Discurso durante a 183ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a guerra cambial e suas consequências para o comércio internacional, particularmente para os países em desenvolvimento como o Brasil, com destaque para reunião do G-20, realizada em Seul, na última semana.

Autor
Roberto Cavalcanti (PRB - REPUBLICANOS/PB)
Nome completo: Roberto Cavalcanti Ribeiro
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • Considerações sobre a guerra cambial e suas consequências para o comércio internacional, particularmente para os países em desenvolvimento como o Brasil, com destaque para reunião do G-20, realizada em Seul, na última semana.
Publicação
Publicação no DSF de 17/11/2010 - Página 50611
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • COMENTARIO, ENTREVISTA, CANDIDATO ELEITO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, ANALISE, ECONOMIA INTERNACIONAL, CONFLITO, POLITICA CAMBIAL, NECESSIDADE, ATUAÇÃO, GOVERNO BRASILEIRO, PROTEÇÃO, PRODUTO NACIONAL, COMERCIO EXTERIOR.
  • QUESTIONAMENTO, SUPERIORIDADE, VALORIZAÇÃO, REAL, COMPARAÇÃO, POLITICA CAMBIAL, PAIS ESTRANGEIRO, CHINA, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), EFEITO, DESEQUILIBRIO, PREÇO, MERCADO INTERNACIONAL, INJUSTIÇA, SITUAÇÃO, REGISTRO, OCORRENCIA, REUNIÃO, CHEFE DE ESTADO, COMPROMISSO, PRAZO, AVALIAÇÃO.
  • PREVISÃO, ALTERAÇÃO, LONGO PRAZO, PADRÃO, MOEDA, POSSIBILIDADE, SUBSTITUIÇÃO, DOLAR, COMERCIO, EXTERIOR, IMPORTANCIA, RENOVAÇÃO, SISTEMA FINANCEIRO INTERNACIONAL, DEFESA, APOIO, GOVERNO FEDERAL, PROCESSO, NEGOCIAÇÃO.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. ROBERTO CAVALCANTI (Bloco/PRB - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Exmº Sr. Presidente José Sarney, é com imensa satisfação que faço este pronunciamento, nesta sessão, sob a Presidência de V. Exª. V. Exª, aí, com todo o vigor, com liderança, tomando decisões administrativas, que bacana! Sinto-me extremamente gratificado de estar, na presença de V. Exª, fazendo este pronunciamento.

            Srªs e Srs. Senadores, retomo, hoje, tema sobre o qual me pronunciei recentemente, no dia 14 de outubro, entre o primeiro e o segundo turno das eleições deste ano, portanto. E o faço porque o assunto abordado naquela oportunidade - a excessiva apreciação da moeda nacional, o Real - é hoje mais relevante do que nunca. E, ao que parece, não estou só na defesa dessa opinião, mas em boa companhia.

            De fato, em uma de suas primeiras entrevistas, concedida poucos dias após a votação do segundo turno, a Presidente eleita, Dilma Rousseff, abordou o assunto em termos extremamente contundentes, na edição do Jornal Nacional, da TV Globo, levada ao ar no último dia 1º.

            Disse ela que há sinais evidentes de que o mundo vive hoje uma guerra cambial; em suas palavras, uma verdadeira guerra mundial, uma guerra de todos contra todos, em defesa dos mercados nacionais.

            Disse mais ainda: que o Brasil precisará atuar fortemente no relacionamento multilateral para impedir a multiplicação das práticas nocivas à competitividade comercial dos produtos nacionais, a exemplo do dumping e das políticas de desvalorização monetária atualmente adotadas por diversas das nações mais ricas do planeta, em suma, para evitar que a guerra cambial se transforme numa guerra comercial, com efeitos desastrosos para o Brasil.

            Não se trata, é evidente, de um diagnóstico ingênuo. Vemos, efetivamente, vários comportamentos inadequados no âmbito do comércio internacional.

            Posso citar, como exemplo evidente, a política cambial praticada pela China, que, artificial e continuadamente, mantém desvalorizada a sua moeda, o yuan, de modo a introduzir fortes e benéficos efeitos na competitividade de suas exportações.

            Com isso - e tendo em vista, ainda, o imenso poder da economia chinesa no conjunto do comércio internacional -, perdem competitividade todas as demais economias do Planeta, sem exceção. Mas esse quadro, nos últimos dias, vem tendendo sistematicamente para pior.

            Os Estados Unidos, até então os grandes opositores internacionais da política chinesa, parecem ter-se bandeado para o outro lado, e também promovem - por meio de uma verdadeira inundação monetária, que mobilizou cerca de US$600 bilhões, a serem injetados paulatina e diretamente na base monetária norte-americana - algo na mesma direção.

            O Governo do Presidente Obama proporcionou, de fato, naquele país, a sua própria versão do dumping cambial, visando restabelecer o dinamismo de sua economia e o precário estado de suas contas externas.

            Com isso - é óbvio! -, vem se tornando praticamente impossível deter a queda da cotação do dólar em relação a todas as demais moedas que contam na cena internacional, inclusive a nossa própria moeda.

            O efeito imediato desse estado de coisas se traduz, em um primeiro olhar, nas graves distorções dos preços relativos que começam a ser observados nas transações de comércio exterior.

            Traduz, também - o que é ainda pior -, uma grave ameaça às bem-sucedidas estratégias com que os principais países em desenvolvimento vinham combatendo, em seu próprio quintal, os efeitos da crise financeira mundial.

