Discurso durante a 204ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Relatório das experiências vividas por S.Exa. como Presidente da representação brasileira do Parlasul.

Autor
Roberto Requião (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PR)
Nome completo: Roberto Requião de Mello e Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), ECONOMIA INTERNACIONAL.:
  • Relatório das experiências vividas por S.Exa. como Presidente da representação brasileira do Parlasul.
Aparteantes
Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 06/11/2012 - Página 58587
Assunto
Outros > MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), ECONOMIA INTERNACIONAL.
Indexação
  • REGISTRO, RELATORIO, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, REPRESENTAÇÃO, BRASIL, PARLAMENTO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), ENFASE, BUSCA, ALTERNATIVA, CRISE, ECONOMIA INTERNACIONAL, RESULTADO, PROPOSTA, COOPERAÇÃO, INTEGRAÇÃO, PAIS, AMERICA DO SUL, ANALISE, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, PAIS ESTRANGEIRO, EUROPA, AMERICA DO NORTE, ASIA, ECONOMIA NACIONAL, RESISTENCIA, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, ECONOMIA, AMBITO INTERNACIONAL, REFERENCIA, NECESSIDADE, RENOVAÇÃO, MODELO ECONOMICO.

            O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Presidente Anibal Diniz, de início, como frequentador assíduo das segundas-feiras, como o Senador Mozarildo, o Senador Cristovam e a Senadora Ana Amélia, solicito a V. Exª um pouco de tolerância com o tempo, porque pretendo apresentar uma espécie de relatório da experiência que tive nas últimas duas semanas.

            Nas duas últimas semanas, Senador Pedro Taques, como Presidente da representação brasileira do Parlasul, eu participei de dois encontros internacionais. O primeiro, no México, no foro de Guadalajara, reuniu especialistas do mundo para debater alternativas de políticas econômicas à crise financeira global. Posteriormente, em Lima, no Peru, participei do Parlamento andino com o mesmo objetivo. Os debates em Guadalajara foram estimulantes, mobilizadores. Economistas latino-americanos e europeus repudiaram com força as receitas de sempre do mercado. Ao invés da persistência em políticas econômicas fracassadas, como teimam os norte-americanos e os europeus, nós discutimos a premência, a necessidade, a inevitabilidade da integração latino-americana como meio de enfrentar a crise, buscando o nosso próprio caminho em direção ao desenvolvimento econômico e ao bem-estar dos nossos povos.

            Concluímos, enfim, que o nosso destino é a unidade, a cooperação, a integração. Vimos que os acordos bilaterais com que nos procuram amarrar os países imperiais condicionam-nos ao atraso, à dependência, à eterna condição de produtores e exportadores de commodities. A unidade latino-americana em torno de um projeto comum de desenvolvimento verdadeiramente será a efetivação da independência do nosso continente.

            Já em Lima, no Parlamento Andino, agitamos a mesma ideia de integração, de entrelaçamento de nossos destinos. Procuramos fazer ver que a crise oferece uma oportunidade rara para os nossos países, que arruína o insucesso das políticas econômicas conservadoras, ortodoxas, e empurra-nos à invenção do nosso próprio caminho, e que ele passa ao largo dos pressupostos do capitalismo global. É a ideia de que o ideograma chinês que grafa a palavra “crise” é o mesmo ideograma que grafa a palavra “oportunidade”, a ideia de oportunidade.

            E defendemos, ainda, em Lima, a crença, a percepção de que os nossos Parlamentos, os Parlamentos regionais, como o Parlasul e o Parlamento Andino, onde nossos povos estão representados, podem constituir, sim, espaço privilegiado não apenas do debate, mas também de tomada de decisões em favor da integração continental.

            É com as lições desses dois encontros em mente que volto os olhos para o nosso País, examinando tantas correntes que ainda nos mantêm presos a princípios, aos fundamentos de uma política econômica que se estiolou, que caiu do galho, depois murchou e morreu, embora pareça que ainda não nos apercebamos de uma forma mais realista disso.

