Discurso durante a 143ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Manifestação sobre o pronunciamento do Senador Valdir Raupp a respeito da regularização fundiária na Amazônia.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FUNDIARIA. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Manifestação sobre o pronunciamento do Senador Valdir Raupp a respeito da regularização fundiária na Amazônia.
Publicação
Publicação no DSF de 28/08/2009 - Página 39713
Assunto
Outros > POLITICA FUNDIARIA. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • DEFESA, NECESSIDADE, AGILIZAÇÃO, REGULARIZAÇÃO, ORGANIZAÇÃO FUNDIARIA, REGIÃO AMAZONICA.
  • QUESTIONAMENTO, CONDUTA, GOVERNO FEDERAL, EXCESSO, EDIÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), DEMORA, EXECUÇÃO, LEGISLAÇÃO, TENTATIVA, DESVALORIZAÇÃO, LEGISLATIVO, EXCLUSIVIDADE, APROVAÇÃO, MATERIA, INICIATIVA, EXECUTIVO.
  • DEFESA, NECESSIDADE, AMPLIAÇÃO, DEBATE, GARANTIA, INCENTIVO, DESENVOLVIMENTO REGIONAL.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Senador Jefferson Praia, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, senhores telespectadores da TV Senado, ouvintes da Rádio Senado, há pouco o Senador Valdir Raupp abordou o tema da regularização fundiária na Amazônia, isto é, a regularização da situação daqueles que ocupam terras na Amazônia de 2004 para trás - muitos deles estão lá há várias gerações, estão lá com documentos precários fornecidos pelo Incra ou pelos Estados.

            Como disse no aparte que fiz ao Senador Valdir Raupp e também na época da votação da medida provisória, que encaminhei a favor, embora tenha posição firme, retilínea, de ser contra as medidas provisórias, porque 90% delas ou mais não são urgentes nem relevantes e, o que é pior, quando chegam aqui, Senador Jefferson Praia, estão cheias de emendas que nada têm a ver com o objetivo da medida provisória, são colchas de retalhos, verdadeiras emendas “frankenstein”, que você, às vezes, aprova porque elas estão de tal forma subterraneamente embutidas que não dá sequer tempo de analisarmos, então, por isso tenho votado sistematicamente contra. Mas, nesse caso, como em outros - em caso de emergência, inundações e certos estados de calamidade -, também acho que as medidas provisórias são necessárias. Eu não tenho uma aversão total, não; acho só que o Presidente Lula tem usado em demasia e desnecessariamente as medidas provisórias. Mas nesse caso, ela é plenamente justificável. E no caso do Estado de Roraima, recentemente, depois de mais de duas décadas de lutas, inclusive existindo uma lei de autoria da Senadora Marluce Pinto... À época, quando seu marido era Governador, o ex-Governador Ottomar Pinto, no primeiro governo, portanto na década de 90, foi aprovada uma lei, eu diria, até redundante porque o art. 14 das Disposições Transitórias da Constituição já diz que o Estado de Roraima está compreendido dentro dos limites geográficos do ex-Território. Então, tudo o que está dentro desse limite é do Estado de Roraima, mas o Governo não só vem expandindo as áreas federais, de reservas ecológicas, de reservas indígenas, e o que sobrava, que é uma quantia menor, ainda estava cadastrada em nome do Incra. E depois dessas décadas de reivindicação, repito, inclusive com base na Lei Marluce Pinto - era uma lei da Senadora Marluce Pinto -, o Presidente baixou, finalmente, uma medida provisória devolvendo, não transferindo, mas devolvendo ao Estado de Roraima as terras que sempre lhe foram de direito. Mas, como disse aqui o Senador Valdir Raupp, o problema é que, entre a publicação da medida provisória e a execução, há uma distância enorme. E aí é aquela história: órgãos do Governo trabalham contra as decisões do Governo. No caso específico, a medida provisória que foi, portanto, encaminhada pelo Presidente da República tem órgãos como o Incra e outros que colocam toda uma série de dificuldades para que, portanto, a lei - já que foi transformada em lei - seja, de fato, transformada em realidade, em benefício daquela população.

            Tenho sempre dito aqui que, infelizmente, a Amazônia é tratada pelo Governo Federal como o quintal do País. Só se olha para a Amazônia para dizer o que não se pode fazer lá, mas não se olha, por exemplo, para os 25 milhões de habitantes que temos na região - homens, mulheres, crianças, brancos de olhos azuis, índios, negros - com a preocupação de dar melhor condição de vida a essas pessoas.

            Então, eu fico realmente aqui a constatar que a equação, ou melhor, a constatação é clara: nós somos 25 milhões de habitantes. São Paulo tem 42 milhões. Então, transformando o que interessa para a eleição, nós somos poucos eleitores se comparados a São Paulo. Então, são deixadas para o fim da fila todas as coisas da Amazônia.

            Aí vem para o aspecto econômico, em termos financeiros. Quanto é que a Amazônia representa no PIB nacional? Apenas 8%. Então, se são apenas 8%, não tem preocupação. Deveria ser o inverso, como prevê a nossa Constituição. Deveria haver o investimento maciço na Amazônia, na sua população, para que a desigualdade existente entre aquela região e as demais regiões do País, principalmente a Sul e a Sudeste, pudesse ser se não eliminada, pelo menos aliviada de maneira muito grande, como manda, repito, a Constituição. Mas aí, infelizmente, o Governo não tem planejamento, não tem consequência nos seus designos, é um Governo muito palanqueiro e de pouca realidade.

