Discurso durante a 147ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas à insegurança jurídica decorrente das mudanças de posicionamento do STF acerca da perda de mandato do parlamentar condenado criminalmente; e outro assunto.

Autor
Pedro Taques (PDT - Partido Democrático Trabalhista/MT)
Nome completo: José Pedro Gonçalves Taques
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLATIVO, JUDICIARIO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL.:
  • Críticas à insegurança jurídica decorrente das mudanças de posicionamento do STF acerca da perda de mandato do parlamentar condenado criminalmente; e outro assunto.
Aparteantes
Paulo Davim, Vanessa Grazziotin.
Publicação
Publicação no DSF de 05/09/2013 - Página 60089
Assunto
Outros > LEGISLATIVO, JUDICIARIO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
Indexação
  • REGISTRO, REJEIÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, PROPOSIÇÃO, OBJETO, CASSAÇÃO, MANDATO PARLAMENTAR, DEPUTADO FEDERAL, CONDENAÇÃO CRIMINAL, DEFESA, APLICAÇÃO IMEDIATA, PERDA, MANDATO, MOTIVO, DECISÃO JUDICIAL, TRANSITO EM JULGADO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), EXTINÇÃO, VOTO ABERTO, AMBITO, LEGISLATIVO.

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco Apoio Governo/PDT - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores.

            A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Maioria/PP - RS) - Gostei.

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco Apoio Governo/PDT - MT) - Alguns gostam de Presidenta.

            A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Maioria/PP - RS) - Eu prefiro Presidente.

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco Apoio Governo/PDT - MT) - Eu prefiro seguir a Academia Brasileira de Letras, que fala presidente.

            Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, cidadãos que nos acompanham pelas redes e pela Agência Senado, a sociedade brasileira, Srª Presidente, está insegura.

            As leis, as normas constitucionais e as decisões judiciais têm um objetivo, que é certo, trazer a segurança jurídica, trazer a segurança jurídica. Digo isso em razão das reiteradas decisões do Supremo Tribunal Federal, cada uma tendo um caminho, cada decisão num sentido no que tange à perda ou não do mandato automaticamente em razão de uma decisão do próprio Supremo Tribunal Federal.

            Veja que o Supremo Tribunal Federal, em um período curto, mudou a sua posição três vezes. Três vezes. Primeiro, afirmou que, com a condenação transitada em julgado no Supremo Tribunal Federal, a perda do mandato seria automática, do Deputado Federal ou do Senador. Depois, o Supremo Tribunal Federal mudou a posição, deixando isso a cargo da Casa Legislativa na qual o Parlamentar exerce a sua legislatura. E, agora, o Supremo novamente muda de posição.

            Muito bem. Recentemente, a Câmara dos Deputados houve por bem aplicar o art. 55 em relação a um Deputado Federal do Estado de Rondônia, Donadon, condenado no Supremo Tribunal Federal a mais de 13 anos de reclusão em regime fechado. A Câmara dos Deputados entendeu por bem que esse cidadão, preso, poderia continuar a ostentar a categoria de Parlamentar federal, a ostentar a situação de Deputado Federal.

            A pergunta que se faz é a seguinte: como é possível um cidadão, com os direitos políticos suspensos nos termos do art. 15 da Constituição, inciso III, exercer ainda o mandato parlamentar? Aquele que tem suspensos os direitos políticos, como nós todos sabemos, de acordo com o art. 15, inciso III, da Constituição, em razão de uma sentença penal condenatória com trânsito em julgado, independentemente do regime prisional, independentemente da pena, não vota, não pode ser votado, não pode ajuizar ação popular -- que é um direito constitucional do cidadão no sentido restrito do termo --, não pode denunciar o Presidente pela prática de crime de responsabilidade, mas ele pode continuar a exercer o mandato de Deputado Federal. Isso não calha no que diz a Constituição de República. Como nós podemos sujeitar, subordinar a decisão do Supremo Tribunal Federal à aprovação ou não na Casa Legislativa de que o Parlamentar faz parte? Isso não se apresenta como razoável, Sra Presidente.

            Eu defendo que, com a condenação criminal transitada em julgado, independentemente da pena, independentemente do regime prisional, automaticamente o cidadão Parlamentar deva perder o mandato, porque não é possível, na democracia, nós permitirmos que condenados possam exercer mandatos eletivos, desde que exista o trânsito em julgado no Supremo Tribunal Federal. Em existindo o trânsito em julgado e, por consequência, a suspensão dos direitos políticos, ele está automaticamente fora do mandato.

