Comunicação inadiável durante a 111ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com a baixa qualidade do transporte público urbano no Brasil e sugestão de inclusão do assunto na pauta de debates.

Autor
Jorge Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Jorge Ney Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Comunicação inadiável
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • Preocupação com a baixa qualidade do transporte público urbano no Brasil e sugestão de inclusão do assunto na pauta de debates.
Aparteantes
Luiz Henrique.
Publicação
Publicação no DSF de 06/07/2013 - Página 43388
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, VALOR ECONOMICO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), REFERENCIA, PRECARIEDADE, SERVIÇO PUBLICO, TRANSPORTE COLETIVO URBANO, DEFESA, NECESSIDADE, SENADO, DEBATE, ALTERNATIVA, OBJETIVO, MELHORIA, SERVIÇO.

            O SR. JORGE VIANA (Bloco/PT - AC. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, aproveitando esta sessão, que tem um quórum qualificado, eu diria, pois enxergo vários ministros, prefeitos, ex-governadores, futuros governadores, venho à tribuna, Senador Aloysio, que tão bem representa a maior cidade do nosso País, junto com o Senador Suplicy, venho à tribuna, caro Líder Eduardo Braga, para apresentar uma proposta bem objetiva ao Senado. Trago um dos temas que certamente foi causa da grande mobilização, uma causa justa da grande mobilização popular, para dentro do Senado. O Senado tem adotado mudanças na sua agenda, mas eu diria que está na hora de trazermos, talvez, a razão mais identificada que está na base das manifestações populares para este plenário, que é o transporte urbano.

            Colega Lídice, V. Exª que está inscrita logo depois de mim, foi prefeita. Não vejo tema mais importante para tratarmos de maneira bastante objetiva, que envolve todos os entes da Federação do que transporte urbano. E por que faço isso? Esta é a Casa da Federação. Aqui há ex-prefeitos -- eu fui prefeito --, ex-prefeitas e ex-governadores.

            Hoje, eu recomendo a todos a leitura de uma matéria publicada no Valor Econômico, que fala do subsídio ao transporte público, transporte coletivo nas cidades.

            Veja, Senador Aloysio, V. Exª que inclusive, quando exilado, morou em cidades da Europa. Na União Europeia, o subsídio ao transporte coletivo varia de 45% a 70%. Nos Estados unidos, varia de 60% a 70%. E aqui no Brasil, em São Paulo, perto de 20%, em alguns transportes, têm subsídios.

            Mas o que nós temos que concluir com as manifestações é que está falido o sistema de transporte coletivo nas cidades brasileiras. Faliu, venceu a validade. Nós deixamos para ser resolvido no custo do IPK (Índice de Passageiros por Quilômetro). Eu fui prefeito, é uma área que sempre gostei de tratar. Tenta-se resolver da seguinte maneira: amontoam-se as pessoas dentro do ônibus, sobe-se a tarifa e baixa-se a qualidade do serviço. Foi isso que nós fizemos ao longo de anos. Em todas as cidades é isso. Muita gente, ineficiência e caro.

            Eu vi aqui especialistas, nesta matéria, que é fantástica, recomendo a todos que leiam, é uma matéria objetiva. Este é um tema suprapartidário. Prefeitos do PT, do PSDB, do PSB, do PMDB, do Democratas, todos passam pela mesma dificuldade. E aí a gente tem que discutir. Mas nós não temos um Ministério das Cidades? Não foi criado o Ministério das Cidades?

            Eu sempre aprendi que pelo menos três coisas são fundamentais nas cidades. A primeira delas é: a cidade precisa funcionar. Ela precisa recolher os resíduos sólidos, o lixo.

