Discurso durante a 79ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com a endemia da dependência das drogas, especialmente, o crack.

Autor
Sérgio Zambiasi (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RS)
Nome completo: Sérgio Pedro Zambiasi
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DROGA.:
  • Preocupação com a endemia da dependência das drogas, especialmente, o crack.
Aparteantes
Cristovam Buarque, Jefferson Praia.
Publicação
Publicação no DSF de 22/05/2009 - Página 18828
Assunto
Outros > DROGA.
Indexação
  • DEFESA, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, AMPLIAÇÃO, PENA, EFICACIA, PUNIÇÃO, TRAFICO, DROGA.
  • COMENTARIO, DADOS, SECRETARIA DE SAUDE, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), SUPERIORIDADE, NUMERO, VICIADO EM DROGAS, DEFESA, ORADOR, NECESSIDADE, INVESTIMENTO, CAMPANHA EDUCACIONAL, AMPLIAÇÃO, ACESSO, INFORMAÇÕES, JUVENTUDE, RISCOS, DROGA, VIABILIDADE, REABILITAÇÃO, PREVENÇÃO, REINCIDENCIA, DEPENDENTE.
  • SOLICITAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, AGILIZAÇÃO, TRAMITAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, AUTORIZAÇÃO, UNIÃO FEDERAL, CELEBRAÇÃO, CONVENIO, ESTADOS, MUNICIPIOS, OBJETIVO, PREVENÇÃO, UTILIZAÇÃO, DROGA, POSSIBILIDADE, REINCLUSÃO, USUARIO, VICIADO EM DROGAS, SOCIEDADE.
  • COMENTARIO, INEFICACIA, ATENDIMENTO, CENTRO DE SAUDE, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), VINCULAÇÃO, PROGRAMA, SAUDE MENTAL, MINISTERIO DA SAUDE (MS), FALTA, MÃO DE OBRA ESPECIALIZADA, TRATAMENTO, DEPENDENTE, DEFESA, URGENCIA, ALTERAÇÃO, POLITICA, GOVERNO.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. SÉRGIO ZAMBIASI (PTB - RS. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Presidente Mão Santa e Senador Suplicy, muito obrigado. Eu agradeço a gentileza. Poderia aguardar, sem nenhum problema.

Eu estava agora mesmo conversando com o Senador Alvaro Dias com relação à questão do preço da gasolina. As pessoas reclamam muito, porque acham muito alto.

Recebi uma demanda da Câmara de Vereadores de Caxias do Sul questionando os valores do preço da gasolina. Como é um tema técnico, obviamente é de ordem técnica a resposta. Mas sempre que se fala em combustíveis, mexe-se, obviamente, no interesse cotidiano dos cidadãos e cidadãs.

Acho importante que o tema do custo do combustível, na mobilidade urbana deste País, tenha que ser discutido também.

Eu estou concluindo hoje, Presidente Mão Santa, uma série de manifestações, uma série de pronunciamentos, no qual tenho abordado um tema que tem me angustiado bastante, que é uma grande epidemia. Aliás, não é epidemia, é pandemia, aproveitando um tema utilizado pela Organização Mundial de Saúde para a questão da Gripe A, a popular Gripe Suína, que, pela sua extensão, ganha já a expressão de pandemia.

Existem outras endemias no mundo que estão matando gente todos os dias e que, infelizmente, não ganham a dimensão e o espaço que assuntos mais midiáticos conseguem receber. É o caso da endemia da dependência das drogas, da endemia da dependência do crack. E eu pretendo continuar trazendo este tema ao debate aqui no Senado, de forma insistente, para que possamos refletir sobre os rumos que devemos tomar para enfrentar esta triste realidade.

Conforme informei na semana passada, apresentei o PLS nº 187, de 2009, que “altera a Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006, propondo mais rigor na punição no crime de tráfico de drogas, cujos efeitos sejam mais gravosos para a saúde”. Realmente devemos ampliar a pena para punir com maior rigor o tráfico do crack.

Lembro que isso é apenas parte de uma grande empreitada, que passa também pela educação, pela informação e pela saúde pública. Trata-se de educação porque, à medida que a população tomar conhecimento mais amplamente dos danos que essa droga causa, haverá menos chance de um jovem experimentar a famigerada primeira pedra.