            A Casa Parlamentar deve se manifestar através de uma decisão da Mesa e essa decisão não é constitutiva, é uma decisão declaratória, ou seja, a decisão da Mesa apenas reconhece a decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal.

            Qual a razão do legislador constituinte de 1988 estabelecer no art. 55, §2º, a previsão de que cabe ao Legislativo decidir sobre a perda ou não do mandato? Nós, na Constituição de 88, estávamos saindo de um período escuro da nossa história, estávamos saindo de uma ditadura em que o Poder Judiciário, muitas vezes, era rebaixado pelo Poder Executivo. Lembremos de que, no final da década de 60, ministros do Supremo Tribunal Federal tiveram os seus mandatos no Supremo cassados pela ditadura. O Judiciário, portanto, naquele momento histórico, apesar da qualidade dos juízes, apesar da garantia constitucional ofertada aos juízes, muitas vezes era rebaixado pelo Poder Executivo.

            Hoje, temos um Judiciário que é independente, temos um Judiciário que garante a concretização de direitos fundamentais do cidadão, temos um Judiciário que mantém a força normativa da Constituição. Portanto, a decisão do Poder Judiciário deve ser definitiva, notadamente, decisão do Supremo Tribunal Federal; notadamente, decisões da mais alta Corte da República. Agora, vamos sujeitar as decisões do Supremo Tribunal Federal às manifestações parlamentares, para que possam ocorrer situações absurdas. Digo, Srª Presidente, situação bizarra, como ocorreu na Câmara dos Deputados. Bizarra!

            Imagine, o cidadão está na Papuda, vem de lá algemado num camburão, desce na Chapelaria; ali, na Chapelaria, a Polícia Legislativa da Câmara o recebe e o acompanha até o plenário; ali, no plenário, ele fica sob escolta da Polícia Legislativa; sobe, faz o seu direito constitucional, exerce o seu direito constitucional de defesa; sai, é absolvido, a Câmara dos Deputados entendeu por bem não cassar o mandato desse Parlamentar; ele vai, entra novamente no camburão, na Chapelaria, vai para a Papuda. De repente, vem o Ministro do Supremo Tribunal Federal Barroso e traz uma decisão que mais parece uma alquimia constitucional, ele está criando uma nova Constituição, estabelecendo regras para cumprimento do mandato daquele que tem condenação a depender do regime que ele recebeu na sentença penal condenatória.

            Com todo o respeito ao Ministro Barroso, um dos maiores constitucionalistas do Brasil, reconhecido Ministro, com idoneidade, notável conhecimento jurídico, conforme determina o art. 101 da Constituição, neste caso, ele não trilhou o melhor caminho, porque cabe ao Supremo Tribunal Federal interpretar a Constituição. Cabe ao Supremo Tribunal Federal retirar da Constituição e dar sentido à Constituição, mas o Supremo Tribunal Federal não pode inventar uma Constituição a cada decisão. Faltou ao Ministro ler o art. 15, inciso III, que diz que, com a condenação transitada em julgado, independentemente do regime prisional, independentemente da pena estabelecida, existe a suspensão dos direitos políticos. Fazer aquela conta para saber se o mandato eletivo, se o cidadão condenado continuará a ser Deputado ou Senador, a depender da pena estabelecida? Isso é alquimia constitucional. Isso não é possível.

            O Ministro Gilmar Mendes, ontem, ao que consta, deu uma entrevista dizendo que o Ministro Barroso criou o chamado “mandato parlamentar salame”. Nós já vimos reforma tributária salame, fatiada, mas “mandato parlamentar salame” não se faz constitucional, não se faz possível

            A decisão do Ministro Barroso, com todo o respeito, é inconstitucional. É a chamada inconstitucionalidade chapada, inconstitucionalidade desvairada, porque é um absurdo. É uma decisão que contraria o que está escrito no próprio texto expresso da Constituição. Quero expressar ao Ministro Barroso, mas isso não é possível na República Federativa do Brasil.

            E veja, Senador Paulo Davim, que, quando ele foi sabatinado aqui, nós questionamos o Ministro sobre ativismo judicial, e ele disse que o Poder Judiciário só poderia se imiscuir em situações em que o Poder Legislativo não tivesse se manifestado. E não foi o caminho que a sua decisão trilhou.

