Discurso durante a 158ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comemoração dos 68 anos de criação do Território Federal do Amapá.

Autor
Randolfe Rodrigues (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/AP)
Nome completo: Randolph Frederich Rodrigues Alves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Comemoração dos 68 anos de criação do Território Federal do Amapá.
Publicação
Publicação no DSF de 14/09/2011 - Página 37144
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • SAUDAÇÃO, AUTORIDADE, SESSÃO ESPECIAL, HOMENAGEM, COMEMORAÇÃO, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, ESTADO DO AMAPA (AP), COMENTARIO, HISTORIA, FUNDAÇÃO, TERRITORIO NACIONAL.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Obrigado, Sr. Presidente.

            Cumprimento o Exmº Sr. Presidente José Sarney, Presidente do Senado Federal e do Congresso Nacional brasileiro; o Exmº Sr. Senador Geovani Borges, Senador da República pelo Estado do Amapá; o Exmº Sr. Camilo Capiberibe, Governador do nosso querido Estado do Amapá; a Exmª Srª Deputada Dalva Figueiredo, coordenadora da nossa Bancada Federal, em nome da qual saúdo todos os demais colegas integrantes da nossa Bancada Federal; o Exmº Sr. Deputado Moisés Souza, Presidente da Assembleia Legislativa do Amapá, colaborador também da realização dos eventos deste dia de hoje; o Exmº Sr. Mário Gurtyev de Queiroz, Presidente do Tribunal de Justiça do Amapá; a Exmª Srª Alice Déa Carvão Nunes, queridíssima viúva do primeiro Governador do nosso então Território Federal do Amapá.

            Da mesma forma, quero cumprimentar todos os Colegas Deputados Estaduais aqui presentes. Saúdo os Deputados Paulo José, Cacá e Michel JK e os demais Deputados Estaduais que vieram para esta cerimônia.

            Quero, da mesma forma, cumprimentar o Deputado Charles Marques, a Deputada Estadual Sandra Hoana e o Dr. Jorge Nova da Costa, último Governador da fase Amapá Território e primeiro Governador também da fase Amapá Estado.

            Cumprimento ainda a Deputada Janete Capiberibe, os Deputados Federais Luiz Carlos, Davi Alcolumbre, Evandro Milhomen, os colegas da nossa Bancada Federal aqui presentes.

            Quero cumprimentar o amigo do Amapá Dr. João Monteiro Barros Filho, Presidente da Rede Vida de Televisão.

            Não quero deixar de cumprimentar os artistas, cantores e compositores do Amapá que vêm alegrar esta data magna da história da nossa terra.

            Diz o poeta Álvaro da Cunha:

“Tu és Amapá, o pólo térmico da América

Saldo do Sol que recriou o mundo.

Teus risos e a tua calha de Amazonas

Talham fontes e cântaros abertos

Muito mais densos que o suor dos homens

E a sede dos desertos.”

            Hoje é a data magna de nossa terra, conforme estabelece o art. 355 da nossa Constituição Estadual. O Amapá celebra hoje o 68º aniversário de sua separação do Estado do Pará e constituição como Território Federal. Mas essa história vem de outras datas. Antes mesmo da chegada dos brancos europeus, as terras da margem esquerda do estuário do Amazonas já eram ocupadas por Tapuiaçus, Marigus e Tucujus, todos pertencentes aos grupos indígenas dos Aruaques, Caraíbas e Tupis-Guaranis. A celebração que hoje fazemos é também derivada dessa origem comum dos povos indígenas. A melhor maneira de comemorar esta data é beber na fonte da história.

            Yamapaba, como era chamada pelos índios tucujus, o lugar da chuva, viveu experiências distintas nos últimos séculos decorrentes de suas singularidades: a disputa por estas terras entre os Estados europeus no século XVII, a consolidação da ocupação portuguesa no século XVIII com as experiências urbanas da Vila Vistosa de Madre de Deus, da Vila de Mazagão e da Vila de São José de Macapá, antiga Estância das Bacabas.