            Todos, rigorosamente todos, querem empurrar o lixo para debaixo do tapete alheio, sendo que - no caso dos que, como nós, nem tapete têm - é impossível tomar com naturalidade a imensa injustiça contida em todo esse lamentável quadro.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é absolutamente injusto que sejamos precisamente nós o conjunto dos países em desenvolvimento que venha a pagar pela farra do consumo inconseqüente, estimulada nos Estados Unidos por décadas.

            Que sejamos nós, os mais pobres, os que venhamos a ser responsabilizados pela verdadeira “corrente” financeira produzida - de forma vazia e sem fundamentos econômicos razoáveis - pelas nações mais ricas.

            Pela montanha de papéis sem valor que, ao se quebrar, levou consigo, em primeiro lugar, parte substantiva do sistema financeiro norte-americano, pego em flagrante de desregulamentação irresponsável e criminosa; e, depois, porção significativa dos principais investidores da Europa e do Extremo Oriente.

            Isso não é justo - é claro! -, mas é o que infelizmente ocorrerá se não pudermos nós, os mais pobres, inverter o jogo perverso, desprezível e covarde que contra nós se arma neste preciso instante!

            O primeiro round dessa peleja aconteceu na semana passada por ocasião do encontro do G-20, em Seul, reunião chamada justamente para debater aquilo que a Presidente eleita, Dilma Rousseff, com muita propriedade, vem chamando, como já disse, de guerra mundial cambial, e os resultados foram pífios.

            Presentes à reunião o Presidente Lula, o Ministro da Fazenda, Guido Mantega, e a própria Presidente eleita, Dilma Rousseff, certamente sabem que todo o cuidado neste momento é pouco.

            Não podemos prever, em detalhes, tudo o que poderá ocorrer deste ponto em diante. O certo é que muitos fundamentos que a quase 70 anos vêm estruturando as finanças internacionais, consubstanciados no célebre acordo de Bretton Woods, firmado ainda no decurso da II Grande Guerra, em 1944, estão provavelmente com seus dias contados.

            A atual preponderância do dólar no comércio multilateral, por exemplo, já bastante desgastados por diversos mecanismos alternativos criados pelas nações ao longo dos anos, parece estar inevitavelmente comprometida.

            Como é do conhecimento geral, vários acordos internacionais, bilaterais ou multilaterais, a exemplo do que ocorre no âmbito do Mercosul, admitem o uso de moeda própria nas relações comerciais externas.

            É importante, portanto, incentivar mecanismos como esses, até porque, infelizmente, a parcela das transações entre Brasil e Argentina bancadas com moeda local é, até o momento, ainda muito pouco relevante; e com o BRIC apenas ensaia titubeantes primeiros passos.

            Pode não ser para agora, mas as tendências para o futuro próximo certamente incluem um pouco do padrão internacional de moeda para o comércio internacional. E as novas características de um profundamente renovado sistema financeiro internacional já terão sido encaminhadas a essa altura.

            Enquanto isso, é vital estimular e aprofundar esse debate enquanto vivemos as incertezas do momento e os riscos que ameaçam, hoje, a competitividade e os mercados de trabalho dos países emergentes.

            Encerro afirmando, Sr. Presidente, que devemos dar, neste momento, todo o apoio que o Governo Federal precisar para atravessar as delicadas, complexas e arriscadas negociações que se avizinham.

            Embora efetivamente não seja justo que venha o Brasil a pagar a conta do ajuste internacional - afinal, nosso País produziu, por vezes a grande custo, todos os ajustes necessários para garantir sua credibilidade e solvência -, teremos de demonstrar, precisamente agora, o consenso, a convergência e a união que logramos alcançar em torno dos temas críticos para os interesses da Nação.

            A cúpula de Seul termina com um pequeno avanço, já que, além de concordar em discordar e de jogar uma decisão final sobre a “guerra cambial” mais para a frente, os protagonistas Estados Unidos e China e demais participantes do G20 também fecharam um acordo que é melhor do que nada.

            Por ele, fica acertada a criação de um mecanismo de avaliação sobre até que ponto e como as políticas econômicas de cada país do G20 estariam contribuindo para os grandes desequilíbrios cambiais e de conta corrente do mundo. Até o final do ano, está prometida uma primeira rodada de avaliação; melhor do que nada.

            Segundo conceituados analistas, a fragilidade do acordo de Seul não está na ideia em si desse mecanismo, mas sim em que não houvesse nenhuma definição de como ele de fato será.

            Assim, é possível que os maiores interessados em prosseguir suas políticas econômicas nacionais sem interferências externas, entre os quais o principal exemplo é a China, ainda possam “aguar” as “diretrizes indicativas” que medirão até que ponto cada país contribuiu para os desequilíbrios globais.

            Sr. Presidente, essa preocupação não é só nossa. Essa preocupação é mundial. No início do ano passado, numa audiência pública, com a presença do Ministro Guido Mantega, nós alertávamos para o fato que de um lado nos envaidece, que é a valorização da nossa moeda, mas que, por outro lado, nos prejudica, que é a perda da competitividade nacional para com outras moedas que, manipulando suas cotações, fazem com que seus produtos cheguem ao mercado internacional de forma privilegiada.

            Era esse alerta que eu gostaria de fazer a todos. Agradeço a tolerância em relação ao tempo.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/11/2010 - Página 50611