Discurso durante a 22ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre as críticas do Secretário–Geral da Fifa, Sr. Jérôme Valcke, acerca do andamento das obras para a Copa do Mundo de 2014; e outro assunto.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA. ESPORTE.:
  • Considerações sobre as críticas do Secretário–Geral da Fifa, Sr. Jérôme Valcke, acerca do andamento das obras para a Copa do Mundo de 2014; e outro assunto.
Aparteantes
Jorge Viana.
Publicação
Publicação no DSF de 06/03/2012 - Página 4893
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA. ESPORTE.
Indexação
  • CRITICA, ORADOR, RELAÇÃO, DESRESPEITO, COMENTARIO, AUTORIA, SECRETARIA GERAL, FEDERAÇÃO INTERNACIONAL DE FUTEBOL ASSOCIATION (FIFA), ASSUNTO, ATRASO, REALIZAÇÃO, OBRAS, CAMPEONATO MUNDIAL, FUTEBOL, LOCALIZAÇÃO, BRASIL.
  • COMENTARIO, ORADOR, ACUSAÇÃO, CORRUPÇÃO, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, RELAÇÃO, CONTROLE, RECURSOS, DESTINAÇÃO, CAMPEONATO MUNDIAL, FUTEBOL.

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco/PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Senador Anibal Diniz, Srªs e Srs. Senadores, primeiramente, mais uma vez, quero destacar que já protocolei perante a Comissão de Constituição e Justiça o relatório com parecer favorável à PEC nº 5/2012, que teve origem na PEC 270, da Deputada Andreia Zito, do PSDB, do Rio de Janeiro.

            Essa PEC, aprovada pela Câmara dos Deputados, pretende corrigir uma injustiça remanescente da Emenda Constitucional nº 41, que oferece tratamento diferenciado entre o aposentado saudável e aquele que se aposentou por invalidez, uma injustiça remanescente de um esforço do Legislativo para oferecer justiça aos aposentados do serviço público. É uma afronta ao princípio da isonomia, incompreensível. Por isso espero que, tanto na Comissão de Constituição e Justiça como neste plenário, os Senadores de todos os partidos, da Oposição e do Governo, possam, com celeridade, aprová-la para reparar essa injustiça que já tem mais de sete anos. Esses aposentados, com justificada razão, pedem celeridade, e nós temos que dar respostas celeremente.

            Por isso, recebemos na semana e hoje encaminhamos à Comissão de Constituição e Justiça o nosso parecer favorável, estabelecendo paridade entre todos os aposentados do serviço público e estabelecendo para esses aposentados por invalidez a aposentadoria integral.

            Sr. Presidente, hoje pretendo abordar outra questão em razão das indagações que são feitas pari passu.

            Nos últimos dias, neste final de semana e hoje, jornalistas indagam sobre o pronunciamento do Secretário-Geral da Fifa, Sr. Jérôme Valcke.

            Não fosse um desrespeito ao Brasil a expressão por ele utilizada, não fosse uma afronta à dignidade nacional quando ele se refere a chute, eu gostaria até de emprestar a ele a chuteira que eu já dependurei há algum tempo, porque, evidentemente, não fosse o desrespeito, nós teríamos que apoiá-lo relativamente ao que diz. A sua cobrança se justifica, não nos termos em que é colocada. Creio que, independentemente de posicionamento de natureza político-partidária, nós devemos sempre preservar a grandeza nacional, a autonomia do nosso País, a nossa soberania e, sobretudo, a nossa dignidade, o que resta de dignidade a este País.

            O Sr. Jérôme cobra que a preparação do nosso País para a Copa do Mundo segue num ritmo que a entidade não julga adequado. E nesta última sexta-feira ele cobrou os atrasos do cronograma das obras dos estádios, do sistema hoteleiro e de transportes.

            É evidente que tem razão. O que nós estamos constatando no Brasil é a incompetência, a desorganização, a anarquia, o desapreço à ética, a irresponsabilidade pública. O que nós não sabemos exatamente é o que se assumiu de compromisso junto à Fifa para que o nosso País sedeasse a Copa do Mundo de 2014. Que preço se prometeu pagaríamos para que essa Copa se realizasse aqui? Não houve transparência, só se fez o espetáculo do anúncio, mas o Brasil não foi informado devidamente, pontualmente, sobre as responsabilidades assumidas pelo então Presidente Lula.

