Discurso durante a 123ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comemoração pelo transcurso de sete anos de promulgação da lei “Maria da Penha” e defesa da criação de instrumentos estatais para conferir maior efetividade à referida norma.

Autor
Blairo Maggi (PR - Partido Liberal/MT)
Nome completo: Blairo Borges Maggi
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM, LEGISLAÇÃO PENAL.:
  • Comemoração pelo transcurso de sete anos de promulgação da lei “Maria da Penha” e defesa da criação de instrumentos estatais para conferir maior efetividade à referida norma.
Aparteantes
Pedro Taques.
Publicação
Publicação no DSF de 06/08/2013 - Página 51188
Assunto
Outros > HOMENAGEM, LEGISLAÇÃO PENAL.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO, PROMULGAÇÃO, LEI MARIA DA PENHA, COMENTARIO, EXCESSO, OCORRENCIA, VIOLENCIA, VITIMA, MULHER.

            O SR. BLAIRO MAGGI (Bloco/PR - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado, Sr. Presidente.

            Srªs e Srs. Senadores, no dia 7 de agosto, o Brasil celebra os sete anos de existência da Lei Maria da Penha, um verdadeiro marco na proteção dos direitos da integridade da mulher em nosso País.

            Não há dúvida de que seus 46 artigos revolucionaram a legislação pátria, que antes tratava com descaso a situação específica e particular da violência doméstica contra a mulher.

            O caso emblemático da farmacêutica cearense, que dá nome à lei, condenada à paraplegia após sofrer inúmeras agressões por parte do seu companheiro, mobilizou e despertou a sociedade brasileira para a gravidade e a dimensão do problema nos lares brasileiros. Entretanto, minhas senhoras e meus senhores, mesmo com todo o seu rigor e forte simbolismo, o fato é que o advento da Lei Maria da Penha ainda não conseguiu frear a escalada das estatísticas relacionadas à violência de gênero.

            Os números, Sr. Presidente, colocam e dão a dimensão dessa verdadeira tragédia nacional continuada. Somente em 2010, 4.297 mulheres foram assassinadas de maneira brutal em nosso País, mais do que o triplo registrado no ano de 1980.

            A cada 15 segundos, uma mulher é agredida no Brasil. A cada 2 horas, uma é assassinada. A taxa nacional de homicídios de mulheres - cerca de 4,4 por 100 mil - coloca o Brasil ainda entre os piores colocados nos rankings internacionais sobre a questão da violência de gênero.

            Ora, se a legislação é modelar e rigorosa, como explicar esse preocupante quadro? Por que ainda temos tantas e tantas mulheres sendo agredidas e assassinadas, mesmo sob os implacáveis ditames da Lei Maria da Penha?

            Uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito foi criada no sentido de investigar as razões para essa alarmante situação, e suas conclusões não deixam dúvidas: a principal causa para esse resultado aquém do esperado da Lei Maria da Penha reside essencialmente nas falhas e sua execução por parte do Poder Público, que não está preparado para fazer cumprir os seus preceitos.

            Em todo o País, para cerca de 100 milhões de mulheres, há apenas 71 casas-abrigo, 192 centros de referência e pouco mais de 500 delegacias das mulheres, com boa parte delas funcionando de maneira bastante precária e insuficiente.

            Em Alagoas, por exemplo, o segundo Estado com maior número de homicídios de mulheres, há somente três delegacias especializadas para o seu atendimento.

            Em Manaus, a CPI contabilizou cerca de 4.550 inquéritos arquivados, principalmente devido à falta de pessoal para dar-lhes o devido andamento. Em virtude desse acúmulo, inúmeras queixas sequer foram apresentadas à Justiça, e os crimes acabaram ficando caducos pelo decurso do prazo.

            Em Boa Vista, para as Srªs e os Srs. Senadores terem uma ideia, a única delegacia especializada de atendimento à mulher não tinha sequer telefone ou conexão à Internet.

            O fato é que tais casos, bastante emblemáticos, denunciam a fragilidade institucional de aplicação da Lei Maria da Penha, cuja aplicação se vê obstada pela ausência operacional adequada dos Poderes Públicos.

            Na maior parte das vezes, portanto, a mulher agredida não tem à sua disposição o aparato institucional adequado para sequer apresentar a sua denúncia e poder obter, por parte do Estado, a proteção de sua integridade física, material e moral. Sem poder contar com os órgãos especializados, não lhe resta alternativa a não ser recorrer às delegacias e juizados comuns, que não dispõem de expertise ou experiência para acolher a vítima e encaminhar o processo da melhor maneira.

            Como resultado, Sr. Presidente, essas mulheres agredidas acabam virando alvo fácil de seus algozes, dificultando ainda mais as ações de repressão e limitando a sua capacidade de buscar os seus direitos e levar o seu agressor aos tribunais.