            O Amapá é um canto de Brasil que se tornou Brasil pela vontade de ser brasileiro. No nosso lugar, a história produziu fortes e contrafortes. Homens e mulheres com audácia inovadora forjaram sentimentos e emoções.

            Antes mesmo da chegada dos portugueses, a epopéica aventura de Yáñez Pinzón, denominava o nosso grande rio de Mar Del Agua Dulce. Hoje, sabemos que a água doce do Amazonas se estende por cerca de 320 quilômetros mar adentro. Os reflexos do nosso rio chegam até a Flórida. Christoval de Acuna, padre jesuíta do século XVI, um dos primeiros a explorar a região do Amapá assim definiu as nossas terras para o Rei da Espanha:

“As terras da Capitania do Cabo Norte, além de serem elas sós maiores que toda a Espanha junta e haver nelas muitas notícias de minas, têm pela maior parte o solo mais fértil e está para dar maiores proveitos e melhores frutos do que quantos há neste imenso rio das Amazonas.”

            A imprecisão de Tordesilhas e a determinação das outras nações européias em questionar este tratado, como é assinalado na célebre expressão de Francisco I, Rei da França, de que queria ver o testamento de Adão que disse que o mundo está dividido entre Espanha e Portugal, são as razões que levam às disputas dos séculos XVI e XVII. O Amapá foi reclamado por espanhóis, foi objeto da cobiça de ingleses e holandeses, foi disputado por franceses e portugueses, sob o triunfo desses últimos, a partir dos termos do Tratado de Utrecht, que fixa no rio Yapoco ou Vicente Yáñez Pinzón a fronteira entre as terras da França e de Portugal na América. A imprecisão de qual era esse rio levou a uma polêmica de duzentos anos.

            Os portugueses triunfam e iniciam o período colonizatório com a concessão da Capitania do Cabo Norte a Bento Maciel Parente, Governador do Maranhão e Grão-Pará. As terras do Amapá são delimitadas pela primeira vez e partem do Oiapoque até o rio Paru.

            É no período pombalino, sob o governo de Fancisco Xavier de Mendonça Furtado, que se consolida a ocupação portuguesa na região.

            É importante aqui destacar que a nossa terra é também templo das fortificações. Lá, estas foram várias: a Cumaú, dos ingleses e holandeses; as de Maiacari, de Araguari e de Macari; e a maior obra do império colonial português no mundo, a fortaleza de São José de Macapá.

            No século XIX, o Tratado de Paris, de 1817, levanta a polêmica sobre o art. 7º do Tratado de Utrecht sobre qual seria o rio Vicente Yáñez Pinzón. Surge, então, a região do Contestado entre os rios Oiapoque e Araguari.

            Vivemos no século XIX as experiências da corrida do ouro e de uma república independente em nosso território, a República do Canani. É o século em que, de fato, nós nos forjamos brasileiros. Foi aí que triunfou a vontade da sociedade amapaense em ser brasileira. Afinal, a sociedade sempre acaba vencendo, mesmo ante a inércia e o antagonismo do Estado.

            O Estado era Tordesilhas, rebelada. A sociedade empurrou as fronteiras do Brasil, criando uma das maiores geografias do mundo. O Estado, encarnado na metrópole, resignara-se ante a invasão holandesa no Nordeste. A sociedade restaurou a nossa integridade territorial com a insurreição nativa de Guararapes e Tabocas, sob a liderança de André Vidal de Negreiros, Felipe Camarão e João Fernandes Vieira, que cunhou a frase da preeminência da sociedade sobre o Estado: “Desobedecer a El-Rei, para servir a El-Rei”.

            O Estado capitulou na entrega do Acre, e a sociedade retomou sob as foices e os machados de Plácido de Castro e seus seringueiros. O Estado fraquejou sobre os corsários franceses capitaneados pelo Capitão Lunier. A sociedade recuperou o Amapá para o Brasil com os punhos de Veiga Cabral e com o sangue de idosos, mulheres e crianças da vila do Espírito Santo do Amapá que baixaram a bandeira francesa e ergueram o pavilhão nacional.

