Discurso durante a 14ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com as modificações propostas para o Código Florestal em projeto de lei que tramita na Câmara dos Deputados.

Autor
Randolfe Rodrigues (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/AP)
Nome completo: Randolph Frederich Rodrigues Alves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Preocupação com as modificações propostas para o Código Florestal em projeto de lei que tramita na Câmara dos Deputados.
Aparteantes
Jorge Viana.
Publicação
Publicação no DSF de 23/02/2011 - Página 4611
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • CRITICA, SUBSTITUTIVO, CODIGO FLORESTAL, TRAMITAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, RELAÇÃO, DESNECESSIDADE, PROPRIEDADE RURAL, MANUTENÇÃO, AREA, RESERVA FLORESTAL.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, ainda há pouco, eu ouvia, com atenção, o Senador Flexa Ribeiro, atento, em especial, à convocação de S. Exª para a necessidade que nós, Senadores amazônidas, temos de organizar-nos. Aí, vinha à minha memória a belíssima iniciativa dos Governadores do Nordeste, na semana passada, de organizar um fórum próprio e de debater o modelo de desenvolvimento do Nordeste diretamente com a Presidenta da República. Tal exemplo deve ser também pautado por nós, Senadores e Governadores da Amazônia.

            Por falar em Amazônia, Senador Pedro Taques, venho aqui para trazer algumas considerações sobre o debate que tramita nas Casas do Congresso Nacional, notadamente na Câmara dos Deputados, sobre o Código Florestal. O Código Florestal será, sem dúvida alguma, um dos temas centrais para o debate aqui, no Parlamento. Trata-se de uma complexa modificação da legislação ambiental brasileira, que trará, no nosso entender, dramáticas consequências para o povo brasileiro. Nesse sentido é que venho à tribuna.

            O que está em curso, então, é uma tentativa, no nosso entender, perigosa de reverter mais de cinco décadas de legislação ambiental que se avançou neste País. A proposta do substitutivo do atual Código Florestal, que foi aprovada em comissão especial, que aguarda votação no plenário da Câmara dos Deputados e que depois virá para apreciação nossa aqui, no Senado, representa um verdadeiro retrocesso na legislação ambiental do País. De acordo com esse novo texto, propriedades rurais de até quatro módulos fiscais...

            O SR. PRESIDENTE (Cícero Lucena. PSDB - PB) - Senador Randolfe, permita-me, apenas... É uma questão regimental para prorrogar a sessão por mais uma hora.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL - AP) - Pois não, Presidente. Agradeço-lhe, de antemão, por possibilitar, dessa forma, o todo de nosso pronunciamento.

            Enfim, de acordo, então, com as modificações, propriedades rurais de até quatro módulos ficam desobrigadas de manter a área de reserva legal, a porção de terra com cobertura original para conservação. Segundo o Incra, essas propriedades de até quatro módulos representam 90% dos 5,2 milhões de imóveis rurais no Brasil.

            Essa desobrigação abre uma brecha para que qualquer fazendeiro com mais de 400 hectares de terra na Amazônia fracione sua propriedade e fuja da lei, aumentando-se, significativamente, os desmatamentos. O texto acaba, também, anistiando desmatadores que cometeram infrações antes de 22 de julho de 2008. É um texto, esse que tramita na Câmara, que premia aqueles que historicamente desrespeitam e desrespeitaram o meio ambiente.

            O relatório dá, ainda, autonomia para os Estados definirem os percentuais de área de reserva legal nas propriedades maiores e flexibiliza a aplicação das leis ambientais dentro de sua região administrativa. Ignora a necessidade, para o Brasil, de uma legislação ambiental federal. Isso significa, concretamente... Senador Jorge Viana, V. Exª foi Governador do Acre e fez um Governo que orgulhou tanto a todos nós, da Amazônia; que serve como referência para nós, amazônidas, e que não à toa foi batizado de Governo da Floresta; que criou, inclusive, uma figura que nos inspira, a da Florestania, que reflete a possibilidade concreta, até então algo inacessível, algo que não se dizia realizável, de convivência harmônica entre preservação de meio ambiente com desenvolvimento humano.

            Seu Governo, a experiência que V. Exª teve no Acre, é um exemplo a ser trazido para o debate que estamos tendo sobre a flexibilização do Código Florestal. Essa flexibilização da legislação ambiental, além de um retrocesso da legislação ambiental brasileira, é, em especial, um retrocesso das experiências avançadas; é um retrocesso do debate, que se tem travado no mundo, sobre a necessidade de se progredir, de haver, cada vez mais, legislações ambientais protetoras desses riquíssimos patrimônios ambientais.

            Não fosse essa urgência de proteção do meio ambiente, o simples reconhecimento de ameaças e riscos a milhares de pessoas seria razão suficiente para se entender a dimensão da irresponsabilidade que pode vir a ser a revogação do atual Código Florestal.

            A aprovação da proposta que está em curso, que está em debate na Câmara dos Deputados, permite legalizar o que é chamado de “áreas urbanas consolidadas”, muitas delas consideradas áreas de risco. Rebaixa os regramentos referentes aos condicionamentos para intervenção humana nas áreas de preservação permanente, como mangues de nascentes, córregos, rios, lagos, topo de morros, encostas e manguezais.

            Alertam-nos - Senador Jorge, quero ouvir com muito prazer o aparte de V. Exª -, nesse aspecto, os dramáticos acontecimentos recentes no Rio de Janeiro, os dramáticos acontecimentos de Santa Catarina e o conjunto de desastres ambientais a que temos assistido no Brasil.

            Ouço com muita honra o aparte de V. Exª, Senador Jorge.

