Discurso durante a 89ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações acerca do desenvolvimento da CPMI do “caso Cachoeira”.

Autor
Fernando Collor (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/AL)
Nome completo: Fernando Affonso Collor de Mello
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO.:
  • Considerações acerca do desenvolvimento da CPMI do “caso Cachoeira”.
Publicação
Republicação no DSF de 29/05/2012 - Página 21924
Assunto
Outros > COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO.
Indexação
  • COMENTARIO, DESENVOLVIMENTO, INVESTIGAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, ACUSAÇÃO, ORADOR, DESTINAÇÃO, ROBERTO GURGEL, PROCURADOR GERAL DA REPUBLICA, ERRO, ORIENTAÇÃO.
  • ACUSAÇÃO, LIGAÇÃO, ROBERTO GURGEL, PROCURADOR GERAL DA REPUBLICA, PROPRIETARIO, PERIODICO, VEJA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), REU, ACUSADO, PARTICIPAÇÃO, CORRUPÇÃO, SOLICITAÇÃO, COMPARECIMENTO, JORNALISTA, OBJETIVO, OBTENÇÃO, INFORMAÇÃO, BENEFICIO, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO.

            O SR. FERNANDO COLLOR (Bloco/PTB - AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente desta sessão, Senador Mozarildo Cavalcante; Srªs e Srs. Senadores, desde o início dos trabalhos da CPMI, Sr. Presidente Mozarildo Cavalcanti, que investiga os negócios do Sr. Carlos Cachoeira, propus e defendi que a primeira pessoa que deveríamos ouvir seria o Procurador-Geral da República. Em seguida ouviríamos os delegados da Polícia Federal responsáveis pelas investigações das operações Vegas e Monte Carlo, bem como os procuradores responsáveis pelos respectivos inquéritos.

            A intenção era exatamente a de, em primeiro lugar, termos uma visão global dos inquéritos por meio do depoimento do Sr. Roberto Gurgel, responsável pelo oferecimento da denúncia ao Supremo Tribunal Federal. Daí, partiríamos, então, para o específico, ouvindo os delegados presidentes dos respectivos inquéritos e os procuradores responsáveis pelos mesmos inquéritos.

            Esta seria, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a opção mais racional, como orienta o princípio básico de se partir do geral para o específico. A verdade é que alguns líderes aceitaram a inversão da lógica e isso se reflete agora, nas críticas quanto à falta de norte que a CPMI supostamente estaria apresentando.

            Contudo, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, surpreendeu-me a reação despropositada e absolutamente desproporcional do Sr. Roberto Gurgel. Tanto foi que ele chegou ao ponto de, por meio de conversas com alguns Senadores, enviar recados velados, associando a proposta de sua convocação a processos outros que estão em vias de julgamento pelo Supremo Tribunal Federal, além de outras aberrações alegadas.

            A única explicação plausível para esse tipo de resistência descabida seria o peso na consciência por atos, falhas ou omissões cometidas pelo Procurador-Geral em algum momento anterior desse processo, transpondo uma mera questão particular sua, de cunho pessoal seu, para um pesado litígio institucional.

            A mesma inversão o Sr. Roberto Gurgel faz com relação ao seu impedimento de depor na CPMI. Quem ficaria supostamente impedido de atuar no Supremo Tribunal Federal por ter testemunhado nos autos do processo? Seria ele, pessoa física, e não a instituição da Procuradoria-Geral da República. Além disso, há que se lembrar que a Constituição não prevê nenhum tipo de cargo ou representação que seja insubstituível, a começar pelo Presidente da República, que possui quatro substitutos para os seus impedimentos, ausências e vacância.

            A indagação que se faz agora é que tendo o Procurador-Geral respondido por escrito às indagações formuladas pela CPMI, se não estaria ele, a partir de agora, impedido de vez de atuar no Supremo Tribunal Federal? Que diferença existe entre um depoimento escrito e um depoimento oral? Ambos são igualmente testemunhos, com os mesmos efeitos jurídicos, sejam eles quais forem.

