Discurso durante a 147ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Insatisfação com a manutenção do mandato do Deputado Natan Donadon pela Câmara dos Deputados; e outro assunto.

Autor
Cyro Miranda (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/GO)
Nome completo: Cyro Miranda Gifford Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLATIVO, CONGRESSO NACIONAL. JUDICIARIO.:
  • Insatisfação com a manutenção do mandato do Deputado Natan Donadon pela Câmara dos Deputados; e outro assunto.
Publicação
Publicação no DSF de 05/09/2013 - Página 60115
Assunto
Outros > LEGISLATIVO, CONGRESSO NACIONAL. JUDICIARIO.
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, REFERENCIA, MANUTENÇÃO, MANDATO PARLAMENTAR, DEPUTADO FEDERAL, CONDENAÇÃO CRIMINAL, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF).
  • CRITICA, PARTICIPAÇÃO, MINISTRO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), REFERENCIA, JULGAMENTO, PROCESSO JUDICIAL, PARTE, BANCO COMERCIAL, CREDOR, EMPRESTIMO.

            O SR. CYRO MIRANDA (Bloco Minoria/PSDB - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Obrigado, Senadora Ana Amélia, que preside esta sessão.

            Srªs e Srs. Senadores, imprensa do Senado que cobre este dia, senhoras e senhores, tanto a absolvição do Deputado Natan Donadon quanto a conduta do Ministro Dias Toffoli são incompatíveis com a República, a democracia e o Estado de direito.

            São dois episódios que alimentam o descrédito e justificam as críticas verificadas nos inúmeros protestos e reivindicações relacionadas à representatividade política e às ações dos Poderes da República.

            Ainda que seja vitória da minoria em razão do quórum qualificado, a decisão da Câmara foi inconstitucional e inoportuna, porque pretende dar o tratamento da excepcionalidade e do casuísmo a um Parlamentar condenado e recluso numa penitenciária.

            Ora, José Afonso da Silva diz que os "direitos políticos consistem na disciplina dos meios necessários ao exercício da soberania popular". Isso se revela, clara e inequivocamente, no direito eleitoral de votar e ser votado.

            Não é por mero acaso que o Ministro e Professor Teori Zavascki ensina que "estar no gozo dos direitos políticos significa, pois, estar habilitado a alistar-se eleitoralmente, habilitar-se a candidaturas para cargos eletivos ou à nomeação para certos cargos públicos não eletivos".

            Estar no gozo dos direitos políticos é um princípio que se repete e se reforça em diversos momentos da Constituição Federal como requisito para o exercício de cargos públicos.

            No Brasil, pela própria luta em favor da redemocratização, o Legislador Constituinte consagrou como regra geral a manutenção dos direitos políticos. Mas numa sociedade assentada no Estado de direito, por mais democrática e aberta que deseje ser, não se poderia deixar de prever a exceção à regra geral.

            Assim é que a Constituição Federal diz no art. 15, inciso III:

"Art. 15 - É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de:

III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos."

            Ora, ao absolver da cassação o Deputado Natan, a minoria dos Deputados feriu a Constituição, sobretudo porque a condenação do Deputado excede o término do mandato parlamentar que lhe foi concedido.

            Esse tipo de atitude demonstra um corporativismo, ao menos da minoria, e revela à sociedade um desejo claro de preservar um Parlamentar que, pela própria conduta, não faz jus ao mandato outorgado pelos cidadãos.

            Sempre é bom lembrar que não somos Parlamentares. Nós estamos Parlamentares, mas somos cidadãos comuns que recebemos da sociedade a tarefa de representá-la nas decisões maiores da Nação e da Federação.

            Se, de alguma forma, à Câmara ou ao Senado ou ao Congresso permite-se algum privilégio, viramos as costas aos eleitores e à sociedade civil. Sinalizamos que não somos dignos de representá-los. Rompemos o contrato social.

            A julgar pelos depoimentos de alguns Deputados, está preparada uma verdadeira farra dos mensaleiros, que devem estar vibrando com a possibilidade de serem absolvidos pelos próprios pares, ainda que condenados pelo Supremo Tribunal Federal. Isso será inadmissível na democracia que temos edificado ao longo da história do Brasil e, em particular, desde a promulgação da Constituição de 1988.

            No caso específico do Congresso Nacional, passamos da hora de abolir o voto secreto. O voto aberto mudará o comportamento do Parlamentar, que será obrigado a dar satisfação ao eleitor. Precisamos agir rápido!

            Lamentavelmente, condutas contrárias à ética e à moral não ocorrem somente no âmbito do Poder Legislativo. Também são contrárias à República e à democracia atitudes como a do Ministro do Supremo Tribunal Federal Dias Toffoli. O Ministro não parece pautar a sua participação no julgamento e apreciação de processos pelos princípios da administração pública. Como é que um Ministro do STF não se declara impedido para apreciar processos do Banco Mercantil do Brasil, onde obteve empréstimos de mais de R$1 milhão, conforme matéria publicada no jornal O Estado de S. Paulo?

            Isso abala o princípio que separa o público do privado, o exercício do poder pelo agente político da sua vida pessoal. É intolerável numa democracia, caracterizada pelo império da lei, que, pouco tempo depois de ter dado sentença favorável ao Banco Mercantil, o Ministro tenha renegociado empréstimos com a instituição, com taxas reduzidas e diferenciadas dos demais correntistas do banco.

            Parece que o Ministro, cuja condução ao Supremo Tribunal Federal foi cercada de controvérsias, precisa reler o Código do Processo Civil, o Código do Processo Penal e o Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, em que pese seu notório saber jurídico, condição para ascender à Suprema Corte. Esses dispositivos deixam bem claro que um juiz não deve relatar processos em que uma das partes for sua credora.

            É difícil acreditar que o Ministro Toffoli relata ações do Banco Mercantil desde que assumiu a cadeira no Supremo, em 2009.

            Segundo o jornal, em 2011, o Ministro contraiu dois empréstimos: o primeiro, de R$ 931.000,00, foi concedido em setembro daquele ano, em 180 parcelas fixas de R$ 13.800,00, a serem pagas até 2026. Liberado três meses depois, o segundo crédito, de R$ 463.000,00, teve pagamento definido em 204 prestações fixas de R$ 6.700,00, com vencimento até 2028.

            Em ambos os casos, estranhamente, o Banco Mercantil não só aceitou o mesmo imóvel como garantia, a casa do Ministro no Lago Norte, mas também ofereceu uma taxa extremamente privilegiada: 1,35% ao mês.

            Esta taxa foi reduzida, em 2011, para 1%.

            Não vou discutir se o Ministro tem outras rendas e capacidade financeira para arcar com prestações acima dos seus rendimentos oriundos do STF, mas não tenho a menor dúvida: o Ministro deve explicações sobre esta conduta.

            Srª Presidente, a democracia, a República e o Estado de direito são instituições que precisam ser construídas e solidificadas a cada dia, porque, para existirem, requerem a incorporação no cotidiano de todos nós, cidadãos, do princípio do império da lei.

            Se os próprios agentes políticos se afastam desse princípio, tanto em decisões como a que livrou da cassação o Deputado Natan Donadon quanto na conduta do Ministro Dias Toffoli, abalam-se as bases da democracia, dura conquista da sociedade brasileira simbolizada pela Constituição de 1988.

            Muito obrigado, Srª Presidente.

            Esse era o pronunciamento.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/09/2013 - Página 60115