Discurso durante a 191ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comemoração do centenário da Associação Psicanalítica Internacional.

Autor
Roberto Cavalcanti (PRB - REPUBLICANOS/PB)
Nome completo: Roberto Cavalcanti Ribeiro
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Comemoração do centenário da Associação Psicanalítica Internacional.
Publicação
Publicação no DSF de 26/11/2010 - Página 52879
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • CUMPRIMENTO, AUTORIDADE, PRESENÇA, SENADO, HOMENAGEM, CENTENARIO, ASSOCIAÇÃO INTERNACIONAL, PSICANALISE, COMENTARIO, EXPERIENCIA, PAI, ORADOR, ATUAÇÃO, MEDICO, PSIQUIATRIA, RELEVANCIA, ENTIDADE, ACOMPANHAMENTO, FORMAÇÃO, EXERCICIO PROFISSIONAL, PSICANALISTA, OCORRENCIA, EXPANSÃO, BRASIL, AMERICA LATINA.
  • HOMENAGEM, MEDICO, CIENTISTA, FUNDADOR, PSICANALISE, IMPORTANCIA, TEORIA, REVOLUÇÃO, PARADIGMA, SAUDE MENTAL.
  • ELOGIO, MARISA SERRANO, SENADOR, INICIATIVA, REQUERIMENTO, HOMENAGEM.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. ROBERTO CAVALCANTI (Bloco/PRB - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, dileto amigo Mão Santa, que, no momento, está nos honrando com a Presidência desta sessão; primeira signatária da presente sessão, Exmª Srª Senadora Marisa Serrano; Sr. Presidente da Federação Brasileira de Psicanálise, Dr. Leonardo Francischelli; Exmº Presidente do Instituto da Associação Psicanalítica Internacional de 2005 a 2009, Dr. Cláudio Laks Eizirik; Exmª Presidente da Sociedade Psicanalítica de Recife, em Pernambuco, Srª Ivanise Ribeiro Eulálio Cabral, a quem saúdo e em nome de quem cumprimento todas as demais autoridades convidadas e os membros aqui presentes dessa associação - à frente, os senhores vão entender a razão pela qual saudei essa companheira, presidente dessa associação na cidade de Recife, em Pernambuco -; demais membros das associações psicanalíticas; Srªs e Srs. Senadores - o Presidente, eu já o citei -, três razões me trazem a esta tribuna na tarde de hoje.

            Um Senador, normalmente, toma ciência de que vai haver uma sessão especial quando vai apor sua assinatura no livro de inscrições. Isso ocorre no final das tardes ou em qualquer outro momento. Às 18h30, os Senadores se dirigem ao livro de registro de coleta de inscrições, para se habilitarem a falar no dia seguinte ou em qualquer outro momento. A inscrição feita para falar no dia seguinte é a regra; fala-se em qualquer outro dia quando se trata de sessões especiais.

            Curiosamente, olhando uma determinada sessão que estava pré-marcada, pré-agendada para homenageá-los, eu disse: não posso fugir de estar presente nessa sessão. E eu diria que são três as fortes razões pelas quais aqui estou. A primeira delas é a comemoração do centenário de uma associação. Não é fácil - sabemos que o Brasil é um País de apenas 500 anos - uma associação perdurar e se agigantar por cem anos. Isso não é fácil. Então, bastaria esse motivo para fazer com que eu aqui estivesse, mas há outro motivo, também gigantesco: a pessoa que convocou esta sessão.

