Discurso durante a 44ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários acerca do movimento, realizado hoje pelos médicos de todo o País contra os planos de saúde.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CALAMIDADE PUBLICA. MOVIMENTO TRABALHISTA.:
  • Comentários acerca do movimento, realizado hoje pelos médicos de todo o País contra os planos de saúde.
Aparteantes
Cyro Miranda, Waldemir Moka.
Publicação
Publicação no DSF de 08/04/2011 - Página 10448
Assunto
Outros > CALAMIDADE PUBLICA. MOVIMENTO TRABALHISTA.
Indexação
  • COMENTARIO, HOMICIDIO, CRIANÇA, ESCOLA PUBLICA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), OCORRENCIA, PROBLEMA, FALTA, POLICIAMENTO, FRONTEIRA, BRASIL, FACILITAÇÃO, ENTRADA, ARMA DE FOGO.
  • CRITICA, ORADOR, ATUAÇÃO, PLANO, SAUDE, BRASIL, MOTIVO, PAGAMENTO, INSUFICIENCIA, MEDICO, CONTRADIÇÃO, EXCESSO, AUMENTO, MENSALIDADE, USUARIO, JUSTIFICAÇÃO, INTERRUPÇÃO, SERVIÇO, GREVE, PROFISSIONAL LIBERAL, NECESSIDADE, EMPRESA, ESCLARECIMENTOS, COMISSÃO DE ASSUNTOS SOCIAIS (CAS), COMISSÃO, DIREITOS HUMANOS.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Anibal Diniz, hoje, vim aqui, para falar especificamente sobre a questão do movimento que os médicos estão fazendo, coincidentemente no dia em que se comemora o Dia Mundial da Saúde, mas não posso começar este pronunciamento sem também, como médico, dizer da minha tristeza, da minha indignação de ver o bárbaro e trágico crime cometido no Rio de Janeiro contra crianças inocentes.

            Isso demonstra algumas coisas, Senador Anibal. Primeiro, como é que uma pessoa de vinte e poucos anos consegue se armar - não era somente uma arma, mas duas armas -, ter munição à vontade? Como é que se consegue isso? Quero chamar a atenção para a existência de várias falhas. Primeiro, há a questão do controle da venda de armas e de munição. Pode estar certo de que essas armas e munições que ele tinha não foram compradas em lojas ou em lugares autorizados, mas entraram clandestinamente pelas nossas fronteiras, pelas fronteiras desguarnecidas, onde não há policial federal em número suficiente, onde não há policial rodoviário federal para fiscalizar as estradas e onde não há sequer a presença das Forças Armadas em número adequado e também com equipamento adequado.

            Mas, partindo para o foco do meu pronunciamento, é preciso que a sociedade brasileira medite sobre o movimento que os médicos estão fazendo hoje. Não se trata de um dia de paralisação em defesa dos seus salários, ou melhor, do pagamento dos planos de saúde, porque esse movimento de hoje é dirigido contra os planos de saúde.

            Quem tem plano de saúde sabe que os valores são, frequentemente, reajustados. Portanto, o que é pago pela pessoa que tem plano de saúde tem aumentado de valor consideravelmente. O levantamento é o de que o valor aumentou mais de 400% nesses dois anos. Enquanto isso, quanto recebe um médico por uma consulta no plano de saúde? Em média, são R$39,00. E o que os médicos estão pedindo? Eles pedem que a consulta médica, que está em torno de R$30,00, passe para R$60,00. Sessenta reais por uma consulta médica! Ora, isso é pago, às vezes, no cabeleireiro; isso se paga, às vezes, com trabalhos que não têm a ver com a vida das pessoas. Mas, se fosse somente o que o médico recebe, ainda poderíamos questionar. O pior, Senador Moka - V. Exª também é médico -, é que o plano de saúde interfere no exercício do médico e na relação médico/paciente. Quem tem plano de saúde sabe muito bem: a pessoa consulta a lista dos médicos que atendem pelo plano, escolhe um médico e começa a ser atendida, mas, daqui a pouco, esse médico não está mais atendendo pelo plano, e é preciso ir atrás de outro médico. E esse médico que está atendendo se, por exemplo, precisar de um determinado exame, o paciente vai ser informado de que aquele exame não é feito pelo plano de saúde. E, pior, o plano de saúde ainda policia os procedimentos que o médico tem de tomar para fazer um diagnóstico ou para estabelecer um tratamento.