            Alguns economistas brasileiros afirmam que o Brasil só avança com o partido da crise. Sem crise, o imperialismo invade todos os polos de poder e sua ideologia pela submissão e dependência invade incessantemente todos os olhos, ouvidos e cérebros, se rogando como a explicação para a aparente estabilidade e para os possíveis lampejos de progresso e prosperidade.

            Na crise, os serviçais do imperialismo não sabem o que fazer, mas o povo, em desespero, cobra respostas. Na crise abre-se o espaço para soluções ousadas, para rupturas, Senador Suplicy, ruptura que, aliás, será inevitável em razão da crise e do desespero, mas que, na mão do estadista, poderá conduzir positivamente para uma nova e boa direção.

            Getúlio Vargas no Brasil e Cárdenas no México, para citar dois exemplos latino-americanos, ascenderam ao poder de formas diferentes, mas ambos só tiveram espaço para chegar, para ascender e fazer o que audaciosamente se propuseram realizar em função da grande crise dos anos 30.

            Chegou a hora de o partido da crise assumir o poder. A crise econômica e geopolítica que poderá vir, que se anuncia para antes do final de 2014, não encontrará o mundo preparado para responder da forma que se respondeu à crise de 2008. Em 2008, o mundo respondeu à crise de forma cooperativa, cada país resolvendo os seus problemas e buscando crescer sem exportar o desemprego. Agora, as circunstâncias são outras, graças à ascensão de forças conservadoras na Europa e nos Estados Unidos - nos Estados Unidos com o famoso Tea Party e na Europa com a filosofia da Srª Merkel.

            As Nações e os blocos econômicos estão se armando para exportar a crise para fora. Como disse a Presidenta Dilma, os países desenvolvidos estão promovendo guerras cambiais, estão aumentando o protecionismo, estão reduzindo os gastos públicos, esperando que os empregos sejam cobertos com mais exportações e menos importações.

            A Europa já começou a reduzir seus gastos públicos de forma cruel, Senador Suplicy, buscando copiar o modelo alemão de austeridade pública e economia voltada para a exportação. O atual motor mundial, a China, que muda o comando agora, mostrou que não pretende responder à crise que se avizinha com a mesma intensidade de expansão dos gastos públicos e consumo como fez em 2008/2009.

            Terá, este ano, provavelmente, o menor crescimento econômico em décadas. Nos anos 30 foi assim: os países reduziram seus gastos públicos, esperando contar com as exportações para reduzir o desemprego, mas a maioria fez isso ao mesmo tempo em que as exportações caíram ao invés de aumentarem. A resposta de muitos países foi aumentar os gastos militares para gerar empregos e tirar o povo da miséria. A guerra acabou sendo estimulada ou pelo temor dos vizinhos, que responderam por ainda mais gastos militares, ou pela necessidade de justificar esse maior investimento em armamentos. É a máxima de Lord Acton, o teórico da democracia: “Pode-se fazer quase tudo com uma baioneta, menos sentar-se em cima dela”.

            O mundo hoje ruma para uma situação que nos faz lembrar os anos 30. A retórica diz que precisam reduzir dívidas públicas colossais, mas essa não é a única razão. Há uma tentativa clara de exportar desemprego através de cortes de gastos e desvalorização de moedas. Expansão cambial, desvalorização de moedas, austeridade interna e exportação para, hipoteticamente, compensar a redução interna de empregos. Empurrada pela Alemanha, a Europa está reduzindo, perigosamente, os gastos públicos e o consumo privado, o que leva ao aumento do desemprego. Ao mesmo tempo, aposta na grande expansão monetária e consequente desvalorização do euro, esperando que as exportações e redução das importações possam gerar empregos em volume suficiente.

             Na Inglaterra, a política é idêntica. Nos Estados Unidos, o Federal Reserve está fazendo uma política monetária ainda mais agressiva, que, de fato, tem ajudado a reduzir o déficit comercial nos últimos anos, assim como tem aumentado significativamente o emprego na indústria exportadora. É o oxigênio de que precisava o Obama para enfrentar as teses do Tea Party e seu adversário nas eleições presidenciais.

