Discurso durante a Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Considerações acerca da necessidade de modernização das políticas públicas de emprego financiadas pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador.

Autor
Douglas Cintra (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/PE)
Nome completo: Douglas Mauricio Ramos Cintra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TRABALHO:
  • Considerações acerca da necessidade de modernização das políticas públicas de emprego financiadas pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador.
Publicação
Publicação no DSF de 12/02/2015 - Página 361
Assunto
Outros > TRABALHO
Indexação
  • DEFESA, NECESSIDADE, MODERNIZAÇÃO, POLITICAS PUBLICAS, EMPREGO, ORIGEM, FINANCIAMENTO, FUNDO DE AMPARO AO TRABALHADOR (FAT), ENFASE, REDUÇÃO, DESEMPREGO, PAIS, COMENTARIO, IMPORTANCIA, MEDIDA PROVISORIA (MPV), ASSUNTO, AJUSTE, BENEFICIO PREVIDENCIARIO, SEGURO-DESEMPREGO, ABONO SALARIAL, FAVORECIMENTO, ECONOMIA NACIONAL.

            O SR. DOUGLAS CINTRA (Bloco União e Força/PTB - PE. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, cidadãos, ocupo esta tribuna no dia de hoje para tratar de um tema que afeta diretamente o interesse dos nossos trabalhadores, mas que também é de suma importância para o setor produtivo e para o desenvolvimento econômico do nosso País.

            Refiro-me à necessidade de modernização e ajustes nas políticas públicas de emprego que são financiadas pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador, o FAT. Essas políticas compõem a rede de proteção social do País e objetivam a preservação do emprego formal, base da geração da renda dos nossos trabalhadores.

            Do ponto de vista técnico, as políticas de emprego podem ser divididas em dois tipos: passivas e ativas.

            As ações passivas destinadas ao emprego são aquelas que buscam oferecer algum tipo de assistência financeira temporária aos trabalhadores que se encontram em situação de vulnerabilidade, que pode ser causada pelo desemprego involuntário ou por baixos salários.

            Nesse campo, destacam-se o seguro-desemprego e o abono salarial.

            Já as políticas ativas objetivam fortalecer a posição do trabalhador diante dos desafios que surgem no mercado de trabalho. São aquelas que têm como metas:

            - prolongar o tempo de permanência dos trabalhadores na condição de empregados;

            - reduzir o tempo para recolocação dos trabalhadores desempregados;

            - aumentar a probabilidade de inserção no mercado do trabalho;

            - fomentar processos de geração de oportunidades de trabalho e renda.

            No conjunto dessas políticas, destacam-se a intermediação de mão de obra operacionalizada pelas agências do Sistema Nacional de Emprego (Sine); as ações de qualificação profissional, que foram reforçadas com o advento do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec); e os programas de geração de emprego e renda, tais como o Proger e o Pronaf.

            Cabe destacar que, enquanto o FAT aloca 99% dos seus recursos em políticas passivas de emprego, os países da OCDE apresentam uma participação mais equilibrada, investindo 59% dos seus recursos nessas políticas. Em 2013, os investimentos com intermediação de mão de obra foram de apenas R$117 milhões, enquanto os gastos com seguro-desemprego e abono salarial alcançaram R$47 bilhões. Ao longo da última década, a participação desses gastos em proporção do PIB quase dobrou, passando de 0,51% do PIB, em 2004, para 0,94%, em 2014.

            O que explica esse crescimento tão vertiginoso, a despeito de a nossa taxa de desemprego cair de 13%, em 2003, para 4,8%, em 2014, a menor taxa da série histórica anual iniciada em 2003? Os especialistas apontam quatro principais determinantes.

            Dois desses fatores estão relacionados ao fortalecimento do mercado de trabalho no Brasil: o aumento do número de trabalhadores formais e o crescimento do salário real, este último relacionado à política de valorização do salário mínimo.

