Discurso durante a 199ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Advertência à diplomacia brasileira, para que o pólo industrial de Manaus não seja prejudicado com a entrada da Venezuela no Mercosul.

Autor
Jefferson Praia (PDT - Partido Democrático Trabalhista/AM)
Nome completo: Jefferson Praia Bezerra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA.:
  • Advertência à diplomacia brasileira, para que o pólo industrial de Manaus não seja prejudicado com a entrada da Venezuela no Mercosul.
Aparteantes
Mozarildo Cavalcanti, Romero Jucá.
Publicação
Publicação no DSF de 30/10/2009 - Página 55953
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • ANALISE, DEBATE, SENADO, INGRESSO, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), EXPECTATIVA, MELHORIA, DEMOCRACIA, GOVERNO ESTRANGEIRO.
  • ADVERTENCIA, GOVERNO FEDERAL, RISCOS, INTERESSE NACIONAL, ADMISSÃO, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), DEFESA, MANUTENÇÃO, ANTERIORIDADE, ACORDO, COMERCIO, ZONA FRANCA, MUNICIPIO, MANAUS (AM), ESTADO DO AMAZONAS (AM), SOLICITAÇÃO, ATENÇÃO, ITAMARATI (MRE), GARANTIA, BRASIL, BENEFICIO, EXPORTAÇÃO, REGIÃO.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. JEFFERSON PRAIA (PDT - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, hoje, dia 29 de outubro, esta Casa deu mais um passo importante no sentido de referendar, no tocante ao Brasil, a adesão da República Bolivariana da Venezuela ao Mercosul.

            A esta altura, Sr. Presidente, parece-me de pouca ou nenhuma consequência prática reiterar objeções. Resta orarmos para que tenham razão aqueles que defendem a recepção da Venezuela pela comunidade mercosulina com o argumento de que o convívio com as democracias do bloco servirá para arejar o clima político-ideológico do regime chavista e resgatar a posição do perigoso isolamento atual.

            Não me parece fora de propósito formular uma prece adicional na esperança de que, integrado a um pacto de nações amantes da paz, o Governo Chávez reduza seus bilionários gastos com a importação de armamentos sofisticados e arquive suas recentes aberturas ao regime xiita iraniano e ao estabelecimento militar russo, de modo a exorcizar o risco de ‘importar’, para o nosso continente, conflitos e rivalidades estratégicas das distantes regiões do globo. (Ainda assim, por maior que seja a nossa fé, creio que a medida preventiva mais eficaz consistiria na adoção de uma sistemática transparente de verificação mútua e regular dos arsenais de todos os membros do Mercosul.)

            Portanto, Sr. Presidente, quero ressaltar que não é só disso que quero falar. O meu tema é, sim, o interesse do Brasil e, especialmente, do meu grande Estado do Amazonas, que tenho a honra de representar nesta Câmara Alta.

            Tenho bem presente o inciso VIII do art. 84 da Constituição Federal, que inclui, entre as atribuições do Presidente da República, a celebração de tratados, convenções e atos internacionais, estando esses sujeitos, é claro, a referendo do Congresso Nacional.

            Por essa razão, lanço, desde já, um apelo ao Palácio do Planalto e ao Itamaraty para que tudo façam a fim de garantir a manutenção dos benefícios conquistados pela Zona Franca de Manaus desde 2004 no marco do Acordo de Complementaridade Econômica (ACE-59) com a Venezuela, que impede toda e qualquer discriminação contra os produtos oriundos do nosso polo industrial, do Polo Industrial de Manaus.

            Lembro que esse acordo foi celebrado entre o Mercosul e a Comunidade Andina de Nações ao tempo em que a Venezuela ainda participava dessa comunidade. Graças a ele, Sr. Presidente, as exportações do Amazonas à Venezuela deram um salto de 525% em apenas cinco anos, crescendo de 28 milhões de dólares, em 2003, para 181 milhões de dólares, em 2008, o que hoje coloca a Venezuela no segundo lugar do ranking dos principais destinos das exportações do Polo Industrial de Manaus, com destaque para produtos como extrato de bebidas não alcoólicas, telefones celulares e televisores.

            Foi necessário assinar o ACE-59, pois o Mercosul entende as Zonas Francas como “terceiro país” no comércio do bloco. Embora o Mercosul tenha esse entendimento, é permitido que se celebrem acordos bilaterais. Tanto é assim que, há 15 anos, a Argentina e o Brasil firmaram acordo para isenção de tributos referentes à importação dos produtos oriundos da área aduaneira da Terra do Fogo e da Zona Franca de Manaus.

