Discurso durante a 186ª Sessão de Debates Temáticos, no Senado Federal

Debate sobre o pacto federativo.

Autor
Paulo Bauer (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/SC)
Nome completo: Paulo Roberto Bauer
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FISCAL, GOVERNO ESTADUAL.:
  • Debate sobre o pacto federativo.
Publicação
Publicação no DSF de 25/10/2013 - Página 75736
Assunto
Outros > POLITICA FISCAL, GOVERNO ESTADUAL.
Indexação
  • PACTO FEDERATIVO, DESENVOLVIMENTO, BRASIL, DIVIDA, ESTADOS, MUNICIPIOS, INSUFICIENCIA, TROCA, INDICE, CORREÇÃO, PROBLEMA, INVESTIMENTO, IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS (ICMS), NECESSIDADE, RENEGOCIAÇÃO, SENADO, IGUALDADE, BENEFICIO, FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS ESTADOS E DO DISTRITO FEDERAL (FPE), FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS MUNICIPIOS (FPM), ESTABELECIMENTO, PRAZO, QUESTIONAMENTO, PROGRAMA, AJUSTE FISCAL, TESOURO NACIONAL, PRIVILEGIO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), IMPORTANCIA, REGULAMENTAÇÃO, IMPOSTOS, REDISTRIBUIÇÃO, RECURSOS, COMPENSAÇÃO, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL.

            O SR. PAULO BAUER (Bloco Minoria/PSDB - SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado, Sr. Senador.

            Sr. Presidente, Renan Calheiros; nobres Senadores; colegas presentes à Mesa; Senador Lindbergh, Senador Walter; prezados Governadores do Mato Grosso e também de Alagoas, é um grande prazer poder participar desta sessão e também aqui manifestar a nossa opinião a respeito de tema tão importante que traz a esta Casa também o Ministro Mantega, para que, exatamente, possamos debater e discutir uma questão fundamental para o desenvolvimento do País, que é o Pacto Federativo.

            Falo aqui em meu nome, mas também falo em nome do PSDB, o meu Partido, na condição de Vice-Líder da Bancada. Naturalmente, não posso deixar de mencionar e abordar assuntos que dizem respeito ao meu Estado, ao Estado de Santa Catarina, e que têm relação direta com o tema que ora está em debate.

            Começo pelo exemplo de Santa Catarina, na questão da dívida dos Estados e Municípios com a União.

            Em 2002, nós, catarinenses, o governo do nosso Estado, tínhamos uma dívida consolidada de R$4 bilhões perante a União. Pagamos, de lá até aqui, R$10 bilhões e ainda estamos devendo R$8 bilhões. Como apresentou aqui o sempre Senador e Governador Teotonio Vilela, meu grande companheiro de Partido, a realidade de Alagoas não é diferente da realidade de Santa Catarina e de tantos outros Estados, como também do Mato Grosso. É isso mesmo: Santa Catarina devia R$4 bilhões, pagou R$10 bilhões, e ainda deve R$8 bilhões.

            Muitos Estados brasileiros estão em situação semelhante. E por que isso aconteceu? Porque o Governo Federal cobra dos Estados juros e taxas mais elevadas do que ele próprio paga ao mercado; paga 7% ao ano para os títulos que oferta do Tesouro Nacional e cobra IGP-DI, acrescidos de mais 9%, ou de até 9% ao ano, dos Estados e Municípios devedores.

            O Governo pode argumentar que a solução já está encaminhada com a aprovação, pela Câmara, ontem mesmo, do Projeto de Lei Complementar nº 238, de 2013. O Governo dirá que basta o Senado confirmar a aprovação do projeto, e tudo estará resolvido. No entanto, Sr. Ministro, essa matéria ainda inspira algumas dúvidas, e deve ser analisada cuidadosamente por esta Casa, pelo Senado.

            A questão da mudança do índice de correção parece, à primeira vista, resolver satisfatoriamente o problema. Estados e Municípios deixam de pagar IGP-DI e até mais 9% e passam a pagar Selic ou IPCA mais 4%, o que for menor. Certamente, todos vão concordar que isso parece razoável, e encerra o problema. Mas não encerra, não, porque não nos podemos afastar da outra realidade e da outra verdade, aqui já apresentada pelos governadores, que é a questão do fluxo de caixa dos Estados, que é a questão do comprometimento percentual da receita líquida do Estado para amortização da dívida.

            Não podemos perder a oportunidade de, nesse momento, inserir também na discussão esse tema.

            E eu diria que o Ministro, o Ministério, o Governo, naturalmente, relutariam em qualquer instante, em qualquer discussão, para a redução pura e simples de 13 para 10, de 12 para 9 ou de 15 para 8. É óbvio que não o fará. Nós sabemos que o Governo também trabalha com limitações. Embora eu integre a Bancada de Oposição e deseje colocar aqui o Governo na parede, exigindo uma providência, uma solução, antes de ser da oposição, sou brasileiro. E, como brasileiro, quero efetivamente que se encontrem soluções boas para todos, para o Governo e para o País, por que não?

