Pela Liderança durante a 14ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas à política externa brasileira com relação à prisão de lideranças oposicionistas ao governo da Venezuela.

Autor
Ricardo Ferraço (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Ricardo de Rezende Ferraço
Casa
Senado Federal
Tipo
Pela Liderança
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL:
  • Críticas à política externa brasileira com relação à prisão de lideranças oposicionistas ao governo da Venezuela.
Aparteantes
Aloysio Nunes Ferreira, Alvaro Dias, Ana Amélia, José Medeiros.
Publicação
Publicação no DSF de 24/02/2015 - Página 54
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL
Indexação
  • CRITICA, POLITICA EXTERNA, BRASIL, MOTIVO, OMISSÃO, ANIVERSARIO, PRISÃO, LIDER, OPOSIÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, DETENÇÃO, PREFEITO, CARACAS, SIMULTANEIDADE, CRISE, ECONOMIA, SOCIEDADE, PAIS, PARTICIPANTE, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL).

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Maioria/PMDB - ES. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Senador Paim, Srªs e Srs. Senadores, brasileiros que nos acompanham pela TV Senado, no último dia 18 de fevereiro, completou-se um ano da descabida e absurda prisão do líder oposicionista Leopoldo Lopez na Venezuela.

            Trata-se de tema que, talvez, possa não significar, ou não impactar o dia a dia de um País como o nosso, que enfrenta tantos e tantos desafios no campo da política, no campo da economia - como se estivéssemos à margem ou à beira de uma tempestade perfeita se formando no âmbito econômico e no âmbito da política. Mas o que está em jogo na Venezuela são valores universais em relação aos quais nós precisamos no empenhar. O que está em jogo é a democracia, o que está em jogo é a liberdade de expressão, que está em jogo é a convivência com a diferença.

            Mas, como se isso não bastasse, foi efetuada a igualmente absurda e violenta detenção do prefeito de Caracas, o Sr. Antonio Ledezma, outra importante liderança da oposição a um regime que tem se mostrado reacionário e abusivo, além de incompetente na gestão daquele país, que tem tudo, todas as condições para ser um país próspero e dinâmico.

            Agora, o que chama a atenção, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores - e falo aqui na condição de Parlamentar que atua na Comissão de Relações Exteriores, tendo tido o prazer, inclusive, de presidir essa Comissão nos últimos dois anos - é a timidez, é a forma quase omissa - por que não dizer omissa? - que nós, lamentavelmente, percebemos na nota do Itamaraty a propósito do atual momento vivido pela Venezuela, na qual as partes são instadas a buscar o entendimento, mas sequer é mencionada a prisão, sob vagas alegações de golpismo, de um líder eleito como o prefeito de Caracas, não nos oferecendo nessa quadra, sinceramente, razão para otimismo em relação às mudanças e aos rumos da política externa brasileira.

            Srªs e Srs. Senadores, como aprendemos a duras penas no Brasil que lutou pela redemocratização e em outros tantos países do nosso continente, a liberdade e o direito de expressão, a pluralidade e a possibilidade de dissentir são fundamentos inalienáveis. Nos nossos dias, em qualquer lugar, não pode haver, e não há, legitimidade fora do ideal democrático.

            Logo após a abertura dos trabalhos legislativos, ocupei a tribuna para partilhar com colegas Senadores preocupações e expectativas relativas ao novo ciclo da Presidente Dilma Rousseff na área da política externa.

            Entre outras muitas correções de rota então assinaladas, sugerimos a necessidade de superar a chamada "paciência estratégica", que vem dominando a nossa relação com os nossos vizinhos problemáticos.

            Cobrei dos formuladores da nossa política externa a capacidade de resistir aos regimes amigos, notadamente os da Venezuela e da Argentina, com quem os governos do PT mantêm fortes vínculos de cunho marcadamente ideológico.

            Retorno agora a esta tribuna, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, por um sentimento de sincera solidariedade para com o povo venezuelano, para com os filhos e as filhas dessa grande nação vizinha pela qual nutrimos o mais profundo respeito e fraternal admiração.

