Discurso durante a 200ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupações com a fragilização do Mercosul; e outro assunto.

Autor
Ana Amélia (PP - Progressistas/RS)
Nome completo: Ana Amélia de Lemos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CALAMIDADE PUBLICA. MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL).:
  • Preocupações com a fragilização do Mercosul; e outro assunto.
Publicação
Publicação no DSF de 12/11/2013 - Página 80732
Assunto
Outros > CALAMIDADE PUBLICA. MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL).
Indexação
  • REGISTRO, SITUAÇÃO, EMERGENCIA, EXCESSO, CHUVA, MUNICIPIO, PORTO ALEGRE (RS), ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), EXPECTATIVA, LIBERAÇÃO, RECURSOS, OBJETIVO, ASSISTENCIA, VITIMA.
  • REGISTRO, CRISE, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), PREJUIZO, ECONOMIA NACIONAL, NECESSIDADE, INTEGRAÇÃO, MEMBROS, GRUPO ECONOMICO.

            A SRa ANA AMÉLIA (Bloco Maioria/PP - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Obrigada, Presidente desta sessão, Senador Ruben Figueiró.

            Endosso as manifestações do nosso colega, Vice-Presidente desta Casa, Senador Jorge Viana, sobre as questões da relevância do agronegócio, da produção sustentável, que é o conceito que foi desenhado no Brasil com a votação do Código Florestal. Agricultores, mais do que qualquer técnico, sabem - e V. Exª é de um Estado de produção agrícola - a relevância de preservar a terra, Senador Jorge Viana. Então, ele, mais do que qualquer um, sabe que tem que preservar curso d’água, tem que ter as matas ciliares, ele sabe fazer curva de nível. No meu Estado, sabe fazer plantio direto na palha. Ele sabe que esse manejo adequado é a sobrevivência dele, porque, se a terra não produzir, ele não terá a renda. Então, preservar a terra, preservar o ambiente em que ele trabalha...

            Agora mesmo, passei por algumas lavouras que são, para mim, as mais bonitas. São as lavouras de trigo. São lindas, e em colheita. Uma belíssima safra. Lamentavelmente, a informação que se tem é que o Governo autoriza a importação de trigo na hora em que está colhendo a safra. Isso, para o agricultor que está comemorando uma boa colheita, Senador, é uma frustração. É uma frustração! Então, a gente tem que olhar esse agricultor que está ali.

            E aí vem mais uma novidade, além dessa de abrir a porteira para importação na hora de uma safra muito boa - e o Brasil é o maior importador de trigo do mundo, com toda a área que nós temos: a máquina agrícola, o trator e a colheitadeira têm que ser emplacados. Cálculos que foram feitos pelo autor do projeto que está proibindo essa exigência, que é o Deputado Alceu Moreira, estimam que R$27 bilhões poderão ser arrecadados por esse sistema. Então, vejam só, é muito complicada a vida do agricultor. Retirar do bolso do agricultor R$27 bilhões é retirar renda de quem produz da terra.

            Mas eu fiz esse preâmbulo apenas para complementar o que disse aqui, com muito brilho, o Senador Jorge Viana, que, junto com o Senador Luiz Henrique, foram os relatores do Código Florestal e trabalharam, com muita seriedade, para que o Brasil fosse dotado de uma legislação adequada à produção sustentável. Aliás, por falar nisso, é exatamente esse ambiente que eu venho abordar.

            Hoje o Rio Grande do Sul foi açoitado violentamente por um gravíssimo temporal. Imagine o senhor que as chuvas, só na capital Porto Alegre, chegaram a 88mm de água, que se acumulou, quando a média de todo o mês de novembro é de 83%. Então, numa manhã, foram 88mm, quando a média do mês é de 83mm. Imagine o senhor os estragos e a perturbação na mobilidade urbana em Porto Alegre, na manhã de hoje, por conta desse temporal.