            Faz-se, por conseguinte, imperativo que os negociadores diplomáticos brasileiros estejam atentos contra qualquer descuido que coloque em perigo, Sr. Presidente, o futuro deste grande patrimônio econômico, social e também ambiental representado pelo Polo Industrial de Manaus.

            Este é, Sr. Presidente, o apelo que faço, portanto, para ficarmos...

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PTB - RR) - Senador Jefferson Praia...

            O SR. JEFFERSON PRAIA (PDT - AM) - Pois não, Senador Mozarildo. É com muito prazer que ouço V. Exª.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PTB - RR) - Fico muito feliz de ouvir as ponderações de V. Exª no que tange ao Polo Industrial de Manaus porque, em todos os debates, mas hoje especialmente, no debate da votação, ouvi vários Senadores da Comissão ressaltarem o superávit da balança comercial entre Brasil e Venezuela, que é basicamente por conta do comércio de São Paulo e de Minas Gerais com aquele País. Embora V. Exª tenha dito que o destino dos produtos da Zona Franca de Manaus, do Polo Industrial, tenha como segundo maior destino a Venezuela, isso ainda é muito pouco comparado com a potencialidade que tem o Polo Industrial de Manaus. Então, disse que vou cobrar, e espero que nos unamos nisso, que, uma vez ingressando no Mercosul, a Venezuela de fato tenha um olhar mais atento para os Estados vizinhos, como é o caso do Estado de Roraima e do Estado de V. Exª, o Amazonas, porque senão vamos continuar aprofundando as desigualdades regionais. Fora o fato - e V. Exª frisou muito bem o que foi um dos grandes argumentos usados por todos; aliás, foi quase uma unanimidade, mesmo entre aqueles fervorosos defensores - de que a democracia na Venezuela não está boa. Se é que existe democracia boa e ruim. Para mim, ou é democracia ou não é. Todo mundo, digamos assim, fez ressalvas à conduta do Presidente Chávez e também usou o argumento de V. Exª, de que não é adequado isolá-la, como foi feito com Cuba. Eu votei a favor, Senador Jefferson Praia, e apresentei um voto em separado que não chegou a ser apreciado porque foi vencedor o que me antecedia. Tive que votar, portanto, com esse voto em separado, com ressalva. Isto é, votei a favor, mas com ressalvas, porque realmente não poderia, como Senador de Roraima, um Estado encravado na Venezuela, votar contra. Só acho - e repito - que, em tempo, deveria ter entrado desde o início. Se não entrou, agora o momento não é muito adequado. Não é e continua não sendo. Mas não votei contra; votei a favor e estou com o mapa de votação aqui na mão. Mas quero dizer que esse ingresso merece, sim, ser observado com cautela para não abrir precedentes para que outros países, em situação semelhante, queiram entrar também no Mercosul. Acho que a integração, aliás, idealizada pelo Presidente José Sarney, quando era Presidente da República, é perfeita. Temos que integrar toda a América do Sul mesmo e, se possível, a América Central também, mas não a qualquer preço, não de maneira açodada. E o que percebi hoje, coincidentemente, é que tinha que se votar na Comissão de Relações Exteriores, porque o Presidente Lula foi à Venezuela e, hoje à noite, terá um jantar com o Presidente Chávez. Portanto, devem comemorar essa aprovação na Comissão de Relações Exteriores.

            O SR. JEFFERSON PRAIA (PDT - AM) - Muito obrigado, Senador Mozarildo.

            Estamos com um tema muito delicado e, é claro, todos estamos refletindo. V. Exª já deu seu voto na Comissão de Relações Exteriores. Terei a oportunidade de dar meu voto favorável ou não e até de me abster quando este tema, esta questão chegar ao plenário. É um tema complicadíssimo porque existem pontos favoráveis, pontos positivos e negativos. Todos nós, que conhecemos um pouco a história, não queremos, em nenhum momento, cometer erros para que, lá na frente, possamos nos arrepender. Principalmente eu, que cheguei a esta Casa há um ano e pouco, sucedendo um grande Senador. Nunca pensei em ser Senador, não sei se um dia serei Senador após este mandato, mas não quero ter, nunca na minha vida, um peso na minha consciência de ter feito algo errado dentro desse contexto, por exemplo, da Venezuela. Por tudo o que se vê lá, mais à frente, pode-se perceber Hugo Chávez querendo fazer - e usarei um termo muito simples e até chulo - maluquices na América do Sul.

            Percebemos os pontos positivos e os pontos negativos. Estou muito concentrado também na particularidade do Estado do Amazonas. Hoje as nossas exportações são boas. Cinco por cento, em cinco anos; aumentamos 525%. Veja bem V. Exª.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PTB - RR) - E são boas sem o Mercosul, só com o acordo bilateral existente.