            Existe até a prioridade, no âmbito do processo judicial, do escrito sobre a oralidade. Assim, estando ele impedido agora, por que, então, não comparece a esta CPMI, quem sabe até por livre e espontânea iniciativa? Que grande contribuição não poderia dar ele não somente à CPMI, mas à República e à sociedade brasileira! Afinal, o requerimento de sua convocação ainda aguarda deliberação na comissão.

            Sobre a celeuma acerca de uma provável atitude de procrastinação por parte do Sr. Roberto Gurgel em relação ao inquérito da operação Vegas, o fato é que, até agora, ninguém explicou o porquê de ele e a Subprocuradora Cláudia Sampaio Marques não terem tomado qualquer providência quanto àquele processo.

            Há quem afirme, com base nos Códigos Penal e de Processo Penal, na Lei - sempre a ela me refiro como ressurreta - nº 1.079, de 1950, na Lei Complementar nº 75, de 1993, na Lei nº 8.625, de 1993, e nas Resoluções nºs 13, de 2006, e 77, de 2011, do Conselho Nacional do Ministério Público, que neste caso desta omissão há, sim, materialização de crime de prevaricação e, no mínimo, de improbidade administrativa por descumprimento de prazos a que estão sujeitos os procuradores no trato e nos desfechos de inquéritos, nos quais se enquadram, acima de tudo, o dever de decidir e o prazo razoável, ou seja, absoluta obediência ao princípio do dever de ofício.

            Quanto a esse aspecto, o testemunho escrito enviado pelo Procurador-Geral em resposta às indagações feitas pela CPMI - em que pese o seu esforço de justificar - constitui, isso sim, uma cabal comprovação daquela sua postura.

            Sobre suas alegações, faço o seguinte relato, com algumas ponderações, para as quais peço, com a devida vênia, a devida atenção, Sr. Presidente, Mozarildo Cavalcanti, Srªs e Srs. Senadores.

            O Procurador-Geral da República, em sua resposta oferecida por escrito às interpelações formuladas pela CPMI, afirma que recebeu - as datas são importantes para que nós tenhamos uma perfeita noção do grave crime de prevaricação que ele cometeu -, em setembro de 2009, os autos do Inquérito nº 042/2008, acompanhados da Medida Cautelar de Interceptação Telefônica nº 2008.35.00000871-4, levada a efeito pela Polícia Federal no bojo da operação Vegas, que tramitavam, até então, no Juízo Federal de Anápolis, em Goiás.

            A remessa desses autos ao Procurador-Geral da República havia sido determinada pelo Juiz Federal de Anápolis, por ter ele se deparado com indícios de envolvimento de autoridade com prerrogativa de foro no Supremo Tribunal Federal. Afirma o Procurador-Geral que analisou o material recebido do juiz e não observou existência de fato penalmente relevante que pudesse ensejar a instauração de inquérito no Supremo Tribunal Federal.

            Muito bem. Alega, então, que não remeteu os autos àquela instância máxima, para fins de arquivamento em relação às autoridades com prerrogativa de foro, porque a tramitação do feito no tribunal revelaria a existência da investigação. Optou, então, segundo ele, por sobrestar o inquérito, no intuito de possibilitar a retomada das interceptações telefônicas e da investigação - afirmação dele.

            Registra, ainda, o Procurador-Geral, que o sobrestamento é procedimento corriqueiro no curso de investigação envolvendo a atuação de organizações criminosas, para esperar o momento mais oportuno de obtenção de provas mediante interceptação telefônica.

            Ocorre que, efetivamente, nenhuma medida investigativa foi, em nenhum momento, tomada pelo chefe do Ministério Público. Ele não solicitou diligências, não requereu interceptações telefônicas, não fez absolutamente nada. E pior: obstou o seguimento das investigações que corriam na primeira instância, na Justiça Federal de Anápolis, porque simplesmente não restituiu os autos, como deveria ter feito - uma das alternativas seria essa - àquele juízo.

            Em relação à sua justificativa para o sobrestamento, há que se perguntar se é usual o retardamento por mais de dois anos - dois anos e meio para ser mais preciso - para a retomada de investigações.

