Discurso durante a 107ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Reflexão sobre o momento por que passa o Brasil.

Autor
Cícero Lucena (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PB)
Nome completo: Cícero de Lucena Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CONGRESSO NACIONAL, GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Reflexão sobre o momento por que passa o Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 02/07/2013 - Página 41357
Assunto
Outros > CONGRESSO NACIONAL, GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, NECESSIDADE, ATUAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, RESPOSTA, REIVINDICAÇÃO, POPULAÇÃO, PAIS, LEITURA, CARTA, AUTORIA, MEDICO, ASSUNTO, CRITICA, PRECARIEDADE, PROPOSTA, GOVERNO FEDERAL, OBJETIVO, RESOLUÇÃO, PROBLEMA, DEMANDA, SOCIEDADE.

            O SR. CÍCERO LUCENA (Bloco/PSDB - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, já se falou muito aqui e encerrou, há poucos instantes, belíssimo pronunciamento do Senador Dornelles, falando sobre o plebiscito. Como ele, também o Senador Jarbas fez comentário sobre o artigo “Carta ao Leitor”, da revista Veja, desta semana, que merece ser lido por todos, para que possamos fazer uma reflexão sobre este momento que o País está vivendo.

            Primeiro, porque ninguém de bom-senso discorda da tese de que o Brasil precisa de uma reforma política. Também não se encontra ninguém, igualmente sensato, que não seja motivado por outras razões e ache que isso deva ser feito via consulta popular.

            Segundo, porque a iniciativa é uma tentativa rasteira de alguns partidos e do Governo de mudar de assunto, de lançar uma cortina de fumaça entre eles e os clamores populares.

            Se há uma coisa que os manifestantes têm demonstrado à exaustão é que os brasileiros estão cansados de golpes baixos e de promessas vãs, Senador Jarbas Vasconcellos; de anúncios de metas de programas que, se formos verificar, não têm atendido aos desejos, aos anseios e à necessidade da nossa população.

            Terceiro, porque não se faz plebiscito para jogar nos ombros das pessoas o peso de decisões sobre o funcionamento de coisas complexas. As pessoas não devem ser obrigadas a decidirem exatamente como as instituições devem funcionar. Elas querem simplesmente que as instituições funcionem bem, que os funcionários públicos sejam imparciais e eficientes e que os políticos representem os seus eleitores nas assembleias, no Congresso ou nos cargos executivos.

            É a gestão que está falhando, é o excessivo número de Ministros e gastos elevados com custeio, e outras questões que não deixam o Brasil andar, como todos nós desejamos.

            Hoje, já se fala nas sobreposições dos ministros palacianos. É ministro dando pitaco naquilo que não lhe cabe institucionalmente. Por outro lado, ficam os ministros decorativos, na melhor versão definida pelo ex-Ministro Nelson Jobim: “Uma é fraquinha e a outra não conhece Brasília.”

            Pois bem, Srªs e Srs. Senadores, devo dizer que esta Casa tem o dever e a obrigação de discutir aquilo que as ruas estão ecoando: projetos, ideias, iniciativas. Nós podemos passar aqui dias e dias elencando item por item. Se for da saúde, por exemplo, podemos discutir que há pouco tempo esta Casa decidiu contra a regulamentação da Emenda nº 29, a mando e sob a orientação da Base do Governo, que sabe da importância do financiamento para que nós tenhamos uma saúde pública digna para atender à população.

            Da mesma forma, temos projetos nesta Casa que fazem a desoneração por parte de muitos itens na área de saúde. Como é que se justifica, por exemplo, Sr. Presidente, que o próprio Poder Público, ao comprar equipamentos, pague impostos, quer seja em âmbito municipal, estadual ou federal? Pagar impostos onera os custos da saúde do próprio ente público. Da mesma forma, existem projetos, na área de saúde, que precisam ser discutidos. Essa discussão não é através de um plebiscito, mas através do debate, das audiências públicas, das iniciativas parlamentares.

            Hoje mesmo, recebi um e-mail que trata de um artigo publicado na Folha de S.Paulo. Este artigo diz o seguinte, Senador Jarbas:

Depredando a saúde da nação.

Como cidadão, fiquei deslumbrado com o clamor que varre a nação. Como médico, e ligado à saúde, mergulhei em esperanças. Contudo, com a mesma velocidade com que esse sentimento aflorou, fui tomado por uma angústia incontida ao observar as manifestações oficiais.

Anunciou-se solenemente que seriam importados milhares de médicos estrangeiros e injetados R$7 bilhões em hospitais e unidades de saúde.

Também se propôs a troca de R$4,8 bilhões de dívidas dos hospitais filantrópicos por atendimento médico e foi anunciada a criação de 11.400 vagas de graduação em escolas médicas.

Perplexo, gostaria de dizer que essas propostas são tão surrealistas que não podem ter sido idealizadas por autoridades sérias, mas sim por marqueteiros afeitos à empulhação. Piores do que os depredadores soltos pelas ruas, já que destroem vidas humanas.

A medicina exercida condignamente pressupõe equipes qualificadas, não apenas com médicos, mas também com enfermeiros, psicólogos e assistentes sociais. Exige instalações minimamente equipadas, para permitir diagnósticos e tratamentos mais simples. Necessita do apoio de farmácias, capazes de prover, sem ônus para os necessitados, as medicações essenciais. Requer processos de higiene, assepsia e certo conforto, para dar segurança e respeitar a dignidade humana dos pacientes.

