Discurso durante a 186ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a necessidade de o Brasil investir em ciência e tecnologia.

Autor
Flávio Torres (PDT - Partido Democrático Trabalhista/CE)
Nome completo: Flávio Torres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA. POLITICA AGRICOLA.:
  • Considerações sobre a necessidade de o Brasil investir em ciência e tecnologia.
Aparteantes
Cristovam Buarque, Marco Maciel.
Publicação
Publicação no DSF de 22/10/2009 - Página 53924
Assunto
Outros > POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA. POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • IMPORTANCIA, DESENVOLVIMENTO CIENTIFICO, NECESSIDADE, INVESTIMENTO, SETOR.
  • COMENTARIO, SITUAÇÃO, BRASIL, INSUFICIENCIA, INVESTIMENTO, SETOR, CIENCIA E TECNOLOGIA, ESPECIFICAÇÃO, FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO CIENTIFICO E TECNOLOGICO (FNDCT), PROVOCAÇÃO, PROBLEMA, AGROPECUARIA, EXCESSO, CRIANÇA, TRABALHO, CAMPO, SUPERIORIDADE, NUMERO, PROPRIEDADE RURAL, UTILIZAÇÃO, AGROTOXICO, LAVOURA.
  • REGISTRO, DADOS, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), LOCALIZAÇÃO, CAMPUS UNIVERSITARIO, UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARA (UFC), MUNICIPIO, FORTALEZA (CE), DEMONSTRAÇÃO, SITUAÇÃO, FUTURO, REDUÇÃO, AREA, DESTINAÇÃO, AGROPECUARIA, EMPENHO, REALIZAÇÃO, PESQUISA, CONHECIMENTO, TECNOLOGIA, INOVAÇÃO, GARANTIA, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, ATIVIDADE, PRODUÇÃO, REGIÃO NORDESTE, BRASIL.
  • IMPORTANCIA, TRABALHO, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), IMPLANTAÇÃO, TECNOLOGIA, POSTERIORIDADE, COLHEITA, CAJU, INCENTIVO, COMERCIO, PRODUTO, ESTADOS, BRASIL, EXPECTATIVA, EXPORTAÇÃO.
  • DEFESA, NECESSIDADE, SELEÇÃO, ADAPTAÇÃO, RECURSOS NATURAIS, PLANTAS MEDICINAIS, IMPEDIMENTO, EXTINÇÃO, ESPECIE, EMPOBRECIMENTO, POPULAÇÃO CARENTE.
  • MANIFESTAÇÃO, DISPOSIÇÃO, ARTICULAÇÃO, EMENDA, BANCADA, OBTENÇÃO, RECURSOS, IMPLEMENTAÇÃO, PROJETO, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA).

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. FLÁVIO TORRES (PDT - CE. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a verdadeira divisão que existe hoje no mundo não é mais entre capitalistas e comunistas, entre norte e sul ou entre países desenvolvidos e países subdesenvolvidos, mas entre quem detém e quem não detém o conhecimento científico. É essa distinção que acaba por determinar a clivagem entre pobres e ricos. Se há uma coisa que aprendi ao longo de minha vida, foi a importância do conhecimento científico. Para que um país tenha condições de desenvolvê-lo, é evidente, torna-se necessário investir nessa área.

            O Brasil, felizmente, vem revertendo um quadro histórico de baixos investimentos em ciência e tecnologia. Caso acompanhemos a evolução da execução financeira do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, criado em 1969, constataremos que, após crescimento até 1978, o volume de recursos reduziu-se de forma significativa, atingindo um pico negativo em 1991 e permanecendo estagnado até 2001. Só a partir daí voltou a crescer. Nos anos seguintes, em particular na gestão do atual Ministro da Ciência e Tecnologia, Prof. Sérgio Rezende, a verba global do Fundo teve evolução positiva ano a ano. Em 2007, chegou a R$1,7 bilhão, saltou a R$2,5 bilhão no ano passado e as projeções indicam que esse crescimento prosseguirá no futuro imediato. Espera-se que, assim, recuperaremos o tempo perdido e imediato. Espera-se que, assim, recuperemos o tempo perdido e superemos o pouco caso com que se tratou o setor durante tanto tempo.

            Na agropecuária, essa desatenção provoca, até hoje, distorções da maior gravidade. Um milhão de crianças trabalham nos campos brasileiros, enquanto 80% dos proprietários rurais ainda usam agrotóxicos em suas plantações. São apenas alguns elementos que tornam nossa produção rural socialmente injusta e antiecológica. A isso se soma o desafio de aumentar a produtividade. Teremos, em 2050, proporcionalmente à população, apenas 40% da área disponível para a agropecuária com que contávamos em 1950.

            Esses dados me foram apresentados, há duas semanas, durante visita à Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa, que se situa dentro do campus universitário da Universidade Federal do Ceará, em Fortaleza.