            Para minha honra e alegria, concedo um aparte para um digno representante do Rio Grande do Norte.

(Soa a campainha.)

            O Sr. Paulo Davim (Bloco Maioria/PV - RN) - Senador Pedro Taques, quero parabenizá-lo pelo brilhante e oportuno pronunciamento que V. Exª faz na tarde de hoje. A despeito do ocorrido na Câmara, com a absolvição do Deputado, eu devo dizer que foi um fato extremamente constrangedor. Foi impressionante a repercussão que esse fato teve em todo o Brasil. Fui abordado no meu Estado por pessoas do povo, pessoas simples, pessoas que estão na massa anônima do Brasil, e eles me abordavam externando as suas indignações, externando a vergonha…

(Soa a campainha.)

            O Sr. Paulo Davim (Bloco Maioria/PV - RN) - … a vergonha do ocorrido na Câmara dos Deputados. Então, eu acho que o Congresso Nacional não pode se permitir passar por constrangimentos, como esse recente. Acho que esta Casa e o Congresso Nacional precisam dar uma resposta ao povo brasileiro. E essa resposta deverá vir sob propostas claras, sob propostas altivas. Essa história do voto secreto precisa acabar com urgência. Nada melhor para combater esses desvios de conduta do que a transparência, a mais absoluta possível. O povo precisa saber o posicionamento dos seus representantes. Ontem, eu ouvi o seu pronunciamento quando V. Exa apresentou à Mesa um manifesto assinado por 22 Senadores. Eu não tive a oportunidade de assiná-lo, mas externo também o meu mais irrestrito apoio àquele manifesto. Acho que V. Exa tem sido extremamente sábio nas suas posições, colocando com maestria, dominando bem o que diz, até porque, por força de ofício, V. Exa talvez seja, de todos nós, o que mais conhece esse tema. Portanto, Senador Pedro Taques, eu acho que a sua presença, a sua palavra têm contribuído sobremaneira para a formatação de um novo posicionamento não só do Senado, mas do Congresso Nacional.

(Soa a campainha.)

            O Sr. Paulo Davim (Bloco Maioria/PV - RN) - Ficam aqui minhas congratulações pelo seu oportuno pronunciamento.

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco Apoio Governo/PDT - MT) - Muito obrigado, Senador Paulo. Eu gostaria de dizer que, por mais que V. Exa não tenha assinado esse manifesto, eu gostaria de incorporar a ele a assinatura de V. Exa, que ainda há tempo. 

            Alguns dizem que não há melhor detergente do que a luz do sol. Para o Parlamentar, não há melhor detergente do que a luz do painel. Porque aquele que não deseja votar que se manifeste votando, ou não comparecendo, ou se abstendo. Mas ele tem que revelar para o eleitor qual caminho ele trilhou.

            O cidadão que nos elege tem o direito constitucional de saber em quem nós estamos votando, de que maneira nós estamos votando, até para que ele possa saber, lá para frente, se ele vai renovar ou não o exercício das nossas funções constitucionais na próxima eleição, Srª Presidente. 

            Portanto, V. Exª trouxe aqui a questão do voto aberto. Eu defendo a votação aberta em todas as situações.

(Soa a campainha.)

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco Apoio Governo/PDT - MT) - Em todas as situações.

            Agora, a Câmara dos Deputados aprovou essa proposta de emenda na data de ontem, mas, com todo o respeito aos 513 Deputados, inclusive Deputados presos -- nós temos que respeitar todos --, com todo o respeito aos Deputados, essa proposta de emenda aqui no Senado vai receber sérias resistências, porque muitos Senadores são contrários à votação aberta de autoridades. E só o Senado vota autoridade, de acordo com o art. 52 da Constituição.

            Portanto, seria muito mais interessante a votação daquela proposta de emenda que se encontra na Câmara dos Deputados, em uma das gavetas escuras da Câmara dos Deputados. Porque muitos projetos, muitas propostas de emenda de relevo que são aprovadas aqui ficam adormecidos numa gaveta escura na Câmara dos Deputados.

            Precisamos do voto aberto, e do voto aberto logo, para que a cassação daqueles outros que já foram condenados pelo Supremo Tribunal Federal possa ser concretizada.

(Soa a campainha.)

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco Apoio Governo/PDT - MT) - Não interessa o regime prisional -- se é fechado; se é semiaberto; se é aberto --, o cidadão tem suspensos os direitos políticos, de acordo com o art. 15 da Constituição.