            No século XX, veio o estabelecimento da infraestrutura estatal com a instituição do território por obra do Decreto-Lei do Governo Vargas e, quarenta e cinco anos depois, com a criação do Estado. Essa obra seria impossível, Dona Alice, sem a determinação inaugural de um homem, o Capitão Janary Nunes, primeiro Governador, e também de pioneiros como Julião Ramos. Dessa aliança entre Janary, Julião e muitos outros, surge a mística do Amapá, assim definida pelo Capitão Janary:

“A mística do Amapá é o ideal de tornar o Território uma das regiões mais ricas e felizes do Brasil. (...) Cada sonho, cada esperança, cada luta, vividos para torná-la mais próspera, emprestaram-lhe força e brilho. Ela resume os anseios mais nobres de quantos batalharam para integrar o Amapá na Pátria Brasileira.

(...) O Amapá fascina. E por isso possui a sua mística. Não há ninguém que penetrando suas fronteiras - desde as margens dos rios até as fraldas do mássico das Guianas (...) Não há ninguém que não sinta essa fascinação que se irradia do ambiente e não termina cativo do seu destino.

(...) Avante, pois, amigos! O futuro tem um lugar de destaque à espera do Amapá, terra onde tudo começa. E vós o conquistareis.”

            A Janary, Saleh, Nova da Costa, Julião Ramos, Alcy Araújo, Congós, Deusolina Salles Farias - cito alguns dos pioneiros aqui representados pelos seus descendentes -, o nosso agradecimento pelos primeiros passos da realização da mística citada por Janary. As gerações que nos antecederam nos mandaram executar um serviço. É nosso dever fazê-lo com amor, aplicação e sem medo.

            Chegamos à condição de Unidade Federada da República Brasileira. Enfrentamos o desafio do enorme salto demográfico da última década do século passado e nos tornamos o mais brasileiro dentre os Estados brasileiros. Mais de 2/3 de nosso povo são imigrantes ou filhos de imigrantes.

            Lutamos para ser brasileiros. Falta ao Brasil nos reconhecer. Ao longo dos últimos 20 anos, fomos vítimas de uma injusta fórmula federativa que nos usurpou pelo menos R$6 bilhões. Essa injustiça já foi reconhecida pela Suprema Corte brasileira. Cabe, agora, por parte deste Congresso Nacional - e o faremos, Presidente Sarney, com a união de todas as lideranças políticas que aqui estão juntas, Governador, Senadores, Deputados Federais e Deputados Estaduais -, aprovar uma nova e justa forma de partilha do Fundo de Participação dos Estados.

            Amapá... Em poucos cantos do Planeta, o povo tem tantas razões para sentir orgulho quanto o nosso. Enquanto o mundo promove destruição ambiental, nós possuímos 90% do nosso território preservado. Nosso endereço é o mais fácil: a esquina do rio mais belo com a linha do Equador. Forjamos um povo diverso, miscigenado, misturado e acolhedor, que, todo dia, recebe gente de todos os cantos com carinho e com amor.

            Somos terra de poetas; impossível não sê-lo com as belezas que temos. Um deles, certa vez, exclamou: “A lua minguante do Amapá brilha mais que a lua cheia de qualquer outro lugar”. A poesia está na nossa história, que o diga Isnard, Álvaro e Alcyr. O Brasil, já dizia Álvaro da Cunha, não sabe o Amapá, o Brasil não sabe nem o quanto é grande o rio Amapá pequeno, e o rio Cupixizinho não iria também fazer por menos, mas sei, Amapá, nós dois sabemos, os rios que somos, os rios que vivemos.

            Lembro 13 de setembro de 1943. Hoje, 13 de setembro de 2011, é chegado o momento de o Amapá ser visto pelo Brasil, não mais pela porta dos fundos, mas, a partir de agora, pela porta da frente. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/09/2011 - Página 37144