            Além dos 18 pontos de alagamento na nossa capital, Porto Alegre, com prejuízos ao serviço público de saúde e de transporte, os sindicatos rurais do Estado falam em perdas com o granizo que caiu em diversas regiões produtoras do meu Estado, como Bento Gonçalves e Santa Tereza, Municípios que são marcadamente dedicados à produção de uvas viníferas, dedicadas à produção do vinho, ou uvas de mesa. Estima-se, na primeira avaliação, que há uma perda de 70% dessa produção. Isso é uma verdadeira tragédia se forem confirmados esses dados preliminares.

            Até o fim do dia, os sindicatos rurais irão concluir um levantamento sobre os impactos da chuva no comércio de produtos agrícolas e na renda dos agricultores, segundo fui informada pelo Vereador Enio de Paris, da Câmara de Vereadores de Bento Gonçalves, do meu partido.

            Um levantamento preliminar feito a pedido da Presidente do Sindicato Rural do Município, Inês Fagherazzi, mostra que as perdas em cultivos de pêssego e uva chegaram, em alguns casos, a 70% nas propriedades atingidas pelo granizo na manhã de hoje. São danos irreparáveis, que prejudicam não apenas a renda do produtor rural, mas também o comércio de alimentos, inclusive os industrializados, como o de vinhos.

            A Defesa Civil deve contabilizar os estragos até o final do dia e atualizar as informações.

            Espero que essa situação de emergência sensibilize as autoridades, em especial os Ministérios da Integração Nacional e das Cidades, para que recursos emergenciais sejam liberados para dar atenção às vítimas desse grande temporal.

            Eu faria uma analogia do temporal de hoje, Senador, com o que está acontecendo no Mercosul: é outro temporal.

            Hoje, 11/11/2013, nós teríamos uma reunião do Parlamento do Mercosul em Montevidéu - hoje e amanhã.

            O Presidente do Parlamento do Mercosul anunciou, na véspera da viagem dos Parlamentares, que a reunião havia sido suspensa. Nem a Argentina, nem o Paraguai iriam comparecer à reunião do Parlamento do Mercosul.

            Isso dá apenas a ideia das fragilidades em que estamos vivendo nesse bloco. Isso começa na área política, mas se aprofunda muito na área econômica.

            O Mercado Comum do Sul, o chamado Mercosul, que é um importante bloco formado pela Argentina, pelo Brasil, pelo Uruguai, por Paraguai e por Venezuela, deveria ser prioridade para o efetivo fortalecimento do comércio exterior regional, sobretudo num momento de crise internacional. Ao contrário disso, está cada vez mais fragilizado.

            A partir do nosso Governo, em relação às sucessivas barreiras comerciais impostas principalmente pelo governo da Presidente Cristina Kirchner, é inegável o sinal do descaso com este bloco regional.

            Essa fragilidade é medida em números. Em 2012, Senador Ruben Figueiró - e o senhor é do Mato Grosso do Sul -, houve uma queda de 15% das exportações brasileiras para o Mercosul. Só no ano passado, uma queda de 15% nas relações comerciais.

            A ausência de compromisso com o Mercosul por parte da Argentina, principal parceiro comercial do bloco, é uma demonstração cristalina, recorrente, do descaso dos principais integrantes do bloco com o comércio regional sul-americano.

            De todos os Estados brasileiros, 21 apresentaram déficit no intercâmbio com a Argentina, e o pior, claro, foi o nosso, que tem, digamos, a fatalidade geográfica de estar aí na vizinhança.

            Só no caso dos calçados brasileiros, as perdas são enormes. Em 2008, auge do comércio de calçados Brasil/Argentina, a corrente de comércio entre os dois países chegou a US$2,188 bilhões, segundo dados da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), cujo presidente, Heitor Klein, tem demonstrado, sempre, a situação preocupante desse setor, com o risco de mais geração de desemprego. E é o Heitor Klein que nos chama atenção para estes dados.