            Esse tipo de situação não pode perdurar. A Agência Nacional de Saúde Suplementar não pode continuar fazendo de conta que existe, fazendo de conta que fiscaliza, sem fiscalizar coisa alguma. Aqui, não quero dizer que todos os planos de saúde são voltados apenas para o lucro, mas, infelizmente, o que a gente deduz é isso mesmo.

            Tenho em mão o depoimento que, hoje, foi publicado pelo jornal Correio Braziliense de duas pessoas. Uma delas diz assim: “Comecei um tratamento dermatológico, mas, no meio do tratamento, tive de mudar de especialista, porque ele já não atendia pelo plano”. E por que ele não atendia pelo plano mais? Ou porque o plano o descredenciou, porque ele devia pedir coisas que o plano não queria pagar, ou porque ele não se conformou de continuar atendendo de maneira insatisfatória, porque não havia mecanismos. Uma senhora diz: “A situação é tão crítica, que os bons médicos se recusam a atender pelo plano. Então, fico sem alternativa”.

            Tenho um documento, Senador Anibal, que foi distribuído pelo movimento dos médicos, encabeçado pela Associação Médica Brasileira, pelo Conselho Federal de Medicina, pela Federação Nacional dos Médicos. Vou ler uma parte dele e pedir a V. Exª que dê como lido todo o documento, porque é importante que fique nos Anais do Senado, para que possamos ver o que está acontecendo e para que a Agência Nacional de Saúde Suplementar não faça de conta que essas coisas não existem. Vou ler, portanto, uma parte do documento:

No dia 7 de abril [hoje] [...], todos os médicos que atendem os planos e seguros de saúde paralisarão suas atividades durante 24 horas. O movimento, que tem recebido ampla divulgação pela imprensa, é resultado da articulação das entidades médicas nacionais e regionais, coordenadas pela Comissão de Saúde Suplementar (Comsu).

Entendemos que o êxito do movimento dependerá também da repercussão gerada nos Estados e Municípios, sendo que os veículos de comunicação em nível local devem procurar os representantes das entidades (conselhos de medicina, associações e sindicatos médicos), em busca de esclarecimento.

Para garantir a unidade do discurso a ser adotado, a Comissão de Saúde Suplementar preparou o kit de informações, que segue anexo. Nele é possível encontrar dados [para isso é que quero chamar a atenção], levantamentos, histórico da manifestação, opiniões de entidades e de especialistas (inclusive, não médicos), além de uma agenda de mobilização nos Estados.

            Aqui, diz-se:

MOTIVO DA PARALISAÇÃO

O protesto de 7 de abril é um alerta dos médicos aos planos de saúde e à sociedade. É preciso exigir respostas dos planos de saúde para corrigir distorções, como a interferência antiética na autonomia do trabalho médico e os baixos honorários. Sem isso, o atendimento dos usuários dos planos de saúde pode ser comprometido [pode ser comprometido? Eu diria que está sendo comprometido].

A paralisação de 7 de abril tem como foco a valorização a valorização do trabalho médico e da assistência em saúde oferecida pelos planos de saúde. Os médicos são solidários com os usuários dessa rede, que sofrem com glosas e com filas de espera e que acreditam que, com o apoio da sociedade, será possível qualificar esses serviços.

            E, aqui, ele diz dos valores pretendidos, sobre o que até já falei: “Os médicos estimam em R$60,00 o valor mínimo a ser pago por cada consulta”. Porém, esse número, evidentemente, não é o ideal que um profissional gostaria de receber por uma consulta médica, que não é um serviço qualquer. É uma atividade que tem a ver com o dom maior da pessoa, que é a vida, a sua saúde.

            É importante frisar que não haverá prejuízos para a população:

Os usuários dos planos de saúde não serão prejudicados pela mobilização. As consultas e procedimentos eletivos [isto é, os não urgentes] que foram suspensos serão remarcados e os casos de urgência serão atendidos.

            Ao contrário do que se está dizendo, as emergências estão funcionando. Não há paralisação nesta área. A paralisação é na área das consultas não urgentes, que chamamos de eletivas, e de procedimentos eletivos.

Na verdade, [...] [esse ato] é uma frente de luta em defesa do direito dos usuários a ter um bom atendimento.