            Ouço, com extremo prazer, o Senador Alvaro Dias.

            O Sr. Alvaro Dias (Bloco Oposição/PSDB - PR) - Senador Ricardo Ferraço, nossos cumprimentos a V. Exª pela oportunidade do pronunciamento - pronunciamento que falta no Palácio do Planalto e no Itamaraty. Não se admite o silêncio do Governo brasileiro diante da violência avassaladora que toma conta da Venezuela, com um presidente truculento, boquirroto, prepotente, autoritário. Esse espetáculo de violência patrocinado por ele ainda agora, com o prefeito detido, é a consagração de um sistema autoritário, implacável, que tem de ser condenado pelos democratas de todo o mundo. Não há justificativa para o silêncio do Governo brasileiro, em nome do nosso povo, em razão das suas tradições democráticas. Essa violência tem de encontrar uma reação à altura do mundo civilizado. E, certamente, um país como o nosso, com sua grandeza, tem de ter presença marcante na hora dessa reação inevitável. A nossa solidariedade também aos venezuelanos e os cumprimentos a V. Exª.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Maioria/PMDB - ES) - Agradeço, Senador Alvaro Dias, e peço permissão a V. Exª para incorporar o aparte que faz ao nosso pronunciamento.

            Confesso, inclusive, que é com muita tristeza e também com crescente preocupação que acompanhamos a escalada da crise que castiga nosso querido vizinho do norte e que tanto mal tem feito ao povo daquele país - crise, aliás, que a um só tempo é política, é econômica, é social, enfim, há um conjunto de variáveis que, neste momento, impacta a Venezuela.

            Na economia, observamos, incrédulos, que um país com potencial de tornar-se um dos mais prósperos do continente, detentor de uma das maiores reservas de petróleo do mundo, parece marchar para o absoluto colapso econômico.

            É tão severa a escassez de alimentos que as pessoas fazem filas quilométricas, que demoram horas, para comprar produtos básicos, bens essenciais, de primeira necessidade, à manutenção do seu dia a dia.

            Tão grave e generalizada é a crise de abastecimento que, segundo recente veiculação da Rede CNN, um pequeno pacote de preservativos chega a custar o equivalente a cerca de €55, ou seja, R$180, no mercado oficial. É o colapso em todos os níveis do abastecimento.

            Estimativas internacionais assinalam o encolhimento de 4% da economia venezuelana apenas em 2014. O déficit fiscal já compromete 20% do produto interno bruto nacional - quase o dobro do índice verificado, por exemplo, na Grécia, que atravessa a pior crise financeira de sua história. A produção de petróleo retraiu-se em 25%, e a inflação já é a maior do mundo.

            O flagelo da economia é o flagelo de toda a sociedade venezuelana, que está empobrecida e maltratada. Aumentou expressivamente no último ano o contingente de pobres e miseráveis do país, ameaçando os ganhos sociais - tenho que admitir - obtidos nos primeiros 16 anos em que esteve à frente do Governo o Sr. Hugo Chávez.

            Contudo, não é apenas o atual descalabro econômico que serve de combustão ao mal-estar que transborda na sociedade venezuelana.

            Ouço, com prazer, a Senadora Ana Amélia.