            Afinal, até quando o Procurador-Geral pretendia esperar o tão aguardado - segundo ele - momento mais eficaz do ponto de vista de formação de prova e fornecimento de informações?

            Ainda no seu testemunho escrito, o Sr. Roberto Gurgel diz que em março de 2011 - ou seja, 18 meses após o mencionado sobrestamento a que ele alude, do inquérito relativo à operação Vegas - teve a confirmação de que a investigação da organização criminosa continuava - palavras dele estas agora - promissoramente. Argumenta que, diante dessa confirmação, ele não poderia deixar de manter o sobrestamento, para aguardar a sequência das investigações e a deflagração de futura operação policial, que veio a ocorrer em 29 de fevereiro de 2012, um ano mais tarde. Um ano mais tarde!

            Logo no mês seguinte, ainda de acordo com a sua resposta escrita, ele recebeu parte do Inquérito nº 89, de 2011, relativo à operação Monte Carlo, contendo aqueles casos fortuitos a que ele se referiu em conversas reservadas, em ameaça velada - pelo menos assim nos pareceu - a alguns integrantes deste Congresso, casos esses fortuitos que surgiram no curso das investigações.

            Assim, ao afirmar que recebeu o inquérito da Operação Vegas em setembro de 2009 e que tomou conhecimento da operação Monte Carlo em março de 2011, o Procurador-Geral tropeça na própria torpeza ao menos três vezes. Primeiro, ao deixar de apurar por quase dois anos, numa ação descontrolada, fatos que ao seu juízo seriam graves. Segundo, ao confessar saber que três Parlamentares federais estavam sendo investigados. E terceiro, por defender como fortuito algo esperado, conforme sempre afirmou.

            Basta repetir suas palavras: “Decidi sobrestar o inquérito no intuito de possibilitar a retomada das interceptações telefônicas e da investigação que a toda evidência se afigurava extremamente promissora”.

            Ora, Srªs e Srs. Senadores, Sr. Presidente Mozarildo Cavalcanti, ora, evidente e promissora, nesse contexto, podem ser sinônimos de fortuito. A verdade, Sr. Presidente, é que todos sabem - e os delegados que depuseram perante a CPMI afirmaram inequivocamente - que não houve nenhum liame entre as operações Vegas e Monte Carlo. Elas desaguaram, por absoluta coincidência, na organização criminosa comandada pelo Sr. Carlos Cachoeira. Mas a segunda operação, a Monte Carlo, foi deflagrada sem que os delegados sequer tivessem notícia da primeira.

            Aliás, a operação Monte Carlo teve início em 2011, mais de um ano após o Procurador-Geral ter sobrestado o inquérito da operação Vegas.

            Além disso, a operação Monte Carlo foi iniciada pelo Ministério Público de Goiás. Foi ele que, verificando haver entre os investigados um policial rodoviário federal, enviou o que havia sido apurado para a Polícia Federal e esta deu continuidade à investigação.

            Portanto, o Sr. Roberto Gurgel, ao contrário do que diz, não se amparou em nenhuma razão republicana ou legal para manter o sigilo do inquérito da Operação Vegas.

            Finalmente, em seu testemunho escrito, o Procurador-Geral afirma que, em 27 de março, peticionou ao Supremo Tribunal Federal, requerendo a instauração de quatro inquéritos para apurar fatos relacionados a autoridades com prerrogativa de foro naquela Corte; e destaca, por derradeiro, que “tais inquéritos foram instaurados com apoio, exclusivamente, no relatório de encontros fortuitos extraídos da chamada operação Monte Carlo”.

            Vejam, então, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que o próprio Procurador-Geral admite nada ter feito em relação à operação Vegas, a não ser sobrestá-la e obstar o seguimento das investigações no âmbito da primeira instância. Foi isso que aconteceu. Ora, se os inquéritos, tardiamente instaurados no Supremo Tribunal Federal, tivessem por base apenas as informações ditas fortuitas, obtidas no bojo da operação Monte Carlo, é fácil deduzir que nada, absolutamente nada foi feito em relação à operação Vegas.

