Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

– Registro da reunião, ontem, dos representantes do Amapá no Congresso para discutir a situação da companhia energética daquele Estado.

Autor
João Capiberibe (PSB - Partido Socialista Brasileiro/AP)
Nome completo: João Alberto Rodrigues Capiberibe
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESTADO DO AMAPA (AP), GOVERNO ESTADUAL, POLITICA ENERGETICA.:
  • – Registro da reunião, ontem, dos representantes do Amapá no Congresso para discutir a situação da companhia energética daquele Estado.
Aparteantes
Randolfe Rodrigues, Wellington Dias.
Publicação
Publicação no DSF de 10/02/2012 - Página 1523
Assunto
Outros > ESTADO DO AMAPA (AP), GOVERNO ESTADUAL, POLITICA ENERGETICA.
Indexação
  • REGISTRO, REUNIÃO, REPRESENTAÇÃO POLITICA, SENADOR, DEPUTADOS, REGIÃO NORTE, ESTADO DO AMAPA (AP), LOCAL, CONGRESSO NACIONAL, ASSUNTO, DISCUSSÃO, SITUAÇÃO ECONOMICA, SITUAÇÃO FUNCIONAL, EMPRESA ESTATAL, ENERGIA ELETRICA, MOTIVO, AUMENTO, DIVIDA PUBLICA, GOVERNO ESTADUAL.

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Senador Moka, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, telespectadores da TV Senado, ouvintes da Rádio Senado, é uma satisfação enorme voltar a esta tribuna pela segunda vez depois de tantos anos e uma satisfação maior reencontrar Parlamentares do meu primeiro mandato e também os novos companheiros, como o Senador Randolfe, o Senador Requião e o Senador Moka.

            Nessa minha segunda intervenção no Parlamento, no Senado Federal, eu gostaria de trazer um tema antigo, um tema que é uma preocupação muito grande hoje da sociedade do meu Estado do Amapá, que tem nesta Casa três representantes: eu, o Senador Randolfe Rodrigues e o Senador José Sarney.

            Ontem, tivemos uma reunião dos representantes do Amapá no Congresso, na Câmara Federal e no Senado. Estávamos juntos lá oito Deputados Federais e três Senadores do Amapá para discutir a situação crítica que atravessa a companhia energética daquele Estado.

            A Companhia de Eletricidade do Amapá é uma das companhias que escaparam das privatizações dos anos 90. Nós sabemos que, a partir de 1995, o setor elétrico brasileiro passou por profundas transformações, profundas mudanças. Na época, eu era governador do Amapá, tinha acabado de assumir o governo do Estado do Amapá, uma região pioneira o nosso Estado, uma região de população muito pequena, de infraestrutura quase inexistente. Nós tínhamos então, nos 16 Municípios, apenas cinco que usufruíam de energia 24 horas proporcionada pela hidrelétrica Coaracy Nunes.

            Havia a intenção de privatizar essa empresa. Fomos sondados para que fizéssemos parte do processo de privatização, mas ali nós esbarramos em um grave problema, porque nós tínhamos cinco Municípios apenas integrados ao sistema de energia 24 horas, energia hidráulica. Para o restante, unidades geradoras forneciam energia de 8 a 14 horas por dia, portanto, a privatização seria restrita a esses cinco Municípios, o que condenaria o restante à escuridão.

            Nós resistimos à privatização, mas, na época, já estávamos com um passivo grande. Recebemos a companhia com um passivo importante para o qual tratamos de buscar solução. Não era só um passivo financeiro. Tínhamos também uma situação caótica de distribuição de energia. A distribuidora vivia momento de extrema dificuldade, as redes envelhecidas, tínhamos apagões permanentes, tínhamos passado, no início dos anos 90 e 91, por apagões que se estendiam por até 16 horas na capital Macapá. Então, tínhamos uma história de muita dificuldade em relação à energia elétrica e isso evidentemente limitava as possibilidades de desenvolvimento do Estado.