            O número de trabalhadores ocupados passou de 80 milhões para 95 milhões no Brasil como um todo, um aumento de 19% em 10 anos (período de 2003 a 2013). Mais importante: a porcentagem de trabalhadores formais (com carteira assinada) passou de 53% para 63% dos trabalhadores ocupados nas regiões metropolitanas.

            Assim, o número de pessoas que têm direito ao seguro-desemprego (em caso de demissão) aumentou de 7 milhões para 12 milhões nas regiões metropolitanas, e de 25 milhões para 39 milhões no Brasil como um todo - um aumento de mais de 50% em 10 anos.

            Além disso, o salário médio real do empregado formal, que é a base para o cálculo do seguro-desemprego, aumentou 37% nesse período. Finalmente, o número de trabalhadores com direito ao abono salarial cresceu quase 150%, pois os aumentos no valor real do salário mínimo fizeram com que grande parte da força de trabalho passasse a ganhar entre um e dois salários mínimos (fazendo jus, portanto, ao abono).

            Por outro lado, os outros dois determinantes não são de caráter positivo.

            Primeiro, há um elevado índice de rotatividade no mercado de trabalho. Nas demissões sem justa causa, esse indicador alcançou 43% em 2012. Isso significa que, para cada grupo de 100 empregados, 43 são demitidos por ano. Em setores como a construção civil e a agricultura, os índices são ainda maiores, alcançando 87% e 66%, respectivamente. Além disso, a elevada taxa de rotatividade tem se concentrado na população mais jovem. Em 2013, cerca de 73% dos benefícios foram apropriados por esse grupo, cuja a disposição para a permanência no emprego é menor. Portanto, a alta rotatividade, aliada à formalização da mão de obra, pressiona os gastos com seguro-desemprego, o que exige ajustes para conter um crescimento acelerado dos dispêndios.

            Um outro determinante reside no aumento do número de fraudes do seguro-desemprego, identificadas em diversos estados do País sob as mais variadas formas, que vão desde a utilização de CNPJ de empresas fantasmas, passando pela contratação de empregados ainda recebendo parcelas dos benefícios, até o uso de informações de bancos de dados do Sine, para gerar encerramento de vínculos trabalhistas falsos. Não se tem estimativa da totalidade dos custos com essas fraudes, porém não se deve pensar que é algo desprezível.

            A propósito, os meios de comunicação têm repercutido ações da Polícia Federal para desbaratar e punir quadrilhas de malfeitores que, em todo o Brasil, manipulam informações e iludem pessoas humildes com o objetivo de obter ilegalmente benefícios do seguro-desemprego.

            Diante do desafio de reprimir e, sobretudo, prevenir essa sangria, peço vênia para parafrasear Franklin Roosevelt lembrando às autoridades competentes que o preço do progresso social é a eterna vigilância!

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, esse cenário nos aponta a necessidade de corrigir distorções na concessão dos benefícios do seguro-desemprego e do abono salarial não apenas com o intuito de promover um ajuste fiscal no curto prazo, mas, sobretudo, na perspectiva de garantir a sustentabilidade financeira do FAT no longo prazo, o que garantirá a manutenção dos benefícios para geração futura dos trabalhadores.

            Nesse sentido, Sr. Presidente, a Medida Provisória nº 665, de 2014, propõe medidas saneadoras que representam uma resposta às transformações estruturais em curso no mercado de trabalho e que possibilitarão ampliar o espaço fiscal para as políticas ativas de emprego.

            Segundo a medida, para a primeira solicitação do seguro-desemprego, serão necessários 18 meses com carteira assinada para fazer jus ao benefício; para a segunda, o prazo de permanência é de 12 meses; e, na terceira, 6 meses. Assim, a alteração tem o objetivo de beneficiar os trabalhadores mais vulneráveis em detrimento daqueles que solicitam o benefício pela primeira vez. Em 2013, R$23 bilhões dos gastos com seguro-desemprego foram alocados para a população mais jovem que apresenta a rotatividade no mercado de trabalho. Como já mencionado, esse valor representa 73% dos dispêndios em 2013.