O que farão os médicos estrangeiros nas áreas remotas do Brasil apenas com termômetros e estetoscópios nas mãos? Irão receitar analgésicos, antidiarreicos e remédios para tosse, o que poderia ser mais bem executado por qualquer prático de farmácia, também afeito às doenças regionais. Médicos que, nos casos mais delicados, nem atestado de óbito poderão assinar, pois não conseguirão identificar a causa da infelicidade.

Pior ainda: como esses médicos conseguirão atuar limitados pela dificuldade de comunicação, desqualificados para tratar doenças já erradicadas em países sérios, frustrados por viverem em regiões destituídas de condições mais dignas de existência para eles próprios, suas mulheres e seus filhos? Certamente tratarão de migrar para centros mais prósperos, abandonando aqueles que nunca conseguirão expressar a desilusão.

Não custa lembrar que muitos países desenvolvidos aceitam médicos estrangeiros, contudo nenhum deles atua sem ser aprovado em exames extremamente rigorosos, que atestam a elevada competência profissional.

Igualmente falaciosa é a proposta de incrementar os recursos para a saúde. Num país como o Brasil, que gasta apenas 8,7% do seu Orçamento em saúde - muito menos que a Argentina (20,4%) e Colômbia (18,2%) -, somente mal-intencionados poderão acreditar que um aporte de recursos de 0,7% do orçamento corrigirá a indecência nacional na área da saúde.

Também enganadora é a ideia de se recorrer às instituições filantrópicas. Em situação falimentar, deixam de pagar tributos porque não recebem do Governo os valores justos pelos trabalhos que prestam. Pelo mesmo motivo, serão incapazes de aumentar o já precário atendimento.

Quanto à criação de novas vagas para alunos de Medicina, nada mais irrealista. Para acomodar os números apresentados, o governo teria que criar entre 120 e 150 escolas médicas. Com que recursos? Com que professores? Com que hospitais?

Presidente, termino pedindo desculpas pela minha insolência. Você, que é digna e tem história, não pode tergiversar perante o clamor de tantos filhos da Nação. Faça ouvidos moucos ao embuste e combata de forma sincera os malfeitos. Assuma, de forma sincera e não dissimulada, a determinação política de priorizar os recursos para as áreas sociais, para não ser tomada por angústia infinita ao cruzar com a multidão, entoando com indignação o canto de Chico Buarque: “Você que inventou a tristeza/ Ora, tenha a fineza/ De desinventar/ Você vai pagar e é em dobro/ Cada lágrima rolada/ Nesse meu penar”.

            Esse artigo, publicado na Folha de S.Paulo, é do Dr. Miguel Srougi, 66 anos, pós-graduado em urologia pela Universidade de Harvard, Professor Titular de Urologia da Faculdade de Medicina da USP e Presidente do Conselho do Instituto Criança é Vida.

            Pois bem, Sr. Presidente. Isso demonstra o quanto nós precisamos debater. Essa é a opinião de um especialista, um médico e um humanista; porém, temos que dar chance ao contraditório. Temos que ouvir o governo dizer a sua posição de uma forma clara, e nós fazermos os devidos questionamentos. Esse é o papel de um País que é democrático, que é responsável, que é sério.

            Temos que debater a educação. Há propostas de educação em tempo integral, como a de minha iniciativa, até o ano de 2022. Há propostas do Senador Cristovam Buarque, da federalização do ensino, e tantas outras iniciativas para a área da educação.

            Temos de discutir a mobilidade urbana, onde estão as prioridades dos investimentos, a desoneração, quando for o caso, do setor, bem como propostas que priorizem o transporte de massa com qualidade e dignidade.

            Temos de discutir a questão da seca do Nordeste, de que tantas vezes já falei aqui. Espero que o clamor que hoje está nas ruas não tire a tão pequena atenção que o governo tem para com a região seca de nosso País; que haja a transposição das águas do Rio São Francisco para que possa estruturar uma garantia hídrica para o abastecimento humano daqueles Estados que tanto necessitam.

            Por isso, Sr. Presidente, acho que quanto maior e quanto mais democrático for o debate, com esta Casa a assumir seu papel, não de forma açodada, a ponto de as discussões das matérias serem rápidas e com posicionamentos equivocados, mas, sim, com a prática do processo democrático de ouvir os contraditórios, de haver debates e que eles sejam estudados; que sejam feitas audiências públicas, mas que, ao se tomar a decisão para sua aprovação, seja aquela que melhor atenda à população.

            A educação nos preocupa muito quando se fala também de financiamento. Eu sou favorável a se ampliar, sim, os recursos para a educação quando se trata de royalties.,O Brasil, conforme publicação de hoje no Estadão, gasta US$950,00 por aluno, enquanto a Coreia do Sul gasta US$5.446,00; Portugal gasta US$5.592,00; Japão gasta US$7.862,00, e os Estados Unidos gastam US$8.816,00 por aluno. Se nós, nesse eco das ruas, não formos a fundo na razão maior dessa desigualdade no Brasil, que é a concentração de renda no Governo Federal, apesar de a Constituição de 88 estabelecer transferência de responsabilidade na área de saúde, de educação, de mobilidade urbana e fez a partilha dos recursos federais, hoje o que há é a inversão, proporcionando uma grande concentração por parte do governo.

            Então, falar em pactos A, B, C e D, sem se falar no Pacto Federativo, com uma melhor distribuição de renda, para que os Estados e Municípios, que vivem e sofrem e que sabem das soluções dos problemas, possam melhor aplicar esses recursos. Assim, o processo tem de ser deslanchado com responsabilidade e agilidade, mas com um bom debate, porque sairemos todos ganhando.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/07/2013 - Página 41357