Discurso durante a 10ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Lamento pelo recente falecimento do ex-Senador e ex-Governador de Pernambuco Fernando Lyra.

Autor
Humberto Costa (PT - Partido dos Trabalhadores/PE)
Nome completo: Humberto Sérgio Costa Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Lamento pelo recente falecimento do ex-Senador e ex-Governador de Pernambuco Fernando Lyra.
Aparteantes
Aloysio Nunes Ferreira.
Publicação
Publicação no DSF de 20/02/2013 - Página 4464
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, EX MINISTRO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), EX-DEPUTADO, FERNANDO LYRA, ELOGIO, VIDA PUBLICA, ENFASE, COMBATE, DITADURA, SOLICITAÇÃO, APRESENTAÇÃO, VOTO DE PESAR, PESAMES, FAMILIA.

            O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco/PT - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidenta, Srs. Senadores, eu gostaria de, na tarde de hoje, ainda que com um pouco de atraso, pois não estava em Brasília, poder me manifestar, lamentando aqui o falecimento desse grande brasileiro, grande pernambucano Fernando Lyra, ex-ministro, ex-deputado federal, ex-deputado estadual, que representou uma perda irreparável para todos os brasileiros, especialmente para todos aqueles que defendem como princípio a liberdade, a democracia, a defesa dos direitos humanos.

            Fernando Lyra faleceu aos 74 anos, no último dia 14, e caracterizou toda a sua trajetória política pela firmeza de princípios, pelo respeito à ética e, acima de tudo, por uma gigantesca capacidade de articulação. Poderíamos chamá-lo de um “gênio da política”, alguém que muito cedo em sua vida se casou com a política. Era uma grande figura humana, um articulador extremamente sagaz, que deixou um forte legado à vida pública do Brasil.

            Fernando Lyra entrou na política partidária em 1966, no antigo MDB, partido formado à época, dentro do jogo que a ditadura desenhava, para funcionar como uma espécie de oposição consentida. Fernando Lyra, juntamente com outros importantes políticos, entre os quais eu destaco aqui o Senador Pedro Simon e o Senador Jarbas Vasconcelos, constituiu, com o Deputado Marcos Freire, o chamado grupo autêntico do PMDB, que, ao longo de vários anos da ditadura, foi uma das vozes que a sociedade teve para denunciar a tortura, a perseguição, a prisão, o exílio, os desmandos contra milhares de cidadãos e cidadãs brasileiros. Aquele partido, como eu disse, havia sido criado em oposição ao regime militar, em oposição ao partido oficial, que era a Arena.

            Fernando Lyra foi eleito Deputado Federal em 1970.

            Eu tive oportunidade, ainda criança, de acompanhar meu pai em comícios do MDB na eleição de 1970, e sempre me impressionaram a coragem política de Fernando Lyra, a sua enorme capacidade como orador - era um orador que empolgava de fato as massas - e como alguém que procurou sempre ser fiel e coerente com as suas ideias.

            Os autênticos eram os mais aguerridos, os mais críticos ao regime militar. Fernando sofreu com a perseguição política a amigos e, em nenhum momento, deixou de denunciar o desaparecimento de presos e de estar ao lado de todos os que queriam liberdade, anistia política. Ele pôde, portanto, participar ativamente da vida pública do País e trabalhar pelo fortalecimento do então MDB.

            Sempre atuante e habilidoso, Fernando Lyra foi um dos principais articuladores da candidatura de Tancredo Neves à Presidência da República, no Colégio Eleitoral em 1985. Dentro da sua visão, era necessário oferecer ao País uma transição que fosse articulada com os donos do poder naquele momento e que pudesse representar uma superação do Regime Militar.

            Todos sabem que a posição dos membros do meu partido e a minha própria, que já era militante, era de descordância com aquele processo do Colégio Eleitoral. Contudo, é forçoso reconhecer aqui a extrema habilidade com que Fernando Lyra se comportou como articulador político naquele momento e, mais do que isso, como se portou como Ministro da Justiça. Foi um dos grandes responsáveis pelo fim de toda legislação autoritária, que restringia o direito de imprensa.

            Ouço, com muita alegria, o Senador Aloysio Nunes.