         A Embrapa Agroindústria Tropical volta-se para a única região do mundo de clima semiárido tropical que reúne todas as condições para a agroindústria e a fruticultura. Afinal, o Estado do Ceará possui 2,8 mil horas de sol ao ano, infraestrutura portuária, energia elétrica, telecomunicação digital e aeroporto internacional. A partir daí, a Embrapa Agroindústria Tropical vem fazendo o possível para viabilizar, por meio de pesquisa, desenvolvimento e inovação, soluções para a sustentabilidade de cadeias produtivas da agroindústria tropical em benefício da sociedade nordestina e brasileira. Constitui, assim, referência em pesquisa, conhecimento, tecnologia e inovação para o desenvolvimento sustentável de cadeias produtivas de interesse da agroindústria tropical.

            A unidade teve sua origem no Centro Nacional de Pesquisa de Caju, instituído em 1987 para atender as demandas do agronegócio caju. Entretanto, percebendo sinais e aspirações da sociedade, promoveu, mediante planejamento estratégico realizado entre 1991 e 1993, a ampliação da sua missão para atuar com produtos e processos demandados pela agroindústria tropical. A partir daí, passou de Centro de Produto para Centro Temático, com a denominação de Centro Nacional de Pesquisa de Agroindústria Tropical e assinatura-síntese Embrapa Agroindústria Tropical.

            Tive a oportunidade de conhecer os laboratórios de Cultura de Tecidos, Pós-colheita, Química de Produtos Naturais e o Horto de Plantas Medicinais e Aromáticas. Atraíram-me a atenção, em especial, dois inovadores projetos, atualmente em desenvolvimento para unidade do Ceará: a Biorrefinaria e a Química de Produtos Naturais.

            Dou aqui um exemplo do trabalho que lá se faz e dos seus efeitos altamente positivos do ponto de vista da ciência, da economia e da geração de renda. A tecnologia de pós-colheita do caju, envolvendo novas formas de tratamento do produto, de sua assepsia, preparo, embalagem e transporte possibilitou incremento importantíssimo na vida de prateleira do caju, evoluindo de dois dias para mais de vinte dias. Isso possibilitou a colocação do produto, que é cultivado fortemente no Nordeste, em especial no Ceará, Piauí e Rio Grande do Norte, em praças distantes como São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Belo Horizonte. Pode-se pensar na sua comercialização no exterior.

            A verdade é que no Brasil, principalmente nas regiões Norte e Nordeste, a falta de domesticação dos recursos naturais, como plantas medicinais, aromáticas ou condimentares, para não falar nas alimentares, tem levado a subutilização e extinção de inúmeras espécies vegetais, favorecendo cada vez mais o empobrecimento da população mais carente. Por isso mesmo, os trabalhos em curso, assim como os projetos delineados, procuram combater os fatores que impedem o avanço do agronegócio e a descoberta de novos princípios ativos com valorização da biodiversidade, em especial a falta de estudos em química de produtos naturais. A implantação do laboratório de referência voltado para esta linha de pesquisa devidamente equipado irá contribuir para o atendimento dessas demandas.

            Em seu conjunto, buscam-se pesquisas inovadoras, como as voltadas para os cactos, tão desprezados e esquecidos, tratados antes como pragas ou peças de paisagismo do que como espécies com potencial econômico.

            A Embrapa Agroindústria Tropical desenvolve hoje rotas tecnológicas que permitem a obtenção de produtos de alto valor agregado a partir das cactáceas. Entre eles estão: nanocristais de celulose, bioadesivos, filmes de biopolímeros, pectina industrial, mulsificantes, sucos e bebidas carbonatadas, etanol e biogás, entre outros.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, existe, infelizmente, uma tentação para minimizar os efeitos dos investimentos em pesquisa e tecnologia, como se tivessem baixa rentabilidade. É justamente o contrário. A Embrapa é uma instituição nacional que pode calcular que cada real investido proporcionou R$13,55 para a sociedade brasileira.

            Cito apenas um exemplo, entre centenas possíveis. O centro de Fortaleza investiu no conhecimento e pesquisa do cajueiro anão precoce. Seus clones, desenvolvidos pela pesquisa, apresentam hoje uniformidade e padrão, elevada produtividade e porte que facilita os tratos culturais, inclusive da colheita. Os dados da safra no Estado do Ceará, no ano de 2008, registrados pelo IBGE, mostram que o cajueiro anão precoce, ocupando apenas 11% da área plantada, respondeu por mais de 19% da produção. Isso demonstra que a produtividade do cajueiro anão precoce é o dobro do cajueiro comum, proporcionando enormes ganhos para o conjunto da sociedade.

            Pretendo auxiliar a Embrapa na articulação de emenda de bancada que contemple os recursos necessários à implementação dos seus projetos. Espero que a Bancada cearense, ao discutir as propostas de emendas que deverão ser enviadas ao Congresso Nacional para elaboração do Orçamento de 2010, concorde com essa proposta.

            O Sr. Marco Maciel (DEM - PE) - V. Exª me concede um aparte?

            O SR. FLÁVIO TORRES (PDT - CE) - Pois não, Senador Marco Maciel, com todo prazer.