Trata-se de informação, de investir em campanhas educativas de forma a tornar as informações acessíveis a toda a nossa juventude, mais exposta à atuação dos traficantes. E quando falo em saúde pública, trata-se de investir na reabilitação e na prevenção da reincidência dos dependentes, não especificamente o dependente químico, mas especificamente o dependente do crack, da pedra, que já somam mais de 50 mil no Rio Grande do Sul, meu Estado, conforme dados da Secretaria de Saúde do Estado.

Dotar o nosso sistema de saúde de condições para atender essa demanda de usuários talvez seja a tarefa mais árdua dado o baixíssimo índice de recuperação desses dependentes, talvez porque, ao procurarem ajuda, não recebam o encaminhamento adequado e acabam retornando ao vício.

Nesse sentido, tramita na Câmara dos Deputados outro projeto de minha autoria, o PL nº 3640, de 2008, que permite que a União possa celebrar convênios, além dos Estados, diretamente com os Municípios com o objetivo de prevenir o seu uso indevido e possibilitar também a atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas.

Tenho certeza de que a aprovação desse projeto permitirá que os governos, tanto federal quanto municipais, possam ter uma política coordenada e integrada para atuar com mais eficiência nesse sentido. Para tanto, peço à Câmara dos Deputados que dê celeridade à tramitação desse projeto, porque, assim, os Municípios poderão atuar com mais eficiência na prevenção ao uso de drogas, especialmente o crack, em convênios com o Sisnad, a secretaria que trabalha essa questão, o Sistema Nacional Antidrogas.

Especialistas entendem que o usuário crônico do crack deve ser cuidado por uma equipe especializada, formada por psicólogos e psiquiatras, Senador Mão Santa, V. Exª que é médico, antes de começar o tratamento. O atendimento prestado pelo Sistema Único de Saúde - SUS se mostra ainda muito ineficiente. Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) fazem parte do programa de saúde mental do Ministério da Saúde.

Segundo dados do próprio Ministério, o Governo Federal investiu em 2008, mais de R$1 bilhão em todo o programa de saúde mental; não temos, infelizmente, os valores específicos para o tratamento de dependentes químicos.

Na prática, os CAPS, como são conhecidos, fazem apenas um trabalho de redução de danos, por não possuírem um local especializado para o tratamento de dependentes químicos.

A especialista da Universidade de Brasília, Maria Fátima Sud Brack, coordenadora do Programa de Estudos e Atenção às Dependências Químicas, em entrevista recente, afirmou que os serviços de saúde mental muitas vezes se recusam a aceitar dependentes de crack, e por isso ela mesma já teve que encaminhar pacientes sem informar que eram dependentes de drogas, senão não seriam aceitos.

É um fato, não há preparo para atendimento a dependentes químicos dentro desses centros. Há um total atordoamento dos profissionais, que não sabem nem para onde encaminhar um garoto que esteja usando crack. Por isso, entendo que a política adotada pelo Governo deve ser mudada radicalmente, e exigem-se medidas urgentes.

Fico olhando todo o impacto, toda a divulgação que a Gripe Suína recebeu no mundo inteiro. A endemia, a preocupação, as manifestações, as mobilizações. Graças a Deus, esse problema chegou ao Brasil, por enquanto, com poucos efeitos. Lá no Rio Grande do Sul foram registrados 17 casos suspeitos.

Ontem, preparando esses dados para essa manifestação, Senador Mão Santa, eu telefonei para algumas farmácias de Porto Alegre. Perguntei se tinham à venda o remédio, os comprimidos para a Gripe A, a Gripe Suína, ao preço de quase R$160,00 a caixinha com dez comprimidos. Liguei para três, quatro farmácias e os estoques estão acabados, não há estoque. No fundo, a endemia se transforma num grande negócio para laboratórios multinacionais, um maravilhoso negócio. Aliás, estava lendo esses dias que as ações desses laboratórios sobem muito enquanto esse medo da gripe ganha um grau de pânico. Quantas vítimas essa endemia causou no mundo? Algumas. Temos de estar preparados para enfrentá-la. Acho que a informação é fundamental. Por isso que, quando vejo toda essa mobilização em relação a essas gripes, a suína, a aviária e outras, infelizmente, não consigo perceber mobilização parecida em relação à questão da dependência química, das drogas, do crack.