            O Sr. Aloysio Nunes Ferreira (Bloco/PSDB - SP) - Muito obirgado, Senador Humberto Costa. V. Exª me dá a oportunidade de, num brevíssimo aparte, também somar a expressão da sua tristeza à minha, pela morte desse grande brasileiro, desse grande democrata, desse grande pernambucano que foi Fernando Lyra. V. Exª ressaltou o papel fundamental e decisivo que ele teve em toda a trama bem feita, paciente, cuidadosa, que permitiu que superássemos o regime militar. Ele, como Ministro da Justiça, foi uma peça chave nesse processo. Inclusive, gostaria de, na mesma linha de V. Exª, citar o fim do banimento dos partidos políticos que, por se alinharem com concepções socialistas, marxistas, viviam na ilegalidade. Muito obrigado.

            O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco/PT - PE) - Com certeza. Agradeço o aparte de V. Exª, que ilustra o meu pronunciamento e, sem dúvida, faz justiça a esse que nós podemos considerar um dos pais da redemocratização do nosso País nesse período posterior à ditadura militar.

            Ressalto ainda o papel que ele exerceu também como Ministro da Justiça no processo constituinte. Sem dúvida, o Brasil conseguiu aprovar, na sua Constituição, artigos tão importantes que são hoje a base para os mais de 25 anos de democracia plena que vivemos. E, sem dúvida, o nome de Fernando Lyra está inscrito nessa construção.

            O advogado recifense José Paulo Cavalcanti conta um episódio que evidencia a clareza e a retidão de Fernando Lyra. Foi o momento que precedeu a posse do Presidente Sarney na Presidência da República em virtude do falecimento de Tancredo Neves. Não havia consenso e tranquilidade nos bastidores de Brasília sobre o nome do sucessor. A discussão girava em torno do então Presidente da Câmara dos Deputados, também um grande democrata, um grande brasileiro, Ulysses Guimarães, terceiro na linha sucessória para assumir o cargo. Fernando Lyra, compreendendo que não era possível passar por cima da Constituição vigente naquele momento, que dava ao Vice-Presidente o direito a assumir o cargo, buscou o entendimento para que o Presidente Sarney, efetivamente, pudesse assumir o comando do nosso País.

            Fernando Lyra exerceu sete mandatos de Deputado Federal, entre 1970 e 1998; foi Ministro da Justiça entre 1985 e 1986, no governo Sarney, mais ainda por indicação de Tancredo Neves, de quem se tornou homem de confiança. Num momento crucial para o País, assumiu importante Ministério, tendo sido fundamental para a desconstrução da lei da censura. Em 1987, participou da Assembleia Constituinte, responsável pela promulgação da Constituição Federal de 1988. O último cargo público ocupado por ele foi o de Presidente da Fundação Joaquim Nabuco, em Recife, de 2003 a 2011, durante o governo Lula.

            Militante do MDB, depois PMDB, PDT e finalmente PSB, Fernando Lyra sempre esteve associado à bandeira dos direitos humanos. Como disse, era um grande orador, reconhecido pela generosidade, pelo sorriso franco e pela boa conversa. Pelo PDT, ainda participou das primeiras eleições diretas no País após a ditadura militar, em 1989, como candidato a Vice-Presidente na chapa de Leonel Brizola, e, no segundo turno, manifestando seu apoio à candidatura do então Luiz Inácio Lula da Silva, posteriormente, Presidente do País.

            Junto-me a todos os brasileiros e brasileiras que lamentam profundamente a morte de Fernando Lyra, um homem corajoso, de fortes convicções políticas, mas dono de uma notável habilidade para negociar e de uma rara inteligência.

            Faço-me minhas as palavras da Presidenta Dilma Rousseff: "A democracia brasileira perdeu um dos seus mais expressivos defensores".

            Gostaria de solicitar, somando o meu a outros requerimentos já apresentados, apresentação de voto de pesar e condolência a todos os familiares e amigos de Fernando Lyra, registrando ainda que todos nós temos uma grande responsabilidade, a de empunhar a bandeira de que, ao longo de mais de setenta anos de vida, Fernando Lyra fez seu roteiro e seu rumo: o roteiro da liberdade e da democracia.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/02/2013 - Página 4464