            A Srª Ana Amélia (Bloco Democracia Participativa/PP - RS) - Caro Senador Ricardo Ferraço, eu também vou abordar esse tema, mas V. Exª, como é natural na Casa política... Cada Parlamentar tem uma visão própria a respeito dessa situação - eu diria caótica - que vive a Venezuela. E nesse cenário de gravidade, com desabastecimento generalizado, no qual ser comerciante e vender gêneros de primeira necessidade é um crime, estão sendo presos os empresários sob acusações as mais estapafúrdias, assim como foi a prisão do prefeito de Caracas, Ledezma. Então, para ocultar os problemas gravíssimos que a população já não suporta mais viver - de desabastecimento, dessa falta de liberdade democrática -, o governo cria esses factóides, colocando na prisão um prefeito eleito democraticamente sob a acusação de que está tramando uma conspiração para a derrubada do governo. Chama atenção essa forma tolerante de ver a crise de um vizinho, especialmente quando levamos em conta que tivemos uma atitude completamente diferente quando o Paraguai, dentro da lei, promoveu o impeachment de seu presidente: o Governo brasileiro tomou a iniciativa imediata de suspender o Paraguai do Mercosul. Agora a Venezuela é membro do Mercosul, as cláusulas democráticas não são diferentes, são as mesmas cláusulas, e isso que está acontecendo na Venezuela deveria merecer, pelo menos, uma posição mais atenta, porque isso vai comprometer o já enfraquecido Mercosul. Além disso, a Argentina - V. Exª se ocupou deste tema -, nosso parceiro preferencial, acaba de fechar um acordo com a China que praticamente tira o Brasil de cena na relação bilateral. Então, parabéns, Senador Ricardo Ferraço, porque V. Exª teve a coragem de trazer aqui, para falar na Comissão de Relações Exteriores, uma das opositoras ao regime, a Deputada Corina, cujo mandato foi cassado pela mão forte do poder executivo venezuelano.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Maioria/PMDB - ES) - Agradeço a V. Exª pela atenta e precisa contribuição à reflexão que trago.

            Se o Governo Federal, se o Itamaraty, que deve conduzir a nossa política externa, se apequena em um momento como este, o Senado da República não pode, e não deve, ter o mesmo papel. Tampouco deve ser esse o papel da Comissão de Relações Exteriores, até porque ávidos estamos de que o marasmo possa ser superado, a inércia possa ser, no Senado, superada, e nós possamos constituir as nossas comissões permanentes e dar continuidade aos debates, às audiências públicas, dizendo aos brasileiros e a todos os que nos acompanham que não vamos nos curvar diante do que vem ocorrendo não apenas na Venezuela, mas também na Argentina, e que tem grave e grande impacto na realidade brasileira.

            Ouço com prazer o Senador Medeiros.

            O Sr. José Medeiros (Bloco Democracia Participativa/PPS - MT) - Senador Ferraço, muito feliz o seu pronunciamento, que nos remete a uma questão muito importante, que é a soberania do nosso País. A forma como o Brasil vem se comportando - que não é de agora; é de tempos -, como foi no caso com a Bolívia e em outros aqui na América do Sul, eu diria essa quase cumplicidade com as atrocidades que esses governos vêm cometendo, essas “democracias” - entre aspas -, que pretendem acabar com os opositores não com argumento, mas à bala, é muito complicado. E V. Exª colocou bem: nós não podemos nos apequenar. Até porque, como diz o ditado, quem se comporta como verme não pode reclamar quando é pisado. E, infelizmente, se esta Casa não enfrentar esse problema, nós vamos ficar vendo calmamente o Brasil se “venezuelar”. Alguns poderão dizer que é um exagero, mas aqui nós já vemos algumas semelhanças, como: qualquer voz contrária é tachada de golpista. A cada voz contrária, é como se estivessem querendo derrubar o Governo. Sabemos que poder não se ganha, poder se toma. Agora, nós temos um processo aqui já consolidado, de instituições consolidadas, mas temos que ficar atentos, porque, de tempos em tempos, vemos nuanças do Governo brasileiro flertando com esses regimes. É decreto que vem para cá, é muita “paciência”- entre aspas -, vamos dizer assim, flertes com essas ditaduras disfarçadas de democracia. V. Exª, com toda a experiência que tem, vem aqui e coloca o pingo nos is, e eu comungo totalmente com o seu pronunciamento. Muito obrigado.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (PMDB - ES) - Agradeço a contribuição de V. Exª. E, com igual prazer, ouço o Senador Aloysio Nunes Ferreira.