            Se, no seu vislumbre, não havia fatos penalmente relevantes atribuídos a autoridades com prerrogativas de foro, então, que o Sr. Procurador solicitasse diligências ou buscasse mais informações. Afinal de contas, não foi à toa que o Juiz Federal de Anápolis ordenou a remessa dos autos à Procuradoria-Geral da República, com vistas, claro, ao Supremo Tribunal Federal.

            No mínimo, o Chefe do Ministério Público, se continuasse persuadido da inexistência de materialidade, deveria ter restituído os autos à Justiça Federal de Primeira Instância para prosseguimento das investigações.

            Provavelmente, dentro do período de setembro de 2009 a março de 2011, as gravações fortuitas teriam revelado o cometimento de crimes por parte de autoridades com prerrogativa de foro no Supremo Tribunal Federal. Mas, infelizmente, Srªs e Srs. Senadores, Sr. Presidente, isso não foi feito pelo Sr. Procurador-Geral. E, graças a essa omissão, essa organização criminosa do Sr. Carlos Cachoeira pode atuar, livre e destemidamente, por 18 meses, sem ser perturbada. A conclusão é das senhoras e senhores que nos ouvem e que nos assistem.

            Em resumo, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o fato é que o Sr. Roberto Gurgel nada sobrestou; ao contrário, omitiu-se ou prevaricou, falhou com a verdade, ao afirmar a necessidade de se retomarem as interceptações telefônicas e outras diligências.

            Ao confirmar que verificou, no inquérito policial da Operação Vegas, a inexistência de qualquer fato com relevância penal, ele tinha o dever legal de arquivá-lo no prazo de 15 dias, como prevê o Código de Processo Penal. Mas, ao engavetar o inquérito - repito: ao engavetar o inquérito -, que não chegara a nenhum ilícito penal, tinha apenas o intuito de guardar a peça processual e utilizá-la, provavelmente, como moeda de troca.

            No engavetamento da Operação Vegas, sem as formalidades legais, ou seja, com despacho de arquivamento, o Procurador agiu de forma criminosa, já que um membro do Ministério Público que atua em qualquer entrância ou instância tem de agir nos estritos limites da legalidade.

            Dentro dos princípios da obrigatoriedade e da legalidade, Sr. Presidente Mozarildo Cavalcanti, um membro do Ministério Público, na apreciação de um inquérito policial, tem somente três condutas possíveis: o arquivamento, a denúncia ao juiz ou a devolução para novas diligências. Não há outra atitude a ser tomada. O Sr. Roberto Gurgel desprezou solenemente o princípio da obrigatoriedade.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a resposta do Procurador-Geral à CPMI, invocando o instituto da ação controlada, para tentar justificar o seu ato ou o seu não ato, é um acinte ao Congresso Nacional. Na prática, ele chamou todos os parlamentares de ignorantes, já que qualquer rábula ou mesmo um gramático sabe que ação controlada não prescinde de uma ação.

           A Lei nº 9.034, de 1995, citada pelo Sr. Gurgel, traz os requisitos indispensáveis à ação controlada. Esta consiste em retardar a interdição policial do que se supõe a ação praticada por organizações criminosas ou a ela vinculada, desde que mantida sob observação e acompanhamento, para que a medida legal se concretize no momento mais eficaz do ponto de vista da formação de provas e do fornecimento de informações. É isso que se diz ser uma ação controlada. No caso, ele não manteve nem mandou manter ninguém ou nada sob observação ou acompanhamento. Não havia nenhuma medida legal em andamento, portanto, passível de se concretizar.

           Ao afirmar que, se tivesse dado continuidade às investigações da Operação Vegas, não teria o êxito que teve na Operação Monte Carlo, o Sr. Roberto Gurgel ofende o Supremo Tribunal Federal e o próprio Ministério Público da União. Para ele, como se depreende, os Procuradores da República que atuam em Goiás e o juiz federal que autorizou as escutas telefônicas são mais operacionais do que ele, Sr. Gurgel, e do que os Ministros do Supremo Tribunal Federal.