            O Partido Republicano está propondo que se copie o modelo alemão de austeridade fiscal, e parece que, a partir do próximo ano, poderá fazer alguma coisa nesse sentido através do chamado abismo fiscal, que está sendo engendrado no Congresso norte-americano pela não prorrogação de aumentos de gastos e cortes de impostos da era Bush e da era Obama.

            Europa e Estados Unidos querem tomar de volta os empregos industriais que perderam para a China e Ásia nos últimos 20 anos, mas, diferentemente de 2009, parece que, dessa vez, a China não quer cooperar. Está preferindo apostar em menor crescimento, em vez de apostar em aumento dos gastos públicos e do consumo interno. Ou seja, a China também está apostando, Senador Diniz, no crescimento das exportações. Mas esse crescimento das exportações decididamente não virá, porque todos estão cortando gastos públicos e o consumo também - há corte no consumo - e estão aumentando o protecionismo. Logo, a mim se me afigura que a crise será inevitável.

            Ela pode ser suave e levar a uma estagnação prolongada ou ser abrupta, caso ocorra algum choque inesperado, como foi, no passado recente, a quebra do Lehman Brothers. Esse choque pode ser qualquer coisa, desde a saída da Grécia da Zona do Euro até algo inimaginável neste momento. Parece que a saída da Grécia foi evitada de uma forma recente e súbita com a flexibilização da Srª Merkel.

            O fato é que os países não vão responder à crise como em 2008, ampliando os gastos públicos. E isso, na soma das atitudes de cada país, será absolutamente mortal para a economia planetária.

            Vamos examinar, agora, Senador Diniz, Senador Suplicy, o nosso quintal. Em 2009, a crise foi branda na América Latina; foi uma marolinha, não foi o tsunami anunciado, porque os preços das commodities se recuperaram rapidamente em razão da imediata resposta chinesa à crise. Hoje, o Brasil e a maioria da América Latina são ainda mais dependentes das exportações de commodities. Quando vier a crise, não haverá saída com a manutenção do mesmo modelo primário exportador ou no mesmo modelo neoliberal de privatizações, de desnacionalização e de juros altos.

            Ilustremo-nos pela realidade brasileira. A situação do balanço de pagamentos está calamitosa. No ano passado, o País teve um déficit de quase US$55 bilhões em transações correntes. Esse déficit está sendo cobrado principalmente com o crescente endividamento externo e desnacionalização, chamada no jargão de mercado de investimento externo.

            Mas esse crescente passivo externo tem levado a buracos cada vez maiores na conta de pagamento de juros e lucros no exterior, cujo déficit anual passou de US$8 bilhões, em 1992, para incríveis US$47 bilhões, em 2011.

            Esse é o preço da crescente desnacionalização da economia brasileira. O pagamento exagerado de juros e lucros explica boa parte do déficit em conta corrente. Mas não é tudo. Além da desnacionalização, o Brasil também está vivendo uma reprimarização ou desindustrialização e crescente dependência tecnológica.

            O boom das commodities gerou um significativo aumento do superávit comercial na última década; porém, a desnacionalização e a dependência de tecnologia e serviços estrangeiros cresceram muito mais. Em menos de 20 anos, o déficit na conta corrente de serviços comerciais passou de 3 bilhões para 38 bilhões, fazendo com que a balança comercial atingisse um déficit de bens e serviços de quase 8 bilhões.

            O tão festejado superávit da balança de exportações de bens - 30 bilhões em 2011 -, decorrente do boom das commodities, não permite nem eliminar o déficit comercial de bens e de serviços.

            Infelizmente, nosso Governo e nossa mídia apenas informam o superávit comercial de bens e nada dizem sobre o déficit comercial total de bens e de serviços. Além do déficit comercial de bens e de serviços, observamos um grande declínio da nossa planta exportadora em favor dos produtos primários ou produtos básicos.

            O mais assustador é que esse déficit comercial ocorre em um momento em que os preços das commodities exportadas pelo nosso País ainda estão, Senador Diniz, em níveis de recorde.