            Nós precisávamos de uma solução. Como não havia, nós não nos incorporamos às teses da privatização, ao sistema capitaneado pelo Ministério de Minas e Energia, pela Eletrobrás e a nossa geradora - que era a Eletronorte - estabeleceu uma espécie de cerco para forçar a privatização.

            No início do nosso Governo, tenho aqui um relatório da Eletronorte que consegui muito recentemente que reflete a dívida da Companhia de Eletricidade do Amapá com a Eletronorte, a dívida histórica - evidentemente, com valores atualizados - mostra que esse passivo começa em 1993, 1994. Quando assumimos o Governo, então, passamos a honrar todos os compromissos de suprimentos da Eletronorte. Mil novecentos e noventa e cinco foi o ano em que a companhia pagou o suprimento em dia.

            Ao mesmo tempo, nós precisávamos medir a energia vendida por essa companhia, porque ela entregava energia sem medir. Era como vender carne sem pesar. Não havia medidores nos domicílios, nas empresas. Então, entramos com um projeto na Eletrobrás de financiamento de medidores e também de troca de unidades geradoras dos interiores, que viviam na escuridão.

            Passou o ano de 1995 e não conseguimos levantar um único centavo da Eletrobrás, do Fundo de Reversão do Sistema, para que pudéssemos dotar a companhia de medidores daquilo que ela vendia, Senador Randolfe. Recebia-se energia sem saber o que estava sendo entregue.

            Em 1996, então, sabendo já que havia uma intenção de sufocar a empresa, para colocá-la no processo de privatização, tomamos a decisão de suspender, durante alguns meses, o pagamento da Eletronorte, no ano de 1996, 1997 e 1998, para investir na empresa, reduzir as perdas e tornar a companhia viável.

            Isso de fato aconteceu. Fizemos os investimentos necessários. Compramos as unidades geradoras, os medidores de energia elétrica. Demos vida nova à empresa e, a partir de 1999, retomamos a nossa relação com a Eletronorte quitando, pagando o suprimento mensal que a Eletronorte entregava à nossa concessionária, à nossa distribuidora, a Companhia de Eletricidade do Amapá.

            Assim foi em 1999, 2000, 2001. Ao mesmo tempo, tratamos de negociar a dívida.

            Tenho aqui o acordo que firmamos naquele então com o Ministério das Minas e Energia, tendo como avalista o Presidente Fernando Henrique Cardoso. Em uma reunião, firmamos o compromisso. A dívida naquele momento, dia 28 de fevereiro de 1999, era no valor de R$37.445.787,48; o prazo de carência era 24 meses; 96 parcelas com juros de 0,5% mensal e acordou-se a não incidência de qualquer reajuste monetário sobre as parcelas vincendas.

            Esse termo de acordo foi estabelecido com o Presidente da República no dia 20 de maio de 1999. Saímos de lá com tudo definido. Mais tarde, o Ministério de Minas e Energia, pelo seu Secretário Executivo, nos encaminhou um ofício modificando o termo do acordo e colocando por terra os compromissos ali assumidos. Aí nós retomamos a negociação e, finalmente, concluí meu mandato. Eu tive que renunciar, no dia 5 de abril de 2002, para concorrer ao Senado da República.

            Então, a partir de 2002, a companhia entra num processo terrível de má gestão, acumulando dívidas que chegam hoje, a preços de junho do ano passado, só com a Eletronorte, a R$1,056 bilhão.

            A Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) já havia recomendado a cassação da concessão da empresa, lá atrás, em 2006, mas o Ministério das Minas e Energia não tomou as providências. Empurrou-se com a barriga e hoje a situação é gravíssima. A solução que se está apresentando hoje é a de que o Governo do Amapá, o povo do Amapá assuma essa dívida através do empréstimo do Tesouro, o empréstimo do BNDES. Essa dívida total chega a R$1,6 bilhão para um Orçamento, neste ano, de R$3 bilhões. Seria assumir uma dívida que corresponde mais da metade do orçamento anual do Estado, o que comprometeria a capacidade de endividamento e de investimento do Amapá.