            Tenho pela Senadora Marisa Serrano extrema e profunda admiração. No Senado Federal, é uma das grandes amigas que construí, é pessoa de reputação ilibada e de uma dedicação fantástica a esta Casa, é amiga de todas as horas. Combatente, é minha opositora em termos de bancada, mas sempre soube, aqui, combater com extrema elegância, com pronunciamentos extremamente contundentes, mas feitos com extrema elegância. Então, eu disse: não posso fugir de apor minha assinatura em uma homenagem proposta pela Senadora Marisa Serrano. Essa nossa amizade vem sendo construída ao longo de um período. No verão passado, a Senadora foi convidada por outro amigo a estar na Paraíba e lá esteve conosco, honrou-nos com uma visita à nossa casa. Há poucos momentos, eu a convidei, novamente, para curtir o verão da Paraíba, mas me parece que a Senadora está com muito calor, porque, na verdade, neste verão, vai para a Antártica. Então, vai fazer o contraste das praias nordestinas. As representantes de Alagoas são maioria, e lá também há praias belíssimas. A Paraíba também as oferece, bem como o Piauí, mas parece que, neste verão, a Senadora vai optar pela Antártica.

            Na verdade, faço minha explanação das razões de eu estar presente nesta sessão. Vou tentar ser breve na leitura do meu pronunciamento, pois o Senador Mão Santa já está olhando para mim, doido para apertar o botão do tempo.

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PSC - PI) - Não, não. Eu estava querendo dizer que Freud explica.

            O SR. ROBERTO CAVALCANTI (Bloco/PRB - PB) - Na verdade, eu teria uma terceira razão, também gigantesca, para aqui estar presente. É uma história de infância, a história da minha vida. Meu pai era psiquiatra. Por ser filho de psiquiatra, eu estava muito próximo das relações de Psicanálise e de Psiquiatria. Meu pai era médico, formado em Pernambuco em 1936. Então, a história que vou contar aqui é de 1936. Não é a de Freud. Data de 1910 a associação, mas a história que vou contar esteve pertinho dali, pois se deu 26 anos depois.

            Meu pai formou-se em Medicina em Recife, Pernambuco. Teve grandes oportunidades de trabalhar com pesquisadores da Psiquiatria e teve uma passagem muito interessante, que fez uma reviravolta na vida dele. Lembrem-se: estamos falando de 1936. Em 1936, na busca de se combater a epilepsia, de se identificar o que era a epilepsia, fizeram uma pesquisa a respeito do momento do ataque de epilepsia, das suas características. Se a filmássemos sem som, a cena física seria muito próxima, no Candomblé - que, em Pernambuco, chama-se Xangô -, ao processo de transe para se receber o santo: há uma convulsão, o rosto fica branco, a pessoa se debate, baba. Se toda essa sequência fosse filmada sem o ruído dos tambores, poder-se-ia pensar que seria uma cena de ataque epilético. Então, à época, em Pernambuco, pesquisou-se isso. Meu pai foi para os Estados Unidos, para estudar Antropologia, cultos afro-brasileiros, para, com a formação dele de professor em cultos afro-brasileiros, ir para a África, para ver que correlação poderia haver em termos dessas comparações.

            Meu pai foi professor universitário e médico e, durante toda a vida, trabalhou não especificamente esse tema, mas foi isso que fez com que ele, além de ser médico psiquiatra, fosse professor catedrático da Universidade Federal de Pernambuco no Departamento de Antropologia.

            Portanto, eu teria realmente três fortes razões para estar aqui. Às vezes, pode-se dizer: “O Senador Roberto Cavalcanti está aproveitando uma janela da TV Senado para falar”. Mas, na verdade, o tema era meritório, a Senadora Marisa Serrano merece tudo de todos nós, e meu pai merecia essa homenagem.

            É bastante conhecido o aforismo “Conhece-te a ti mesmo”, inscrito nos pórticos do antigo Oráculo de Delfos. É impossível não pensar nele quando estamos a comemorar os cem anos de existência da Associação Psicanalítica Internacional (IPA). É impossível não pensar no aforismo, porque é exatamente a isto que se vem dedicando a entidade nos cem anos de sua existência: permitir que as pessoas, por meio da palavra, possam ter um conhecimento de si mesmas, de tal maneira que consigam aliviar sofrimentos psíquicos e dores emocionais, a fim de buscar o sonhado ideal de felicidade.

            A história da IPA, pois, começa antes de sua fundação, com os trabalhos fundamentais de Sigmund Freud. A obra foi iniciada na virada do século XIX para o século XX, quando Freud publicou A interpretação dos sonhos, resultado de teorização do seu trabalho clínico nos anos anteriores. Depois da publicação desse trabalho, há o processo contínuo de difusão das ideias freudianas para além de sua cidade natal de Viena.

