Discurso durante a 100ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas à gestão de contratos da Procuradoria-Geral da República; e outro assunto.

Autor
Fernando Collor (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/AL)
Nome completo: Fernando Affonso Collor de Mello
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM:
  • Críticas à gestão de contratos da Procuradoria-Geral da República; e outro assunto.
MINISTERIO PUBLICO:
Publicação
Publicação no DSF de 18/06/2015 - Página 174
Assuntos
Outros > HOMENAGEM
Outros > MINISTERIO PUBLICO
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, VOTO DE PESAR, MORTE, PAES DE ANDRADE, EX PRESIDENTE, CAMARA DOS DEPUTADOS, APRESENTAÇÃO, PESAMES, FAMILIA, ELOGIO, VIDA PUBLICA.
  • CRITICA, PROCURADOR GERAL DA REPUBLICA, MOTIVO, FORMA, GESTÃO, CONTRATO, LICITAÇÃO, PROCURADORIA GERAL DA REPUBLICA.

            O SR. FERNANDO COLLOR (Bloco União e Força/PTB - AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Exmo Sr. Senador Paulo Paim, Presidente desta sessão, Exmas Srªs Senadoras, Exmos Srs. Senadores, eu gostaria, inicialmente, de expressar as minhas mais profundas condolências pelo passamento de S. Exª, o ex-Deputado Federal, ex-Presidente da Câmara dos Deputados, ex-Presidente da República, o cearense, o nordestino Paes de Andrade.

            Quando Presidente da República, tive em Paes de Andrade, então Presidente da Câmara dos Deputados, um excepcional interlocutor. Nós nos falávamos por telefone ou pessoalmente dia sim, dia não. Nos finais de semana, sempre estávamos nos comunicando, para que ele me pusesse a par do andamento das diversas medidas provisórias que estavam tramitando naquela Casa e aqui no Congresso, sempre me aconselhando no que fazer, nos passos seguintes a dar, para que pudéssemos, finalmente, aprovar a Medida Provisória nº 168.

            A Paes de Andrade, devo muito, como pessoa, como então Presidente da República, porque ele, na sua sabedoria, na sua forma de ser, coincidia perfeitamente com os interesses que todos tínhamos à época, e nos animávamos, que era com o início do processo democrático, com a eleição do primeiro Presidente da República eleito pelo voto direto, depois do período militar.

            A Paes de Andrade, portanto, o meu mais profundo respeito.

            Aos seus familiares, à Dona Zilda, à Mônica, esposa do nosso companheiro Senador Eunício Oliveira, a todos os seus parentes, gostaria de transmitir os meus votos de condolências e o meu abraço afetuoso.

            Foi-se um grande homem, mas ficou o seu legado. O legado de Paes de Andrade será sempre lembrado e honrado por todos aqueles que entendem que a política é um mister, é um sacerdócio a que todos nós temos que nos dedicar com amor, com espírito público e, sobretudo, com a seriedade que se quer e se faz necessária para um político que exerça o seu mandato.

            Eram essas as palavras iniciais que gostaria, portanto, de deixar registradas, Sr. Presidente, Paulo Paim, no momento em que todos nós entristecidos estamos sendo noticiados do falecimento do ex-Deputado, ex-Presidente da Câmara e ex-Presidente da República Paes de Andrade.

            Sr. Presidente, deixando essa seara de bons exemplos que nos foram legados por Paes de Andrade, sinto-me, pelas circunstâncias, obrigado a trazer aqui, a esta Casa, mais uma vez este tema que nos deixa a todos de certa forma incomodados, inconformados e que dizem respeito às ações do Procurador-Geral de República.

            Trago novas informações que ajudam a desnudar a suposta e pretensa aura do Sr. Procurador-Geral.

            Mas, antes de ir aos fatos, gostaria de saber o que está acontecendo no âmbito da Procuradoria Geral da República a ponto de se registrarem duas mortes de servidores nos últimos dois anos dentro das instalações do órgão.

            A última morte se deu há cerca de um ano, exatamente no dia 1º de abril de 2014, uma terça-feira, quando um jovem com cerca de 30 anos, servidor da área de Planejamento e Orçamento, Chefe da Divisão de Custos, foi alvejado dentro do prédio comandado pelo Sr. Janot.

            As notícias internas que nos chegam dão conta de que o assédio moral, a pressão funcional e o desrespeito pessoal para com determinados servidores que não se deixam subjugar têm levado a essa tragédia.

            O simbolismo dessa lamentável perda, uma morte no local de trabalho, é inevitável, Sr. Presidente, e a estatística é muito grave e assustadora, para ocorrer com um órgão que defende acima de tudo os interesses sociais e individuais indisponíveis.

