Discurso durante a 47ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre o horário de transmissão do programa “A Voz do Brasil”.

Autor
Benedito de Lira (PP - Progressistas/AL)
Nome completo: Benedito de Lira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
IMPRENSA, TELECOMUNICAÇÃO.:
  • Considerações sobre o horário de transmissão do programa “A Voz do Brasil”.
Publicação
Publicação no DSF de 29/03/2012 - Página 8624
Assunto
Outros > IMPRENSA, TELECOMUNICAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, RELAÇÃO, VOTAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, PROJETO DE LEI, CAMARA DOS DEPUTADOS, REFERENCIA, OBRIGATORIEDADE, TRANSMISSÃO, VOZ DO BRASIL, EMISSORA, RADIODIFUSÃO, REGISTRO, CONTESTAÇÃO, ORADOR, FATO, FLEXIBILIDADE, HORARIO, PROGRAMA, RADIO.

            O SR. BENEDITO DE LIRA (Bloco/PP - AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, trago na tarde-noite de hoje um assunto que é recorrente ultimamente no País e tramita hoje nesta Casa do Congresso Nacional. É um assunto que, ao longo de mais de 70 anos, era pacífico, tranquilo e agora virou motivo de mobilização, de entendimento, de corre para lá e para cá, para tentar viabilizar e mudar. Tenho muito medo dessas mudanças, Sr. Presidente. Vamos mudar para melhor e, depois, é para acabar. Eu me refiro, Sr. Presidente, ao horário de transmissão do programa A Voz do Brasil.

            Há uma campanha, pela Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e Televisão, para mudar o horário: tirá-lo das 19 horas às 20 horas para colocá-lo no horário que mais convier às emissoras, com a alegação de que nesse horário não existe absolutamente audiência, o que não é verdade. Pelos levantamentos que têm sido feitos, pelas pesquisas encomendadas, não é essa a razão maior.

            Qual é o motivo maior? É tirar A Voz do Brasil para botar jogo de futebol. Jogo de futebol tem o tempo inteiro, os horários já estão previamente estabelecidos de 20 horas, 21 horas por diante.

            Então, Sr. Presidente, há mais de uma década assistimos a um debate sobre o tema: mudança do horário de transmissão do programa A Voz do Brasil.

            No Governo Federal, no Congresso Nacional, na Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão e entre inúmeros profissionais ligados aos meios de difusão, o assunto tem sido discutido com frequência, provocado a realização de incontáveis reuniões e motivado a publicação de inúmeros textos, artigos, projetos legislativos e outras formas de manifestação.

            Em 1º de dezembro de 2010, em pronunciamento sobre o assunto, esta Casa aprovou o Projeto de Lei da Câmara dos Deputados, PLC nº 109, de 2006 (origem no Legislativo, Câmara dos Deputados, PL nº 595/2003), de autoria de Deputada Federal Perpétua Almeida, cuja ementa é a seguinte: “dispõe sobre a obrigatoriedade de emissoras de radiodifusão transmitirem o programa oficial dos Poderes da República, alterando o art. 38 da Lei nº 4.117, de 27 de agosto de 1962 (Código Brasileiro de Telecomunicações - CBTC)”.

            O Projeto de Lei, Sr. Presidente, da referida Deputada, com pareceres favoráveis das Comissões de Ciência e Tecnologia, de Comunicação e Informática e de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara dos Deputados, está em vias de ser encaminhado ao Plenário daquela Casa, para votação final. De acordo com sondagens recentes, devido às fortes pressões que estão sendo feitas em favor de sua aprovação, ele conta com boa chance de se transformar em lei.

            No entanto, a matéria em questão, que expõe a intenção de alterar o art. 38 do Código Brasileiro de Telecomunicações, para que possa constar do seu texto a flexibilização do horário de transmissão do programa, entre 19 e 22 horas, pelas emissoras comerciais e comunitárias privadas e pelos veículos de comunicação educativos, vinculados aos Poderes Legislativos, federal, estadual e municipal, tem causado grande polêmica.

            De acordo com a proposição, o horário total do noticiário permanecerá o mesmo. Assim, os 60 minutos de programação continuarão distribuídos da seguinte maneira: 25 minutos para o Poder Executivo; 5 minutos para o Poder Judiciário; 10 minutos para o Senado Federal e 20 minutos para a Câmara dos Deputados.