           Em suma, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, mais do que nunca, precisamos de uma verdade definitiva, de uma versão contundente da postura do Procurador-Geral da República. Precisamos disso. A República precisa disso, até porque, à medida que essas especulações se agravam, vêm à tona novos fatos semelhantes de procrastinação ou, como ele diz, de sobrestamento.

            Pior ainda, Sr. Presidente, são as referências ainda mais danosas que estão aparecendo e que envolvem o nome do Sr. Roberto Gurgel, a começar pela perseguição e implacável campanha que ele tem feito contra a indicação da Câmara dos Deputados do Conselheiro Luiz Moreira Gomes Júnior, em sua recondução ao Conselho Nacional do Ministério Público.

            Contudo, Sr. Presidente, mais grave ainda é o costume do Procurador-Geral de se utilizar de colegas e de assessores na coleta de informações de toda ordem, como tem ocorrido com vários de seus procuradores mais próximos.

            Espero, sinceramente, não ser essa conduta, esse método uma constante corriqueira, uma habitual mania da instituição que ele chefia. E digo isso, Sr. Presidente Mozarildo Cavalcanti, Srªs e Srs. Senadores, uma vez que coube exatamente aos procuradores responsáveis pelos inquéritos das Operações Vegas e Monte Carlo o vazamento aos repórteres Gustavo Ribeiro e Rodrigo Rangel, da revista Veja - sempre ela metida nessas falcatruas! -, dos autos dos processos da 11ª Vara Federal de Goiás. Imaginem, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a gravidade desse assunto, desse gesto, desse ato! Esses processos da 11ª Vara Federal de Goiás, vale acentuar, estão sob segredo de Justiça e foram vazados por dois procuradores, a mando do Sr. Roberto Gurgel.

            São esses, Sr. Presidente, os mesmos procuradores, Srª Léa Batista de Oliveira e Sr. Daniel de Rezende Salgado, que, com o mesmo argumento usado pelo Sr. Roberto Gurgel quanto ao suposto impedimento legal, solicitaram o adiamento de seus depoimentos na CPMI.

            Sr. Presidente, não quero e não posso acreditar que alguns membros do Ministério Público atuem como fonte de jornalistas, tal qual o Sr. Carlos Augusto Ramos e seu grupo. E o pior é que há o vazamento de documentos que estão sob segredo de Justiça. Se confirmados, Sr. Presidente, esses atos devem ser tipificados como crimes. São atos que ferem profundamente a dignidade de uma instituição encarregada de defender os interesses da sociedade.

            Por tudo isso, cada vez mais, convenço-me de que o norte desta nau, que é a CPMI, aponta para a revista Veja. Esta, pelo visto, tem seu comportamento sorneiro de fazer reportagens generalizado por diversos jornalistas sob o comando do Sr. Policarpo Júnior. Este era quem distribuía, com presteza, pela lucratividade e pelo prestígio, as informações obtidas de fontes ilegais e de quem deveria combater o crime. Manipulava os insumos recebidos não no interesse público, não em prol da sociedade, mas, sim, para obter vantagens, primeiramente para si próprio, em troca de prestígio profissional, e, depois, para o seu patrão, Sr. Roberto Civita, e para sua revista. Atuava, assim, como um autêntico armador de equipe, planejando as jogadas em busca do lucro para o seu grande incentivador e padrinho, aqui já citado algumas vezes, Sr. Roberto Civita.

            Já pensaram todos se os demais procuradores passassem a agir como tem feito o chefe da Procuradoria-Geral? Imaginem todos se o Procurador-Geral tivesse denunciado esse esquema criminoso que conhecia e os elementos que tinha em mão ainda em 2009, antes das eleições! Já pensaram se essa revista tivesse também denunciado desde o início a organização criminosa da qual se valia como fonte de informação inesgotável durante quase dez anos? Será que estaríamos vivendo os momentos tenebrosos pelos quais estamos hoje passando?