            Nós não estamos, aqui, a tratar do Deputado A, B, do Senador X ou Z; nós estamos a tratar do que está escrito na Constituição da República.

            Srª Presidente, nós vivemos momentos em que cada Parlamentar deve assumir a sua responsabilidade, cada um de nós. Para quem é contrário, existem argumentos contrários à votação aberta. Muitos entendem que podem sofrer pressão. Senador que aceitar pressão é algo complicado. Por isso, a Constituição estabelece que a idade mínima para ser Senador seja 35 anos, porque aqui nós temos pessoas experientes. Dos 81 Senadores, temos, parece-me, 40 ex-Deputados Federais; 35 ex-Governadores; tínhamos 3 ex-Presidentes da República; e a Senadora Ana Amélia e eu, que nunca exercemos cargos eletivos.

            Quem não aguenta pressão, é melhor ficar em casa.

(Soa a campainha.)

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco Apoio Governo/PDT - MT) - Não vem para o Senado.

            Para minha honra, concedo um aparte a S. Exª a Senadora Vanessa.

            A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco Apoio Governo/PCdoB - AM) - Da mesma forma como fez o Senador Davim, quero cumprimentá-lo pelo pronunciamento. Logo na sequência, quando amanheceu o dia seguinte à decisão da Câmara dos Deputados, eu digo a V. Exª que custei a acreditar que aquilo estivesse acontecendo, porque não há efeito prático nenhum, nobre Senador. Nenhum!

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco Apoio Governo/PDT - MT) - Nenhum.

            A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco Apoio Governo/PCdoB - AM) - Porque, como V. Exª coloca, ele não pode exercer os seus direitos políticos. Ele não tem como votar; ele não tem como participar; ele não tem a sua liberdade; ele está sem poder exercer o direito à liberdade. E como alguém sem o direito à liberdade pode ser Parlamentar? Então, eu acho que o que temos de fazer, Senador… Eu, à época, dizia que a Câmara deveria rever a sua decisão. Salvo engano, já existe precedente de que, em casos semelhantes, a própria Mesa Diretora…

(Interrupção do som.)

            A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco Apoio Governo/PCdoB - AM) - … considerou extinto o mandato. Portanto, acho que a nós não cabe outra atitude senão evitarmos que isso volte a ocorrer mais adiante. E como evitarmos? Há duas propostas importantes: uma é a emenda constitucional, Emenda nº 18, salvo engano também, pela qual perda de direitos políticos acarreta automaticamente a perda de mandato; e a outra é o voto aberto. Eu concordo: não há mais por que votar perda de mandato pelo voto secreto. Concordo com V. Exª. Não sei se o caminho adotado pela Câmara ontem foi o mais ágil. Eu acho que é o mais demorado de todos. Lá está a PEC 196 na Comissão; votando na Comissão, rapidamente a Câmara votaria no plenário e nós marcaríamos a sessão de promulgação. Esse seria o caminho mais rápido. Então, cumprimento V. Exª pelo pronunciamento, Senador.

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco Apoio Governo/PDT - MT) - Sim, eu agora… A votação na Câmara dos Deputados da PEC, não aquela que nós votamos aqui, mas da PEC que estende para todos os cargos, me faz lembrar um ditado do Estado de Mato Grosso: “Se tem jabuti no pau, ou é enchente, ou é mão de gente!” Esta PEC lá foi votada por algum motivo, se o jabuti está no pau, ele não subiu no pau, ou é enchente, ou é mão de gente. Aí tem alguma coisa que nós precisamos analisar, tendo em conta os julgamentos do Supremo Tribunal Federal.

            Eu encerro, Srª Presidente, agradecendo os apartes e a tolerância de V. Exª. Mas é difícil ser político no Brasil dessa maneira, porque nós todos somos políticos, nós todos estamos no mesmo balaio. Estamos no mesmo balaio porque somos políticos, é lógico que cada um com ações diversas, mas se você é político, você já entra devendo. Já entra devendo. E isso não é bom para a democracia. A Câmara dos Deputados é de suma importância, o Senado é de relevo, de significativa relevância na consolidação da democracia.

            Parece-me que alguns desejam o enfraquecimento do Legislativo -- o enfraquecimento do Legislativo. Isso não é bom para um Estado que se diz democrático de direito.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/09/2013 - Página 60089