            Esse aumento inédito do preço das commodities salvou o País de uma crise muito séria, e o Governo de enfrentar a decisão de acabar de uma vez por todas com o modelo neoliberal implantado por Fernando Henrique Cardoso.

            A crise só não é maior, neste momento, em função da seca norte americana e de uma quebra nos Estados Unidos de mais ou menos 50% da produção de grãos.

            Graças a essa folga nas contas externas, o Governo pôde dar um passo à frente na questão social, sem romper, no entanto, com o modelo econômico implantado nos anos 90. Entretanto, o preço foi pago pelo setor manufatureiro e décadas de capacitação tecnológica e industrial que definhou nos últimos 10 anos.

            O Brasil teve um robusto superávit comercial na indústria até 2007. E, inclusive, até 1989, tinha superávit ou equilíbrio comercial em alta, média-alta, média-baixa e baixa tecnologia industrial.

            A Abimaq publicou um estudo mostrando que, em 1980, o Brasil produzia industrialmente mais do que a Coreia do Sul, a Tailândia, a Malásia e a China juntas. O último balanço que nós temos - que é de 2010, não de 2012 - nos informa que nós não chegamos a produzir industrialmente mais do que 15% do que produzem esses países. Da superioridade, passamos a uma produção equivalente a 15%.

            Entretanto, a partir de 2009, o Brasil passou a ter déficit até mesmo em média e baixa tecnologia. Nem mesmo o superávit de US$18 bilhões em baixa tecnologia foi capaz de impedir que tivéssemos um déficit comercial de bens industriais de US$30 bilhões.

            Esse superávit robusto em baixa tecnologia decorre do fato de que os termos de troca têm sido bastante favoráveis ao Brasil. Preços de commodities começaram a subir a partir do último trimestre de 2001 e, ao final de 2010, já haviam aumentado em nada menos do que 75%, já deduzida a inflação. Como o Brasil é um exportador líquido de commodities, a elevação dos seus preços traduziu-se também em uma melhora expressiva nos termos de troca. É aquela diferença das trocas internacionais, tão proclamada pelo Brizola, que sofreu uma relativa inversão nesse período de tempo.

            Nesse mesmo período, do quarto trimestre de 2001 ao quarto trimestre de 2010, essa variável teve uma melhora de 34%.

            A relação altamente favorável entre os preços de exportação e de importação tem garantido um superávit comercial de bens superior a US$23 bilhões no acumulado dos últimos 12 meses, até abril de 2012. Porém, apesar desse robusto saldo comercial, o altíssimo pagamento de juros e lucros para o exterior tem levado o País a ter um déficit em conta corrente de R$50 bilhões, financiado principalmente com o crescente endividamento e desnacionalização de empresas brasileiras.

            Se os termos de troca - a razão entre cotação de vendas e compras externas - estivessem, hoje, nos níveis de 2005, quando estavam próximos à média histórica do Brasil, o Brasil teria, nos 12 meses, até abril de 2012, um rombo, na balança comercial de bens, de US$25 bilhões, em vez de um superávit de US$23 bilhões, segundo os cálculos do J.P. Morgan. A piora de quase US$50 bilhões no saldo comercial faria o déficit em conta corrente pular dos atuais US$50 bilhões para quase US$100 bilhões.

            Esse choque no preço das commodities, certamente, aconteceria em um momento de crise nos mercados financeiros internacionais. E esse déficit de US$100 bilhões não poderia ser coberto com financiamento externo. O Brasil sofreria, certamente, um forte ataque cambial.

            Presidente, vou precisar de um pouco mais do que três minutos para concluir essa intervenção.

            Obrigado, Presidente.

            Neste caso, os US$333 bilhões de reservas cambiais não fariam frente aos mais de US$1,2 trilhões de passivo externo líquido.

            Nessa situação, o modelo econômico e social dos últimos 10 anos não teria e não terá mais viabilidade alguma. Não será mais possível manter a economia crescendo, baseado nas políticas sociais e no consumo de produtos importados, financiados por crescente desnacionalização. Não será mais possível manter o tripé do Armínio-Malan-Pallocci: superavit primário, meta de inflação, câmbio flutuante.

