Discurso durante a 81ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Manifestação de pesar pelo falecimento, hoje, do ex-Senador Abdias Nascimento; e outro assunto.

Autor
Acir Gurgacz (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RO)
Nome completo: Acir Marcos Gurgacz
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Manifestação de pesar pelo falecimento, hoje, do ex-Senador Abdias Nascimento; e outro assunto.
Publicação
Publicação no DSF de 25/05/2011 - Página 18121
Assunto
Outros > HOMENAGEM. SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, ABDIAS NASCIMENTO, EX SENADOR, ELOGIO, ATUAÇÃO, COMBATE, DISCRIMINAÇÃO RACIAL, NEGRO.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), DENUNCIA, RELAÇÃO, PROSTITUIÇÃO, MULHER, CRIANÇA, ADOLESCENTE, VICIO, DROGA, DERIVADOS, COCAINA.
  • DEFESA, COMBATE, TRAFICO, DROGA, INTERIOR, FRONTEIRA, PAIS, NECESSIDADE, TRATAMENTO MEDICO, VICIADO EM DROGAS.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. ACIR GURGACZ (Bloco/PDT - RO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Boa tarde, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é com pesar que noticio, nesta tarde de hoje, o falecimento de Abdias Nascimento, ex-Senador do PDT.

            Abdias nasceu em Franca, em 14 de março de 1914, ex-político e ativista social brasileiro, foi um dos maiores defensores da cultura e da igualdade para as populações afrodescendentes no Brasil, intelectual de grande importância para a reflexão e atividade sobre a questão do negro na sociedade brasileira.

            Teve uma trajetória longa e produtiva, indo desde o movimento integralista, passando pela atividade de poeta, até ativista do Movimento Negro, ator e escultor.

            Após a volta do exílio (1968-1978), insere-se na vida política (foi Deputado Federal de 1983 a 1987, e Senador da República de 1997 a 1999), além de colaborar fortemente para a criação do Movimento Negro Unificado em 1978.

            Em 2006, em São Paulo, instituiu oficialmente o dia 20 de novembro como o Dia da Consciência Negra no Brasil. Recebeu o título de Doutor Honoris Causa da Universidade de Brasília. É autor de vários livros, como Sortilégio, Dramas para Negros e Prólogo para Brancos, O Negro Revoltado, entre outros.

            Foi professor benemérito da Universidade do Estado de Nova Iorque e Doutor Honoris Causa pelo Estado do Rio de Janeiro, grande militante no combate à discriminação racial no Brasil.

            Filho de Dona Josina, a doceira da cidade, e Seu Bem-Bem, músico e sapateiro, Abdias cresceu numa família coesa, carinhosa e organizada, porém pobre e foi-se diplomar em Contabilidade pelo Atheneu Francano em 1929. Com 15 anos, alistou-se no Exército e foi morar na capital de São Paulo. Na década de 30, engaja-se na Frente Negra Brasileira e luta contra a segregação racial em estabelecimentos comerciais da cidade.

            Prossegue na luta contra o racismo organizando o Congresso Afro-Campineiro em 1938. Fundou em 1944 o Teatro Experimental do Negro, entidade que patrocina a Convenção Nacional do Negro em 1945 e 1946.

            A Convenção propõe à Assembleia Nacional Constituinte de 1946 a inclusão de políticas públicas para a população afrodescendente e um dispositivo constitucional definindo a discriminação racial como crime de lesa-pátria. À frente do TEN, Abdias organiza o 1º Congresso do Negro Brasileiro em 1950. Militante do antigo PTB, após o golpe de 1964, participa desde o exílio na formação do PDT. Já no Brasil, lidera em 1981 a criação da Secretaria do Movimento Negro do PDT.

            Na qualidade de primeiro Deputado Federal afro-brasileiro a dedicar seu mandato à luta contra o racismo (1983-87), apresenta projetos de lei definindo o racismo como crime e criando mecanismos de ação compensatória para construir a verdadeira igualdade para os negros na sociedade brasileira. Como Senador da República (1991, 1996/99), continua essa linha de atuação.

            Em 1990, Abdias é eleito na chapa do PDT ao Senado pelo Rio, com Darcy Ribeiro e Doutel Andrade.

