foram o que inspiraram as lideranças que encontraram a saída da crise. Porque Hitler não existia em 29. Em 1934, ele teve 88% dos votos na Alemanha. Mussolini se consolidou como liderança na Itália. No Japão aconteceu a mesma coisa. E o revanchismo da Primeira Guerra Mundial e o impacto da Crise de 29 se desdobraram numa corrida armamentista, que foi a saída da Crise de 29. A corrida armamentista, a disputa de um lugar ao sol, o revanchismo, o sentimento nacionalista levaram à Segunda Guerra Mundial. A verdadeira resposta à crise foi a Segunda Guerra Mundial. Foram 20 milhões de pessoas assassinadas, foi a perseguição aos judeus! Essa foi a cultura que se gerou em 29, e que temos de combater a cada dia, dizendo que precisamos de governabilidade global, de parceria, de integração, de soluções em que os países se juntem para enfrentar essa crise.

Portanto, faz muito bem o Presidente da República, o Presidente Lula, com o prestígio que o Brasil construiu hoje, de se sentar no sábado que vem com o Presidente Obama, que tem imensa responsabilidade, porque ali o sistema financeiro quebrou; ali dez mil pessoas estão entregando as casas todos os dias porque estão inadimplentes e não têm como pagar o financiamento que tinham; ali já há 4 milhões e meio de empregos... No caso da economia americana, estamos falando de 25% da economia mundial. Nós somos 2%. Quando vemos o que acontece no Japão, na União Européia e nos Estados Unidos, uma crise dessa proporção, temos que ter a convicção de que este país não só atrasou o impacto dessa crise, como amenizou o seu impacto. Ela é muito menor no País do que está acontecendo no coração do capitalismo industrial - Europa, Estados Unidos e Japão. Muito menor! Muito menor porque fomos prudentes; muito menor porque construímos fundamentos macroeconômicos sólidos; muito menor porque o Brasil tinha US$230 bilhões de reservas. Eram US$200 bilhões de reservas cambiais e US$30 bilhões de swap reverso. E, na hora em que a crise cambial veio, e o real se desvalorizou, diferente das pequenas crises que vivemos em anos anteriores, como a do México, a da Rússia, a da Argentina e da Malásia, quando um vento batia aqui e o País desmoronava, o dólar disparava, a dívida pública crescia, o Banco Central saia aumentando brutalmente a taxa de juros, o Governo aumentava a carga tributária, cortava gastos, a recessão se aprofundava. Por quê? Porque nós estávamos vulneráveis nas contas externas e porque quem monitorava a política econômica era o FMI, o mesmo FMI que hoje está entrando na Polônia, na Romênia, na Eslovênia.

Todo o Leste Europeu está batendo às suas portas dia a dia porque eles estão vivendo o que a América Latina viveu no começo dos anos 80. Aqui, não. Nós não só temos liberdade para dirigir a nossa economia... Não precisamos do FMI, talvez possamos ajudá-lo a encontrar soluções novas porque ele tem que se reestruturar na forma de pensar e de agir. Aqui, diferente dos anos 80, o Brasil continua tendo US$200 bilhões em caixa. O Governo acaba de pegar US$36 bilhões das reservas para dar linha e segurança para os bancos internacionais rolarem a dívida de todas as empresas brasileiras que têm dívida em dólar a serem roladas este ano. Não há crédito no mercado internacional. Os grandes bancos internacionais não voltarão tão cedo ao mercado.

O Lloyds Bank, que foi estatizado esta semana pelo Governo Gordon Brown, na Inglaterra, é um banco que foi credor do Império brasileiro. O Lloyds Bank foi credor do Império brasileiro há duzentos anos e quebrou nessa crise, como quebrou o maior banco do mundo.

Aqui, não tem um único banco quebrado. O sistema financeiro brasileiro está sólido. E fico muito feliz. Depois de tantos anos tentando dizer que nós não tínhamos que privatizar o Banco do Brasil, a Caixa, o BNDES, o The Economist esta semana diz: “O Brasil tem uma inserção diferenciada porque tem um setor público financeiro forte e consolidado”. Trinta e sete por cento do sistema financeiro brasileiro é BNDES, Caixa e Banco do Brasil, e, com essa capacidade de financiamento, nós conseguimos prover parte do crédito que o setor privado, especialmente internacional, já não dá, e não poderá dar tão cedo. Cem bilhões de reais a mais de aporte de recursos no BNDES. Caixa e Banco do Brasil aumentaram em 13% o volume de crédito de setembro para cá, substituindo a banca internacional, substituindo os médios e pequenos bancos cuja equação não está resolvida.