            Senador Anibal e Srs. Senadores, não conheço um médico que tenha se formado sem ter o desejo de atender bem, sem ter o desejo de ver a pessoa que ele atende curada, de ver a pessoa sem o problema que ela traz ao consultório. Portanto, o médico não pode continuar cúmplice dessa situação dos planos de saúde. Eu mesmo tive, recentemente, na minha família o caso de uma pessoa que foi se consultar e tivemos de pagar por fora um exame que era necessário, mas que o plano de saúde não cobria.

            Ora, então, é preciso se discutir isso de maneira muito ampla. A atividade do plano de saúde não é uma atividade privada como qualquer outra, não é uma atividade comercial como qualquer outra. Tem, sim, que se preocupar, é evidente... Ninguém vai investir em uma empresa de plano de saúde que não seja para, ao final, conseguir ter lucro e poder, portanto, expandir o seu negócio. Mas não dá para pensar em fazer negócio, como se faz com outras áreas, com a saúde das pessoas, com a condição de trabalho dos profissionais de saúde.

            Então, quero dizer que não é possível mesmo que o Senado não aproveite este momento, através das suas comissões, como a Comissão de Assuntos Sociais, a Comissão de Direitos Humanos... Aliás, hoje, tivemos lá na Comissão de Direitos Humanos a presença dos presidentes da AMB, Associação Médica Brasileira, do Conselho Federal de Medicina, da Federação Nacional dos Médicos, justamente porque queremos tirar só do âmbito da Comissão de Assuntos Sociais a questão do atendimento às pessoas, a questão do direito das pessoas de terem um bom atendimento. Esse é um direito humano. Mas é um sofisma. Por exemplo, no meu Estado hoje está havendo, há dois ou três dias, um seminário, Senador Moka, com o seguinte slogan: “Saúde, direito do cidadão e responsabilidade de todos”.

            Ora, estão alterando até a letra da Constituição. A Constituição é bem clara: a saúde é um direito do cidadão e um dever do Estado. Então, se o Estado... “Ah, mas não é o Estado que é responsável pelos planos de saúde.” É, sim! O Estado é o responsável por regular os planos de saúde. O Estado é o responsável, porque o nome está dizendo: é uma saúde suplementar, uma assistência suplementar, que, aliás, só existe porque o Sistema Único de Saúde não consegue cobrir adequadamente o atendimento.

            Aliás, o Sistema Único de Saúde é uma coisa à parte. Nem vou misturar aqui, porque é pior do que os planos de saúde. É pior. Então, hoje quero ficar na questão dos planos de saúde.

            Aqui, acho que precisamos fazer algo urgentemente. Já nos comprometemos hoje na Comissão de Direitos Humanos... Porque pertenço às duas Comissões, Assuntos Sociais e Direitos Humanos, e acordamos que, na Subcomissão de Saúde das duas Comissões, vamos fazer um trabalho conjunto para realmente adotar medidas urgentes, porque eram medidas que deviam ter sido tomadas ontem. Em Medicina, o que é urgente é urgente mesmo, não pode ser adiado, e essa questão é de urgência urgentíssima.

            Senador Moka, ouço V. Exª, com muito prazer.

            O Sr. Waldemir Moka (Bloco/PMDB - MS) - Senador Mozarildo, quero me associar ao discurso que V. Exª faz, e parabenizá-lo. O tema hoje, na Comissão de Direitos Humanos, foi discutido. O Senador Paim, aliás, disse na Subcomissão da Saúde, da Comissão de Assuntos Sociais, que levaria o tema. Ouço que V. Exª pretende fazer uma audiência com as duas comissões. Eu acho isso importante. E diria o seguinte: o fundamental é que, no Senado, peçamos que os planos de saúde abram as suas planilhas. Do contrário, não há como, porque, na verdade, o que se paga ao profissional é um valor muito pequeno. O que vemos é que, na hora de majorar os preços para aqueles que têm um plano de saúde, é algo... Dizem: “está-se cobrando muito, mas está-se remunerando bem os profissionais”. Não é verdade. O que estamos vendo são os planos de saúde engordarem os seus lucros, em detrimento de um atendimento. Aí, é claro, se o profissional recebe um valor pequeno pela sua consulta, o que ele tem de fazer? Aumentar a produtividade, ou seja, atender mais pacientes em um tempo menor, o que vai, sem dúvida, ser prejudicial. Por isso é que o médico, que é um profissional consciente, está se recusando a fazer parte disso e está aproveitando o dia de hoje até para denunciar o absurdo que está acontecendo na questão dos planos de saúde. Eu acho que o momento é agora. Vamos fazer essa audiência com as duas comissões e, no meu entendimento, objetivamente, é o caso de pedirmos que os planos de saúde mostrem as suas planilhas, para que possamos ver qual é o lucro e a parte destinada à remuneração dos profissionais. Agradeço o aparte a V. Exª.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Eu é que agradeço o aparte que V. Exª faz.