            O que se discute hoje no Brasil como se fosse o mais importante é a chamada Lei Geral da Copa. Mas, o que se debate quando se fala em Lei Geral da Copa? O que se discute, sobretudo na imprensa, é se não podemos tomar cachaça ou cerveja nos estádios de futebol durante a realização da Copa do Mundo. Enquanto nós discutimos a cachaça e a cerveja, bilhões são desviados. Fica a impressão até de que o que se deseja é utilizar a Lei Geral da Copa para mudar o foco. Enquanto se discute e se oferece espaço a esse debate sobre a Lei Geral da Copa, nós estamos verificando que os estádios são superfaturados, os recursos são públicos, as grandes empresas, as empreiteiras de obras públicas são privilegiadas com taxas de juros subsidiadas pelo trabalhador brasileiro, através de recursos que têm origem no FAT e no BNDES, com transferências generosas do Tesouro Nacional para o BNDES. Dinheiro público na execução de obras privadas, com o povo brasileiro subsidiando.

            Vou ler apenas alguns dados para consolidar o entendimento de que estamos muito atrasados. O Secretário-Geral da Fifa diz que não entende por que as coisas não estão se movendo, os estádios não estão dentro do cronograma e por que tantas coisas estão atrasadas. Na verdade, o Governo brasileiro não se dá ao respeito. Por isso, é ofendido; por isso, é agredido; por isso, é humilhado; por isso, há esse descaso da Fifa, uma entidade internacional, evidentemente de conceito, mas que não tem o direito de estar afrontando um governo de um país como o nosso. Mas o Governo brasileiro não se impõe. Recentemente, a Presidente Dilma, quando esteve na Suíça, se reuniu com o segundo escalão da Fifa. Obviamente, isso é emblemático.

            Em vez de encaminhar o Ministro do Esporte para essa reunião, talvez porque naquele momento o Ministro estava sendo alvejado por denúncias, a Presidente, ela própria, se sujeitou a se reunir com esse senhor Secretário-Geral da Fifa. É evidente que esse fato coloca o Brasil no chão. É um País que se humilha, que dá o direito a alguém que não tem, evidentemente, esse status todo, de nos agredir dessa forma.

            Os entraves à preparação da Copa são eminentemente gerenciais. Vale ressaltar que, segundo o Tribunal de Contas, o custo estimado de todas as obras da Copa está na casa de R$25 bilhões, sendo apenas 8,8% de capital privado, repito: 8% de capital privado. E diziam, quando anunciaram a Copa do Mundo no Brasil: esta é a Copa da iniciativa privada; não vamos colocar dinheiro público. Palavras ao vento.

            Para nós que estamos aqui fazendo oposição, cumprindo o nosso dever, não é mais novidade. O que este Governo fala não se escreve. O que as autoridades públicas constituídas atualmente no Executivo nacional, o que essas autoridades falam não se escreve.

            O último atraso divulgado diz respeito a adequação e reformas em sete portos do País orçadas em aproximadamente R$900 milhões. Faltando pouco mais de dois anos para o mundial, seis dessas obras ainda nem começaram. E quando nós falamos em portos, é bom destacar aqui, recentemente, quando se fez o ranking dos portos em vinte países, os do Brasil ficaram exatamente em vigésimo lugar, ou seja, os portos estão desestruturados, estão sucateados e o Governo brasileiro está atrasado em relação àquilo que prometeu à Fifa no que diz respeito à recuperação.

            Os bancos, Caixa Econômica Federal e BNDES lideram o ranking dos recursos públicos. O jornal O Globo, em matéria divulgada recentemente, diz que o gasto com os doze estádios, previsto em R$4,1 bilhões, 57,6% acima do que foi previsto inicialmente - Mineirão; Fonte Nova; Maracanã; Cidade da Copa, em Pernambuco; e Arena, da Amazônia, são os responsáveis pela inflação na estimativa de investimento. Na conta ainda não estão incluídos os recursos para a realização do estádio do Corinthians, em São Paulo, cuja maior fonte de recurso será o BNDES. Esse estádio está orçado em mais de R$800 milhões, embora já se tenha falado também que superaria R$1 bilhão.

            O custo da construção do estádio Mané Garrincha aqui, em Brasília, por exemplo, que está sendo construído, em fevereiro passado, após nada menos do que onze aditamentos de contrato e o planejamento e a execução de duas novas licitações, a conta chega R$907 milhões, um acréscimo de R$236 milhões, e nós verificamos que, para a saúde, não há recursos; para aposentados, não há recursos; para estradas, não há recursos, estão esburacadas; não há recursos para obras de infraestrutura; para segurança pública, não há recursos; para os policiais, não há recursos para salários, mas nós estamos aqui falando de um estádio, o estádio de Brasília: R$236 milhões de acréscimo, e não sabemos o preço final dessa obra, mas já temos um acréscimo de R$236 milhões, mais de R$907 milhões para um estádio de futebol em Brasília. Quando é que vamos lotar esse estádio de futebol, depois da Copa do Mundo?