            Essa não é a alternativa definida por nossa bancada...

(Interrupção do som.)

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP. Fora do microfone.) - definida pelos três Senadores. Essa definição do Ministério das Minas e Energia, que é um sistema assemelhado ao que foi feito com as Centrais Elétricas de Goiás. Mas a gente tem que ponderar os dois Estados.

            Quero ouvir a palavra do Senador Randolfe Rodrigues.

            O Sr. Randolfe Rodrigues (PSOL - AP) - Senador Capiberibe, quero cumprimentar V. Exª que em bom momento apresenta aqui a questão dramática que vive o nosso Estado e ao mesmo tempo paradoxal. O Amapá vai se tornar uma potencia geradora de energia elétrica com a construção das hidrelétricas que está em curso agora, a Hidrelétrica de Ferreira Gomes, a Hidrelétrica do Caldeirão, a Hidrelétrica do Salto de Santo Antonio, enfim, vamos nos tornar uma potencia geradora e no momento que nos tornamos uma potência geradora, estamos sob a ameaça de perder nossa empresa distribuidora. E é bom que se diga, Senador Capiberibe, perder não por responsabilidade direta do povo do Amapá ou por responsabilidade direta do governo atual, ou por responsabilidade do Estado do Amapá. E nós não podemos aceitar em hipótese alguma. Quero concordar com V. Exª. Em torno dessa posição, estamos em uníssonos com a bancada. Nós não podemos aceitar nenhuma das duas alternativas, únicas até agora apresentadas pela União, pelo Ministério das Minas e Energia. É inaceitável aceitar passivamente a decretação de caducidade da nossa Companhia de Eletricidade e é inaceitável também aceitar que o Amapá seja tratado da mesma forma que foi tratado o Estado de Goiás, porque o Amapá não é Goiás. Nós temos um orçamento, como V. Exª destacou, de dois, três bilhões de reais, Goiás tem um orçamento dez, quinze vezes superior ao nosso. Nós não podemos aceitar um endividamento do Estado - já concluindo, Sr. Presidente - que representará gerações e gerações futuras de cidadãos amapaenses pagando por uma conta que não lhes pertence e que eles não são responsáveis. Então cumprimento V. Exª pelo discurso. Reafirmo que essa é a posição uníssona nossa. A União, o Ministério das Minas e Energia tem que encontrar entre esses dois termos uma mediação. E sabemos que é possível que ela encontre.

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP) - Muito obrigado, Senador Randolfe. O Senador conhece muito bem a situação da companhia do nosso Estado e as condições que vivemos esses anos todos. Parece ironia: quando nós não tínhamos geração, tínhamos uma distribuidora; de repente nós passamos a ter geração, que deve chegar a 500 megawatts, no entanto, a nossa distribuidora faliu, e faliu por má gestão. E o que me parece grave é que nada acontece com quem levou a companhia para esse passivo absurdo, porque cresceu nos últimos anos. Até 2006, esse passivo era de cerca de R$200 milhões, incluído juro de 1%, porque nós fechamos um acordo com juro de 0.5%. Mas a Eletronorte insiste em nos impor juro de 1% ao ano. Nem a taxa Selic cobra mais isso! Agora, imaginem, se a Selic não cobra mais 1%, está abaixo disso, a Eletronorte insiste em nos impor juro de 1% ao ano e - pasmem - multa de 10% ao ano.

            Eu tenho aqui um parecer do Tribunal de Contas da União que condena essa cobrança de juros por entes públicos. Mas para a Eletronorte, só de multa, seriam R$90 milhões. São juros que o Tribunal de Contas considera ilegais.

            Portanto, é necessário que voltemos a conversar. Eu diria até, Senador Randolfe, que colocar nas costas do povo do Amapá uma dívida sobre a qual ele não tem nenhuma responsabilidade, seria penalizá-lo demais. No entanto, se houvesse punição severa para quem contraiu essa dívida... Não se explica como, durante anos, não se pagou nem o suprimento da Eletronorte. Como é que se explica que o consumidor, se atrasar o pagamento da ...