            No que se refere às divergências de opinião existentes, convém destacar que, ao longo da tramitação do projeto, surgiram três posições distintas. A primeira, de caráter mais extremo, defende, pura e simplesmente, o fim da transmissão obrigatória. A segunda, apoia as regras atuais, ou seja, a obrigatoriedade da emissão, com horário único e fixo. Finalmente, a última posição, que preconiza a flexibilização, é a proposta que deverá ser votada em breve. É importante assinalar que a matéria conta com a simpatia do Governo e com o apoio declarado da Associação Brasileira de Empresas de Rádio e Televisão, que, aliás, tem feito forte lobby sobre os Deputados Federais pela sua aprovação.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, gostaria de aproveitar esta oportunidade para me manifestar contrariamente à flexibilização, que, a meu ver, descaracteriza o programa de rádio mais antigo do Brasil, prejudica o interesse público e favorece a iniciativa comercial privada, que quer tomar conta do horário. A posição que deveríamos adotar é pela obrigatoriedade da transmissão do programa e pela manutenção do seu formato atual. É com esse perfil que A Voz do Brasil presta, há quase 80 anos, um relevante serviço ao povo brasileiro.

            A Voz do Brasil, criada em 1935, durante o Governo Getúlio Vargas - queiramos ou não -, faz parte da história da radiodifusão brasileira e não deve ser desvirtuada. É o noticiário mais antigo do rádio brasileiro e de todo o Hemisfério Sul. Apesar de ser detentor desse patrimônio histórico, de levar a informação aos recantos mais longínquos do território nacional e de informar com isenção, a milhões de brasileiros, o que se passa no Executivo, no Legislativo e no Judiciário, seu formato atual está sendo questionado por poderosos interesses econômicos e políticos.

            Para as empresas privadas de comunicação e seus aliados, o programa ocupa, inutilmente, um horário nobre, que poderia muito bem render milhões de reais de lucro. Além disso, acham que ele está completamente ultrapassado pelos novos tempos e pela presença das mídias altamente desenvolvidas, que têm o poder de levar a notícia para qualquer lugar em tempo real.

            Ora, Sr. Presidente, isso é uma assertiva que, na verdade, não corresponde àquilo que nós conhecemos nos mais longínquos Municípios e lugares do Brasil. Nem todo mundo tem acesso à informática, Sr. Presidente; nem todo mundo tem um tablet na mão, Sr. Presidente; nem todo mundo sabe o que é isso, Sr. Presidente. As pessoas ficam querendo questionar esse assunto porque, na verdade, o interesse é totalmente diferente. Não é o interesse de bem informar a sociedade, mas é o interesse eminentemente econômico, financeiro, para ganhar mais, e é muito prático isso.

            O que eu acho mais interessante, e me assusta inclusive, é que conta com o apoio das duas Casas do Congresso Nacional. As coisas, Sr. Presidente, estão mudando consideravelmente. Eu sei perfeitamente que a tecnologia avança com toda a força, só que lá no sertão do Nordeste brasileiro, lá nos rincões da Paraíba, as pessoas têm pouca leitura e não sabem mexer com tecnologia desses equipamentos que nós estamos vendo diariamente. É exatamente por essa proposição que dizem que a coisa mudou, mas o homem do campo, o homem que mora na zona rural realmente ouve, as pessoas pensam que não, mas ele ouve o seu rádio. Praticamente todos eles o têm na cabeceira da cama - lá está o radiozinho dele para ouvir a notícia, para que ele possa acompanhar o que acontece.

            E as emissoras comerciais, nos seus horários comerciais, não transmitem nenhuma matéria de interesse da sociedade brasileira, a não ser aquilo que, na verdade, possa dar maior rentabilidade aos seus programas.

            Para as empresas privadas de comunicação e seus aliados, Sr. Presidente, o programa cumpre inutilmente um horário, repito. Mas, na verdade, isso é totalmente divergente daquilo que a gente presencia no resto do Brasil.

            Segundo esses agentes, os atuais veículos de informação são sofisticados e fazem parte do Brasil moderno, informatizado, totalmente urbanizado, industrial e poderoso economicamente. Em contrapartida, eles dizem que, nesses 77 anos de existência, A Voz do Brasil pouco mudou. Mas ela não pode mudar, Sr. Presidente. Ela não pode mudar por uma razão muito simples: é a transmissão permanente das ações que são praticadas nos poderes constituídos; são os assuntos que dizem respeito ao que é feito nos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.