            No ano passado, o comércio desses produtos caiu para US$1,6 bilhão. Mais de US$400 milhões estão deixando de ser comercializados apenas nesse segmento. As perdas também atingem os setores de móveis e da indústria de alimentos.

            Caminhões frigoríficos com alimentos perecíveis já tiveram que voltar, com perda total da carga, caro Senador Ruben Figueiró. Indústrias do meu Estado; produtos perecíveis.

            Mais uma vez, o Rio Grande do Sul, sentiu o choque do protecionismo argentino: o déficit da balança comercial gaúcha com a Argentina já supera, nesta semana, mais de US$1,3 bilhão, segundo dados da Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul, presidida por Heitor Müller. As barreiras ao comércio persistem, e, lamentavelmente, nada está sendo feito!

            São 750 mil pares de calçados à espera de liberação e centenas de produtos alimentícios retidos na alfândega. Muitos - como eu disse - perecíveis.

            E veja só: ali, na alfândega do Rio Grande do Sul, todos sabem que a moda também é um produto perecível, porque, passada a estação, ela já não vale mais. O produto cai de preço, porque não há mais o interesse do comprador.

            E estamos às vésperas do Natal. Produtos estão aguardando autorização na entrada da Argentina, e o comércio está sendo prejudicado. Como se sabe, meu Estado faz fronteira com a Argentina e, também, com o Uruguai, dois importantes parceiros comerciais do Mercosul. O Rio Grande do Sul é o primeiro a sentir as turbulências e o mal-estar quando a relação comercial no Mercosul está abalada.

            O importante envolvimento do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior com as questões de comércio está, sem dúvida, carente do empenho pelo conjunto do Governo brasileiro.

            Eu já falei muito com o Ministro Fernando Pimentel, vejo nele pessoalmente um esforço no sentido de resolver essas barreiras, mas não tem sido suficiente - esse esforço pessoal do Ministro Fernando Pimentel - para que a Argentina mude esta atitude em relação ao Brasil.

            É preciso uma ação diplomática e comercial estratégica em favor da real ampliação e consolidação do comércio exterior do Brasil, a começar pela vizinhança. Nós temos que trabalhar nesse entendimento. Estamos sendo paternalistas demais e menos defensores do nosso setor industrial ou produtivo.

            Falta política externa coordenada e estratégica que fortaleça, verdadeiramente, o comércio regional, sem prejuízos à nossa economia e sem desestímulos aos empresários, comerciantes e empreendedores, mesmo os individuais, que se dedicam, diariamente, ao comércio internacional, sobretudo aqui na região da América do Sul. Enquanto a novata Aliança do Pacífico, formada por México, Chile, Colômbia e Peru, fortalece o comércio exterior com mais de US$556 bilhões em exportações só no ano passado, o Brasil amarga prejuízos com o Mercosul sem conseguir o apoio para cumprir a cartilha básica da imperfeita, mas necessária, união aduaneira.

            No ano passado, como eu disse, as exportações totais do Mercosul foram de apenas de US$335 bilhões. A Aliança do Pacífico, uma área de livre comércio que já conseguiu zerar as tarifas de 90% dos produtos de exportação, ganha, diferentemente do Mercosul, a atenção de países desenvolvidos, interessados em fechar negócios com a América Latina.

            Não estou falando de uma área de livre comércio, como é o caso bem sucedido da União Europeia. Falo de uma união comercial mais simples, menos complexa, mas que não consegue deslanchar nem gerar crescimento de exportações e importações. As riquezas mínimas esperadas com a manutenção de um bloco do porte do Mercosul estão esquecidas e longe de se transformarem em ganhos econômicos e sociais para os integrantes desse bloco aduaneiro.

            Lamentavelmente, os rumos do Mercosul estão, a cada dia, mais desanimadores. O Governo brasileiro, líder do bloco, não tem conseguido superar as sucessivas frustrações. Duas importantes reuniões da representação brasileira no Parlamento do Mercosul que estavam agendadas para hoje, como eu disse, foram canceladas, conforme nota do Presidente do Parlamento do Mercosul, Rubén Martinez Huelmo.