            Da mesma forma, é intrigante que as duas mortes ocorreram com servidores das áreas de segurança e de finanças, setores sensíveis e estratégicos quanto ao sigilo de informações que detinham.

            Será que não teriam sido eles também pressionados, assediados e submetidos a métodos de torturas psicológicas que remontam ao medievalismo e que são muito utilizados - muito utilizados -, no momento em curso, pelo Ministério Público?

            No caso específico da gestão de Janot, não teria sido o motivo da morte o fato de o servidor ter se recusado a se submeter às orientações canhestras e obscuras dele e de seu grupelho, como no caso, por exemplo, de um termo aditivo proibido de ser acessado, até o do aluguel escuso de um luxuoso imóvel? Isso para dizer o menos, muito menos.

            O que está se passando, afinal, nos subterrâneos do Ministério Público, sob o comando de Janot? E quanto à promessa do Procurador-Geral feita à Associação dos Servidores de que daria todas as contribuições necessárias, durante a investigação? Isso ocorreu? Por que, então, na noite da morte, o computador do servidor foi vasculhado e teve toda a sua memória retirada? Não passou na cabeça de Janot que o servidor tenha salvado no pen drive e deixado com pessoas de fora, em segurança, as informações ali contidas? Ora, Sr. Janot, há muito ainda a ser explicado.

            Mas, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu já trouxe a esta Casa, em outro pronunciamento, a ilegalidade cometida pelo Procurador-Geral na contratação de uma empresa de comunicação. Pois bem. Agora, aparecem novas evidências da promíscua relação de Janot com a mesma empresa de comunicação Oficina da Palavra, que, a cada contrato, reveste-se com nomes fantasias diferentes: Oficina da Palavra, Palavra Encantada, Oficina Treinamento de Comunicação... Enfim, uma série de nomes, sob o mesmo comando e sempre sob a mesma condição: a falta de licitação.

            Ah, se algum prefeito deste País ou algum governador agisse dessa forma, o que não faria o Ministério Público?

            Além do Contrato nº 83/2014, sem licitação, promovido pelo Procurador-Geral, e cujo termo aditivo até hoje aparece indisponível no Portal da Transparência do Ministério Público, novas informações evidenciam a relação promíscua e rotineira de Janot com essa empresa de comunicação.

            Quando ele era Diretor da Escola Superior do Ministério Público, Janot já havia contratado a mesma empresa para prestar serviços a ele, como fez depois durante sua campanha ao cargo de Procurador-Geral da República.

            Agora, mais recentemente, além do contrato de mais de R$600 mil e do respectivo termo aditivo sigiloso, não disponível no Portal da Transparência, aparecem mais dois contratos com a Oficina da Palavra, no valor total de R$342 mil, Processos nºs 7.607/2014-79 e 11.021/2014-17, tudo para promoção de treinamentos internos e - claro - sem a exigência de licitação.

            Ou seja, de 2014 para cá, Janot gastou mais de R$1 milhão somente com sua empresa amiga. Curioso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é que o Ministério Público acompanha processo instalado em Mato Grosso, com investigação acerca da contratação dessa mesma empresa, Oficina da Palavra, em relação a eventos da Copa do Mundo.

            Uma das denúncias investigadas - vejam os senhores e as senhoras - refere-se exatamente ao problema de inexigibilidade de licitação que teria ocorrido na contratação da empresa pela Secretaria de Estado Extraordinária da Copa em Mato Grosso. Ou seja, no entendimento do Ministério Público de Janot, lá em Mato Grosso, não se pode contratar a Oficina da Palavra sem licitar, mas, aqui na Procuradoria Geral da República, sob o comando de Janot, pode. Isso se traduz no conhecido dito popular: “Faça o que digo; não faça o que eu faço”.

            Mas isso não é tudo, Sr. Presidente. Novamente vamos aos fatos. Por meio do Termo de Contrato nº 55, de 2014, o Sr. Janot alugou, por cinco anos, para - aspas - “atender as necessidades da Procuradoria Geral da República” - fecho aspas -, um prédio de 1.226m2 com subsolo e dois pavimentos, situado na QI 15 Área Especial B, no Lago Sul, em Brasília, Distrito Federal.

            O contrato de locação foi assinado em 14 de outubro de 2014 e celebrado entre o órgão comandado por Janot e a empresa incorporadora. O custo do aluguel é de R$67 mil por mês mais impostos e taxas de manutenção. Em cinco anos de contrato, o custo final será, só de aluguel e sem os reajustes anuais, superior a R$4 milhões, sem dizer que o contrato poderá, após os cinco anos, ser prorrogado sucessivamente.