            Realmente, qual é a sensação de uma pessoa que paga um plano de saúde e tem a sua mensalidade aumentada quando vai se consultar? É a de que o médico também recebeu o aumento, proporcional. Ora, aí está o exemplo. O aumento foi de - os dados estão hoje na imprensa - mais de 400%, o aumento dos planos de saúde. Mas qual foi o aumento não só para os médicos, mas para o laboratório, para os outros profissionais de saúde? Não houve aumento nessa proporção.

            Então, V. Exª disse muito bem: termina o médico ficando nesta dicotomia, ou ele aceita ficar ganhando esse valor baixo e, portanto, atendendo o maior número de pessoas para ter uma remuneração melhor no final do mês; ou a consciência dele dói e ele deixa o plano de saúde, como disse aqui uma pessoa entrevistada pelo jornal Correio Braziliense. Ela disse que os bons médicos não atendem mais. Outro disse que começou um tratamento com um bom médico e, depois, o profissional não atendia mais.

            Então, eu não gosto de banalizar a figura das CPIs, as comissões parlamentares de inquérito, mas acho que devemos fazer esse esforço nas duas subcomissões - na Subcomissão de Saúde da Comissão de Direitos Humanos e na Comissão de Assuntos Sociais. Se não obtivermos êxito, Senador Moka...

            O Sr. Cyro Miranda (Bloco/PSDB - GO) - Senador, V. Exª me concede um aparte?

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Se não obtivermos êxito, Senador Moka, será hora de fazermos uma CPI sobre a questão da saúde suplementar, isto é, dos planos de saúde.

            Ouço V. Exª, com muito prazer.

            O Sr. Cyro Miranda (Bloco/PSDB - GO) - Também, como conversávamos há pouco, deveria haver uma tabela progressiva de acordo com as especialidades, tempo, doutorados, porque hoje o recém-formado recebe a mesma coisa que um médico que está há vinte, trinta anos na profissão e fez vários cursos de especialização; a remuneração é a mesma. Acho que isso tem facilitado e acomodado muito o pessoal dos planos, eles não estão sendo pressionados. Então, fica essa sugestão também para que V. Exª possa levar. Obrigado.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Acho que V. Exª tem razão. O problema, como disse o Senador Moka, é que não conhecemos direito a planilha dos diversos planos, não conhecemos exatamente esses mecanismos. Temos de convocá-los para as Comissões de Assuntos Sociais e Direitos Humanos. Se isso não resolver, defendo que façamos uma CPI para ter acesso às planilhas, para ter acesso a tipo de pagamento - está aqui o nosso presidente da Comissão de Assuntos Sociais. Realmente, não dá para continuarmos sabendo disso, ouvindo isso, sofrendo com essa questão às vezes na família da gente, vendo as pessoas reclamarem, como está aqui hoje no Correio Braziliense, e não fazemos nada.

            É algo inusitado ver a classe médica fazer um dia de paralisação nacional. Isso porque o médico tem aquela formação de que tem de se doar, mais do que receber. Ocorre que o médico é um ser humano e precisa comer, alimentar-se, cuidar de sua família, atualizar-se permanentemente. E, se ele não é bem remunerado, o que vai acontecer? Não vai fazer nada disso.

            Portanto, concluo, dentro do prazo regimental, pedindo a V. Exª, Senador Anibal, que autorize a transcrição dessa matéria publicada pela Associação Médica Brasileira, pelo Conselho Federal de Medicina e pela Federação Nacional dos Médicos e também da matéria do Correio Braziliense de hoje. Este dia merece registro, reflexão e providências por parte do Senado.

            Muito obrigado.

 

***********************************************************************************************

DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR MOZARILDO CAVALCANTI EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inseridos nos termos do inciso I, § 2º, art. 210 do Regimento Interno)

***********************************************************************************************

Matérias referidas:

- “Apagão na Saúde” - Correio Braziliense;

- “Paralisação - Movimento por reajuste dos valores pagos pelos planos de saúde” (Associação Médica Brasileira, Conselho Federal de Medicina, Federação dos Nacional dos Médicos).


Modelo1 4/25/241:03



Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/04/2011 - Página 10448