            A medida provisória também faz alterações no seguro-desemprego destinado aos pescadores artesanais em período de defeso. O objetivo é tornar mais claro o enquadramento para fins de concessão do benefício, diferenciando aqueles que vivem exclusivamente da pesca daqueles que exercem outras atividades profissionais. Também é vedado o acúmulo de benefícios assistenciais e previdenciários com o seguro-defeso. O pescador que recebe, por exemplo, auxílio-doença não poderá receber o valor equivalente ao seguro-defeso. Além disso, será instituída uma carência de três anos a partir do registro oficial como pescador para que o valor seja concedido.

            Com isso, objetiva-se corrigir distorções, como o acúmulo de benefícios, a extensão do seguro-defeso - por decisão judicial - para quem não exerce de forma exclusiva a profissão de pescador e a ausência de critérios objetivos para definição de quem efetivamente está habilitado a receber o seguro. Portanto, Sr. Presidente, o propósito é garantir o benefício exclusivamente a quem tem direito.

            Com relação ao abono salarial, pago ao trabalhador que recebeu até dois salários mínimos, a MP em vigência prevê a elevação da carência de um para seis meses ininterruptos de trabalho. Além disso, o abono será pago proporcionalmente ao tempo trabalhado, assim como ocorre com o pagamento do décimo terceiro salário.

            É importante destacar que, quando o abono salarial foi criado em 1990, o valor real do salário mínimo era muito baixo - cerca de US$81. Em 2014, esse valor alcançou uma média de US$325. Além disso, não havia programas sociais do alcance do Bolsa Família. Portanto, o grau de vulnerabilidade social atualmente é muito menor, e também não nos parece razoável tratar de forma isonômica quem trabalhou 30 dias em relação a quem trabalhou o ano inteiro. Dessa forma, é plenamente justificável um saudável ajuste na concessão desse benefício.

            Finalmente, ressalto que as medidas necessárias para aprimorar as políticas públicas de emprego não se restringem ao escopo da medida. Há grandes desafios, como o de reduzir a rotatividade da mão de obra e oferecer um programa mais eficiente de intermediação e reinserção da mão de obra no mercado de trabalho.

            As agências do Sistema Nacional de Emprego são pouco eficientes para recolocar trabalhadores no mercado e se transformaram em meros postos receptores dos pedidos de seguro-desemprego. Segundo estimativas do Ministério do Trabalho, essas agências conseguem preencher apenas 4% das vagas oferecidas e perdem de longe para as empresas que fazem seus próprios processos de recrutamento. Das mais de 3 milhões de vagas ofertadas pelas empresas por meio do Sine, apenas 800 mil foram ocupadas em 2013. A conclusão é que o sistema precisa ser reestruturado para padronizar o atendimento e fazer uma conexão mais direta entre a política de concessão do benefício e a qualificação dos trabalhadores desempregados, por meio de cursos de qualificação profissional, como os oferecidos pelo Pronatec.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, parece-nos evidente que tão importante quanto a criação de um programa ou de uma política pública é o seu redesenho em função das mudanças econômicas e sociais que ocorrem ao longo do tempo. Afinal de contas, a sua própria efetividade é determinante para que o público-alvo seja revisto. Nesse contexto, torna-se necessário reduzir as despesas do FAT com políticas passivas para investir no fortalecimento das políticas ativas, pois essas têm impacto direto no aumento da produtividade do trabalhador e da economia, o que gera maiores ganhos de bem-estar para toda a população no longo prazo.

            Sr. Presidente, tive oportunidade de debater esse tema com V. Exª rapidamente e tenho certeza de que, através do debate nesta Casa, conseguiremos trazer soluções que, sem dúvida alguma, irão garantir a médio e longo prazo a sustentabilidade do FAT, que é, sem dúvida nenhuma, um grande patrimônio do trabalhador brasileiro.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/02/2015 - Página 361