Discurso durante a 91ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas à instalação dos Conselhos de Políticas Sociais pelo Governo Federal.

Autor
José Agripino (DEM - Democratas/RN)
Nome completo: José Agripino Maia
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO, POLITICA PARTIDARIA, POLITICA SOCIAL.:
  • Críticas à instalação dos Conselhos de Políticas Sociais pelo Governo Federal.
Aparteantes
Cristovam Buarque.
Publicação
Publicação no DSF de 10/06/2014 - Página 692
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO, POLITICA PARTIDARIA, POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • REGISTRO, POSIÇÃO, PARTIDO POLITICO, DIRETORIA DE ENGENHARIA DA MARINHA (DEM), OPOSIÇÃO, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, RELAÇÃO, CRIAÇÃO, CONSELHO, POLITICA SOCIAL.

            O SR. JOSÉ AGRIPINO (Bloco Minoria/DEM - RN. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, a minha palavra, nesta tarde de segunda-feira, é para manifestar uma posição que o meu Partido está tomando na Câmara dos Deputados, que pode parecer, num primeiro momento, uma observação aligeirada, pode parecer merecedora de reparos, mas, na verdade, eu desejo deixar claro que está sendo tomada a bem do País e a bem da verdade.

            Eu me refiro à posição que o Líder do meu Partido, Deputado Mendonça Filho, está tomando na Câmara dos Deputados. Trata-se de um projeto de decreto legislativo que objetiva evitar a instalação de uma novidade que o Governo anuncia como uma coisa popular, uma coisa benéfica, e que eu desejo, nesta tarde de hoje, ainda que rapidamente, analisar. Refiro-me à instalação dos conselhos de políticas sociais - o anunciado Conselho de Política Social -, que o Governo estaria agora, só agora, desejando instalar, para ouvir o povo sobre o que fazer.

            Presidente, acho curioso. No ano passado, em junho, julho, o Brasil foi assolado, de Norte a Sul, de Leste a Oeste, por movimentos substantivos, movimentos graúdos de manifestações populares de indignação, de protesto contra aquilo que o Senador Cristovam acabou de falar a propósito da Copa; aquilo que se resolveu denominar de “eu quero saúde padrão FIFA”, “eu quero educação padrão FIFA”, “eu quero transporte público padrão FIFA”, como um símbolo. A referência era o que o Brasil estava gastando com os estádios, basicamente com os estádios, sem ter a contrapartida da igualdade de oportunidades para brasileiros, que tinham estádios maravilhosos, majestosos, mas tinham uma saúde pública deplorável, um transporte público deplorável e que continua a produzir as lamentáveis cenas de incêndio de ônibus de ponta a ponta neste País.

            Os movimentos populares ocorreram de forma substantiva e graúda em junho, julho e agosto. Depois, com menos intensidade. Eles foram contaminados pelos Black Blocs, que passaram, não sei insuflados por quem, a produzir violência explícita, com depredação de patrimônio público e privado, e inibiram os movimentos populares merecedores de aplausos no Brasil, porque eram pacíficos e traziam bandeiras que, se tivessem sido observadas pelo Governo, já teriam produzido melhoras para o País.

            A minha pergunta é por que esses conselhos de políticas sociais não foram gestados no ano passado, logo após as manifestações populares, para que as pessoas que quisessem se manifestar fossem organizadas e houvesse instrumentos de audição para que elas pudessem se dirigir a esses conselhos, e esses conselhos ajudarem na formulação de políticas públicas? Por que só agora? Por que só agora em tempo de eleição?

            Muito bem. Essa é a primeira indagação que faço, ou o primeiro reparo, dando guarida à manifestação do nosso Líder na Câmara, o Deputado Mendonça Filho.

            Senador Cristovam, eu gostaria que V. Exª fizesse a reflexão que eu quero fazer. V. Exª é um estudioso e deve saber que o ditador de extrema direita fascista, Mussolini, lá atrás, criou os conselhos corporativos. Naquele tempo, a Itália não tinha congresso. Ele criou os conselhos corporativos os quais não ouvia. Ele fazia o que queria. Mas criou a figura do conselho corporativo para dar a impressão ao país de que estava ouvindo as pessoas, para que ele pudesse fazer as coisas que ele queria, da cabeça dele, como se tivesse o respaldo dos conselhos corporativos, numa atitude fascista. Um país que, àquela época, não tinha congresso para falar em nome do povo e era substituído por conselhos corporativos.

            Logo depois, Oliveira Salazar, que tinha um congresso para inglês ver, criou também coisas semelhantes, para bypassar o congresso, para fazer coisas que Salazar queria fazer com o cunho popular, bypassando o congresso. Não lembro o nome dos conselhos, era um conselho de audiência popular. Oliveira Salazar, um símbolo da extrema direita do mundo, que governou Portugal por anos e anos.

            V. Exª deve se lembrar que, no Estado Novo, houve essa tentativa. Aqui no Brasil, no Estado Novo, houve essa tentativa. No Estado Novo o que menos se prezava era o Congresso, era a Casa do povo. E se tentou criar isso.

            Por essa razão é que o meu Partido está para preservar a força da representação popular do Congresso, que tem os seus defeitos, mas tem as suas virtudes.

            Eu quero que acusem o Congresso Nacional de produzir uma lei malfeita, mal-intencionada. Pode ter na sua composição gente - poucos -, que não seja de boa conduta, até admito, mas lei debatida por seis meses, um ano, dois, três, quatro. As leis que o Congresso produz são sempre de boa qualidade. São coisas refletidas, são coisas debatidas, são coisas democráticas, produto de um País cujo patrimônio maior que tem é a sua democracia.