O Governo, por intermédio do Banco do Brasil, comprou metade do Votorantin. O Banco Votorantin são R$82 bilhões, um banco médio, e é o banco que financiava o mercado usado de automóveis. Ouvi aqui vários Senadores questionando: por que ajudar a indústria automotiva a sair da crise? Porque a indústria automotiva é a indústria da indústria, é a indústria que mais encomenda para trás. Atrás do automóvel tem siderurgia, mineração, máquinas, equipamentos, têxtil, vidro, eletroeletrônica, borracha. Então, ela puxa toda uma cadeia produtiva e é o setor que, para frente, também estabelece revendas, combustíveis, oficinas. Portanto, essa é uma indústria que, quando cai, arrasta o conjunto da indústria, como está acontecendo nos Estados Unidos. Aqui, não. Aqui, não.

Produzíamos, em fevereiro do ano passado, 216 mil automóveis; produzimos, no mês passado, 201 mil automóveis. Praticamente voltamos ao mesmo patamar, que não tinha no último trimestre. Por isso a queda do PIB no último trimestre foi muito forte, porque chegamos ao patamar de 100 mil veículos por mês. Já voltamos a 200. Nessa primeira semana de março, a venda de automóveis cresceu 16%. Se mantivermos essa batida, vamos voltar a produzir exatamente o que produzíamos antes da crise.

A indústria de caminhões começou a voltar, mas a de ônibus ainda não. Precisamos de um programa de financiamento de ônibus com as prefeituras para melhorar o transporte coletivo, para ajudar esse segmento importante da indústria automotiva a manter emprego, a manter produção e alavancar o crescimento.

O Governo desonerou IPI e as pessoas falam que tem que voltar a subir. Só pode voltar a subir na hora em que a demanda se consolidar, que as vendas se sustentarem. Se acham que isso vai garantir o FPM e o FPE, não vai, porque sem produzir não tem arrecadação. E, se você tira o imposto do carro final, não quer dizer que todos os outros setores da economia que estão associados à indústria automotiva não estejam gerando impostos e não estejam melhorando a capacidade de arrecadação do FPE e do FPM.

Quero dizer, Sr. Presidente, que o sistema financeiro brasileiro é sólido. Ainda que o crédito não tenha voltado totalmente, nas ACCs, no crédito externo, já voltou 95%.

As empresas brasileiras, as grandes, que perderam financiamento lá fora, porque não existe mais, tiveram que suprir a sua necessidade de crédito internamente, prejudicando médias e pequenas empresas. Nós precisamos de novas atitudes para irrigar o crédito para as médias e pequenas empresas e, sobretudo, para resolver o problema de bancos pequenos e médios, que não está resolvido.

Quero falar de outra vantagem comparativa do Brasil. Além das reservas cambiais e do sistema financeiro sólido - e a liquidez está voltando, não como era antes da crise, mas já voltou de forma significativa, muito melhor em março do que era no último trimestre do ano passado -, nós temos uma melhora nas contas públicas. A dívida pública caiu...

(Interrupção do som.)

O SR. PRESIDENTE (Gilvam Borges. PMDB - AP) - Senador Mercadante, V. Exª estende e engrandece esta tribuna e, portanto, tem o direito de concluir dizendo quanto tempo necessita.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Acho que, com mais cinco minutos, concluímos.

O SR. PRESIDENTE (Gilvam Borges. PMDB - AP) - V. Exª terá dez minutos.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Vou procurar não usar os dez minutos e buscar concluir.

A outra característica da resposta do Brasil, como é que o Brasil criou uma linha de defesa a essa crise, é que a dívida pública brasileira, pela primeira vez na História, quando há desvalorização do câmbio, não está indexada ao câmbio. Então, quando o real se desvalorizou, o Governo era credor de US$230 bilhões. O que aconteceu com a dívida pública? Caiu 5,9% do PIB. A nossa dívida pública, que era de 52% do PIB em 2002, hoje é 36%. A dívida diminuiu e, com isso, abre algum espaço para o Governo manter as políticas sociais, melhorar, especialmente para o setor mais frágil e mais vulnerável, a crise, e manter os investimentos, acelerar o PAC, lançar um programa habitacional.