            O Sr. Jorge Viana (Bloco/PT - AC) - Muito obrigado, Senador Randolfe. V. Exª traz um tema que faz com que o Congresso, especialmente esta Casa, o Senado, faça algo fundamental, que é olhar para trás e olhar para o futuro. Olhar para trás porque nós estamos diante da possibilidade de se mexer numa lei do século passado, de 1965. Eu, como engenheiro florestal, entendo que, tendo o mundo mudado tanto, é extremamente necessário fazermos uma atualização dessa legislação. Mas, em muitos aspectos, o que vemos na proposta que hoje está tramitando na Câmara, é que ela atrasa ainda mais a legislação ambiental brasileira. É óbvio que há avanços colocados, mas há também pontos sobre os quais temos ainda que nos debruçar, e V. Exª os levanta com muita propriedade, como amazônida que é, como membro vivo de um Estado, o Estado do Amapá, que experimentou, ainda no governo do ex-Governador Capiberibe, a busca pela consolidação de princípios da sustentabilidade, coisa em que nós no Acre conseguimos avançar um pouco mais. Acho que, sem um instrumento como o Código Florestal atualizado, sem a legislação ambiental estar atualizada, o Brasil não se firmará como uma nação - que é o nosso desejo -, uma nação que seja um exemplo para o mundo, por guardar a Amazônia, por guardar a maior biodiversidade do Planeta. Então, queria me associar ao discurso de V. Exª e dizer que a hora é oportuna. Espero, sinceramente, que a Ministra do Meio Ambiente e o Governo da Presidenta Dilma possam trazer de volta esse tema e que possamos retirar aquilo que possa contaminar as boas intenções que a proposta guarda. Acho que há melhorias essenciais a serem feitas na proposta, inclusive para que o País possa cumprir as metas de redução das emissões de carbono que assumiu diante do mundo. O Brasil está hoje entre as seis nações do Planeta que geram o maior número de emissões de CO2 e outros gases. Especialmente no Brasil, as emissões estão muito vinculadas às queimadas que, do Governo do Presidente Lula para o atual, conseguimos trazer com uma diminuição bastante significativa. Então, eu queria colocar que é óbvio que temos de levar em conta que o Brasil é um grande produtor de alimentos no mundo, que temos uma situação que tem de ser resolvida em várias regiões do País. E só se resolve isso com uma legislação que observe, que preste atenção na realidade, mas também isso não pode significar afrouxarmos uma legislação que precisa ser aperfeiçoada, que precisa até ser mais dura em vários aspectos, para que o Brasil se firme como um país que luta para consolidar o desenvolvimento sustentável. Agradeço suas palavras em relação ao Acre, as palavras de V. Exª, e acredito que vamos travar sempre essa unidade na busca de consolidar o desenvolvimento da Amazônia e do País, mas com sustentabilidade, como já temos referência na nossa região. Parabéns a V. Exª pelo pronunciamento. Queria só me associar às suas preocupação e aos seus propósitos.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL - AP) - Exª, Senador Jorge, incorporo no todo o aparte de V. Exª e agradeço a contribuição. Reitero que essa contribuição enriquece o tema que estamos debatendo, um tema a que V. Exª, pela experiência que teve como Governador, pela experiência de juntar sustentabilidade ambiental com desenvolvimento humano, não poderia deixar de contribuir e, com certeza, quando o debate vier aqui para esta Casa, muito contribuirá.

            V. Exª é de uma terra... Eu costumo dizer isso, aliás, esse é um trecho citado originalmente por V. Exª: V. Exª é da terra onde nascem os rios, eu sou da terra onde os rios deságuam. V. Exª está nas nascentes do Amazonas, nós estamos na foz do Amazonas. Só uma região como a nossa pode reunir tamanha diversidade.

            E não à toa nossa região, que representa mais de 60% do território brasileiro, deve ser vista a partir de faróis e de perspectivas como a experiência que V. Exª conduziu no Acre, cuja prova maior é a sustentabilidade também política dessa experiência ao longo dos anos.

            Então, nesse sentido, trazendo essa concreta experiência de possibilidade de convivência harmônica entre desenvolvimento econômico, entre desenvolvimento humano e sustentabilidade ambiental, trago aqui, Sr. Presidente, o reclame do nosso partido, a nossa preocupação com as modificações que estão ocorrendo no Código Florestal.

            É verdade que uma legislação de 1965 necessita e deve ser modificada para ser aperfeiçoada para se olhar para frente, não para retrocedermos. Então, quero acreditar que este debate será tratado pelo Executivo a partir dessa preocupação e será tratado ainda pelos Deputados na Câmara dos Deputados. A mesma preocupação norteará o debate quando vier ao Senado.

            A verdade sobre isso é que precisamos debater aqui um projeto de desenvolvimento que seja pautado pelo respeito às nossas florestas. As florestas brasileiras não são balcões de negócio; são bens de interesse comum. Os impactos do desmatamento já percebemos quais são. Os impactos do desmatamento das nossas florestas e de outros biomas do território brasileiro são altamente negativos. Reitero as experiências tristes que já tivemos, que temos vivido com as mudanças climáticas e com a ocupação indevida pela ausência de coordenação e de legislação ambiental.

            É esse recado de catástrofes ambientais que nós temos sentido e ouvido, e recentemente o Rio de Janeiro teve a mais grave da história brasileira. São desastres como esse e tais outros que devem servir de alerta para nós termos todo o cuidado necessário na modificação da nossa legislação ambiental, caminhando na contramão do que o Planeta tem avançado no sentido de respeito aos parâmetros de convivência harmônica entre homem e meio ambiente.

            Era o que tinha a dizer, Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/02/2011 - Página 4611