            O Sr. Marco Maciel (DEM - PE) - O prazer é todo meu, nobre Senador Flávio Torres. Quero começar meu breve aparte dizendo que vi a Embrapa nascer. Eu era Deputado Federal, no início da década de 1970, quando chegou à Câmara dos Deputados e, posteriormente, ao Senado Federal a proposta do Poder Executivo de criação da Embrapa. Isso nos tempos em que era Presidente da República Ernesto Geisel. Desde o início, engajei-me no trabalho para que o projeto fosse aprovado, algo que aconteceu com poucas emendas. Depois de aprovado na Câmara, foi acolhido no Senado. E o fato é que a Embrapa se constituiu em empresa extremamente importante para agregar valor, quer dizer, ciência e tecnologia, inovação à economia brasileira e, sobretudo, à economia do setor primário. Creio que a experiência foi vitoriosa, como V. Exª demonstra com dados no seu discurso, plenamente vitoriosa. Primeiro, porque foram disseminadas essas unidades da Embrapa em todo o País, dependendo da vocação de cada região; em segundo lugar, porque se promoveu a formação de muitos técnicos, cientistas, pesquisadores, que fizeram cursos no País ou no exterior; e depois porque se deu mais nitidez à descoberta de áreas que ofereciam muito boas condições para o cultivo. E não é sem razão que, hoje, a Embrapa é observada no mundo todo como modelo a ser perseguido, a ser adotado. E, como Vice-Presidente da República, e antes disso também como Deputado Federal e Senador, sempre apoiei a Embrapa, inclusive nunca deixei de ir, anualmente, à cerimônia da passagem do seu aniversário, quando se faz sempre um balanço das atividades da empresa. Acredito que muito desse desenvolvimento do agronegócio se deve à Embrapa, não somente à sua atuação no Nordeste, no Norte, no Centro-Oeste, no Sul, no Sudeste. Por isso, quero felicitá-lo pelo fato de trazer à consideração do Plenário do Senado o que ocorreu em seu Estado especificamente e os resultados que vêm apresentando para o desenvolvimento da região nordestina, que é justamente a região de menor nível de desenvolvimento relativo. Portanto, V. Exª traz, a meu ver, à consideração da Casa o reconhecimento do papel da Embrapa, de seus dirigentes, de seus técnicos, de seus cientistas, de seus pesquisadores. Espero que a Embrapa continue a merecer o apoio do Governo, das instituições estaduais e regionais, para que possamos continuar a avançar nesse campo para o qual o Brasil está muito habilitado, que é justamente o campo do agronegócio. Parabéns a V. Exª!

            O SR. FLÁVIO TORRES (PDT - CE) - Muito obrigado, Senador.

            Concluindo, Sr. Presidente, eles estão esperando, para concluir dois projetos que mencionei no meu pronunciamento, R$6 milhões. E vemos as comissões aqui, tratando, por exemplo, sem querer trocar uma coisa pela outra, a compra pelo Brasil de R$27 bilhões de caças a jato para combater não sei exatamente o quê. E há um laboratório que forma dezenas de rapazes, que está dando emprego, que está qualificando e não está conseguindo R$6 milhões para implementar uma pesquisa. É algo que não consigo compreender: como o País deixa uma coisa dessas acontecer.

            Concedo um aparte ao Senador Cristovam Buarque.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Senador Flávio, de fato é injustificado isso, sobretudo quando a gente já teve a experiência, no passado, de que este País soube manter seu patrimônio usando alguns recursos. Oitenta anos atrás, quando veio a crise de 1929, nosso setor cafeeiro produzia sem ter quem comprasse lá fora. Getúlio Vargas decidiu comprar café e queimá-lo, o que parecia absurdo, mas foi a maneira de manter os pés funcionando, em vez de cortá-los; de manter os fazendeiros recebendo seus lucros e de os trabalhadores receberem seus salários. E foi isso que levou o Brasil a se industrializar. E, quando houve a recuperação do comércio internacional, o Brasil tinha os pés de café prontos para voltar a exportar. Temos, hoje, dezenas de milhares de profissionais formados, a um custo altíssimo, e desviados da profissão, ou sem profissão, parados, desempregados. Cientistas desempregados o Brasil tem. Cientistas mudando de rumo e de ramo, porque, hoje, algumas categorias do setor público pagam muito mais do que recebe um cientista. Creio que o Brasil faria algo absolutamente compatível com as necessidades do futuro empregando esse pessoal e colocando-o para trabalhar. O que o senhor fala é um dos exemplos do que é possível fazer no Brasil: não jogar fora os bilhões de dólares investidos na formação de pessoal, porque um cientista que fica cinco anos desempregado ou cinco anos fora do seu ramo já não é mais cientista da sua área. Então, o que o senhor traz é uma saída para que o Brasil não queime os cérebros que foram formados a um custo muito alto. E, além disso, use esses cérebros para trazer resultados positivos para o País.

            O SR. FLÁVIO TORRES (PDT - CE) - Muito obrigado, Senador Cristovam.

            Sr. Presidente, era isso o que tinha a dizer.

            Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/10/2009 - Página 53924