Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Proposta de debate sobre o pacto federativo, a reforma tributária e a reforma política.

Autor
Randolfe Rodrigues (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/AP)
Nome completo: Randolph Frederich Rodrigues Alves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATUAÇÃO PARLAMENTAR.:
  • Proposta de debate sobre o pacto federativo, a reforma tributária e a reforma política.
Aparteantes
Lindbergh Farias, Pedro Taques.
Publicação
Publicação no DSF de 10/02/2011 - Página 2507
Assunto
Outros > ATUAÇÃO PARLAMENTAR.
Indexação
  • ANUNCIO, PRESENÇA, SENADO, DIRIGENTE, SINDICATO, TRABALHADOR, INDUSTRIA, ESTADO DO AMAPA (AP), ELOGIO, ATUAÇÃO.
  • REGISTRO, COMPROMISSO, ORADOR, MANDATO, SENADO, DISCUSSÃO, PACTO, FEDERAÇÃO, EXTINÇÃO, INJUSTIÇA, DISTRIBUIÇÃO, RECURSOS, FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS ESTADOS E DO DISTRITO FEDERAL (FPE), DEFESA, MELHORIA, INFRAESTRUTURA, ESTADO DO AMAPA (AP), AMPLIAÇÃO, UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAPA (UFAP), REDUÇÃO, DESIGUALDADE REGIONAL, IMPLANTAÇÃO, REFORMA POLITICA, REFORMA TRIBUTARIA, PROMOÇÃO, DESENVOLVIMENTO, REGIÃO AMAZONICA.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, eu queria, de início, fazer o registro, na sessão de hoje, da presença, na tribuna de honra do Senado da República, dos dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Urbanas do Estado do Amapá, o glorioso Sindicato dos Urbanitários, o primeiro sindicato a ser reorganizado no Amapá após a redemocratização e um dos primeiros sindicatos do Amapá, fundado no final dos anos 50. Feito esse registro, agradecendo e cumprimentando a luta dos trabalhadores e do Sindicato dos Urbanitários em defesa da Companhia de Eletricidade do Amapá, dos direitos dos trabalhadores urbanos da Companhia de Água e Esgoto do Amapá e da Eletronorte, quero saudar a luta, neste momento, desses trabalhadores pela Federalização da Companhia de Eletricidade do Amapá.

            Feita essa preliminar, quero inaugurar esse pronunciamento, desta feita, falando desta tribuna às Srªs Senadoras e aos Srs. Senadores e, em especial, através da TV Senado, ao povo do Amapá.

            Quero, neste momento, destacar o sentido da nossa eleição para o Senado da República, o sentido do que nos conduz a estar aqui representando o nosso Estado federado.

            As eleições de 2010, para o Amapá, representaram um recado firme e incontestável, um recado de mudança. Foi quando o sentimento dos amapaenses foi aviltado que o povo do Amapá não se desesperou nem cruzou os braços, ergueu-se e disse basta. Foi no domingo, 3 de outubro, que ficou determinado para todos nós o dever de honrar a confiança do povo daquele Estado do extremo norte brasileiro. Foi naquele domingo memorável que 203.259 cidadãos me honraram com sua confiança. De apenas a ideia de um grupo político, nós nos tornamos um projeto da sociedade amapaense.

            Trago aqui a citação do poeta francês Verlaine, que dizia, no final do século XIX: “Com êxtase e o medo de haver sido o escolhido”, entrego-me hoje, desde a semana passada, ao serviço de representar o Amapá na Casa da Federação brasileira.

            A nossa campanha ao Senado da República foi pautada pela palavra de ordem da fé. Quero me reportar aqui à citação presente no versículo 11 da Bíblia Sagrada, que é uma das melhores definições, para mim, sobre o que é fé: “A fé é o firme fundamento das coisas que se esperam, e a prova das coisas que não se veem.” É a esta memória, com sua inspiração, que recorrerei aqui, no Senado, toda vez que o desalento da pressão, da atuação do dia a dia vier a me assaltar.

            Então, um dos principais desafios nossos aqui, desta tribuna, no Senado da República, é a luta pela recuperação do orgulho de ser amapaense.

            Sr. Presidente, caros colegas Senadores, temos à nossa frente um grandioso e complexo desafio, Senador Pedro Taques. É um desafio que vai ser desta legislatura do Senado da República, que é o desafio de rediscutir o pacto federativo.