            O primeiro passo são as muitas cartas que Freud trocou com diversos outros cientistas que mostravam interesse pela Psicanálise. O resultado foi o surgimento de uma comunidade internacional de psicanalistas interessados na difusão das ideias freudianas e na troca de experiências profissionais e científicas. Há encontros anteriores dessa pequena mas atuante comunidade, mas é em 1910, durante o Congresso na cidade alemã de Nuremberg, que se decide pela formalização desse grupo em uma associação autêntica, capaz de agregar psicanalistas das mais diversas nacionalidades.

            Nesses primeiros anos, a IPA funciona mais como meio de agregar os muitos grupos nacionais que surgiam. No entanto, a expansão da Psicanálise trouxe desafios à entidade, sendo o principal a necessidade de oferecer método e credibilidade a essa prática terapêutica.

            Esse processo se dá por meio da criação de determinadas exigências para a formação de novos psicanalistas, dentre as quais, por exemplo, a exigência de que o candidato a psicanalista recebesse supervisão e fosse analisado por um psicanalista devidamente credenciado. Tal medida foi fundamental para a qualidade do processo de preparação dos interessados na atividade psicanalítica.

            Em fases posteriores, a IPA se viu às voltas com outras questões importantes, dentre as quais podemos citar as relativas à expansão da Psicanálise para fora da Europa, principalmente na América Latina. Esse processo de expansão pela América Latina alcança o Brasil de forma muito consistente.

            Desde o início do século XX, há iniciativas isoladas de interessados pela Psicanálise. No entanto, é apenas no pós-Segunda Guerra Mundial que a Psicanálise finca raízes mais sólidas no Brasil, com o crescimento do número de adeptos e com o surgimento de entidades que recebem o reconhecimento definitivo por parte da IPA. Além de entidades em centros mais tradicionais como Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre, há novas sociedades que surgem no sul do País, no interior de São Paulo, no Nordeste, em Brasília e no Centro-Oeste.

            Ao mesmo tempo em que há esse processo de crescimento internacional, a história da IPA é marcada pela contínua expansão teórica e científica da Psicanálise. Freud, é claro, estabeleceu um núcleo duro de suas obras. Conceitos como o de inconsciente são partes dessa área central do pensamento freudiano. No entanto, Freud se manteve, ao longo da vida, na busca constante pelo refinamento das próprias ideias. Seus discípulos compartilham, evidentemente, esse núcleo teórico. Todavia, a teoria freudiana sempre abriu espaço para a discussão, o debate, a apresentação de novas ideias.

            Nesse sentido, a IPA funciona como continuadora da obra de Freud. Os psicanalistas associados a ela trabalham para o constante aperfeiçoamento e a melhoria do arsenal teórico freudiano e têm feito contribuições significativas ao longo dos últimos cem anos.

            Freud abriu um caminho que representa um modo revolucionário de se perceber o mundo, em que a capacidade de duvidar e a de questionar são fundamentais para explorar a mente humana. Essa revolução freudiana nem sempre foi facilmente aceita. Suas teorias foram e são perturbadoras, tendo sido frequentemente atacadas e criticadas. O caminho aberto por Freud foi profícuo e revolucionário, e sua aceitação não é fácil. No entanto, representa um caminho para que possamos compreender quem somos, para que possamos, enfim, cumprir o aforismo do Oráculo de Delfos e conhecer a nós mesmos.

            Nessa missão, que talvez seja a mais profunda de todas, é inegável o papel da IPA como o grande condutor dessa jornada. São critérios, métodos e ações que permitem manter a credibilidade da Psicanálise como prática terapêutica e, enfim, conseguir que ela cumpra com o ideal de seu fundador de ser um meio terapêutico capaz de produzir alívio ao sofrimento que o homem impõe a si mesmo.

            Muito obrigado. (Palmas.)


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/11/2010 - Página 52879