            O SR. JEFFERSON PRAIA (PDT - AM) - Isso. E com o Mercosul, veja bem, devemos observar o risco. E esse é um ponto sobre o qual tenho de dar uma estudada porque não entendo dessa área de Direito Internacional, mas vou procurar saber um pouco mais. É preciso saber se não há perigo de a Zona Franca de Manaus ser considerada um terceiro país. Não podemos, por exemplo, ter esse entendimento.

            Em conversas muito rápidas que tive sobre este assunto, alguém chegou a me falar que prevaleceria o acordo que já temos atualmente e também um acordo bilateral. Caso fosse esse o encaminhamento, não seria difícil ser feito.

            Senador Romero Jucá, com muito prazer, ouço V. Exª.

            O Sr. Romero Jucá (PMDB - RR) - Senador Jefferson Praia, é apenas para registrar a importância do que foi aprovado hoje, dizer que, no processo de negociação, todas as salvaguardas estão sendo feitas. E mais: o procedimento que estamos negociando com a Venezuela, a relação que se está estreitando com a Venezuela será extremamente importante para os Estados de Roraima e Amazonas. Hoje a Venezuela compra fora mais de 70% do que consome e tem uma balança comercial bastante positiva com o Brasil. O Brasil vende e tem um superávit de mais de 4,5 bilhões, duas vezes e meia o superávit que temos com os Estados Unidos, para ver a importância relativa no que diz respeito ao saldo comercial, e compra R$7 bilhões à Colômbia. O Presidente Chávez quer substituir essas aquisições da Colômbia para outros países da América do Sul, por conta de relações de divergência política. O País e a região com mais condições para substituir esse fornecimento de alimentos, de produtos industrializados, são os Estados de Roraima e o Amazonas, exatamente por sermos vizinhos da Venezuela e estarmos reconstruindo inclusive a BR-174 com investimento este ano de mais de R$300 milhões, feitos pelo Presidente Lula. Então, comungo da preocupação de V. Exª, mas quero registrar que essa preocupação, apesar de ser pertinente, dentro do arcabouço que se está construindo, será algo extremamente positivo na relação. E quero registrar para a Casa, aproveito o momento, a aprovação de hoje, que foi importante; o Mercosul, idealizado pelo Presidente José Sarney, se consolida com a Venezuela. Quer dizer, é importante integrar toda a América do Sul. O Mercosul, que até então era o Brasil com o Cone Sul, ao trazer a Venezuela, de certa forma, espraia pela América do Sul, trazendo o terceiro país em termos de PIB. A Venezuela tem um mercado consumidor de 25 milhões de habitantes, com uma renda per capita maior do que a brasileira. São dados importantes. É claro que são necessários ajustes. Mas volto a dizer, na questão da democracia, o que disse no debate: a forma de se ampliar a democracia, os direitos humanos é agregar países, é criar transparência, é inserir em procedimentos internacionais, e não excluir. Se exclusão, se cerceamento, se isolamento resolvessem o problema da democracia, o muro de Berlim não havia caído. A Alemanha Oriental seria um grande país democrático, e não foi.

            O SR. JEFFERSON PRAIA (PDT - AM) - Cuba já teria mudado há 50 anos!

            O Sr. Romero Jucá (PMDB - RR) - Então, nós temos que, na verdade, inserir a Venezuela. E o Mercosul não é feito de países iguais; pelo contrário, é feito de países diferentes. O que temos de procurar é a convergência desses países em vários aspectos, e um deles é a democracia. Então, vamos trabalhar para fortalecer a democracia e os direitos humanos dentro da Venezuela também, por meio dos mecanismos do Mercosul.

            O SR. JEFFERSON PRAIA (PDT - AM) - Muito obrigado, Senador, pelos esclarecimentos que V. Exª faz.

            Acredito que talvez este seja o maior argumento: a questão relacionada à nossa aproximação. Não queremos fazer qualquer tipo de ingerência à Venezuela, como não faremos com nenhum outro País. Todos os países têm o direito de resolver os seus problemas, mas acredito que a aproximação será importante.

            Na nossa forma de atuar politicamente, nós fazemos até isso. Não sei se V. Exªs concordam. Quando há alguém divergindo, nós nos aproximamos para conversar e ver como nós avançamos no contexto do entendimento. A meu ver, esse pensamento talvez conduza a entrada da Venezuela no Mercosul.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.

            O SR. ROMERO JUCÁ (PMDB - RR) - Sr. Presidente, eu gostaria de votar as matérias da Ordem do Dia.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/10/2009 - Página 55953