            Sem avanços concretos no campo econômico, faltam decisões políticas fortes o suficiente para acelerar as negociações com outros parceiros da América do Sul e também da União Europeia. É importante salientar que nos dez primeiros anos do Mercosul, o Brasil e os demais membros conseguiram produzir um importante crescimento nas trocas comerciais intrabloco: uma expansão de 400%, que atraiu, obviamente, a atenção de outros países interessados no Mercosul.

            As exportações do Brasil para a Argentina, no período de 1990 a 2000, cresceram quase 1.000%, segundo avaliação da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo. Naquele período, o Mercosul estimulou o aumento da escala industrial em alguns setores do Brasil e da Argentina, beneficiando o desenvolvimento da indústria automobilística e de bens de consumo duráveis.

            Os rumos da política econômica argentina, entretanto, têm gerado sucessivas instabilidades no Mercosul. Constantes barreiras não tarifárias impostas aos produtos brasileiros e um ultrapassado regime de licenças prévias estão inflando os números negativos das trocas bilaterais.

            No ano passado, as nossas exportações para a vizinha Argentina caíram 20,7%, enquanto as importações apresentaram queda de 2,7%.

            Em 2012, as exportações brasileiras para o Mercosul caíram 15%. Há quem diga que uma zona de livre comércio, como a concebida lá nos anos 90, de menor alcance, seria o caminho para minimizar as perdas que o atual modelo do Mercosul tem gerado no Brasil.

            Mesmo com a valorização do dólar, o que favorece, sim, as nossas exportações, a balança comercial do Brasil segue debilitada.

            O Governo brasileiro fala em um possível acordo com a União Europeia, mas o Brasil e o Uruguai ainda não estão em condições e com propostas prontas para conseguir o apoio da Argentina e do Paraguai antes da apresentação aos europeus, prevista para o fim deste ano.

            Enquanto isso, a Argentina aumenta as compras de produtos chineses, enquanto o Brasil acumula o pior resultado semestral dos últimos 18 anos. O déficit já passou dos US$3 bilhões no primeiro semestre deste ano. Por descaso com a área internacional, o Brasil está importando muito mais do que exportando.

            As vendas externas somaram US$114,5 bilhões, enquanto as importações superam os US$117,5 bilhões. Isso significa menos emprego, comércio deprimido e escassez de recursos circulando na economia brasileira.

            Portanto, passa a hora de o Governo Federal olhar com mais atenção e dar prioridade para as questões que estão envolvendo o comércio do Mercosul.

            Deixar esse bloco comercial sem rumo é oficializar a morte prematura dessa união aduaneira e abrir brechas para que as crises econômicas, causadas ou não por problemas climáticos ou financeiros, se instalem de modo recorrente em nosso País, com danos econômicos e sociais que teremos dificuldades em reparar.

            São essas observações que eu trago na tarde de hoje, Senador Ruben Figueiró, para mostrar, realmente, não só como gaúcha, que a questão do Mercosul transcende o meu Estado. Ela tem relação com Santa Catarina, com o Paraná, com vários Estados brasileiros, com o seu Estado, Mato Grosso do Sul, e não é possível ficarmos vendo a banda passar sem reclamar ou sem cobrar providências mais rápidas para evitar um colapso na nossa produção.

            Já estamos com um déficit comercial expressivo, e deixar que ele se amplie é muito ruim para todo o conjunto da economia brasileira.

            Esse alerta é um benefício para o País. Não é um alerta crítico, é um pedido, um apelo, um SOS para o Governo, na área econômica, dar mais atenção. Porque não é possível admitir, Senador Ruben Figueiró, que nós olhemos, tácita e passivamente, a Argentina substituir o Brasil, que está do seu lado, por produtos chineses.

            Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/11/2013 - Página 80732