Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas à suposta agenda legislativa neoliberal apresentada pelo Presidente do Congresso Nacional na abertura dos trabalhos legislativos.

Autor
Lindbergh Farias (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Luiz Lindbergh Farias Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATIVIDADE POLITICA:
  • Críticas à suposta agenda legislativa neoliberal apresentada pelo Presidente do Congresso Nacional na abertura dos trabalhos legislativos.
Aparteantes
José Medeiros, João Capiberibe.
Publicação
Publicação no DSF de 04/02/2016 - Página 9
Assunto
Outros > ATIVIDADE POLITICA
Indexação
  • CRITICA, RENAN CALHEIROS, SENADOR, PRESIDENTE, SENADO, APRESENTAÇÃO, PROPOSTA, LIBERALISMO, SOLUÇÃO, CRISE, ECONOMIA NACIONAL, DEFESA, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, ASSUNTO, TERCEIRIZAÇÃO, CONTRATAÇÃO, TRABALHADOR, REALIZAÇÃO, ATIVIDADE ESPECIFICA, INDEPENDENCIA, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), EXCLUSÃO, EXCLUSIVIDADE, EXPLORAÇÃO, PRE-SAL, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), CRIAÇÃO, LEGISLAÇÃO, RESPONSABILIDADE, EMPRESA ESTATAL, TRANSFORMAÇÃO, SOCIEDADE ANONIMA.

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores e Srªs Senadoras, subo à tribuna para falar dos nossos trabalhos legislativos no ano de 2016 e confesso que fiquei muito preocupado com a mensagem, com a fala do Presidente do Senado, Renan Calheiros, no dia de ontem.

    O Presidente do Senado, infelizmente, apresentou uma agenda para o Senado Federal e para o Congresso, que, na minha opinião, é uma agenda neoliberal radical. Não é uma agenda coerente com o momento de crise econômica que nós estamos enfrentando. Eu não tenho dúvida de que a principal tarefa que este Congresso tem de pautar neste 2016 é de como o Brasil vai retomar o seu crescimento econômico e de como protegermos o emprego.

    Infelizmente, a fala do Presidente Renan Calheiros não vai nesse sentido. Vai no sentido oposto. Ele lançou cinco propostas como prioritárias para serem analisadas pelo Senado e pelo Congresso. Primeiro, terceirização. Ele voltou com esse debate. Nós sabemos que o Presidente da Câmara, Eduardo Cunha, conduziu pessoalmente a aprovação desse projeto pela Câmara dos Deputados, mas, quando chegou aqui, no Senado, conseguimos parar a tramitação desse projeto, inclusive com a ajuda do Presidente Renan Calheiros. Então, para nós é uma surpresa ele começar falando dos projetos pelo ponto da terceirização. Nós vamos resistir aqui no Senado. Terceirização nós sabemos o que significa: redução de salário dos trabalhadores.

    Mas ele não para apenas na terceirização. Ele lista aqui os projetos prioritários, Senador Capiberibe. O segundo ponto de que ele fala, depois da terceirização, é independência do Banco Central, mandato fixo para o Banco Central. Ora, nós votamos aqui, em dezembro, projeto meu que dava uma dupla função ao Banco Central. Hoje, o Banco Central tem apenas a função de controle da inflação. O projeto que apresentei colocava, além de controle da inflação, compromisso com o crescimento econômico e geração de empregos. É assim no Banco Central norte-americano, no FED, e é assim no Banco Central europeu, porque em alguns momentos, como nós tivemos agora em janeiro, se você olhar apenas para a inflação, você desconsidera o ambiente econômico deteriorado que nós estamos tendo. Nós estamos vivendo uma recessão. Aumentar a taxa de juros é um absurdo.

    Nós temos no Brasil, infelizmente, um Banco Central que aplica as maiores taxas de juros do mundo. Nós pagamos no ano passado quinhentos bilhões de juros. Nós comprometemos 8% do PIB com pagamento de juros. Na verdade, a tese do Banco Central independente é deixar esse Banco Central aprisionado apenas aos interesses do mercado.

    Eu falo aqui para os Srs. Senadores: o povo elege o Presidente da República. Conversava sobre isso, um dia desses, com o Senador José Serra, que já foi candidato a Presidente da República. Se o Senador José Serra for eleito Presidente da República, ele tem que ter o direito de escolher o presidente do Banco Central. O projeto de qualquer candidato a Presidente tem que ser referendado pelo povo. O povo elege um candidato baseado em um programa econômico.