            O Supremo Tribunal Federal já determinou que o prazo de validade da esdrúxula fórmula de distribuição do Fundo de Participação dos Estados expira em 31 de dezembro de 2012. O meu estado é injustiçado pela fórmula atual de repartição do FPE. O princípio do FPE, consagrado na sua origem, em 1965, é que o Fundo de Participação dos Estados é um instrumento econômico do Pacto Federativo. Entretanto, não é isso que hoje ocorre. O Amapá que, pelo princípio de ter arrecadação própria menor, deveria ter um Fundo de Participação maior é, lamentavelmente, o décimo quarto Estado da Federação na repartição dos recursos do Fundo. E isso é uma injustiça, de acordo com o princípio que deu origem ao Fundo de Participação dos Estados, que dá conta de que os Estados com arrecadação própria de ICMS menor devem ter FPE maior e os Estados com arrecadação própria de ICMS maior deveriam ter FPE menor.

            No nosso Estado, também padecemos de profundos gargalos da infraestrutura. Nós temos, lamentavelmente, os piores indicadores do País em rodovias, em abastecimento de água tratada, em coleta e tratamento de esgoto, em aparelhos urbanos nas nossas cidades e em energia elétrica. Aliás, em relação à energia elétrica, nós padecemos da situação de podermos nos tornar um gigante com pés de barro, pois seremos, na próxima década, uma potência de geração hidrelétrica, entretanto não resolveremos o problema de energia elétrica do Amapá se não resolvermos o problema da nossa empresa de distribuição de energia elétrica, a Companhia de Eletricidade do Amapá, que vive a dramática crise de ter, por sucessivas administrações equivocadas, uma dívida de R$1,3 bilhão.

            O País em que nós vivemos é um País de profundas desigualdades, de desigualdade social, de desigualdade regional. Vivemos, lamentavelmente, em uma Federação que põe em xeque a sua própria existência enquanto federação, priorizando, lamentavelmente, o desenvolvimento nacional do centro-sul.

            Um dos melhores exemplos disso são os dados que trago aqui sobre o incentivo à produção do saber científico. Vejam que 70% dos mestres e doutores do País estão concentrados no Sul e no Sudeste. A Amazônia desfruta de apenas 10% do número de doutores do País.

            Compreendo que nenhuma civilização avança sem investimento no conhecimento. Por isso, considero fundamental a necessidade de ampliarmos os investimentos na nossa Universidade Federal do Amapá, que, lamentavelmente, dentre as universidades amazônidas é a última em investimentos por parte do Governo da União.

            Queria pautar também as posições políticas que teremos aqui nos temas das grandes reformas nacionais. Já disse da tribuna da Casa que considero central enfrentarmos o debate sobre duas reformas: a reforma tributária e a reforma política.

            No que tange à reforma tributária, quero debater a necessidade de promoção de justiça fiscal no Brasil. Em primeiro lugar, padecemos e vivemos uma das mais altas cargas tributárias do planeta, que prejudica os mais pobres, que prejudica os menos favorecidos. Ainda praticamos um flagrante processo de tributos regressivos.

            Nós, no Brasil, preferimos onerar bens, serviços e salários por falta de determinação histórica em tributar o patrimônio e a renda. A nossa estrutura tributária, complexa e burocrática, expulsa empresas da formalidade e condena milhões de brasileiros ao subemprego indigno.

            Defendemos uma reforma tributária que desonere os mais pobres, que desonere bens e serviços, que favoreça as regiões periféricas sem perda da autonomia dos Estados, reafirmando que não podemos aceitar, sob o falso pretexto de modernidade, a retirada de nenhum direito dos trabalhadores no que tange ao debate sobre a reforma tributária.

            Em relação à reforma política, urge, Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, entrar na pauta nacional o debate sobre a reforma política que amplie a participação do povo brasileiro, Senador Lindbergh, como protagonista da cena política nacional.

            Lamentavelmente, tenho visto muito debate da reforma política, mas tenho visto e inclusive as duas Casas do Congresso Nacional têm pautado reformas que mais tangem a serem reformas eleitorais e, muitas vezes, do interesse do conjunto dos políticos do que de fato reforma política.

            Reforma política de fato tem que debater financiamento público e tem que debater a ampliação da participação popular nas decisões políticas.

            Temos no nosso texto constitucional um importante instrumento, consagrado inclusive no parágrafo único da nossa Constituição, que inova em relação aos textos constitucionais anteriores, quando diz que todo poder emana do povo e que o exerce diretamente. E remete ao art. 14, inciso I, II e III, da Constituição os instrumentos do exercício popular, através do plebiscito, da iniciativa popular de leis e do referendo.