            Essa matéria é feita diariamente; ela não é repetida. A Voz do Brasil de hoje não é A Voz do Brasil de amanhã. A Voz do Brasil de ontem não foi A Voz do Brasil de hoje. Todos os dias há notícias novas e importantes, como decisões adotadas, assuntos ligados ao Judiciário, processos julgados, decisões tomadas. E essas decisões são levadas no dia, na hora, pelo rádio; não é por meio da informática; não é por meio dos tablets, Sr. Presidente. Não é pelos meios de modernidade, não, mas pelo rádio, que é o meio de comunicação - e ninguém se engane - mais ouvido no País.

            Por isso, Sr. Presidente, como disse no início deste pronunciamento, não é de hoje que A Voz do Brasil enfrenta resistências. Nos últimos anos, ela teve de lutar contra inúmeras ações judiciais que contestavam a difusão do programa em seu horário tradicional. Algumas rádios que entraram com esses processos reivindicavam, por exemplo, transmitir jogos de futebol no horário oficial do programa. Mas, graças à lucidez dos juízes, todas elas foram rejeitadas.

            Por fim, é importante relembrar que os empresários de comunicação, quando compraram ou receberam suas concessões de rádio, conheciam perfeitamente as regras do jogo e não se opuseram ao horário.

            Eminentes Senadores e Senadoras, em dezembro de 2010, o Instituto de Pesquisa e Opinião Meta divulgou os resultados de uma enquete sobre: “Hábitos de Informação e Formação de Opinião da População Brasileira II”, que estão disponíveis no site da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República.

            O levantamento, cuja amostra representou 12 mil domicílios particulares, escolhidos em todas as regiões do País, realizou 12 mil entrevistas, com pessoas de ambos os sexos, maiores de 16 anos.

            De acordo com aquele instituto, na interpretação dos dados referentes ao programa A Voz do Brasil, as conclusões foram as seguintes. Entre os ouvintes de rádio, o que corresponde a 75,9% dos entrevistados, 56,3% consideraram importante ou muito importante a veiculação de A Voz do Brasil e 22,7%, ou seja, mais de 31 milhões de pessoas, declararam que costumavam acompanhar o programa.

            Por sua vez, no quesito referente à obrigatoriedade de sua transmissão, as Regiões Nordeste, Sul e Sudeste apresentaram índices inferiores a 50% de aceitação. Mesmo assim, no Nordeste, 49,8% concordaram com a obrigatoriedade. Todavia, no Sul, 36,1% se mostraram favoráveis; e, no Sudeste, apenas 31,4% aprovaram. Em contrapartida, no Centro-Oeste e no Norte, 50,8% e 60,1%, respectivamente, disseram sim à obrigatoriedade.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, como podemos observar, os dados da pesquisa revelam, claramente, que, ao contrário do que é divulgado pelas empresas privadas de comunicação, a obrigatoriedade da divulgação diária de A Voz do Brasil, entre 19 horas e 20 horas, é de grande importância para milhões de brasileiros, sobretudo para aqueles que vivem na cidade, no interior e no campo.

            Finalmente, não podemos nos esquecer que, ao contrário do que dizem os críticos, A Voz do Brasil é um verdadeiro instrumento da democratização da notícia. Podemos dizer, igualmente, que o programa transmite aquilo que as emissoras comerciais não dizem.

            Por isso, acredito que a flexibilização pode ser vista como o primeiro passo para acabar de vez com esse programa de relevante envergadura para a comunicação dos assuntos republicanos, Sr. Presidente. Daí a minha contrariedade. Gostaria que esta Casa e a Câmara dos Deputados, ao apreciarem esta matéria, a rejeitassem.

            Esse é o primeiro passo, Sr. Presidente, na minha observação, para acabar de vez com A Voz do Brasil, um programa que foi construído ao longo de quase 80 anos, mas que agora tenhamos que tirá-lo do ar para atender a determinados interesses, que não são interesses republicanos, mas interesses de ordem pessoal. São interesses econômicos; não são interesses para a sociedade brasileira, para aqueles que vivem bem distantes da capital da República e dos centros urbanos, sejam eles de maior ou de menor densidade demográfica.

            Por isso, espero que as Casas do Congresso Nacional possam manter A Voz do Brasil exatamente para preservar a dignidade da República Federativa do Brasil.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/03/2012 - Página 8624