Pela ordem durante a 227ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Considerações sobre o rito processual do pedido de impeachment de Presidente da República.

Autor
Fernando Collor (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/AL)
Nome completo: Fernando Affonso Collor de Mello
Casa
Senado Federal
Tipo
Pela ordem
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Considerações sobre o rito processual do pedido de impeachment de Presidente da República.
Publicação
Publicação no DSF de 18/12/2015 - Página 271
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • COMENTARIO, DELIBERAÇÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), REFERENCIA, PROCEDIMENTO, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, CITAÇÃO, HISTORIA, JULGAMENTO, ORADOR, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, ENFASE, PUBLICAÇÃO, ACORDÃO, ALTERAÇÃO, DIFERENÇA, SITUAÇÃO, ATUALIDADE, DEFESA, REGULARIDADE, INTERPRETAÇÃO, JUDICIARIO.

    O SR. FERNANDO COLLOR (Bloco União e Força/PTB - AL. Pela ordem. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado.

    Hoje, o Supremo Tribunal Federal, como todos nós sabemos e estamos acompanhando, trabalha em torno de estabelecer um rito para o processo de impeachment, a que se deu entrada na Câmara dos Deputados. Por questões óbvias, eu acredito que é meu dever me manifestar neste momento, para trazer, de viva voz, o que ocorreu em 1992.

    Começando por 1989, quando provocado por um pedido de impeachment do então Presidente da República, o Supremo Tribunal Federal decidiu pelo entendimento de que Lei nº 1.079, de 1950, não havia sido recepcionada pela Constituição de 1988. Sem uma regulamentação, o pedido de impeachment foi então prontamente arquivado.

    O acórdão dessa decisão teve sua publicação pendente por quase três anos - por quase três anos! Esse foi, portanto, o primeiro entendimento do Supremo Tribunal Federal sobre a questão de solicitação de afastamento do Chefe de Estado.

    De 1989 - quando ocorreu isso que eu acabo de relatar - passamos para 1992. Diante do açodamento político que tomou conta do País perante o pedido de impeachment, a Suprema Corte se valeu daquele acórdão que havia demorado três anos para ser publicado.

    A Suprema Corte, então, se valeu desse acórdão - que demorou três anos, e que não havia sido publicado - para, sem que ele tivesse sido publicado, alterá-lo no sentido diametralmente oposto. Ou seja, passou a entender que muitos dos dispositivos da lei de 1950 estavam, sim, recepcionados pela nova Constituição. Esse foi o segundo entendimento.

    E mais: em análise de um mandado de segurança, o Supremo, por entender que se tratava de questão interna corporis, delegou ao Presidente da Câmara dos Deputados a definição do rito processual, com base nos dispositivos da lei ainda aplicáveis no Regimento Interno da Casa. Fixou-se, assim, o rito sumário para o impeachment. E, de fato, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o rito sumário foi o que ocorreu.

    Em 1992, o pedido de impeachment foi recebido na Câmara dos Deputados no dia 1º de setembro. Eleita em chapa única e em votação secreta, a Comissão especial encarregada de examinar o pedido do afastamento era composta de 49 Deputados e respectivos suplentes, tendo sido instituída já no dia 3 de setembro. Recebido no dia 1º, no dia 3 de setembro foi instituída a Comissão.

    O trâmite na Casa, desde o pedido de apresentação do pedido de impeachment, deu-se em apenas 28 dias até a votação que autorizou a abertura do processo em 29 de setembro. A partir daí, o rito a ser obedecido no Senado foi fixado pelo Presidente do Supremo, a quem caberia - como coube - presidir a sessão do Senado, transformado em órgão judiciário - rito este, vale frisar, reconhecido formalmente com a publicação no Diário Oficial da União somente no dia 8 de outubro de 1992, na Seção 1, pp. 14.246 e 14.247, e estranhamente publicado no Diário Oficial de forma apócrifa, sem assinatura de quem quer que seja e, mesmo assim, foi levado em conta.