            Considero importante introduzirmos nesse debate a necessidade de termos mais um instrumento de soberania popular, a possibilidade da revogação popular de mandatos por parte do cidadão brasileiro. Instrumento este que quero debater nesta Casa e que quero posteriormente trazer também elementos e informações para, porventura, introduzirmos este inciso IV no art. 14 do nosso texto constitucional, ampliando a participação popular.

            Por fim, o debate que aqui apresento é o debate de ser aqui, em especial, um Senador amazônida. E falo isso com muito orgulho. Sabemos da importância atual e futura da Amazônia para o Brasil e para o Planeta. Quero de imediato rejeitar a redoma de vidro preservacionista, propagandeada por interesses estrangeiros que querem impor a nós, mas com a mesma veemência quero também recusar o crescimento econômico à custa da depredação ambiental sem limites.

            Finalmente, quero destacar as características do mandato que procurarei exercer no Senado da República. Será um mandato proclamado como socialista, a serviço do que se convencionou ser socialismo. Não o socialismo das tristes experiências do Leste Europeu, não o socialismo das lamentáveis experiências que tivemos na história, mas o socialismo com liberdade, porque liberdade não existe no socialismo, e o socialismo como horizonte estratégico da causa humanitária de um mundo de felicidade.

            Antes de concluir, tenho a honra de conceder o aparte a um Senador que nesses primeiros dias aqui no Senado da República, já com muito otimismo, pela sua inabalável posição ética e pela firmeza de convicções com que se tem postado neste plenário e aqui no Senado.

            Concedo, com muita honra, o aparte a V. Exª, Senador Pedro Taques.

            O Sr. Pedro Taques (Bloco/PDT - MT) - Senador Randolfe, é uma honra poder caminhar no Senado nesta Legislatura com V. Exª. V. Exª, desde o primeiro dia, já demonstrou sua independência e coragem. Independência e coragem, penso, são atributos do representante de um Estado importante como o Amapá. Quero cumprimentá-lo pela sua participação desde o primeiro dia nesta Casa e também me propor a, junto com V. Exª, debater a reforma política. Tenho certeza que como V. Exª, entendo que a reforma política não se trata apenas de uma reforma eleitoral, mas essa reforma política deve buscar a reforma também do pacto federativo, para que possamos repensar o papel dos municípios, valorizando-os no concerto da Federação. Só assim poderemos ter o que a Constituição afirma como uma Federação. Essa reforma política deve também trilhar o caminho do voto distrital, ao meu pensar. Eu chamo V. Exª a esse debate. Voto distrital com financiamento público de campanha, quem sabe iniciando com financiamento público de campanha para as eleições para Presidente da República, daqui a quatro anos. Progressivamente, introduzirmos no cenário político nacional o financiamento público de campanha. Discutir também o sistema proporcional, que é a razão de muitos males, como nós todos conhecemos, evitando que o Supremo Tribunal Federal e que o Tribunal Superior Eleitoral, muitas vezes, possam se valer de resoluções e de decisões com força de lei, para que regule a eleição. Esta Casa - o Congresso Nacional como um todo - tem a obrigação moral e constitucional de resolver essa questão. Parabenizo V. Exª e me coloco ao seu lado nessas discussões a respeito da reforma política. Muito obrigado.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL - AP) - Senador, incorporo no todo o aparte de V. Exª ao meu pronunciamento, porque contribui com ele. E tenho plena concordância, em especial, com o tema do voto distrital.

            Reafirmo a concordância no sentido de dizer que temos que avançar no debate da reforma política. Não podemos cometer o erro do passado de fazer apenas reformas, pequenos remendos eleitorais na nossa legislação. O Congresso Nacional - a Câmara dos Deputados, o Senado da República - tem que ir a fundo no tema da reforma política, constitucionalizando inclusive esses mecanismos de modificação. E reitero: não existirá reforma política se nós não ampliarmos a participação popular nas gestões políticas, não debatermos e introduzirmos no nosso texto constitucional temas como financiamento público de campanha, e acrescento aí o voto distrital.