            A coisa é tão fantástica! Fiz uma viagem à China. No caso, à República da China. Em Taipei, não existe mais depósito de lixo na cidade. Ninguém joga mais o lixo em lixeira. É tão eficiente o sistema que, na hora certa, passam três caminhões, um atrás do outro, tocando uma musiquinha, as pessoas saem de casa e colocam o lixo já partilhado naquele veículo, que vai embora para o aterro, para reciclagem. Não há essa história de deixar lixo em beira de rua. É fantástico isso.

            Então, coleta de lixo. A cidade está razoavelmente bem funcionando. E transporte, que é o primeiro funcionamento.

            Senador Eduardo Braga, V. Exª falava da preocupação, dos problemas que viveu essa semana. Manaus tem um milhão de pessoas na periferia, numa população de dois milhões. V. Exª foi um excepcional prefeito. Na época, eu e o Senador Jarbas, que era Prefeito de Recife, fomos os mais bem avaliados. Depois, no Governo, eu virei uma espécie de prefeito, porque segui trabalhando. Em Rio Branco, ajudei muito o Prefeito Angelim e o Prefeito Marcus Alexandre nesse tema. Está havendo algumas mudanças importantes, mas eu diria que ou nós trazemos para cá, talvez dentro daquele debate temático, os temas de interesse do País… Por que não trazer o tema mais falado durante as manifestações, que é o transporte público, transporte coletivo?

            Os especialistas dizem, na matéria, que quem viaja a Londres volta elogiando, anda de ônibus, anda de metrô…

… o custo do transporte público em Londres foi de € 9,3 bilhões -- € 7 bilhões foram gastos na operação e € 2,3 bilhões em investimentos. Do total, apenas € 4 bilhões foram arrecadados com a venda de passagens. Os subsídios governamentais chegaram a € 4,65 bilhões…

            Subsídio para ter qualidade, para a cidade funcionar. E avança um pouco: “No Brasil, o modelo de financiamento de transporte público é baseado na tarifa e quase completamente financiado por ela”. Inclusive aquelas autorizações para idosos e para pessoas com necessidades especiais. Todas essas autorizações de passe livre entram também na tarifa. E ficam a cargo de quem? Quem anda de ônibus no País hoje? Os mais pobres. Aliás, pesquisa feita pelo Ipea mostra que os 10% mais pobres não andam de ônibus por conta do custo.

            O mecanismo que nós criamos para o vale-transporte atende apenas 26% dos usuários. A gente fica achando que está tudo bem resolvido…

(Soa a campainha.)

            O SR. JORGE VIANA (Bloco/PT - AC) - … e só 26% dos que andam de transporte coletivo é que vêm diretamente com o vale-transporte. E não há solução para essa questão se não houver uma radical mudança na política de transporte público e transporte coletivo neste País.

            Estou trazendo este tema porque ele estava na maioria das cartolinas das manifestações, que foram fantásticas, porque os temas apresentados não cabiam numa faixa. Cada um tinha uma cartolina na mão com a sua reivindicação. Claro que elas se repetiam, mas foi algo muito interessante, algo pedagógico. E acho que o Senado e as Casas Legislativas precisam trazer esse debate.

            Na cidade de Nova York, por exemplo, com subsídio, as tarifas cobrem 60% do custo. É um caso excepcional. Só 40% são subsidiadas, mas lá todo mundo, ou quase todo mundo, anda de algum transporte público ou de alguma concessão pública. Então, lá as tarifas bancam. O sistema é eficiente quando mais gente anda.

            A cidade de Bogotá, por exemplo, adotou um sistema muito eficiente de subsídio e é, cada vez mais, uma referência de cidade no mundo.

            As nossas, em que moram 84% dos brasileiros, Sr. Presidente, estão insustentáveis, não funcionam. A vida está cada dia pior nas cidades brasileiras. E a solução está sendo quem pode vai se afastando e morando em algum condomínio fechado, mas também, quando eles vão acessar a cidade, não têm como fazê-lo. Então, está passando da hora de nós enfrentarmos.