    Digo somente no dia 8 de outubro, Sr. Presidente, Sªs e Srs. Senadores, pois, no dia seguinte à aprovação na Câmara, ou seja, na Câmara foi aprovado no dia 29, no dia 30 de setembro, o Senado Federal recebeu autorização, e, no mesmo dia, procedeu, em plenário, à leitura do comunicado da Câmara. No mesmo dia, elegeu, por voto secreto e chapa única, a comissão especial que iria deliberar sobre o tema, e, em seguida, no mesmo dia 30, a instituiu.

    Essa comissão, composta por 21 Senadores e respectivos suplentes, reuniu-se ainda no mesmo dia 30. Escolheu seu Presidente, no mesmo dia 30, e o Relator, e, de imediato, ainda no dia 30, aprovou a admissibilidade para instaurar o processo. Um dia depois, em 1º de outubro, o parecer da comissão, em regime de urgência, e em sessão extraordinária do Senado, foi aprovado em plenário por votação simbólica, sem discussão, sem questão de ordem, sem qualquer tipo de interveniência, encaminhamentos e que tais.

    No dia seguinte, em 2 de outubro - chegou ao Senado no dia 30, no dia 1º houve isso a que me referi -, portanto, dois dias depois de ter chegado aqui ao Senado, às 10 horas e 20 minutos, foi entregue a comunicação oficial do afastamento do Chefe do Executivo pelo 1º Secretário do Senado Federal, em que se daria o julgamento em até 180 dias. Mas nem metade desse prazo foi necessário. Já suspenso o titular do exercício da Presidência da República, depois da decisão do Senado, o ritmo apressado do processo arrefeceu-se aqui no Senado Federal, ainda assim o trâmite não chegou a três meses.

    Em 29 de dezembro, mesmo com a renúncia do Presidente da República, o julgamento foi adiante, e cassaram seus direitos políticos por oito anos. Já em 2015, o atual pedido de impeachment foi inicialmente apresentado à Câmara, numa primeira versão, posteriormente aditada, também no dia 1º de setembro, não por obra do acaso, a mesma data de 1992.

    Portanto, se os mesmos critérios, os mesmos prazos e, principalmente, se as mesmas disposições políticas de outrora tivessem sido adotadas agora e com a eventual aprovação na Câmara dos Deputados, a Presidente da República - apenas para fazer uma comparação - hoje já estaria afastada há 75 dias e estaria, ainda, a apenas 14 dias do julgamento final do Senado Federal.

    Ora, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, digo isto porque, nesses 23 anos, a Constituição Federal de 1988 continua em vigor. A Lei nº 1.079, de 1950, a ressurrecta, continua a mesma. O Regimento Interno da Câmara não se alterou quanto aos dispositivos correspondentes.

    Mas é claro que tanto a Constituição como a Lei do Impeachment e os Regimentos das Casas do Congresso podem ser alterados. Para tanto, para se alterar isso, duas condições são necessárias: as alterações têm que ser efetuadas pelo Parlamento - nós não podemos abrir mão das nossas prerrogativas - têm que ser efetuadas pelo Parlamento, a quem cabe legislar, e devem ocorrer em períodos de estabilidade política e institucional.

    Como bem asseverou no último domingo o ex-Ministro do Superior de Justiça Gilson Dipp:

O Judiciário tem de ser comedido. Ele só pode se manifestar, mesmo que provocado, naquilo que for de índole constitucional, e não de processo legislativo, de aspectos que estão reservados à lei ordinária ou aos regimentos internos dos órgãos. [Fecho aspas.]

    Em suma, se o Supremo Tribunal Federal voltar a deliberar sobre o tema de modo diverso do que foi fixado em 1992, será o terceiro entendimento distinto.

    Por tudo isso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a esta altura, com um processo de impeachment já em curso, não há como vislumbrarmos novas regras, novas interpretações à luz de uma base jurídica pacificada e que não se alterou. Isso, sim, seria uma decisão a-histórica. Isso, sim, Sr. Presidente, seria ao mesmo tempo um golpe no passado e no presente.

    Eram os esclarecimentos que gostaria de prestar a esta Casa.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/12/2015 - Página 271