            O ataque cambial inevitável levará à necessidade de controle cambial. A meta de inflação será necessariamente ultrapassada, porque a taxa de câmbio poderá passar tranquliamente dos R$3,00. Os gastos públicos terão de ser elevados para impedir uma recessão muito forte. A saída dos últimos 10 anos para impedir que a meta de superavit primário não conduzisse à recessão foi incentivar o crédito ao consumo interno. No entanto, essa saída já mostra sinais de que está esgotada.

            As famílias brasileiras já estão bastante endividadas e já não se mostram mais capazes de aumentar seu endividamento: 50% a menos na venda de motocicletas, um indicador significativo do desespero da tal classe média anunciada, o que tem levado, de forma geral, à forte queda de consumo de bens duráveis.

            O Governo terá que desistir de mais uma tentativa de aumentar o crédito ao consumo, primeiro porque as importações de bens supérfluos do exterior deverão ser reduzidas na crise; segundo, porque o comprometimento médio das famílias com o serviço da dívida hoje no Brasil, talvez já seja, Senador Suplicy, o maior do Planeta.

            Enfim, haverá uma ruptura. Para o bem ou para o mal. O modelo económico neoliberal, com ou sem "sensibilidade social" não funcionará mais.

            Essa ruptura poderia ser no sentido de uma submissão absoluta, total, ao FMI, com a volta do PSDB ou das suas teses econômicas ao poder, ou o rompimento com as políticas neoliberais.

            A proposta que o mundo nos oferece é do novo tratado de Methuen, o tratado do vinho do Porto - a troca de vinho do Porto sem gravames para a Inglaterra, com a compra por Portugal sem gravames dos tecidos ingleses -, que acabou com toda a possibilidade de desenvolvimento de Portugal e drenou o ouro do Brasil, levado para Portugal, para os interesses ingleses, deixando Portugal condenado ao atraso.

            Senador Suplicy, que Deus, os anjos e todos os santos nos preservem e guardem dos Malans, dos Aridas, dos Armínios, dos Gustavos Francos ou dos Loiolas e, sem a menor sombra de dúvida, dos Meirelles!

            Ruptura tanto com o neoliberalismo do mais puro extrato que os tucanos representam, como com o neoliberalismo de baixos teores, com filtro social, que boa parte do PT defende!

            Maquiagens, medidas quebra-galhos são remendos que não se sustentam e precisam ser substituídos ou recosturados sequentemente.

            Ruptura, Senador Suplicy! Radicalização na busca de saídas! Afora isso, é conversa mole para o povo dormir e se iludir.

            Ruptura, Srs. Senadores! Romper para sobreviver, romper para construir a mais generosa de todas as utopias: a utopia de um mundo novo e solidário para todos.

            As políticas que a Europa nos propõe, os tratados bilaterais têm encontrado a resistência do Governo da nossa Dilma, têm encontrado a resistência dos discursos do nosso Ministro da Fazenda, mas em doses homeopáticas. O momento é de alopatia, de remédios fortes e firmes, de rompimento com o neoliberalismo e de construção de uma nova política. O momento é o do Mercosul, é o da unidade sul-americana, é o da entrada da Venezuela, é o do estímulo ao crescimento do mercado interno.

            Talvez, Senador Suplicy, seja o momento criado por George Washington logo depois da independência norte-americana, um Alexander Hamilton mandando para o Congresso Nacional um tratado de manufaturas, rompendo com a ideia de Adam Smith e de David Ricardo, que se inspirou, quando construiu sua proposta neoliberal, sem nenhuma dúvida, no Tratado de Methuen, o Tratado do Vinho do Porto, o Tratado que liquidou Portugal.

            É um momento de recriação não das teorias econômicas, mas de uma prática com coragem de crescimento do nosso bloco, do Mercosul, da América Latina, com a resistência absurda das elites peruanas, com a vitória do Hugo Cháves na Venezuela, que, aliás, é agora saudado por nosso Mendonça de Barros em artigos consistentes publicados pela imprensa nacional.