            Aí, pergunto ao Ministro: como um Estado vem ao Governo Federal, já que tudo é centralizado, e todos dependemos do Governo Federal, lamentavelmente? Não existe mais Federação, Senador Lindbergh. Existe um grau de dependência do império brasileiro. E o império brasileiro está efetivamente presente no Governo Federal, que concentra a maior arrecadação do País e as maiores decisões quanto a investimentos do País.

            Então, vem um governador a Brasília, para buscar recursos para a execução de obras, e se vê compelido a colocar recursos do Estado, dos quais ele não dispõe, como contrapartida para a execução daquele projeto. Não seria óbvio, Ministro, que os recursos dessa contrapartida, no projeto que o próprio Governo Federal aprovou, fossem deduzidos daquela parcela mensal que se cobra, a título de amortização da dívida, e colocados de novo para pagamento no final do contrato ou no final do prazo para o seu vencimento? Eu penso que não estaríamos aumentando dívida alguma. Estaríamos apenas repactuando dentro do processo do prazo para a quitação dos valores.

            De outra forma, também penso, Senador Armando Monteiro, naquela votação que fizemos aqui no Senado, na qual definimos que o Governo Federal não poderia transferir aos Estados o ônus das desonerações tributárias que praticou para salvar a economia nacional, quando isentou veículos, isentou material de construção, isentou tantas outras atividades econômicas de impostos. Providências contra as quais não temos nenhuma crítica a fazer, mas é de se perguntar: como é que o Governo Federal desonera tributariamente uma área e uma atividade econômica, impondo a um Estado uma redução de receita, e o Estado não tem nenhuma compensação com isso? Por que não deixar que o Estado tenha compensação outra vez pela via da dedução daquele “prejuízo”, entre aspas, que lhe foi imposto por essa desoneração, na extensão do prazo da dívida que ele tem consolidada com a União? Ora, todos nós sabemos: reduz-se o valor da dívida pela mudança do indexador. Mas não se mexeu no valor da prestação que está casada com a arrecadação de ICMS de cada Estado. Portanto, o Estado pagará mais rápido o seu débito, mas continuará tendo problemas na sua gestão, no seu custeio, nos investimentos que precisa realizar. E, se o Estado conseguir obter recurso, mesmo que através de um novo financiamento, porque também está prevista a possibilidade de ele aumentar o seu endividamento graças a esse recálculo, então, no novo financiamento que buscar, outra vez vai precisar de recursos da sua receita própria para colocar como contrapartida. E não haverá condições de ele fazer o Estado avançar e crescer com investimentos em infraestrutura, com melhoria de serviços públicos, que são o grande sonho deste País e de toda a sua população.

            No entanto, Sr. Presidente, devo ainda destacar, além disso, um detalhe importantíssimo, levantado pela Liderança do PSDB aqui no Senado, referente à repactuação da dívida acumulada pelos Estados e Municípios. O projeto apenas autoriza - cito de novo: autoriza - a União a recalcular os saldos devedores. Logo, impõe-se a pergunta: qual o critério para essa renegociação? Será um critério isonômico para todos os Estados e Municípios ou o Governo Federal usará a futura lei como mais um instrumento de ação política?

            Certamente o Ministro nos dará uma resposta garantindo que todos os entes federados terão o mesmo tratamento. Mas, todos sabemos, citando Cora Corolina, que, na prática, a teoria é outra.

            A responsabilidade, então, recai sobre nós, Senadores. Analisemos a possibilidade de mudança na redação desse artigo, transformando esse poder discricionário, concedido pelo projeto, em um poder vinculado. Regulemos os critérios para essa renegociação entre o Governo Federal, Estados e Municípios, de modo a impedir, já na letra da lei, a concessão de privilégios a alguns governos e o surgimento de desculpas para o não atendimento de outros. E essas desculpas nem queremos colocá-las no âmbito da política. Nós temos que mantê-las, inclusive, sob a análise técnica. Cada governador que demorar para renegociar vai continuar pagando seus 13%, 14% até chegar o dia em que tudo for recalculado, e meses são anos na administração pública, e anos são décadas. E eu tenho certeza de que nenhum governador está interessado em aguardar até abril, maio, junho do ano que vem, um ano eleitoral, para, então, ver a sua renegociação feita.

            É preciso, sim, criar o efeito impositivo e estabelecer prazo para que a negociação seja feita, se não nós teremos problemas, logo, logo, que não queremos vivenciar e que devemos evitar.

            Eu, mesmo, vou estudar, Senador Lindbergh, na Comissão de Assuntos Econômicos, da qual faço parte, a possibilidade de apresentação de emenda nesse sentido.

