Discurso durante a 90ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Homenagem ao jovem Roberto Santana de Araújo, morto no último sábado no Morro da Mangueira, na cidade do Rio de Janeiro, vitimado por bala perdida.

Autor
Marcelo Crivella (PRB - REPUBLICANOS/RJ)
Nome completo: Marcelo Bezerra Crivella
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Homenagem ao jovem Roberto Santana de Araújo, morto no último sábado no Morro da Mangueira, na cidade do Rio de Janeiro, vitimado por bala perdida.
Publicação
Publicação no DSF de 06/06/2009 - Página 22267
Assunto
Outros > HOMENAGEM. SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, CIDADÃO, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), INOCENCIA, VITIMA, ARMA DE FOGO, OPERAÇÃO, POLICIA, COMBATE, TRAFICO, DROGA.
  • REPUDIO, GRAVIDADE, VIOLENCIA, PAIS, AMEAÇA, TRABALHADOR, CIDADÃO, TRAFICO, CRIME ORGANIZADO, COBRANÇA, SUSPENSÃO, AREA, COMUNIDADE, PRIORIDADE, OPERAÇÃO, CENTRO DE INTELIGENCIA, CONTROLE, FRONTEIRA, REPRESSÃO, LAVAGEM DE DINHEIRO, TENTATIVA, PRISÃO, COMANDO, TRAFICO INTERNACIONAL, DROGA, ARMA, ATUAÇÃO, FORÇAS ARMADAS.

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O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PRB - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado, Sr. Presidente.

Sr. Senador Cristovam Buarque, senhores telespectadores da TV Senado, senhores ouvintes da Rádio Senado, demais presentes a este plenário, eu, no Dia da Terra, gostaria de estar aqui fazendo um pronunciamento sobre as riquezas do nosso meio ambiente, sobre os avanços que construímos nesta Casa e sobre os tantos percalços que ainda temos que enfrentar para termos um País menos desigual, menos poluído, e para garantir às futuras gerações todos os benefícios de que nós pudemos desfrutar na nossa geração.

Mas, Sr. Presidente, eu hoje vou prestar uma homenagem a um brasileiro, a um carioca, meu amigo, meu irmão de fé, que, no fogo cruzado das invasões que a polícia faz nas comunidades carentes, foi vítima de uma bala perdida e morreu na noite do último sábado.

V. Exª citou aqui, Senador Gilberto, com muita sabedoria, que o meio ambiente é também o homem. Portanto, ao lamentar e ao ler aqui o elogio fúnebre que passarei a fazer em seguida, estou também fazendo um clamor, um grito, um grito da terra, porque, segundo a Bíblia, eu creio, todos nós, no que concerne à matéria, que viemos do pó, do pó da terra, e à terra voltaremos. De tal maneira que esse ser humano, que foi arrancado da terra e recebeu o sopro de Deus, que lhe deu alma e espírito, também tem que ser respeitado.

Passo, então, Sr. Presidente, a ler o elogio fúnebre que escrevi em homenagem a Roberto Santana de Araújo, como um brado de alerta ao Congresso Nacional, às autoridades, sobretudo às autoridades do meu Estado do Rio de Janeiro.

No último sábado à noite, policiais subiram ao Morro da Mangueira trocando tiros com o tráfico local. Uma bala de fuzil matou Roberto Santana de Araújo, um jovem de 27 anos, que estava dentro de casa naquele momento, se despedindo da noiva, para ir a uma vigília na igreja. Eram quase dez horas da noite.

Mais uma bala perdida, mais um vida ceifada.

Esse jovem humilde, trabalhador, pacato e ordeiro, bom filho, bom irmão, bom amigo, coração sem ódios e conduta exemplar, enfrentava com grandeza a mediocridade do seu tempo. Com uma vontade inflexível, decidia com firmeza e construía com bravura cada etapa da sua existência, forjada nos princípios da dignidade, do amor ao trabalho, da devoção à família, do cristianismo autêntico e da força imbatível, pura e radiante da sua fé em Deus.