Nós não temos, Senador Praia, uma estatística sobre quantas pessoas morreram ontem em relação ao crack, mas foram dezenas com toda a certeza. Na medida em que nós temos 50 mil dependentes no meu Estado, quantos serão lá no Amazonas? E aqui em Brasília? E no Rio de Janeiro ou em São Paulo? Quantos serão no Brasil? A estatística no meu Estado diz que há 50 mil usuários dependentes. Mas e no Brasil? Não é uma endemia? Não seria uma endemia? O detalhe é que, para essa endemia, você não compra remédio na farmácia. Nenhum laboratório está oferecendo algum tipo de medicamento que possa ser comprado no balcão da farmácia e que possa minimizar o drama desses dependentes, porque quem entra nesse caminho dificilmente encontra a via da volta. É quase um caminho sem volta.

Então, é uma preocupação que me chama atenção, a endemia da dependência química e das drogas, Senador Praia.

O Sr. Jefferson Praia (PDT - AM) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. SÉRGIO ZAMBIASI (PTB - RS) - Pois não.

O Sr. Jefferson Praia (PDT - AM) - Só para parabenizá-lo, Senador, e dizer o seguinte: nós, na verdade, estamos perdendo nessa guerra contra as drogas no nosso País. Nós não temos avançado no combate. Então, precisamos agir urgentemente para vermos como é que nós vamos tratar essa questão, que é um problema seriíssimo, como V. Exª muito bem está relatando neste momento. Muito obrigado.

O SR. SÉRGIO ZAMBIASI (PTB - RS) - Eu que agradeço, colega Praia, a sua intervenção. Essa é uma luta que tem que ser de todos.

No meu Estado, a Associação do Ministério Público do Rio Grande do Sul lançou, semana passada, uma campanha que é absolutamente meritória: Crack - Ignorar é o seu Vício? É isso, é no sentido de criar conscientização. A campanha promove palestras em escolas, sindicatos e associações de bairro. Para isso, a iniciativa está contando com o apoio de entidades como a Central Única das Favelas do Estado (Cufa-RS), a Procuradoria-Geral de Justiça, a Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul e a Secretaria Estadual de Saúde.

         Esse é um desafio de todos nós, porque, diante de um efeito devastador que uma droga como o crack vem revelando, é louvável e tem que ser destacada e divulgada a iniciativa da Associação do Ministério Público do Rio Grande do Sul, da Central das Favelas do Rio Grande do Sul e de outras entidades associadas lançando essa campanha, alertando para as consequências desta terrível chaga.

Paralelamente, nós entendemos que o Governo também deve contribuir com a sua parte. Cito apenas um exemplo, e veja como existem muitas coisas a serem feitas. Quando um usuário que é segurado da Previdência Social, por exemplo, consegue o benefício do auxílio-doença para se submeter a um tratamento da sua dependência, também tem problemas para concluir esse tratamento. Ocorre que muitos peritos ainda não estão instruídos suficientemente a respeito das especificidades de um tratamento da dependência química, que envolve a internação do dependente por longos períodos, durante a qual é promovida a sua recuperação física, dada a emaciação sofrida pelo toxicômano e o necessário acompanhamento psicológico que lhe permite abandonar o vício. Ao perceberem, depois de um certo período de tratamento, a visível melhora na aparência física do usuário de drogas, simplesmente indeferem a prorrogação do benefício, por julgarem o indivíduo em condições, apto para retornar ao trabalho. É uma temeridade, pois, em muitos casos, o indivíduo acaba retornando ao vício por não concluir adequadamente um tratamento para sua dependência.

Para acabar com a discricionariedade desse ato, que hoje é exclusivo de um perito médico, apresentei nesta semana o PLS nº 202, de 2009. Ele pretende incluir dispositivo na Lei nº 8.213, de 1991, para permitir que, na hipótese da decisão da cessação do auxílio-doença do dependente químico, por parte da perícia médica, essa decisão possa ser revisada automaticamente por uma junta de peritos, com garantia do direito de manifestação do requerente. Espero, com isso, estar agindo nas três vertentes do problema: a prevenção, a repressão e o tratamento.

         Presidente Mão Santa, enquanto o SUS não apresenta respostas ao problema, os dependentes químicos procuram outras formas de se verem livres do vício, eles e suas famílias. Foi em uma comunidade terapêutica evangélica que uma jovem, com o nome fictício de Carla, com 30 anos, moradora de Brasília, ex-usuária de crack, procurou ajuda e despertou a sua espiritualidade. Para ela, ler a Bíblia durante o tratamento foi fundamental para sua recuperação. Creio que seja uma alternativa viável também investir e apoiar essas comunidades terapêuticas, uma vez que elas prestam voluntariamente e, muitas vezes, a duras penas, um serviço que deveria ser oferecido pelo Poder Público.

