Discurso durante a 78ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa de que o dinheiro usado na construção do Estádio Nacional de Brasília tivesse sido destinado à educação.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.:
  • Defesa de que o dinheiro usado na construção do Estádio Nacional de Brasília tivesse sido destinado à educação.
Aparteantes
Eduardo Suplicy, Pedro Taques.
Publicação
Publicação no DSF de 23/05/2013 - Página 28205
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
Indexação
  • COMENTARIO, FATO, TRANSFERENCIA, GASTOS PUBLICOS, CONSTRUÇÃO, ESTADIO, LOCAL, DISTRITO FEDERAL (DF), MOTIVO, RECEPÇÃO, CAMPEONATO MUNDIAL, FUTEBOL, DESTINO, CRIAÇÃO, MANUTENÇÃO, ESCOLA PUBLICA, REGIÃO.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, ultimamente costuma-se dizer que não existe mais esquerda nem direita, que não existe mais progressista nem conservador e que os partidos são todos iguais. O próprio Presidente do Supremo chegou a manifestar isso recentemente, isto é, que os partidos haviam perdido a nitidez ideológica.

            Isso é verdade, mas ainda existe o lado de lá e o lado de cá. Ainda existe progressista e conservador. E eu, Senador Pedro Taques, defino como conservador aquele que comemora as coisas boas que aconteceram e, como progressista, aquele que luta pelas coisas boas que ainda falta serem feitas, obviamente sem esquecer as boas coisas que aconteceram.

            É surpreendente, Senador Jarbas, como, ultimamente, pessoas que tinham realmente espírito transformador, revolucionário, perderam esse vigor e passaram a dizer que as coisas estão muito melhores. E é verdade, mas não estão satisfatórias.

            E vou pegar um exemplo, Senador Taques: o estádio de futebol do Distrito Federal, que é uma obra que, hoje, encanta uma boa parte da população. É a mais cara, segundo dizem, do mundo inteiro, mas que está dando certa satisfação às pessoas. Vou mais longe: em seu primeiro teste, ele passou; conseguiu vender, em poucas horas, com filas de oito horas, os ingressos para um jogo. Obviamente, um jogo de dois times de fora de Brasília, porque aqui não temos times com um número de torcedores capaz de empolgar e encher o estádio.

            Mas eu fiz umas contas, Senador Taques, para saber o que a gente poderia ter feito na educação no lugar do estádio. Se esse R$1,6 bilhão tivesse sido usado na ideia de construir, equipar e financiar superescolas, como eu gosto de chamar - escolas com professores ganhando R$9.500,00 por mês, em prédios bonitos e bem equipados, com todas as crianças em horário integral -, nós poderíamos ter colocado para estudar 15 mil crianças, da primeira série do ensino fundamental à última série do ensino médio.

            Eu volto a dizer: não é pagar com esse dinheiro, por ano, 15 mil; é pagar 12 anos de educação. Claro que, para isso, do custo pequeno que são 165 milhões para um grupo de alunos, a gente descontou e colocou como se fosse numa caderneta de poupança gerando juros. Você soma os juros durante 12 anos, você soma o custo durante 12 anos e o resultado são 15 mil alunos.

            Para 15 mil alunos, Senador, a gente pode considera que eles teriam um salário de R$4 mil. Certamente, alunos que saíssem de um ensino médio de qualidade, em que eu imagino, inclusive, Senador Paim, haveria formação profissional também, como eu defendo, eles poderiam ganhar, no mínimo, R$4 mil por mês - no mínimo! É o preço de uma baixa patente da Polícia Militar no Distrito Federal.

            Se a gente considera esses R$4 mil por mês, ao longo da vida útil desse jovem, até ele ficar velho, isso equivale a R$26 bilhões, ou seja, numa visão progressista, a meu ver, esse estádio, que é apenas um, se transformaria em 17 estádios.

            Essa é a diferença entre quem está de um lado e quem está do outro: é como se usa o dinheiro público e quem é o beneficiário. É como se usa: se na construção de um estádio ou na educação das crianças. O beneficiado é cada um de nós que vai ao jogo, porque prefere ir lá a assistir pela televisão, ou uma vida inteira desses jovens com um salário conquistado graças à educação que receberam. É isso que divide a gente.

            O que divide a gente, com toda franqueza, não são mais as siglas partidárias; é um ou outro lado em que a pessoa se encontra na hora de tomar decisões relacionadas a quem se beneficia e como será gasto o recurso público.