            Em 1991, assume a cadeira do Senado e, pouco depois, é nomeado primeiro titular da Secretaria Extraordinária de Defesa e Promoção das Populações Afro-Brasileiras do governo do Estado do Rio de Janeiro, criado pelo Governador Leonel Brizola. Em 1996, falece o Senador Darcy Ribeiro, e Abdias assume a cadeira de novo, exercendo o mandato de Senador até 1999.

            Abdias reapresenta no Senado seu projeto de lei sobre ação compensatória. Com duas propostas, procura estabelecer o princípio da reparação para o povo afrodescendente. A primeira cria uma ação civil pública contra atos e omissões de discriminação racial; a segunda estabelece sanções na contratação de serviços para o setor público contra empresas que cometem atos e omissões de discriminação racial.

            Apresenta ainda emenda à Constituição Federal, garantindo às comunidades remanescentes dos quilombos os mesmos direitos fundiários assegurados às populações indígenas. Sugere a inscrição dos líderes da Conjuração Baiana, os mártires da Revolta dos Alfaiates no Livro de Heróis da Pátria, no Panteão da Liberdade e da Democracia, Praça dos Três Poderes. Institui o Prêmio Cruz e Sousa, comemorativo do centenário da morte do poeta simbolista catarinense.

            O Governador Leonel Brizola o nomeia Secretário de Defesa e Promoção das Populações Afro-Brasileiras do Estado do Rio de Janeiro de 1991 a 1994. Mais tarde, é nomeado primeiro titular da Secretaria Estadual da Cidadania e Direitos Humanos, em 1999 até 2000.

            Portanto, fica aqui registrado o falecimento de Abdias Nascimento, um dos grande pedetistas do nosso Partido, do nosso País.

            Sr. Presidente, não quero crer que estamos perdendo a luta contra as drogas no nosso País, mas, a cada dia que passa, vemos mais e mais provas de que os entorpecentes estão ganhando terreno em meio à sociedade em nosso País.

            Nos últimos dias, li uma reportagem no jornal O Globo que mais parecia uma história de terror. Uma história de horror que muita gente vem vivendo neste País, em função de drogas como o crack e, agora, também com o oxi.

            A reportagem mostra como vivem meninas e mulheres à beira da BR-364, entre Rio Branco, no Acre, e Porto Velho, em Rondônia. Mulheres e meninas que se prostituem por quantias irrisórias, para simplesmente conseguir ganhar dinheiro suficiente para comprar o crack ou o oxi.

            A reportagem fala de meninas que são “tocadas” para as ruas pelos próprios pais, aos oito, nove, dez anos de idade, para venderem seus corpos ainda de criança a fim de conseguirem algum dinheiro para levar para casa.

            O texto é bem claro quando diz que uma entre cinquenta dessas mulheres e meninas fazem programas hoje sem usar drogas. Apenas uma em cinquenta não utilizam drogas! Quarenta e nove usam crack ou oxi para aguentarem a rotina degradante à qual são obrigadas a se submeter.

            Mas é até difícil dizer o que acontece antes: se vem antes o vício ou se vem antes a degradação da prostituição. Isso pouco importa: os dois são um problema sério para essas crianças, para esses jovens.

            Estamos vivendo hoje em um País no qual até mesmo as pequenas cidades de cinco, dez mil habitantes são assoladas por traficantes. Antigamente, esse mal era um castigo sofrido apenas nas grandes cidades, nos grandes centros. Hoje, não!

            Hoje, pela manhã, falava com um radialista, o Sr. Robert, de Jaru, quando ele dizia que, inclusive, na zona rural o tráfico de drogas é uma coisa muito forte e está prejudicando muito as famílias.

            Recebi uma informação e um pedido do nosso amigo Robert para que a gente possa fazer um projeto de lei no sentido de que cada cidade tenha, em seus hospitais, dependências para o tratamento de dependentes químicos.

            Estamos fazendo esse levantamento, Robert, no sentido de fazer uma emenda à Constituição, tornando obrigatório aos governos estaduais e federal atender essa demanda, que, infelizmente, está aumentando dia a dia.

            As drogas, mesmo as mais pesadas e destruidoras como o crack e o oxi, estão sendo comercializadas no nosso interior, no meio rural, exatamente em locais onde os tratamentos para os dependentes químicos - já tão difíceis mesmo nas cidades grandes, ainda mais nas cidades pequenas! - são muito mais difíceis.