            (Interrupção do som.)

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP) - ... [Intervenção fora do microfone] conta, tem sua luz cortada? Então, a companhia continuava arrecadando, continuava recebendo do consumidor, mas não pagava o suprimento da Eletronorte, da geração.

            São coisas estranhas que acontecem neste País e que temos que dar um basta. Ora, eu diria, e repito, que o povo do Amapá poderia até pagar essa conta, mas vendo aqueles que cometeram os desvios, a má gestão também pagando por isso, sendo punidos pela via judicial.

            No entanto, conhecemos o nosso País, onde a impunidade prevalece mesmo diante de graves crimes cometidos contra a sociedade.

            Portanto, a solução encontrada pela bancada, já que se considerou que foge à alçada do Ministro Edison Lobão, do Ministério de Minas e Energia, buscar uma alternativa para solucionar o impasse, a bancada está encaminhando uma solicitação à Presidenta Dilma, à Ministra da Casa Civil, para que juntos, bancada e Governo, encontremos uma solução justa, uma solução que contemple o povo do Amapá e que também atenda às exigências do Governo Federal.

            Sr. Presidente, muito obrigado. Agradeço ao Senador Randolfe, às Srªs e aos Srs. Senadores.

            O Sr. Wellington Dias (Bloco/PT - PI) - Senador Capiberibe.

            O SR. PRESIDENTE (Waldemir Moka. Bloco/PMDB - MS) - Senador Wellington Dias, V. Exª desejaria apartear? S. Exª já deixou a tribuna, mas se V. Exª quiser fazer algum comentário, tenho certeza de que o Senador irá ouvi-lo.

            O Sr. Wellington Dias (Bloco/PT - PI) - Só por um pequeno prazo. Primeiro, gostaria de parabenizá-lo por trazer esse tema. É um tema que, além do Amapá e de outros Estados brasileiros, envolve o meu Piauí; Alagoas. Enfim, vivenciamos juntos. Foram os Estados que não aceitaram a linha da privatização, foram os Estados que aceitaram a resistência. Creio que esse processo que o Amapá vive também é uma experiência nova para o Brasil: a Eletrobrás trabalhar como distribuidora. Estivemos agora cobrando do Ministro Lobão, que se comprometeu a ter alguém no próprio Estado. Havia uma diretoria, no Rio, que cuidava das seis ou sete empresas de distribuição. Isso dificultava muito. Quero apenas parabenizá-lo. Vivi, ainda como governador, agonia semelhante, vendo aquilo que era necessidade do meu Estado nessa área. Enquanto V. Exª estava falando ali, eu estava revivendo o mesmo drama, a mesma situação. Queria parabenizá-lo pela forma corajosa de trazer o tema. Estaremos juntos para construir alternativas que sejam boas para o Brasil do ponto de vista do povo. Muito obrigado.

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP) - Muito obrigado, Senador Wellington.

            Senador Moka, permita-me um comentário. Temos pressa em uma solução, por uma razão muito simples: a empresa está sufocada. Há oito anos a tarifa está congelada. Ora, todos os insumos aumentaram de preço. A Eletronorte aumentou o preço do suprimento, da energia produzida. A empresa está asfixiada. E precisamos de uma solução urgente. Está no vermelho? É óbvio que está no vermelho. Imaginem oito anos com uma tarifa defasada, com a tarifa congelada. E não se dá uma solução? O pior dos mundos é o mundo sem solução. Precisamos sentar, definir e resolver esse problema.

            Não é possível! Só porque o Amapá está lá no outro lado do mundo? Por que é um Estado pequeno? Aqui nós temos uma representação grande, tão grande quanto a de São Paulo. É essa representação que está falando aqui que quer uma definição.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/02/2012 - Página 1523