            Eu insisto, apesar de saber que essa é uma posição que vai contra a corrente de boa parte da população, em que muito melhor do que ter feito esse estádio seria ter feito essas escolas; seria ter feito essa transformação da vida de um número expressivo de crianças no Distrito Federal.

            Eu vou continuar sendo daqueles que, ao invés de comemorar o que foi feito, continuo sonhando com coisas novas a serem feitas, Senador Jarbas. E creio que, apesar das conquistas que o Brasil teve, sem dúvida alguma, nos últimos anos da democracia, especialmente nos últimos 20 anos, mesmo assim, falta tanto, falta tanto, que eu prefiro continuar progressista e não conservador.

            Era isso, Srª Presidenta. Contudo, o Senador Taques pediu a palavra e eu gostaria muito de ter o seu aparte.

            O Sr. Pedro Taques (Bloco/PDT - MT) - Quero cumprimentar V. Exª, Senador Cristovam, e dizer que esse debate sobre esquerda e direita, como alguns dizem, já restou superado. No Brasil, isso chega à última instância: alguns partidos dizendo que não são de esquerda nem de direita, nem de centro. Isso é uma “geleca”, uma geléia; algo inodoro, insípido, incolor, o que não é nada. Alguns dizem que esquerda busca a proteção da igualdade, do princípio, e a direita, naquele sentido, francês, busca a liberdade. Acho que esses conceitos, hoje, não estão superados. Nós temos de buscá-los na nova dimensão.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Isso.

            O Sr. Pedro Taques (Bloco/PDT - MT) - Uma nova dimensão, um novo olhar do sujeito sobre o mesmo objeto. E de que maneira fazer isso? Acho que, hoje, nós temos de buscar contrariar ou buscar beneficiar aqueles que são excluídos e incluídos: aqueles que são excluídos da educação, da dignidade, da saúde, que são marginalizados. Eu acho que essa é a busca, hoje, direita e esquerda, respeitando esses conceitos que são históricos, mas não são científicos, porque nós temos de olhá-los numa outra dimensão, sob um outro olhar. Temos de ser favoráveis, temos de buscar resolver as questões dos excluídos, como V. Exª nessa conta, aí, bem fez. Um País como o nosso, com milhões de analfabetos, pessoas destituídas do mínimo, do que se denomina de piso mínimo de dignidade, ou mínimo existencial, gastar bilhões de reais em elefantes brancos é uma coisa terrível. Parabéns pela sua fala. Quero me associar ao senhor, não à direita ou à esquerda, mas a uma causa, à causa de buscar fazer com que os excluídos, em todos os sentidos, possam ser incluídos.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Agradeço seu aparte. Realmente, o senhor trouxe a palavra-chave: conceito.

            É claro que existem conservadores e não conservadores. Quem quiser pode chamar isso de direita e de esquerda. Eu, aliás, gosto de chamar assim, por uma questão de tradição. Agora, temos que redefinir o que é direita e o que é esquerda. Essa redefinição é que é importante. Mas querer misturar tudo não é possível, não é correto.

            Há uma linha separando o lado de lá e o lado de cá, com todo o respeito que tenho aos que estão do lado de lá. Mas há o lado de lá e o lado de cá, e eu prefiro ficar do lado dos progressistas; dos que têm mais sonhos do que festas para comemorar; dos que preferem investir mais no futuro a investir no presente; dos que preferem cuidar das crianças a cuidar de nós que queremos usufruir de alguns espetáculos.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - V. Exª me permite?

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Senador Suplicy, com muito prazer.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Eu quero lhe dizer que o considero um homem de esquerda, progressista, uma pessoa que, ao colocar os propósitos de universalização da boa oportunidade de educação, de boas oportunidades para todos, da garantia de uma renda para todos, deseja que o Brasil se torne uma Nação efetivamente justa, onde os valores da solidariedade, da fraternidade e da liberdade possam prevalecer. Construir uma sociedade justa através da liberdade e da democracia é um propósito lastreado em valores e ideais comuns de que, tenho convicção, V. Exª e eu comungamos.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Obrigado, Senador.

            Por isso, nós estamos do mesmo lado. Não interessa o partido em que o senhor esteja ou em que eu esteja, mas nós fazemos parte de um mesmo lado: o lado daqueles que sonham e não apenas comemoram.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/05/2013 - Página 28205