            Por essa razão trago à apreciação, nesta tarde, a posição que o meu Partido toma contra esses conselhos de políticas sociais, remetendo ao passado aquilo que foi feito com instrumentos para driblar, para bypassar a força da representação popular legítima pelo voto democrático do povo, que é o Congresso de qualquer país.

            E mais uma indagação: por que só agora? Se queria que as manifestações do povo, as queixas do povo pudessem ser ouvidas, por que não fez isso lá atrás, lá em abril, lá em agosto, em setembro do ano passado? Por que só agora? Por que é tempo de eleição? E quer aparecer como raio de esperança, criando esses conselhos que na verdade são um misto de coisa atrasada com coisa de extrema direita, para bypassar ou para diminuir o poder do Congresso Nacional brasileiro? Vai ter o nosso protesto.

            Ouço com muito prazer o Senador Cristovam Buarque.

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Senador José Agripino, eu tendo a ficar favorável ao que democratize. Agora, que contradição é essa de querer democratizar por decreto? Ou seja, na base da autoridade, o que não deixa de ser autoritarismo, mesmo quando diz que o objetivo é democratizar. Por que não um projeto de lei? Por que não um projeto de lei que seja discutido aqui ao longo de meses e meses, para que a gente, no fim, faça um sistema que permita, sim, ouvir o povo? É preciso. Acho que estamos num Parlamento antiquado, na época da internet, na época do celular. Nós estamos antiquados por falta de diálogo direto com o povo. Que nós desenvolvamos aqui mecanismos de escuta da vontade popular, mas isso não pode ser feito por decreto. Primeiro ponto. Segundo ponto: se quer ouviu o povo, por que não põe em discussão o Orçamento, as prioridades orçamentárias? Aliás, o PT inventou o chamado Orçamento Participativo, que, apesar de uma certa manipulação que pode ser feita, pelo menos ouve o povo de alguma forma, embora a gente perceba que, no fim, quem vai para as reuniões dos orçamentos participativos são os grupos organizados corporativamente, mais do que o próprio povo em si. Então, o que me indigna e que eu acho que é lamentável é que, em nome de uma democratização sintonizada, eu diria, com a ideia de escuta maior do povo, estejam fazendo isso por decreto. Isso é que é contraditório e lamentável. É contraditório e autoritário.

            O SR. JOSÉ AGRIPINO (Bloco Minoria/DEM - RN) - Obrigado, Senador Cristovam. V. Exª sempre dando contribuições positivas às ideias que se debatem, às vezes a favor, às vezes contra, mas sempre com muita lucidez.

            Veja, Senador Cristovam, a audiência a segmentos que têm contribuição a dar ao debate de algo que esteja sendo examinado pelo Congresso é garantida pelas audiências públicas. Agora mesmo eu acabei de pedir vista de um processo que trata do disciplinamento de uma matéria, atribuições da atividade de economistas, porque surgiu uma dúvida entre atribuições de economistas e administradores. Nada melhor do que você ouvir as partes, ouvir de forma administrada, pública, para que os argumentos sejam colocados de parte a parte.

            Quantas vezes nós não trouxemos aqui, em audiências públicas, manifestações de segmentos, de sindicatos, de representações de classe, de raça, de religião, de tudo, para que publicamente, com a TV Senado ou com a Rádio Senado divulgando para milhões de brasileiros, as opiniões pudessem ser expostas, e o debate pudesse ser estabelecido entre aqueles que vêm trazer as suas ideias e os Senadores, que vão decidir, que são os legisladores, democraticamente, usando a instituição Congresso Nacional como elemento de debate maduro, não por decreto, mas por delegação direta do povo. Tanto as audiências públicas trazem para cá representantes de categorias quanto quem debate são os outorgados pelo voto do povo para legislar, que somos nós, os Senadores ou os Deputados Federais.

            Só para terminar. Eu comecei a minha vida pública, Senador Cristovam, como Prefeito de Natal. De Prefeito de Natal, eu fui eleito direto Governador de Estado. A coisa que mais me fez popular como Prefeito de Natal, e quando fui Prefeito de Natal, eu nunca tinha visto um ofício de serviço público, um processo de serviço público, porque eu era da iniciativa privada, engenheiro construtor de estradas. O que me fez popular, o que me fez sentir a dor do povo, fazer com que o dinheiro público fosse gasto com mais parcimônia do que o meu próprio dinheiro, foram as reuniões que eu fazia às sextas-feiras em igrejas, em conselhinhos comunitários, em pontas de rua, para perguntar ao povo o que ele queria que fosse feito com recurso próprio da Prefeitura. Eu arranjava recurso para fazer o programa do Banco Mundial, do Banco do Nordeste, do BID, do Banco Interamericano, que eram programas robustos, mas o recurso próprio dava para fazer a extensão de água, o pequeno posto policial, o equipamento do posto de saúde, a puxada do transporte coletivo, o calçamento de uma rua que significasse o eixo do transporte coletivo para um bairro. Ali eu instituí o orçamento participativo. Era o povo. Eu nem me apercebia disso. Isso foi em 1979. Eu nem me apercebia disso. Mas ali foi onde fundei o orçamento participativo. Na verdade, o mais democrático de todos os instrumentos de você fazer política pública é você entregar ao povo, no diálogo aberto, sistemático, toda sexta-feira, a definição sobre o que fazer com o pouco recurso para uso livre de que o gestor público pode dispor.

            Então, com a colocação de V. Exª faz, eu concluo minha fala com esta manifestação: a bem de um princípio democrático de respeito ao Congresso brasileiro e de mostrar os exemplos do passado que não podem remeter a equívocos do presente, essa história de conselho de política social, a esta altura, é programa de tentativa de uso de algo de governo com claríssimo objetivo eleitoral. Por essa razão, nós vamos nos manifestar claramente contra.

            Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/06/2014 - Página 692