            Em relatório do dia 9 de fevereiro, o Tribunal de Contas apontou alguns procedimentos adotados pelo consórcio executor dos trabalhos e pela Novacap, que subsidia a obra, que podem explicar em parte a escalada de custos. São eles, nas exatas palavras do órgão fiscalizador:

            - Escolha de materiais sem o devido estudo de reaproveitamento, como, por exemplo, a especificação de edital das fôrmas para concreto. O mercado disponibiliza modelos que podem ser reaproveitados vinte vezes, mas, nessa obra, a Novacap especificou uma fôrma que só pode ser reutilizada três vezes;

            - Duplicidade de custos - isso tudo porque é dinheiro do povo brasileiro, é por isso que se age dessa forma - de equipamentos que estão sendo alugados mensalmente, mas que também foram previstos em gastos com outros serviços, tais como "fornecimento e aplicação de concretos", "montagem de grua", "camada impermeabilizadora" e "armadura de aço";

            - Lentidão no atendimento à determinação de detalhamento dos custos relacionados à mobilização e desmobilização, utilização de percentual indevido de encargos trabalhistas, montante de vale transporte superdimensionado, pagamento indevido de insumos não aplicados na obra e sobrepreço em alguns itens.

            Sobra dinheiro, evidentemente. Então, é essa festa, é uma festança. Isso é uma farra com o dinheiro do povo brasileiro.

            - Notas de serviços evidenciando subcontratações que não foram submetidas à análise e à aprovação formal da Novacap, o que pode resultar na execução de serviços sem o devido rigor técnico e com baixa qualidade;

            - Falhas no controle da quitação dos encargos trabalhistas da mão de obra subcontratada.

            Enquanto isso, a parceria promíscua se mantém. O Sr. Ricardo Teixeira, em que pese denúncias nacionais e internacionais, não abre mão de comandar o futebol brasileiro. Ele se sustenta no apoio que recebe graças ao poder econômico e político que tem a CBF, sobretudo em razão da Seleção Nacional de Futebol, que é um patrimônio cultural do povo brasileiro. O Sr. Ricardo Teixeira se mantém. As denúncias de corrupção aqui, as denúncias de corrupção na Europa, as irregularidades constatadas, inquérito da Polícia Federal, ações judiciais na Justiça Federal, mas ele permanece intocável, porque há autoridades públicas do Executivo, do Legislativo e do Judiciário que lhe oferecem sustentação e, sobretudo, há um conluio com cartolas de clubes e federações que garantem a sua permanência à frente da CBF. O Governo brasileiro não deveria aceitar essa parceria.

            O Sr. Jorge Viana (Bloco/PT - AC) - Senador Alvaro, um aparte, por gentileza?

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco/PSDB - PR) - Vou concedê-lo, com prazer, ao Senador, antes dizendo que o Governo brasileiro não deveria aceitar essa parceria promíscua, até porque a imagem de qualquer governo se torna temerária quando aceita parceria desta natureza, sobretudo, porque, como disse antes, apenas 8,8% dos recursos - e é o Tribunal de Contas da União que faz o balanço - da Copa do Mundo são recursos privados, o restante é de natureza pública e, portanto, cabe ao governo sim conduzir esse processo. O governo obteve do Congresso Nacional tudo o que desejou: flexibilização da legislação de licitações, flexibilização da lei de responsabilidade fiscal, até mesmo através de medidas provisórias afrontosas a Constituição, o Congresso Nacional ofereceu ao governo tudo aquilo que o governo pediu a pretexto de agilizar os procedimentos para a realização de uma Copa do Mundo que pudesse oferecer internacionalmente uma boa imagem e um conceito de competência do nosso país.

            Eu vou conceder com prazer a V. Exª o aparte que me solicita, com a maior satisfação.