Seu sangue inocente, derramado em vão, clama aos céus, mas clama também aos homens de boa vontade. Até quando teremos que suportar essa escalada da violência, esse fogo cruzado em áreas densamente povoadas que põe em risco milhares de trabalhadores e suas famílias e faz do princípio constitucional da inviolabilidade do lar um ridículo e cínico deboche, um escárnio satânico, o mais aviltado e corrompido de todos os direitos?

Que tenhamos ódio e nojo do tráfico de cocaína, de maconha e de crack, pelo rio de sangue que desce dos morros, por tantos jovens lançados na sepultura com os corpos mutilados e ensanguentados, enquanto outros são despejados como lixo em presídios medievais onde são barbarizados e vegetam numa existência desgraçada; por tantas vidas perdidas; pelo comércio maldito que divide pobres em facções e põe irmãos contra irmãos numa guerra monstruosa, inútil e miserável. Sim, por tudo isso, se compreende nossa revolta.

Mas não é com mais violência ou monstrificando a força policial no ímpeto da marcha da insensatez que vamos vencer essa guerra. Não se pode dizer de onde veio o disparo. A perícia vai provar. Mas o fato de causar tiroteios onde residem pessoas, trabalhadores é absolutamente inaceitável.

Melhor seriam as operações de inteligência, como aquela que prendeu o assassino de Tim Lopes sem disparar um tiro. Melhor seria a repressão à lavagem desse dinheiro sujo, pressuposto vital para a lucratividade e continuidade do negócio. Melhor seria o controle das fronteiras por onde hoje passa tamanha quantidade de armas e drogas que se constitui na mais acintosa e insolente afronta à honradez da nossa soberania. É lá nas fronteiras brasileiras que se combate o tráfico no atacado e se prendem os tubarões que organizam, financiam e distribuem em grandes quantidades armas, munições e drogas. Nas comunidades está apenas o varejo, apenas o peixe pequeno.

E que não se diga que a Polícia Federal não possui efetivo para dar conta dessa missão, porque por essa razão aprovei lei já sancionada pelo Presidente da República, portanto em pleno vigor, que confere poder de polícia às Forças Armadas nas fronteiras terrestre, aérea e marítima para o combate às drogas e armas.

No clima de guerra em que vivemos no Rio é preciso alertar que os espíritos violentos costumam cair na mesma intransigência dos fanáticos que se norteiam cegos e determinados pelos esquemas ditados pela própria arrogância e se tornam energúmenos completamente blindados aos apelos da razão.

Criminalidade se combate sempre com inteligência; às vezes, com a força bruta; mas nunca com chacais que uivam famintos de ódio e sedentos de sangue, como aqueles que, a soldo de terceiros, recebem autorização para uma saída do presídio para cometer crimes bárbaros acobertados pelo álibi, com a presunção da impunidade.

Paulo Roberto, me disseram seus pais, andava muito feliz. Tinha adquirido uma autonomia de táxi para não ter mais que pagar diárias na sua cooperativa, onde exercia o cargo de Diretor de Ética, respeitado e estimado por todos. Deixou com sua mãe uma frase lapidar, de rara sabedoria, que sintetiza sua visão de mundo e nos deixa uma lição inesquecível: “Quem fala mal do sacrifício fala mal de Jesus”.

Era assim que ele encontrava forças para lutar e, com renúncia e idealismo, forjar o futuro. Pessoas como ele não morrem. Não se apagam no esquecimento. O rastro de sangue que deixou do Morro da Mangueira até o Hospital do Exército, onde veio a falecer, será para sempre um clamor de justiça daqueles que, no anonimato de uma vida humilde, superando adversidades, injustiças e preconceito, sonharam, sofreram, lutaram e tombaram para construir sem violência um mundo melhor.

Que Deus o tenha e o guarde por nós, que não soubemos guardá-lo.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/06/2009 - Página 22267