            É sabido que, dada a complexidade em situações que envolvem sentimentos, relacionamentos familiares e, muitas vezes, filhos e crianças, os casos de violência contra a mulher exigem não somente o aparato policial e judiciário ordinário. Pela Lei, os juizados de violência doméstica devem lidar tanto com a questão criminal propriamente dita, com a prisão do agressor, quanto com as questões cíveis - guarda dos filhos, divórcio, pensão alimentícia.

            Resta insuficiente, portanto, o acolhimento e julgamento pelas varas comuns, que apenas lidam com a parte criminal, e não raro de maneira insensível, anacrônica e completamente ultrapassada.

            Caso ilustrativo ocorreu em 2007, já sob a vigência da lei, quando um Juiz de Minas Gerais prolatou sentença em que afirmava que "a Lei Maria da Penha era um conjunto de regras diabólicas" e que "a desgraça humana começou por causa da mulher, e o mundo deve continuar sendo de prevalência masculina".

            Os disparates do magistrado mineiro, infelizmente, ainda encontram eco em setores retrógrados e machistas de nossa sociedade e, com o auxílio cúmplice da negligência estatal, insistem em não dar cumprimento à legislação.

            É chegada a hora de dar um basta, minhas Senhoras e meus Senhores Senadores!

            Como legisladores e fiscais, temos a obrigação institucional e moral de lutar pelo cumprimento dos mandamentos legais que aqui formulamos, sob pena de transformarmos em letra morta aquilo que, com tanto esforço e luta, construímos.

            O Estado brasileiro, aí compreendendo todas as esferas públicas responsáveis, precisa garantir às mulheres brasileiras a devida proteção legal que o nosso ordenamento jurídico estipula.

            Em primeiro lugar, não há uma base de estatísticas criminais localizadas sobre o assunto. Esse banco de dados, Sr. Presidente, permitiria a formatação de políticas públicas focalizadas para o combate à violência de gênero, com informações detalhadas sobre o lugar das ocorrências e que tipo de programa seria o mais adequado.

            A falta de recursos tem sido um dos maiores empecilhos para o enfrentamento da questão. Apenas 26 centavos são gastos por mulher, a cada ano, pelos programas federais voltados para essa questão. Na prática, nos últimos oito anos, apenas R$11 milhões foram aplicados anualmente nesses programas de âmbito nacional.

            Faltam recursos, sobretudo, para a implantação das delegacias, centros de atendimento, defensorias e juizados especializados no atendimento aos casos de violência de gênero.

            Sem eles, nobres Colegas, não há como haver uma aplicação efetiva da Lei Maria da Penha, cuja eficácia depende, de maneira visceral, desse aparato institucional especializado e funcionando regularmente.

            Concedo um aparte ao Senador Pedro Taques.

            O Sr. Pedro Taques (Bloco/PDT - MT) - Senador Maggi, apenas para me associar a V. Exª nessa comemoração. A Lei Maria da Penha é um passo importante para a superação da discriminação de gênero. Veja que a Constituição, como V. Exª bem sabe, prega a discriminação positiva ou uma ação afirmativa: o tratamento dos desiguais de forma desigual. A Constituição determinava, naquele momento histórico, em 1988, já fazendo 25 anos este ano, uma lei protetiva para o gênero mulher, e a Lei Maria da Penha vem superar essa discriminação que existia, agora positiva. Por isso, quero parabenizar. Mas, além da lei, nós precisamos concretizar, como V. Exª estava a fazer referência, a implantação das delegacias, de um sistema próprio de proteção para as mulheres. Quero me associar a V. Exª e parabenizá-lo pela fala.

            O SR. BLAIRO MAGGI (Bloco/PR - MT) - Muito obrigado, Senador Pedro Taques.

            Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, após quase uma existência inteira de muito sofrimento e luta pela vida, a cearense Maria de Penha se transformou em uma legítima heroína brasileira, emblema vivo da causa pelos direitos da mulher e contra violência de gênero.

            Confinada a uma cadeira de rodas após inúmeras agressões, a busca por justiça de Maria da Penha libertou milhares de brasileiras do jugo de seus companheiros malfeitores.

            Mas sabemos que muitas outras Marias se encontram, neste momento, pelos quatro cantos do País, às voltas em casos recorrentes de agressões domésticas, cujos algozes dividem o mesmo teto e as ameaçam cotidianamente.

            Desamparadas pelo Estado, muitas delas não se sentem seguras o suficiente para denunciar os seus agressores, fazendo com que esse ciclo de violência doméstica não cesse.

            É nosso dever lutar, movidos pela força e pela resistência de Maria da Penha, para que todas as Marias sofridas e agredidas deste País tenham condições de se libertar de seus agressores e possam viver dignamente, como cidadãs livres e conscientes de seus direitos.

            É o que todos nós desejamos, Sr. Presidente.

            Esse é o meu pronunciamento deste dia, deixando registrada, então, Sr. Presidente, já a data comemorativa da Lei Maria da Penha, que será comemorada agora, no dia 7 de agosto.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/08/2013 - Página 51188