            E, aqui, Sr. Presidente, cabem algumas reflexões. O contrato de locação do imóvel se deu, claro, por meio de dispensa de licitação. Esse é um mote recorrente da gestão do Sr. Janot - dispensa de licitação -, descumprindo, desta forma, o inc. X do art. 24 da Lei 8.666, de 1993, que condiciona, para não haver incoerência, a escolha do imóvel as suas necessidades de instalação e localização.

            Pergunto: afinal, que finalidades precípuas pode ter a Procuradoria Geral da República, que, já tendo dois toletes envidraçados onde se aninha, precisa alugar um imóvel de 1.226m² no Lago Sul, ainda mais numa área nobre e totalmente residencial? Pior ainda: o que se verifica é que o prédio simplesmente está desocupado, vazio, sem nenhum funcionamento há oito meses. E lá se foram para o ralo do desperdício, até aqui, R$536 mil dos cofres públicos mais R$1 milhão gastos com reforma e adaptações. Tudo pela ineficiência e pela improbidade do Sr. Janot.

            E, agora, o inimaginável, o absolutamente reprovável: o imóvel está desocupado porque, depois de todos esses gastos, o Sr. Janot descobriu singelamente que não podia ter alugado aquele imóvel, já que se trata de uma área destinada ao uso restrito de creche, e, com isso, não conseguiu o habite-se do Governo do Distrito Federal. Agora, mais uma vez, imaginem os senhores, se fato parecido tivesse ocorrido com alguma prefeitura do interior, com alguma prefeitura de capital, ou Governo de Estado? O que não estaria fazendo o Ministério Público.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, mais um fato. A Portaria PGR nº 287, de 12 de junho de 2007, regulamenta o exercício de funções de confiança e cargos em comissão, no âmbito do Ministério Público da União. O seu art. 3º, §1º é claro ao exigir diploma de nível superior para aquele que ocupar cargo em comissão para os níveis CC4 a CC7. Apesar da exigência, o Sr. Janot, por intermédio administrativo de seu secretário-geral, nomeou no dia 24 de fevereiro de 2014, uma determinada senhora, para exercer, na chefia de gabinete do Procurador-Geral, o cargo em comissão de assessor nível CC4 da assessoria de cerimonial.

            O grave e o ilegal é que a referida assessora chefe não possui diploma de nível superior, como exige a norma interna do próprio Ministério Público da União, cujo chefe é o Sr. Janot. E mais: a mando de Janot, seu chefe de gabinete atestou por memorando - pasmem! - que a indicada não atendia às normas estabelecidas pela própria PGR e ainda assim solicitou textualmente o descumprimento da regra. E pior: com o singelo, porém cínico argumento de que a nomeação irregular, segundo ele coloca na própria portaria que assina, aspas: "prestigia o interesse público", fecho aspas.

            Enfim, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, esse é o perfil real do Sr. Janot. Apesar de todas as denúncias que aqui tenho feito, ele permanece inerte, omisso, fazendo-se de morto e como se fosse inatingível e estivesse acima do bem e do mal. Não responde a nenhuma das acusações, como, por exemplo, o acobertamento de crimes praticados por pessoas próximas e familiares, o recolhimento, por parte dele, de aluguéis sem prestar contas ao fisco e sem recolher os impostos devidos, a sua prática ilegal da advocacia, entre tantas outras. Por que esse silêncio mortal, Sr. Janot? Por quê?

            Afinal, Sr. Presidente, seriam todos esses fatos que já trouxe aqui os chamados acertos cometidos por Janot e que alguns setores da mídia insistem em promover? Que acertos são esses? Que sensível e notável revolução Janot faz dentro da instituição? A revolução das ilegalidades, da coerção moral sobre servidores, a ponto de levá-los a escolher entre a vida e a morte? E os meios? Será que estariam também os meios sendo "janotizados"? Por que essa "janotice", essa tafularia por parte dos meios? Por que não apuram também todos esses fatos, todas essas denúncias?

            Como afirmou recentemente o jornalista Carlos Newton, abro aspas:

            “[...] o jornalista não pode esquecer que, ao fazer esse tipo de denúncia, Collor está prestando um serviço à nação [...]. E isso tem muita importância, a imprensa não pode se reservar o direito de esconder tais fatos.”

            Não escondam! Mostrem tais fatos, apurem, como é a obrigação do bom jornalismo. “O resto [continua o jornalista] é folclore, não é jornalismo”.

            Mais uma vez, muito obrigado a V. Exª, Senador Paulo Paim, pelo tempo que me dispensou para dirigir essas palavras a V. Exªs.

            Era o que tinha a dizer por enquanto, Srªs e Srs. Senadores.

            Obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/06/2015 - Página 174