            Tenho a maior honra de conceder um aparte... E antes de concedê-lo permita-me fazer aqui uma remissão ao passado. Com o Senador Lindbergh Farias nós fomos cúmplices do movimento estudantil, militamos do mesmo lado, na mesma frente política, no movimento estudantil. Permita-me dizer, Senador Lindbergh que fui um liderado do senhor. O senhor foi Presidente da União Nacional dos Estudantes quando eu era Coordenador-Geral do Diretório Central dos Estudantes da Universidade Federal do Amapá. Não vou utilizar o termo destino, mas quis a história e a democracia - e esse é um ganho somente da democracia porque só a democracia pode possibilitar isso - o reencontro de lideranças estudantis no plenário da mais alta Casa legislativa deste País. 

            Então, é com muita honra e com um misto de satisfação e de saudosismo do movimento estudantil, que concedo o aparte a V. Exª.

            O Sr. Lindbergh Farias (Bloco/PT - RJ) - A honra é minha estar lhe chamando de V. Exª aqui no Senado Federal. V. Exª roubou meu título de Senador mais jovem. Tenho 41 anos e V. Exª tem 37. Era bem mais jovem na época do movimento estudantil e estou aqui agora chamando de V. Exª neste Senado Federal. É um grande orgulho para mim e para minha geração ver o brilhantismo de V. Exª. Não estou aqui para rasgar seda, mas, de fato, fico olhando, observando nas comissões e nos debates seu papel já nesta Casa. V. Exª vai mudar.E eu acho que é tarefa da nova geração que está chegando aqui também, Senador Randolfe, tentar mudar, tentar aproximar este Senado da vida real das pessoas. Eu vim de uma prefeitura. Estava em Nova Iguaçu, muito perto das pessoas nos debates do dia a dia. Se há uma coisa de que tenho medo neste Senado é que, ao invés de puxarmos o Senado para perto da vida real, nos distanciemos do contato com as pessoas, da vida cotidiana das pessoas. Este Senado não pode nos mudar. Temos que, com esta juventude, esta garra, este seu brilhantismo, de alguma forma contribuir para que este Senado seja cada vez mais a Casa do povo. Aqui sempre vamos ter, Senadora Lídice da Mata, grande guerreira, lutadora, baiana, espaço nos debates políticos, na luta entre situação e oposição, mas temos que criar uma pauta verdadeira. A reforma política é muito importante, mas quem vem.... V. Exª está nas ruas, sabe disto: o povo exige uma saúde melhor, uma saúde pública melhor, esse hoje é um problema nacional. O povo exige discussão sobre segurança pública. De forma que acho que esta talvez seja uma das maiores tarefas nossas, conectar este Senado Federal às ruas, ao povo, ao desejo das pessoas. E V. Exª vai ter um grande papel pelo seu Partido, nas ligações com os movimentos sociais. Nós também, mas V. Exª vai ter esse papel. Digo V. Exª porque estamos no Partido do Governo. Temos nossas relações com os movimentos sociais. Vamos sempre fazer essa intermediação. Mas nesse sentido V. Exª tem mais liberdade para costurar, para ser essa voz aqui no Parlamento. Estou tomando tempo de V. Exª, mas quero dizer que sempre, quando estiver falando, quero que olhe lá e veja que há alguém torcendo por V. Exª. Sei que V. Exª vai impor essa sua capacidade aqui, nos trabalhos do Senado Federal. Muito obrigado.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL - AP) - Concluindo, Sr. Presidente, Senador Lindbergh, quero aqui destacar que é uma honra pertencer à mesma geração de V. Exª, é uma honra termos sido da mesma geração no movimento estudantil. Tenho e terei com V. Exª muitos pontos de consenso aqui no Senado.

            Quando V. Exª fala do contato com as ruas, quero dizer que V. Exª é mestre nisso. O contato com o povo V. Exª nos ensinou, estando no movimento estudantil. Eu brinquei, quando V. Exª disse que fiquei com o posto do mais jovem a chegar a esta Casa. Mas essa foi a minha única vitória sobre V. Exª em nossas vidas. No movimento estudantil, eu sempre era vencido por V. Exª, pela competência de V. Exª na direção da nossa gloriosa União Nacional dos Estudantes, na condução do movimento estudantil brasileiro.

            Então, quero incorporar no todo o aparte de V. Exª, que muito me honra, que muito me orgulha, e reiterar os termos de que tenho a honra de pertencer à nossa geração, de pertencer à mesma geração de V. Exª e de comungar desses passos aqui no Senado da República.

            Por fim, Sr. Presidente, nosso papel aqui foi designado pelo povo do Amapá. Foi o povo que nos designou num desejo de mudança. E é essa responsabilidade que pretendemos aqui honrar.

            Obrigado pela tolerância, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/02/2011 - Página 2507