            O Sr. Jorge Viana (Bloco/PT - AC) - Muito obrigado. Eu queria cumprimentar V. Exª, que tem uma das atuações mais contundentes, é um dos Senadores que mais trabalha nesse Senado - com todo respeito aos demais colegas -, e tem uma missão que não é nada fácil de fazer uma oposição como V. Exª tem feito, com a competência que a vida pública lhe deu de respaldo. Mas o meu aparte é em função do discurso de V. Exª sobre a crise, que é real, que nós estamos vivendo às vésperas da realização da Copa do Mundo. É fato concreto, o Brasil tem agora o privilégio, isso foi uma conquista do Brasil, eu tenho colocado, falado do quanto foi importante para o Presidente Lula, todos que se envolveram diretamente nessa busca de trazer para o Brasil dois grandes eventos: as Olimpíadas e a Copa do Mundo. Isso é resultado desse Brasil que estamos construindo. Começou com mudanças ainda no governo e do partido que Exª sabe, eu falo isso diariamente, no Presidente Fernando Henrique, e o Presidente Lula aprofundou tudo isso. Agora conseguimos algo fantástico, depois de 60 anos trazer a Copa do Mundo para cá. Mas eu confesso que eu fico estarrecido diariamente quando abro os jornais e vejo que veio recentemente agora um funcionário da FIFA e fala algo sobre as autoridades brasileiras e sobre o Brasil, que a gente não pode repetir na tribuna do Senado. É de dar chute no traseiro por conta de atraso, e há obviamente uma situação inusitada. Tem o Ministro Aldo, com a capacidade, a competência, a seriedade que o acompanha, tentado fazer que a autoridade brasileira prevaleça. Vem um funcionário da FIFA e fala o que fala. E a CBF é como se tivesse num canto. Então, essa situação é muito grave. Eu acho que o Brasil não vai ter sucesso se não resolver previamente essa situação. A CBF sempre foi, independente de cor partidária, um problema no Brasil. Todo mundo quer descobrir por que e como as coisas funcionam ali. Eu falei aqui do Senado: é uma caixa-preta. Falei aqui da tribuna, no ano passado, que está na hora de nós tirarmos esse pano que encobre isso. E o brasileiro é apaixonado por futebol. Agora, além da paixão, que já seria suficiente para desvendarmos os mistérios da CBF, nós temos também a situação de sermos a sede do evento de maior audiência do Planeta, que é a Copa do Mundo. E nós precisamos ter autoridade na preparação, durante e depois desta Copa do Mundo. V. Exª tem razão: está mais do que na hora! E aqui estão oposição e situação falando a mesma linguagem. Está mais do que na hora de o brasileiro ter uma satisfação. E penso que o Governo tem um papel importante, porque, como bem colocou V. Exª, os governos estaduais e o Governo Federal é que estão trabalhando fortemente para que esta Copa seja uma referência para o mundo. O Brasil, que é uma referência no futebol, tem de ser uma referência de organização nesta Copa. E, com a CBF vivendo a crise que vive, com o futebol brasileiro, ou os cartolas do futebol envoltos numa crise, não acredito que esta Copa vá ter a transparência necessária, a organização e a eficiência necessárias, muito menos o sucesso que nós esperamos. Então, parabéns a V. Exª por passar mais uma vez aqui preocupações muito pertinentes. Muito obrigado.

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco/PSDB - PR) - Senador Jorge Viana, primeiramente o agradecimento pelas palavras generosas. V. Exª sempre competente e elegante. Foi um governador bem-sucedido e hoje um Senador que cumpre aqui o seu papel. Estamos em partidos diferentes, em lados opostos, mas eu tenho de reconhecer mérito na atuação de V. Exª, recentemente, inclusive, numa matéria complexa, como a do Código Florestal, e V. Exª teve um desempenho elogiado por todos nós.

            E, sobretudo, reconhecer que há mazelas que devem ser combatidas. E esse é o papel da oposição, mas não só da oposição. Aqueles que dão sustentação ao Governo possuem autoridade também para combater determinadas mazelas. E nós estamos diante de um impasse que pode ter um significado de desmoralização total para o nosso País se não houver correção de rumos. Se nós continuarmos nesse ritmo de lentidão de procedimentos e, sobretudo, sem nenhum respeito á ética, sem nenhum apreço ao dinheiro público, nós vamos chegar à realização da Copa do Mundo, oferecendo uma péssima imagem ao mundo e legando ao povo brasileiro uma herança maldita.

            Sem dúvida, é essa a principal preocupação que nos traz à tribuna no dia de hoje.

            O chute que vem de lá merece o nosso repúdio, porque não é dessa forma que se trata um país; não é dessa forma que se trata um governo. Mas, quanto aos argumentos usados em relação a atrasos, a desempenho, a gerenciamento, a aplicação de recursos, a competência administrativa, nós não temos o que refutar. Ao contrário, temos de assinar embaixo.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/03/2012 - Página 4893