            Eu queria aqui dizer que os estudos apresentados hoje no jornal Valor Econômico foram feitos pelo Dr. Luís Antonio Lindau, PHD em Transporte pela Universidade de Londres e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Temos também os posicionamentos do Dr. Carlos Henrique de Carvalho, Coordenador de Planejamento e Pesquisa do Ipea, e de professores da Poli/USP da Universidade de São Paulo. Todos eles colocam, claramente, a falência do sistema de transporte coletivo no País e apontam caminhos.

            Como o Senado é a Casa que tem uma quantidade enorme de ex-prefeitos, de ex-governadores, de futuros prefeitos e governadores…

(Soa a campainha.)

            O SR. JORGE VIANA (Bloco/PT - AC) - … de ex-ministros, a minha sugestão é que debatêssemos, trouxéssemos para cá o tema que foi central nas grandes mobilizações do País, que é a mobilidade urbana. Não gosto muito desse nome…

            O Sr. Luiz Henrique (Bloco/PMDB - SC) - V. Exª me permite um aparte?

            O SR. JORGE VIANA (Bloco/PT - AC) - Concedo o aparte a V. Exª, com a compreensão do Presidente…

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - O Regimento não permite, mas é uma sessão especial e o debate é fundamental.

            O SR. JORGE VIANA (Bloco/PT - AC) - … para que eu possa, logo em seguida, concluir o meu pronunciamento.

            Por gentileza, Senador Luiz Henrique, ex-prefeito, ex-governador, e ex-bom prefeito e ex-bom governador, e grande Senador desta Casa.

            O Sr. Luiz Henrique (Bloco/PMDB - SC) - Agradeço a V. Exª, que, como sempre, está tratando de assunto da maior relevância e da maior atualidade. O grande x da questão, já que o x está nas manchetes, é a cultura nacional do veículo individual. O cidadão quer sair de carro, estacionar na frente da loja, estacionar na frente do cinema, estacionar ao lado do estádio de futebol. No Brasil, nós precisamos quebrar essa cultura. E posso falar por experiência própria. Eu estabeleci, em Joinville, o segundo sistema de integração dos ônibus, com passagem única e bilhetagem eletrônica do País. O primeiro foi implantado por uma figura histórica deste nosso Brasil, que foi o Prefeito Grama, em Campinas. Foi o primeiro. Eu instituí o segundo, em Joinville. Pois bem, ao invés de quatro passagens que os trabalhadores pagavam em alguns roteiros, todo mundo passou a pagar uma só passagem, facilitada pelo sistema de bilhetagem eletrônica. Pois bem, qual era a minha expectativa? Vai aumentar o número de passageiros dos ônibus, que foram modernizados. Cada bairro recebeu a sua estação de integração, a que eu chamei de Estação da Cidadania. Pois bem, o que ocorreu? Ao invés de aumentar o número de usuários de ônibus, diminuiu o número de usuários de ônibus, criando dificuldades, inclusive operacionais, para as empresas. Em compensação, a cidade de Joinville, que era tranquila, entupiu-se de automóveis, e hoje padece de problema de mobilidade urbana…

(Soa a campainha.)

            O Sr. Luiz Henrique (Bloco/PMDB - SC) - … como qualquer cidade brasileira. Esse não é mais um problema de Rio, São Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre, Curitiba. O problema de mobilidade urbana hoje é um problema de cidades médias e pequenas até. Então, qual é o x da questão? É a cultura do veículo individual. Por isso, V. Exª é muito feliz ao propor um grande debate. E V. Exª vai ver -- eu falo por experiência própria -- que a grande decisão será quebrar a cultura do veículo individual e estabelecer a prevalência da cultura do veículo coletivo em nosso País.

            O SR. JORGE VIANA (Bloco/PT - AC) - Para concluir, Presidente, quero piorar um pouco esse quadro que o Senador Luiz Henrique acaba de pintar. Como eu disse, gosto muito deste tema e procuro aprender cada dia. Não sei se todos sabem, a média de carro por habitante no Brasil é de 200 carros por 1000 habitantes. O problema é que esse número ainda vai crescer não sei como e não sei onde.