Tenho dito isto desta tribuna desde o início desta crise, há um ano e meio que eu venho plantando no deserto: é preciso conter o gasto de custeio, o Senado não pode aprovar propostas demagógicas fiscais num cenário como esse. Nós temos que ter austeridade para podermos manter as políticas sociais e aumentar os investimentos nos setores mais estratégicos, que é o que vai compensar a queda do mercado externo. Como é que nós vamos manter o crescimento se o comércio mundial caiu 45%? Só há uma forma: substituindo o mercado externo pelo mercado interno onde for possível, principalmente na construção civil - estradas, infraestrutura, portos, aeroportos, PAC, habitação popular, saneamento básico -, como uma forma de nós gerarmos emprego. Não pressiona o balanço de pagamento, não depende do mercado internacional e puxa toda uma cadeia: cimento, siderurgia, madeira. Ir para frente. O sujeito ter uma casa própria dá estabilidade e segurança à família, especialmente num cenário de crise. Ele vai comprar uma geladeira, um fogão, uma cama; portanto, alavanca a economia em um setor que tem grande impacto social.

Quero dizer, Sr. Presidente, que o Governo proveu liquidez nos depósitos compulsórios; buscou restabelecer as condições de financiamentos externos, que estão totalmente fragilizados; desonerou alguns setores, como o Imposto de Renda Pessoa Física, num quadro de queda forte das receitas tributárias; por isso mesmo, austeridade no custeio é fundamental para não voltarmos a endividar o Brasil na crise, para mantermos o controle sobre a dívida pública. Não o desendividamento que fazíamos antes, porque isso não será possível, mas mantermos o equilíbrio das contas públicas. Por quê? Porque é preciso investir mais. Ao mesmo tempo, é possível, é necessário, é indispensável que a taxa básica de juros caia mais rapidamente.

Já disse, na última audiência, ao Presidente do Banco Central, Henrique Meirelles... Por sinal, aprovei o projeto de que o Banco Central tem de prestar contas trimestralmente ao Senado. Hoje, aprovei o requerimento convidando Henrique Meirelles, o Ministro Presidente do Banco Central, a estar na Comissão novamente, espero que o mais breve possível. A política monetária, a queda dos juros no Brasil está atrasada. Os indicadores mostram isso. Porém, quando no resto do mundo a taxa de juros já está no chão, a nossa tem espaço para cair. E, a cada um ponto percentual de queda na taxa básica de juros, o Governo ganha R$8 bilhões no Orçamento fiscal do ano, em juros da dívida pública. Portanto, se reduzirmos 4%, 5% da taxa de juros do início da crise para lá, são R$40 bilhões para substituir aquilo que vai faltar em termos de receita, porque a economia desacelerou fortemente.

Então, quero concluir dizendo que eu pondero à oposição - e lamento que não possamos fazer um debate mais aprofundado - que não se apresse no diagnóstico, não estimule esta retórica - não estou dizendo que alguém está fazendo isto, só estou ponderando que não é bom que se faça - do “quanto pior melhor”, e, sobretudo, que não subestime este País no enfrentamento dessa crise, não subestime, porque não só o Brasil chegou mais tarde como vai sair mais cedo.

Do meu ponto de vista, a crise americana é uma crise estrutural. As famílias devem uma vez e meia - endividamento - do que vão receber na renda disponível anual; quer dizer, cada um deve, em média, uma vez e meia do que vai receber no ano. O crédito total na economia americana é 195% do PIB, quer dizer, o crédito é duas vezes o PIB. Aqui é 40%, aqui não há esse endividamento nem das famílias, nem das empresas. Lá é essa dívida, esse endividamento que moveu o consumo americano com um déficit comercial de US$4,7 trilhões durante cinco anos, que fez com que o resto do mundo pudesse crescer, especialmente a China; 40% do PIB chinês é exportação, e a economia americana é o grande consumidor. A economia americana se apropriava de 60% da poupança mundial. Isso, com essa indústria financeira sofisticada, alavancava o consumo, puxava o crescimento mundial.