            Os Centros de Atendimento Psicossocial, os chamados CAPS, que funcionam em cidades com mais de 50 mil habitantes, exigem uma estrutura física e humana que a maioria dos nossos pequenos Municípios não dispõem - e isso mesmo com o Ministério da Saúde fornecendo todo o apoio para a criação desses centros. Até mesmo porque os pequenos Municípios raramente têm condições de arcar com as contrapartidas necessárias para firmar esses convênios com o Ministério da Saúde, que demanda cinco profissionais remunerados pela prefeitura e também a disponibilização do espaço físico.

            Enquanto vivemos a dificuldade do tratamento dos dependentes químicos, a droga expande seus domínios.

            Estamos perdendo essa guerra também nas fronteiras, por onde passam as drogas, componentes para a produção delas, assim como armas e dinheiro que fortalecem os narcotraficantes. E isso acontece em escala mundial.

            Os diamantes que são contrabandeados de Rondônia, por exemplo, da nossa reserva de Roosevelt, a maior do mundo, vão parar nas mãos de traficantes que entram e saem do Brasil com liberdade. Muitos desses traficantes têm conexões na África e na Europa e usam nossos diamantes para comprar armas, que são usadas em dois ou três continentes em guerras e nas nossas ruas brasileiras.

            Enquanto isso, meus amigos de Rondônia, a sociedade teima em olhar com liberalismo para a questão das drogas!

            Ouvimos debates sobre a legalização da maconha como se não soubéssemos que tanto a maconha quanto o álcool - que infelizmente é uma droga lícita, abrem as portas para as drogas mais pesadas.

            Isso acontece, Sr. Presidente, porque acabam sendo usados precocemente por nossas crianças e nossos adolescentes, que não têm capacidade de estabelecer limites e querem desfrutar repetidamente as sensações obtidas com as drogas.

            Isso pode ser visto claramente na reportagem de O Globo, que citei há pouco. Leio aqui um trecho:

Usei oxi pela primeira vez com um cliente. Ele trouxe, deu uma fissura legal. Peguei o dinheiro que ganhei dele e fui comprar pedra. Agora, uso todo dia e me sinto bem - conta H., de 23 anos, que tem três filhos e, desde que começou a fumar, há pouco mais de um mês, não tem passado muito tempo com [seus filhos].

            Outros trechos mostram, de forma inequívoca, a forma como os traficantes pensam e as suas consequências.

            Agora, Sr. Presidente, é de assustar qualquer um a composição química dessas drogas que os traficantes estão oferecendo para meninas de oito anos, drogas que os traficantes estão persuadindo, forçando essas meninas e jovens a oferecerem com o intuito de viciar mais pessoas.

            O crack é feito com cocaína, bicarbonato de sódio e amoníaco. O oxi é uma mistura de cocaína, cal virgem e querosene.

            O cal virgem, que é o nome que se dá ao óxido de cálcio, é um produto muito utilizado na construção civil e que deve ter seu contato com a pele evitado. Em caso de inalação ou ingestão, pode causar sérios danos à saúde. O querosene é um derivado de petróleo altamente tóxico. Eles misturam isso para que as pessoas queimem e inalem seus gases.

            As nossas crianças estão inalando amoníaco, cal virgem e querosene. Elas estão morrendo por causa disso!

            Esse é um assunto, Sr. Presidente, da mais alta importância que trago nesta tarde. E peço, mais uma vez, ao nosso Ministro da Saúde, que tem tido um empenho muito grande no combate às drogas, para que dê atenção às nossas crianças. Não é uma questão de polícia, é uma questão de saúde. Nós precisamos, como diziam os nossos amigos de Jaru hoje, no telefone pela rádio, cuidar dessas crianças, dos nossos jovens que já estão dependentes. Precisamos tê-los nos hospitais. Precisamos ter os hospitais preparados para dar essa atenção aos nossos jovens. É um momento importante em que nós, brasileiros, temos que nos unir e avançar para combater esse mal que assola os brasileiros e as famílias que hoje têm, em seu meio, dependentes químicos que sofrem, não só eles mesmos, mas também toda a família.

            Sr. Presidente, muito obrigado pela sua atenção.

            Era o que eu tinha para tratar nesta tarde de hoje.


Modelo1 4/25/247:06



Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/05/2011 - Página 18121