            Então, eu, inclusive, vou estar, amanhã, Senador Jefferson Praia, no Município de Pacaraima, na fronteira com a Venezuela, onde vai acontecer uma sessão itinerante da nossa Assembléia Legislativa. Esse Município de Pacaraima, que, portanto, está encaixado dentro da Venezuela - de um lado temos Pacaraima e de outro, Santa Elena de Uairén, na Venezuela -, Pacaraima vem sendo, sistematicamente, prejudicada pelo Governo Federal. Duas reservas indígenas já mutilaram o Município: a reserva indígena de São Marcos e agora, recentemente, a reserva indígena Raposa Serra do Sol. Mais do que isso, os investimentos lá ficam prejudicados porque também a Funai e o Ministério Público questionam até mesmo o perímetro urbano da sede do Município. Com isso, o que nós estamos vendo? Nós aprovamos aqui uma área de livre comércio para essa cidade. O Governo, depois, mudou, tirando de Pacaraima para Boa Vista. Ao invés de deixar a de Pacaraima e criar uma em Boa Vista, tirou a de Pacaraima.

            Pois bem. Enquanto isto, do lado venezuelano foi instalada uma zona franca, em Santa Elena de Uairén, e praticamente toda a população do Estado de Roraima vai lá comprar desde o rancho a equipamentos eletroeletrônicos, praticamente tudo. Assim, nós estamos ficando para trás. Quer dizer, um Estado pobre, com um Município pobre, prejudicado por quem? Pelo Governo do País, pelo Governo Lula.

            Nós, então, vamos estar lá amanhã, conversando com a população, vendo e sentindo de perto essa realidade para podermos buscar, realmente, uma solução que signifique o desenvolvimento de uma região estratégica para a defesa e a soberania do País. Basta citar um exemplo: a Venezuela tem combustíveis - a gasolina e o diesel - com preços várias vezes mais baratos do que os praticados do lado do Brasil, no nosso Estado. Com isto, o que acontece na prática? Praticamente todo combustível consumido em Roraima é contrabandeado da Venezuela. As reservas indígenas existentes lá são verdadeiros depósitos de combustível contrabandeado, que, depois, passam para os carros. Inclusive, há denúncias de que os próprios postos de gasolina compram esse combustível para misturarem ao combustível nacional e, portanto, lucrarem mais.

            Então, é preciso - e aqui estou falando para um Presidente que também é lá da Amazônia, lá do nosso Amazonas - que realmente tenhamos um debate muito forte na Subcomissão da Amazônia, para não ficarmos nessa história de só termos que implorar - pedir, pedir e pedir ao Governo Federal - e não termos uma ação forte, porque, na verdade, o que o Governo quer é tornar o Poder Legislativo inoperante, incapaz de tomar iniciativas, pois a matéria só é aprovada se for de iniciativa do Governo, embora haja projetos iguais.

            Vou até citar um exemplo. Eu tenho um projeto para fortalecer a aviação regional no País, mas que vai beneficiar sobretudo a Amazônia. Foi aprovado no Senado há vários anos e está na Câmara. Agora o Governo diz que vai fazer por iniciativa dele. Quer dizer, iniciativa parlamentar não presta. Mas eu não desisto disso, não, porque acredito na atividade parlamentar, inclusive porque o meu Estado de Roraima hoje é Estado por uma decisão parlamentar, da Assembléia Nacional Constituinte.

            Se lá temos uma universidade, uma escola técnica - aliás, hoje não é mais nem escola técnica, mas um instituto federal de ensino tecnológico -, é por iniciativa parlamentar. Quase tudo que tem em Roraima realmente partiu da iniciativa parlamentar, porque, se fosse esperar pela iniciativa do Presidente da República, não existiria nada em Roraima, a não ser demarcação de reservas ecológicas, de reservas indígenas, proibições e proibições.

            Então, quero fazer este registro e dizer que amanhã vou estar em Pacaraima e que, ao voltar, espero que possamos tomar algumas medidas, como, inclusive, uma sugestão boa do Senador Valdir Raupp, convidar o Presidente do Incra e o Ministro do Desenvolvimento Agrário, para que possamos sair dessa hipocrisia de aprovar uma lei e não poder implementá-la. Vi, inclusive, uma portaria - acho que dei uma cópia para V. Exª - do Ministério do Desenvolvimento Agrário regulamentando a questão da vida dos ribeirinhos. Por que não se debate isso com o Congresso? É a portaria de um grupo de tecnocratas que acham que são colegas de Deus, que sabem mais da Amazônia do que nós que somos da Amazônia.

            Quero deixar este registro aqui e dizer que amanhã estarei no Município de Pacaraima e que espero trazer um diagnóstico mais amadurecido, junto com a Assembléia Legislativa do Estado, para defendermos, de maneira muito forte, o nosso Estado e a Amazônia como um todo.

            Muito obrigado.

 

            


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/08/2009 - Página 39713