            O Sr. Aloysio Nunes Ferreira (Bloco Oposição/PSDB - SP) - Senador Ferraço, apenas um breve aparte para me solidarizar com o pronunciamento muito oportuno de V. Exª. Eu fui membro da Comissão de Relações Exteriores desta Casa sob sua Presidência e tenho as melhores lembranças do seu desempenho naquela Comissão. E V. Exª hoje, na tribuna, retoma uma linha de trabalho que já iniciou naquela Comissão, na sua Presidência. Eu me lembro da sua atitude corajosa de, em solidariedade ativa ao diplomata brasileiro Eduardo Saboia, ir até a fronteira do Brasil para poder propiciar a saída segura dele de uma situação vexatória e perigosa para ele. Sob a sua Presidência, a Comissão votou um requerimento de minha autoria, de convite ao embaixador da Venezuela para que viesse à Comissão exatamente para tratar de problemas de violação de direitos humanos no seu país, violações que se intensificam e que se agravam. Espero que, na retomada dos trabalhos da Comissão, nós possamos, com o mesmo denodo com que V. Exª se empenhou em solidarizar-se com a Deputada Corina, com o Embaixador Saboia, nesta Legislatura, retomarmos essa linha de solidariedade ativa àqueles que lutam pela democracia na Venezuela. Muito obrigado.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (PMDB - ES) - Inclusive, com a retomada dos trabalhos na Comissão de Relações Exteriores, com base em resolução que todos nós aprovamos, nós teremos ainda, na primeira quinzena de março, a presença de S. Exª, o Chanceler Mauro Vieira, cumprindo determinação desta resolução, para que ele possa debater conosco os rumos da política externa brasileira.

            Então, na primeira quinzena de março, teremos a oportunidade de passar em revista todos esses temas; temas que se relacionam à Venezuela, os impactos e a relação com o nosso País desse recente acordo firmado entre a Argentina e a China, que traz impactos muito negativos à construção de uma área comum aqui no nosso Mercosul.

            O Sr. Aloysio Nunes Ferreira (Bloco Oposição/PSDB - SP) - Apenas para concluir Senador, apenas um postscriptum: e o Ministro Mauro Vieira haverá de receber na Comissão manifestações veementes de muitos de nós de contrariedade a essa nota covarde do Governo brasileiro em relação aos últimos acontecimentos na Venezuela.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Maioria/PMDB - ES) -Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, parece-me dever imprescritível de todos nós oferecer uma enérgica contribuição à defesa desses que são valores e princípios que não podem ser negociáveis, dentro, evidentemente, das normas legais e com as armas do Direito em qualquer situação em que ela se encontre em risco. Contra o rastro de crimes e de violações perpetradas pelo Presidente Maduro, temos o dever de invocar a letra dos atos internacionais e dos tratados de que somos signatários.

            A República Bolivariana da Venezuela é hoje membro integral do Mercosul, ao qual acedeu com o compromisso de respeito à cláusula democrática inscrita nos documentos constitutivos do Mercosul. Por essa razão, o que acontece na Venezuela ou em quaisquer outros dos países que compõem o Mercosul interessa, sim, ao nosso País.

            Nossa longa tradição de não interferência em assuntos de natureza interna de outros países não deve nos impedir de condenar as arbitrariedades cometidas por qualquer país, desde que se transforme em tema com repercussões sobre valores que nos são caros, como a democracia, os direitos humanos e a liberdade de expressão.

            Na triste fase atravessada pela política externa do atual Governo brasileiro, em que cálculos ideológicos e até partidários parecem se sobrepor ao que há de permanente e absoluto no interesse nacional, só nos resta esperar que, diante do nítido agravamento da situação venezuelana, o Brasil adote atitude compatível com a sua liderança e com o seu peso político na região.

            É essa a manifestação que faço, Sr. Presidente, na expectativa de que o novo Chanceler, o experiente Embaixador Mauro Vieira, possa dar um rumo diferente na coordenação dos rumos da política externa brasileira.

            O Brasil deve se oferecer, sim, como mediador, mas não pode continuar se apequenando, não pode continuar se acovardando diante das violações que estamos observando na Venezuela.

            Muito obrigado, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/02/2015 - Página 54