            Ruptura. Ascensão do partido da crise, coragem nas medidas tomadas. O Governo brasileiro está no caminho certo, mas homeopatia não resolve o problema. O caminho é certo, mas está sendo trilhado, a meu ver, com pouca coragem e muito vagarosamente.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - V. Exª me concede um aparte?

            O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - Com todo o prazer, Senador Eduardo Suplicy, dou-lhe um aparte.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - V. Exª fez uma análise de profundidade, Senador Roberto Requião, sobre os riscos que o Brasil enfrenta em época de crise e sobre os caminhos corajosos com os quais procura estimular a Presidenta Dilma e o nosso Ministro da Fazenda, Guido Mantega, como principal condutor da política econômica. E, sobretudo, assinala quão importante é que nós possamos dar o apoio necessário para que a produção industrial brasileira, com tecnologia dinâmica, possa efetivamente fazer com que cresçamos não apenas na área de commodities, mas também naquilo que o Brasil, nos anos 80, como V. Exª aqui registrou, já mostrou que é capaz de ter: uma indústria com uma tecnologia bastante avançada, à altura de competir com as principais nações. V. Exª ressalta também a importância de avançarmos na integração latino-americana do Mercosul. Estou de pleno acordo com esse propósito. Acho muito importante que avancemos com coragem. Ainda mais agora, eu acho que há não apenas a perspectiva de a Venezuela estar bem entrosada com os países do Mercosul, mas também a perspectiva de, logo, as instituições do Paraguai mostrarem que ali o povo deseja, de fato, também uma democracia para valer. Assim, poderemos integrar mais países no âmbito do Mercosul. V. Exª assinala, em seu pronunciamento, aquilo que está por acontecer nos Estados Unidos amanhã. Permita que eu aqui faça uma ponderação e expresse uma preferência clara. Economistas, como, por exemplo, Paul Krugman, têm assinalado os riscos que poderão advir, se, porventura, o candidato republicano Mitt Romney vier a vencer. Em que pese, às vezes, limitações e até eu gostaria que houvesse, por vezes, conforme V. Exª assinala, ainda mais ousadia e coragem por parte do Presidente Barack Obama, mas eu tenho aqui como que uma confiança de que, por tudo que ele fez até agora, inclusive por aquilo que ele representa, quando, por exemplo, em 28 de agosto de 2008, foi escolhido da primeira vez na Convenção Democrata, escolhendo para essa data os 45 anos do aniversário de I have a dream, de Martin Luther King Junior, quando ele expressou os seus anseios e sentimentos maiores de construir uma sociedade efetivamente solidária. Quero aqui expressar - até aos norte-americanos, muitos dos quais amigos nossos - que amanhã os Estados Unidos têm uma decisão de enorme importância, que repercutirá sobre o Brasil e a América Latina, mas, avalio que as diretrizes propostas, representadas pela plataforma do Presidente Barack Obama, serão bem melhores para a humanidade, para os Estados Unidos, para caminharmos na direção de efetiva paz social, e, daí, com menos guerras, e possivelmente também uma melhor integração das três Américas e, sobretudo, com o respeito ao desenvolvimento do nosso Mercosul. Meus cumprimentos a V. Exª.

            O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - Não vejo exatamente assim, Senador Suplicy.

            É evidente que a minha simpatia, como a sua, é pelo Obama, mas a minha simpatia não é pela política econômica do Obama, nem pelas suas posições em relação ao Brasil e à América Latina, que são exatamente as mesmas de Bush e, aliás, com a mesma equipe. É pela conciliação racial dos Estados Unidos. A reconciliação dos Estados Unidos consigo mesmo, 30 anos depois do Mississipi em Chamas, do racismo da Ku Klux Klan. Isso realmente foi formidável.