            A meu ver, Sr. Presidente, esse semanário, a revista Veja, cujos métodos rasteiros já perduram por mais de duas décadas, pode ser o fio que devemos puxar para desfazer esse novelo, que são os negócios escusos do Sr. Carlos Cachoeira e a prevaricação e, no mínimo, a falta de responsabilidade funcional do Sr. Roberto Gurgel. O Sr. Carlos Cachoeira e o Sr. Roberto Gurgel estão unidos em uma mesma teia, em que a aranha é a revista Veja e aqueles que regurgitam em torno dela.

            Sr. Presidente, Mozarildo Cavalcanti, Srªs e Srs. Senadores, para as atividades ilícitas no âmbito da Administração Pública e as fraudes licitatórias de empreiteiras, dispomos de órgãos vários, como a Controladoria-Geral da República e o Tribunal de Contas da União. Para as relações não republicanas do esquema Cachoeira com deputados e senadores, dispomos dos Conselhos de Ética das duas Casas do Congresso, bem como do Supremo Tribunal Federal. Para os negócios ilegais envolvendo governadores, dispomos das respectivas assembleias estaduais e do próprio Superior Tribunal de Justiça. E, para a própria atuação criminosa do grupo Cachoeira, dispomos da Polícia Federal e da Justiça brasileira. A todos esses órgãos, a CPMI poderia prestar valioso auxílio se começássemos de fato por onde ninguém se dedicou a investigar.

            Esse é um entendimento que, à primeira vista, poderia não proceder, caso todas as apurações e investigações tivessem começado pela própria CPMI. Mas, como eu disse, desde o início, Sr. Presidente Mozarildo Cavalcanti, Srªs e Srs. Senadores, essa Comissão Parlamentar Mista de Inquérito, diferentemente de todas as outras já ocorridas, deu início aos seus trabalhos já no fim de um processo judicial, quando todos os inquéritos, elementos e provas já estão em pleno andamento, próximos de um desfecho. Começamos, assim, pelo caminho inverso. Não por outro motivo, as dificuldades de oitivas e de acessos documentais têm prevalecido em nossos trabalhos.

            Por isso, reafirmo que a nós, na CPMI, restaria, primordialmente, começar nossas investigações pelas suspeitas relações entre a revista Veja e todas as suas fontes criminosas. E isso não seria controlar a imprensa, não! Não queiram confundir! Nada tem a ver com o controle de imprensa ou com liberdade de informação, absolutamente nada! Tem a ver com a liberdade que cada um de nós tem de apontar os crimes que são cometidos em quaisquer áreas da atividade humana. E a atividade jornalística é uma delas. Por que jornalistas, agora, podem ficar imunes a qualquer tipo de crítica ou ataque a uma má conduta? Por quê? Em que se diferenciam de nós? Têm de responder pelos seus crimes!

            Defender o sigilo da fonte não é suficiente, porque o sigilo da fonte não pode servir de trincheira para acobertar atividades criminosas. Quem assim age é coautor do crime praticado e, portanto, passível de uma intimação, no mínimo, para depor e explicar exatamente os limites das suas atividades. E isso não seria, como eu disse, controlar a imprensa, muito menos cercear sua liberdade. Seria tão somente, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, investigar o modus operandi de um veículo específico, a revista do Sr. Civita. Essa revista e seus jornalistas são, juntamente com o Procurador-Geral da República, a maior fonte de informação à nossa disposição para chegarmos a um bom e esperado termo ao final dos nossos trabalhos.

            O Sr. Procurador-Geral da República, Sr. Roberto Gurgel; a revista Veja, com o Sr. Roberto Civita, com o Sr. Policarpo Júnior e outros que tais; e o Sr. Carlos Cachoeira estão indelevelmente ligados, vinculados, grudados, colados nestas duas operações: a primeira é chamada Vegas; e a segunda, Monte Carlo. A eles, é feito o convite, a convocação, a solicitação, o pedido, para que, em nome de suas próprias consciências, em nome da verdade, em nome das profissões que exercem, em nome da República brasileira e da sociedade do nosso País, venham à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito e apresentem as suas defesas e as informações de que dispõem.

            Era isso o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente Mozarildo Cavalcanti, Srªs e Srs. Senadores.

            Agradeço a V. Exª, Sr. Presidente, o tempo que me foi concedido.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/05/2012 - Página 21924