Isso acabou. Esse tempo acabou. Os americanos se empobreceram. A renda das famílias americanas, o patrimônio está em bolsa de valores. Isso se desfez. Caiu em 50% o valor da bolsa. As pessoas não têm mais como manter o financiamento, porque não há mais o mecanismo de crédito que existia. Os americanos vão sair menores dessa crise do que eram. Ainda muito fortes, talvez ainda a maior economia do mundo, mas muito menores do que eram. E vão sair muito mais tarde. Hoje, o Warren Buffett fala em cinco anos para os Estados Unidos se recuperarem. Os americanos não são competitivos nem onde eles iniciaram a história da industrialização, como é o caso da indústria automotiva.

Não é o caso do Brasil. O Brasil, neste momento, tem uma perspectiva promissora no futuro, sem subestimar a crise, sem subestimar a profundidade dessa crise e os desafios que temos pela frente. Tem uma perspectiva promissora porque nós, primeiro, temos o pré-sal e, num prazo de cinco a seis anos, vamos nos transformar numa grande potência exportadora de energia de petróleo. Estamos aumentando os investimentos em energia renovável, como é o caso das hidroelétricas e da biomassa - mais da metade do consumo de combustível da indústria automotiva já é de etanol. Somos, nos últimos cinco anos, o País que mais aumentou o excedente exportável de alimentos, e vamos ter uma safra de mais de 138 milhões de toneladas neste ano. O Brasil já é, do ponto de vista da agricultura, o grande sustentáculo das exportações agrícolas no mundo. Falta estoque no mundo, e essa crise atinge os setores exportadores, atinge os setores que dependem de crédito, mas não atinge o consumo básico de alimentos. Por isso, as exportações brasileiras caíram muito menos do que as do resto do mundo, e a renda agrícola já melhorou com a desvalorização do real, com a redução do preço do petróleo, que reduz o preço do custo do fertilizante e reduz o preço do transporte dos petroleiros, enfim, das mercadorias. Então, a renda agrícola está se sustentando no Brasil, e a seca na Argentina melhorou especialmente a nossa safra de grãos em termos de valor.

O Brasil tem uma política social que, nos últimos cinco, foi a maior distribuição de renda de toda história do IBGE. O Bolsa Família protege os mais pobres, as 11 milhões de famílias mais desfavorecidas. O salário mínimo continua crescendo muito acima da inflação: 12% neste ano, com uma inflação de 6%. Nós dobramos o poder de compra de 26 milhões de brasileiros, aumentando o mercado de consumo de massas, que é o que permite amortecer a crise internacional. Como eu disse, nós temos que substituir o mercado interno pelo mercado externo.

Vai haver desemprego? Vai haver desemprego. Está havendo desemprego, especialmente no setor exportador e no setor que depende de crédito. Tem que haver negociação entre trabalhador e empresário? Tem. Nós podemos desonerar alguns setores? Podemos. Mas o melhor caminho para enfrentar essa crise é restabelecer o sistema de crédito, é impulsionar o PAC.

O PAC é ação propositiva do Estado na infraestrutura, na logística, na energia, em saneamento, em habitação, é o grande instrumento de resposta do Estado brasileiro à crise.

Essa crise precisa de parceria dos governos municipais e estaduais com o Governo Federal, da iniciativa privada com o setor público, de oposição e governo, uma parceria em defesa do Brasil, a confiança do Brasil.

Eu quero ser cobrado desta tribuna, e vou repetir o que disse: nós sairemos maiores do que entramos nessa crise, como Nação; jogaremos um papel cada vez mais relevante na política internacional; e vamos sair muito mais cedo do que as grandes potências econômicas, que entraram antes, estão muito piores do que nós e terão muito mais dificuldade de sair do que o Brasil.

Portanto, para analisar a conjuntura, não fiquem me olhando só no retrovisor do semestre anterior, que já era muito ruim. Este semestre já é um pouco melhor. O próximo poderá ser melhor ainda. E, seguramente, o segundo semestre poderá ser melhor, se nós não tivermos fatos muito relevantes que deteriorem esse grave cenário internacional.

Por isso, eu acredito neste País. Acho que o Governo tem rumo, tem política, tem utilizado instrumentos - e pode acelerar alguns deles - e nós sairemos mais cedo do que as outras nações. 

Muito obrigado, Sr. Presidente.


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