            Mas, o Obama tem caprichado na tentativa de desunião da América do Sul. Os Estados Unidos é que patrocinam, defendem a cisão do Paraguai; optam pelos acordos bilaterais. Há a tentativa desesperada de nos tomar a saída pelo Pacífico, pelo Acordo do Pacífico com o México, Chile e Peru, para evitar que o Brasil tenha uma saída, que se integre como grupo econômico. E a política do Tea Party, o abismo promovido no congresso nacional pela direita, de certa forma não é o discurso do Obama, mas, na prática, é exatamente a política que ele pratica.

            Tirando esse aspecto social de reconciliação dos Estados Unidos consigo mesmo, eu, como você, se votasse nos Estados Unidos, votaria no Obama, porque na nossa balança o peso dele é mais interessante do ponto de vista humanitário, do ponto de vista da humanidade, mas acho que a política econômica do Mittney e do Obama é exatamente a mesma. O Obama disfarça essa política com o discurso liberal. É aquela velha história de transformar direitos individuais em política pública, que contamina também um pouco a nossa política brasileira, ao mesmo tempo em que afasta a discussão da macroeconomia e dos grandes problemas nacionais.

            Nós vemos o Congresso debruçado sobre os direitos individuais, com os quais eu comungo. Inclusive, sou relator de um projeto importantíssimo da Senadora Marta Suplicy na Comissão de Direitos Humanos. São legítimos, mas não são exclusivos. Eu vejo é uma cortina de fumaça em cima da discussão dos grandes problemas. Assim como eu tentei mostrar aqui que nós não estamos nessa situação, que se fala em 333 bilhões de reservas contra 1,2 trilhão de furo, numa crise que pode surgir a qualquer momento. Ou até mais, segundo cálculos, por exemplo, daquele economista filho de Plínio de Arruda Sampaio, que tem colocado na Internet e nas entrevistas que tem dado no Brasil inteiro.

            E nós estamos cobrindo isso com o quê? Com falsas notícias de que a compra de empresas brasileiras, que é extraordinariamente negativa para nós da maneira como é feita, e os investimentos especulativos estão nos dando vantagem na balança.

            Nós não estamos bem, e o meu elogio à política econômica do governo é um elogio com reticências. Eu acho que a política não é corajosa, ela é correta, mas coragem falta; ela não é aprofundada, ela não tem a velocidade suficiente, e nós podemos, sim, ser atropelados pela crise, sem dúvida alguma. E não acho “Graça” nenhuma - e esse graça em letra maiúscula e entre aspas - nessa história da falta de petróleo no fim do ano. Isso é falta de planejamento, falta de ação. Estamos vivendo uma crise de iniciativa nos investimentos públicos no Brasil, e, via de consequência, nos investimentos privados, porque quando o Estado não se mexe, o clima é negativo.

            Então, vejo com pessimismo a falta de ação do Governo que eu apoio. E apoio porque acho que está correto, apoio porque a alternativa é a política do PSDB, esse Tea Party brasileiro do PSDB que joga o Brasil para trás.

            E não quero atribuir ao PT a crise, porque, afinal, eu não sou um tolo, ela vem desde 1980 com um processo de ilusão, com aumento de preços das commodities no mundo, puxado pelo avanço da economia chinesa. Nós esquecemos o Mercosul, nós esquecemos da industrialização, nós esquecemos de tudo, porque o acordo com o capital que sustentava o nosso governo na mídia foi compensado com políticas sociais.

            Mas V. Exª, que é economista - eu não sou -, sabe melhor do que eu que uma inflação, que pode vir nesse processo todo, liquida do dia para a noite com as políticas sociais. E nós podemos ter um declínio de liderança, como já ocorreu, no nível popular, com o Fernando Henrique, com o Sarney, o que eu decididamente não gostaria que acontecesse.

            O futuro é a volta no neoliberalismo ou a coragem do rompimento e o estabelecimento de uma política social de verdade.

            E não saúdo com alegria as eleições norte-americanas. Parece a mim, como a V. Exª, que Obama é melhor. Do ponto de vista do interesse nacional e do Brasil, eles são exatamente a mesma coisa.

            Obrigado, Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/11/2012 - Página 58587