Que possamos, então, continuar refletindo sobre esse tema e que possamos, conjuntamente, buscar alternativas para combater essa triste realidade que avilta a sociedade brasileira.

Obrigado, Presidente Mão Santa.

O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - V. Exª me permite um aparte, Senador?

O SR. SÉRGIO ZAMBIASI (PTB - RS) - Senador Cristovam Buarque.

Sr. Presidente, tão generoso, como é a sua marca, o aparte está concedido.

O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Creio que os melhores apartes são quando o orador já terminou, porque, assim, não se interrompe o discurso, que estava tão bem concatenado sobre um tema tão importante. Fico feliz, Senador, que o senhor esteja trazendo este problema, porque ele faz parte de um conjunto de problemas que ameaçam o futuro do Brasil. Nós estamos esquecendo isso. Nós, hoje, estamos em risco no Brasil. Nós somos um País ameaçado, ameaçado pela destruição ambiental, ameaçado pela falta de conhecimento necessário para realmente atravessar o século XXI e ameaçado pelo problema das drogas. É muito mais do que um simples problema de famílias, do que um simples problema de um ou outro jovem. Este é um problema que ameaça o futuro do nosso País. E, quando o futuro de um país está ameaçado, tem que haver uma mobilização. Quando há uma invasão, uma ameaça de guerra, convocam-se reservistas, treinam-se soldados, compram-se armas. Mas a gente tem que estar preparado. Nós não estamos dando a importância devida ao problema que o senhor trouxe aqui. Então, fico feliz que tenha trazido. Mas não temos feito algumas vigílias aqui que têm dado repercussão nacional, como fizemos com os aposentados, como fizemos com a Amazônia e vamos fazer pelas crianças brasileiras? Façamos uma vigília, aqui no Senado, sobre o problema da droga neste País. É uma ideia que deixo ao senhor, como quem tomou a liderança; ao Senador Paulo Paim, que tem sido um grande defensor deste assunto, também do Rio Grande do Sul, e quem liderou a convocação da vigília dos aposentados. Vamos fazer uma vigília sobre o problema da droga, trazendo pessoas aqui, não só Senadores, como fizemos com a da Amazônia, sob a forma de audiência, trazendo pessoas para falarem sobre o assunto. De tal maneira que a gente possa mostrar que o Senado está preocupado, que o Senado tem uma proposta. Essa é a ideia que eu queria lhe dar, no final do seu discurso. E o senhor aceitando, encampar. E que vire uma proposta sua, mais do que merecida, porque foi o senhor que trouxe o problema para cá: Uma vigília, no Senado Federal, sob a forma de audiência pública, de mais de uma comissão. E coloco a Comissão de Direitos Humanos à disposição, a de Assuntos Sociais também seria boa, para discutirmos o problema da droga no Brasil e a ameaça desses riscos para o futuro do nosso País.

O SR. SÉRGIO ZAMBIASI (PTB - RS) - Senador Cristovam, agradeço a sugestão e a sensibilidade de um educador que tem a percepção da importância das mobilizações. Vamos unir as Comissões de Assuntos Sociais e de Direitos Humanos e, quem sabe, possamos fazer uma vigília do Congresso brasileiro, trazendo a esta Casa representantes de entidades, como é o caso da Associação do Ministério Público do Rio Grande do Sul, que lança essa campanha de mobilização junto às escolas. Lá esteve presente inclusive o rapper carioca MV Bill, autor do documentário Falcão - Meninos do Tráfico. Levou a experiência pessoal e seu grito de alerta em relação ao problema. Trazendo representantes da Cufa - Central Única das Favelas do meu Estado, do Rio de Janeiro e do Brasil, que realmente trazem experiências do cotidiano da periferia, saindo dos gabinetes e indo exatamente ao encontro de onde está o problema.

A ideia de V. Exª deve ser discutida nas Comissões e trazida ao Plenário, e que não seja iniciativa de um Parlamentar, que seja iniciativa da Casa, do Congresso. Porque é através do coletivo que conseguimos produzir a necessária reação que o tema exige em âmbito nacional.

Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/05/2009 - Página 18828