Discurso durante a 143ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Lamento pelo baixo quorum na sessão destinada a decidir sobre a cassação do mandato do Deputado Federal Natan Donadon; e outro assunto.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CAMARA DOS DEPUTADOS. SAUDE, EDUCAÇÃO.:
  • Lamento pelo baixo quorum na sessão destinada a decidir sobre a cassação do mandato do Deputado Federal Natan Donadon; e outro assunto.
Publicação
Publicação no DSF de 30/08/2013 - Página 58095
Assunto
Outros > CAMARA DOS DEPUTADOS. SAUDE, EDUCAÇÃO.
Indexação
  • CRITICA, QUORUM, PRESENÇA, SESSÃO, PLENARIO, CAMARA DOS DEPUTADOS, OBJETIVO, CASSAÇÃO, MANDATO PARLAMENTAR, CONDENAÇÃO CRIMINAL, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF).
  • CRITICA, QUALIDADE, SERVIÇOS PUBLICOS, BRASIL, ENFASE, EDUCAÇÃO, SAUDE.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, creio que é unânime, hoje no Brasil, que as manchetes dessa manhã nos jornais envergonham o Congresso Nacional com a decisão da Câmara de manter o mandato de um Deputado, que para vir aqui se defender saiu da Papuda, a prisão do Distrito Federal.

            Mas havia uma coisa no discurso dele que eu quero chamar a atenção. O Deputado reclamou, Senador Jucá, da comida e da água fria da cadeia. Foi preciso um Deputado ser preso para descobrir que, na cadeia, há água fria e comida ruim. Por isso é que defendo escola pública para os nossos filhos; por isso é que defendo que nós temos que usar os serviços públicos -- e que não seja a cadeia --, para descobrirmos as dificuldades dos serviços públicos no Brasil.

            Esse Deputado devia achar que havia ar condicionado na cadeia, ele devia achar que água era quente com banheira, com massagem, e tudo que se tem direito no conforto dos que podem pagar.

            A mesma coisa, nós todos, das classes mais altas -- média e alta --, achamos que as escolas, Senador Raupp, estão ótimas, porque as dos nossos filhos estão boas. Nós pagamos por elas e achamos que as escolas em geral estão boas, quando estão em condições piores do que a cadeia. Por uma razão muito simples. Um preso, no Brasil, custa cerca de R$3 mil por mês, e um aluno da escola pública custa R$2,5 mil por ano. Ou seja, o custo mensal de um preso, com água fria e comida ruim, por mês, é quase 50% a mais do que o custo de uma escola pública, por ano.

            E aí o Deputado descobre que a água lá é fria. A gente não descobre que a escola dos filhos dos pobres é ruim. É preciso, sim, levar adiante, Senador Randolfe, pelo menos debatermos -- debatermos, não digo nem aprovar --, a ideia da conveniência de que nós usemos os serviços públicos que o povo usa.

            Eu digo isso, mas quero deixar clara a profunda frustração de ver a Câmara dos Deputados ter votado -- por omissão, na verdade; a maioria dos votos foi a favor da cassação, mas os que se omitiram, fugiram, não votaram -- pela derrubada da proposta de cassação de um Deputado que vem da prisão para cá. Eu lamento profundamente.

            E lamento profundamente quando vejo, na lista dos ausentes, pessoas muito próximas, pessoas de partidos com tradição neste País, Parlamentares que lutaram sempre pela decência, pela ética, pela seriedade, pela respeitabilidade da Casa.

            Eu creio que o povo brasileiro precisa olhar com cuidado os que não votaram. E nós temos que fazer o voto aberto, Senador Paim; e eu defendo a sua proposta de tudo ser aberto. Eu me sinto constrangido, Senador Sérgio Souza, quando dou um voto secreto aqui. Eu me sinto constrangido diante dos meus eleitores. Eles têm direito de saber como é que eu votei em cada caso aqui, tudo, tudo, tudo. Eu me sinto constrangido, envergonhado. Por isso, eu defendo a proposta do Senador Paim.

            Mas, nesse caso de ontem, não basta o voto ser aberto; é preciso saber quem faltou. Porque ficar ausente, às vezes, é uma forma de votar secretamente. Você se retira do plenário, não vota, ninguém vê a luzinha acesa verde ou vermelha correspondente ao seu nome, e sai tranquilo. É preciso que a população olhe quem não votou ontem. Alguns provavelmente terão desculpas. Alguns estavam ausentes da cidade, alguns podiam estar doentes. Mas aqueles que estavam lá e se retiraram pouco antes da votação não têm desculpa, colaboraram para envergonhar a Câmara.

            E ao envergonhar a Câmara, Senador Renan, envergonham também a nós, que somos irmãos siameses da Câmara. Somos uma só coisa, na verdade, que é o Congresso Nacional.

            A Câmara, ontem, podia ter evitado a tragédia de votar dessa maneira.

            E eu concluo, Senador, dizendo que o povo vai para a rua porque caiu a ficha. Caiu a ficha de que o hospital de quem pode pagar é muito melhor do que o hospital público; caiu a ficha de que não adianta esperar, porque já esperaram muito, e isso não vai mudar; caiu a ficha de que a educação é ruim; caiu a ficha de que não adianta comprar um carrinho e ficar endividado, pagando, pelo resto da vida quase, uma prestação para ficar três horas no trânsito engarrafado; caiu a ficha de que a corrupção ficou endêmica; caiu a ficha para o povo, mas não caiu a ficha para muitos de nós que fazemos política. A ficha ainda não caiu para aqueles que ontem se ausentaram, para aqueles que ontem votaram para salvar o Deputado. Não caiu a ficha deles, Senador, e isso é um perigo, porque, se cair a ficha do povo e não cair a nossa, o conflito vai levar à nossa derrota. Se cai a ficha deles e não cai a nossa, eles virão aqui para a frente, como já vieram, e vão tentar mais do que tentaram, e vão fazer isso em cada câmara de vereadores, em cada assembleia legislativa.

            É preciso que a ficha caia entre nós; tanto a ficha de que os serviços públicos estão degradados, como descobriu o Deputado, usando a água fria da cadeia, quanto também dos serviços públicos que nós não usamos, na área da saúde e da educação, sobretudo.

            É isso, Sr. Presidente. Vamos fazer com que a ficha caia também na cabeça e no coração de cada um de nós. A ficha dos maus serviços públicos e a ficha de que o povo está muito irritado e muito descontente, porque, para eles, a ficha já caiu.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/08/2013 - Página 58095