            Como citei a goiana Cora Coralina, não posso deixar de comentar uma emenda, aprovada ontem, por mérito da Bancada de Goiás, especialmente do Líder do Democratas na Câmara, Deputado Ronaldo Caiado. A emenda garante benefícios da futura lei para ao menos 13 Estados que têm outras dívidas com a União. Entre eles, a minha Santa Catarina.

            Já se comenta que a Presidente irá vetar essa emenda. Se isso for verdade, a nossa esperança recairá sobre a apreciação do veto, especialmente agora, com o instituto do voto aberto, quem sabe! Aí nós veremos quem é quem, pela vez primeira. 

            Aproveitando a presença do Ministro, coloco também alguns questionamentos quanto ao Programa de Ajuste Fiscal do Tesouro Nacional (PAF). Da forma como foi colocado, o programa está direcionado exclusivamente para o Município de São Paulo, ao que parece. Por quê? Porque é o único que se encaixa nas regras colocadas.

            Entretanto, outros 180 Municípios - e o Ministro já fez menção a eles aqui - se encontram em situação semelhante à do Município de São Paulo. Qual a razão para não dar a eles as condições de enquadramento facilitado para poderem também ser beneficiados por esse programa?

            Encerradas as minhas observações sobre a questão das dívidas, Sr. Presidente, peço licença para abordar rapidamente outro ponto colocado em debate: a guerra fiscal entre os Estados.

(Soa a campainha.)

            O SR. PAULO BAUER (Bloco Minoria/PSDB - SC) - Esse é um tema particularmente sensível para o meu Estado, Santa Catarina, que está no centro deste debate, pois é um dos Estados que ainda resistem ao acordo sobre as novas alíquotas do ICMS proposto pelo Governo Federal.

            Santa Catarina tem seus motivos para isso, Ministro, e apresentou um argumento difícil de ser refutado. O setor agroindustrial catarinense hoje compra insumos com alíquota de 12% e vende sua produção com a mesma alíquota. Se aceitar a proposta do Governo, passará a comprar pagando 7% e a vender cobrando 4%.

            A conta não fecha, o que poderia levar as agroindústrias a deixarem Santa Catarina e irem, por exemplo, para Mato Grosso, onde o milho está disponível todos os dias. Se elas continuarem lá em Santa Catarina, nós temos que construir a ferrovia mais rapidamente para que o milho chegue lá. Se não, não tem galinha nem suíno que consiga crescer a ponto de se transformar em renda. E nós queremos, sim, Ministro, que esse assunto seja resolvido, e eu cofio que será.

(Soa a campainha.)

            O SR. PAULO BAUER (Bloco Minoria/PSDB - SC) - Muita gente em Santa Catarina diz que o Governo Federal é bom, que está fazendo muito. Eu contradito afirmando que o Governo Federal não é bom para Santa Catarina. Ele, na verdade, é apenas um emprestador de dinheiro, quando autoriza BNDES e o Banco do Brasil a realizarem operações de crédito que alcançam 12 bilhões para o Estado só nos últimos dois anos. Está, na verdade, com os empréstimos, exigindo que os catarinenses paguem no futuro o que já vêm pagando desde sempre, na forma de tributos da União.

            Somente nos dois últimos anos - já estou encerrando, Sr. Presidente -, Santa Catarina pagou 45 bilhões em impostos ao Governo Federal, e no mesmo período retornaram ao Estado apenas 9 bilhões em investimentos. Ou seja, tirou 45 devolveu 9. É muito pouco, Ministro, para um Estado que contribui com o desenvolvimento do País de forma exemplar.

            Perdoe-me a digressão, Sr. Presidente. Retorno à questão do ICMS.

            (Soa a campainha.)

            O SR. PAULO BAUER (Bloco Minoria/PSDB - SC) - Ainda que cheguem a um acordo que necessariamente deverá envolver compensações da União com os Estados, fica a pergunta: o Governo Federal irá mesmo bancar esse acordo? Se existe essa intenção, não a vimos se materializar na discussão e votação da MP 599. Qual a posição do Governo sobre o Projeto de Lei Complementar nº 106, de minha autoria, relatado pelo Senador Armando Monteiro, que cria o Fundo de Compensação de Receitas? V. Exª, Ministro, já disse que ele precisa ser implementado. Só não sei se será o projeto apresentado e relatado na forma de substitutivo pelo Senador Armando Monteiro.

            De qualquer forma, sei que já me alongo e vou encerrando, sem deixar de dizer que tenho a convicção...

            (Soa a campainha.)

            O SR. PAULO BAUER (Bloco Minoria/PSDB - SC) - ... de que a discussão sobre o ICMS deveria, sim, estar inserida num debate maior, que contemplasse uma ampla reforma tributária e ajustes nos mecanismos dos Fundos de Participação de Estados e Municípios. Portanto, na reformulação do Pacto Federativo. Mas, já que não está, eu me associo às palavras do Senador Lindbergh Farias, e vamos tratar dos quatro temas que ainda podemos neste ano.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/10/2013 - Página 75736