            Nós temos no Brasil 200 carros para cada 1000 habitantes. O problema. Senador Delcídio, é que nos Estados Unidos são 700 carros para cada 1000 habitantes; na Europa são 450 a 500 carros para cada 1000 habitantes; na China ainda está perto de 50 carros para cada 1000 habitantes. Ou seja, o número de carros no Brasil, nos próximos anos, nas cidades, deve dobrar. E aí não sei em que ruas vão andar, Presidente Paim.

            Então, Senador Luiz Henrique, nós temos 200 carros para cada 1000 habitantes no Brasil, mesmo depois desse boom do automóvel. Como a média na Europa é de 450 a 500 carros por habitante e nos Estados Unidos é 700… Eu conversava com um especialista no assunto, e ele disse que, certamente, o número de carros nas cidades brasileiras vai dobrar.

            O que podemos fazer? Alongar o prazo do alcance desse número.

            Como se faz isso? Melhorando o sistema de transporte coletivo nas cidades.

            Todos que viajam aqui, quando vão para o exterior, não ficam andando de táxi ou de carro alugado; andam de metrô, andam de ônibus em todas as cidades. Pelo menos quando converso com os colegas, com as pessoas que viajam, é o que dizem.

            Todas as cidades do mundo inteiro têm transporte de qualidade. Em Berlim, há exigência numa concessão. Imagine um Brasil desse jeito. Este é o padrão Berlim: uma concessão de linha de ônibus -- está escrito lá --, tem que atingir 94% de índice de pontualidade para o ônibus, sob pena de pagar multa e até de perder a concessão. Isto é sistema de qualidade: a pessoa que vai pegar o ônibus sabe a hora que ele passa, sabe que hora chega ao lugar, que minuto chega ao lugar. Aí passa a ser muito eficiente, limpo, eficiente, e todo mundo faz opção pelo transporte público e passa a ter um carro como artigo de luxo, para usá-lo no fim de semana, para passear, para viajar.

            No Brasil, nós tivemos muitas melhoras da porta para dentro, é verdade, graças ao governo do Presidente Lula, à Presidenta Dilma. Graças a esse movimento dos últimos dez anos, melhoramos nosso País da porta da casa para dentro, com o salário, mas acho que esse modelo se esgotou; as pessoas querem mais. Elas querem melhoria da porta para fora. A qualidade dos serviços públicos está péssima. Caiu muito, piorou, porque aumentou o número de pessoas nas cidades, aumentou o desejo das pessoas de terem acesso aos serviços, e o que nós vemos? As pessoas frustradas, morando mal em cidades insustentáveis, em cidades que não funcionam e dependendo de serviços públicos precários.

            Esse é o quadro suprapartidário, que atinge todos. É contra tudo e todos, porque ele é real e foi expresso não só pela juventude, mas também pelos idosos, puxados pela nossa juventude, pelos que têm algum tipo de organização ou associação e por aqueles que não têm nenhuma organização mas estavam lá com sua cartolina fazendo suas reivindicações.

            Então, o apelo que faço: vou entrar com um requerimento, solicitando que esse seja um dos itens apreciados, quando formos fazer um debate de um dia, de manhã e à tarde ou à tarde e à noite, sobre o funcionamento das cidades brasileiras, sobre a qualidade do transporte nas cidades brasileiras. Certamente, no plenário desta Casa, vamos ter e colher grandes e importantes contribuições.

            Tomara que o Ministério dos Transportes do Brasil mude sua agenda e coloque como agenda prioritária a discussão, o debate e a busca de solução conjunta entre a União, os Estados e os Municípios para o problema do transporte em nosso País, especialmente nas cidades.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/07/2013 - Página 43388