    Agora eles querem o quê, Senador Capiberibe? Um mandato fixo que perpasse os mandatos. Eu pergunto: de que adianta eleger um Presidente da República, se não se pode nomear o presidente do Banco do Central, não se pode fazer uma política monetária diferente? Então, nós temos que unir forças. Não vamos deixar esse projeto passar aqui.

    Agora, veja bem, primeiro item do Renan: terceirização; segundo: independência do Banco Central; terceiro: projeto do Serra sobre a Petrobras.

    O que o projeto do Serra faz? Tira a Petrobras da condição de operadora única do pré-sal e tira os 30%. De todo o campo do pré-sal que vai ser explorado a Petrobras já tem direito a 30%. Veja bem: fomos nós que descobrimos o pré-sal. Ninguém tem que fazer investimento para descobrir. Está lá, foi descoberto pela Petrobras. O Senador Serra quer tirar como se fosse um ônus a Petrobras ter direito a esses 30%. Não é ônus; é bônus.

    Agora, o mais grave é o Presidente Renan Calheiros falar em votar esse projeto neste momento, em que o preço do barril do petróleo está inferior a US$30. Tirar a Petrobras e fazer um leilão aqui, sinceramente, é entregar a preço de banana para as grandes multinacionais do petróleo, com o real a esse preço e com o preço do barril de petróleo dessa forma.

    O grande argumento do Senador José Serra com esse projeto era o seguinte: "A Petrobras está sem capacidade de financiamento, e nós temos que agilizar a extração do pré-sal. Para agilizar, nós temos que tirar a Petrobras." Gente, a pergunta que faço é esta: nós queremos agilizar leilão de pré-sal sem a Petrobras, com o preço de vinte e poucos o barril de petróleo? Isso é entreguismo! Eu estou falando que é entreguismo, porque o Senador Renan Calheiros disse ontem, quando falou desse projeto da Petrobras: "Evocações como desnacionalização ou entreguismo estão completamente ultrapassadas." Não estão ultrapassadas, não, Presidente Renan. É um erro, é um absurdo agilizar a exploração do pré-sal tirando a Petrobras. É entregar a preço de banana uma riqueza nossa, uma riqueza do País. É um ataque à soberania nacional.

    Mas há outros pontos. Ele colocou cinco como prioritários.

    O quarto é uma Lei de Responsabilidade das Estatais, projeto do Senador Tasso Jereissati que está como primeiro ponto da pauta. Chamo atenção porque essa é uma discussão muito complexa. Na verdade, ele transforma todas as empresas públicas em sociedades anônimas. Agora, empresa de sociedade anônima é aquela regida principalmente para o lucro. Eu faço uma pergunta aqui: uma Embrapa. Como se vai fazer com a Embrapa? Vai ser transformada em uma sociedade anônima? E a Ebserh, empresa criada para cuidar dos hospitais universitários? A lógica não é o lucro; a lógica é o serviço público, com políticas públicas.

    Vou entrar em outro exemplo: Caixa Econômica Federal. A Caixa Econômica Federal é diferente do Banco do Brasil, que é de economia mista. Eu fui prefeito em Nova Iguaçu. Havia Caixa Econômica em tudo que é lugar! A Caixa Econômica faz o programa Bolsa Família. Se ela virar uma S.A., na verdade, não vai poder executar esse conjunto de políticas públicas.

    O BNDES é outro exemplo. O BNDES empresta com juros menores, baseado em vários critérios: desenvolvimento regional, desenvolvimento nacional. Se o BNDES for transformado em uma S.A., ele tem que se comportar como um banco com aquela lógica privada toda.

    Então, esse projeto, para mim, também é um grande equívoco. Acho que está havendo pouca discussão neste Senado e que esse é um projeto que nós temos que aprofundar.

    É um prazer ouvi-lo, Senador.

    O Sr. José Medeiros (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Senador, essa preocupação é muito importante, e eu cito um exemplo. No interior de Mato Grosso, está a cidade de Diamantino, e próximo a Diamantino há um grande vilarejo. Quando visitei o Município, há poucos dias, eles me reclamaram que não conseguem telefonia. A comunidade está toda isolada, porque não consegue telefonia celular. Mandei todos os documentos aqui, pedindo. Enfim, em todo comunicado que recebi, é essa a lógica, realmente, de que financeiramente não é interessante para a empresa concessionária, e eles simplesmente relegam aquela comunidade a ficar isolada, porque a lógica, realmente, é o lucro. Aí, como não dá lucro...

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Claro.

    O Sr. José Medeiros (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Então, em certos casos, realmente, concordo plenamente com V. Exª. Temos que ter essa preocupação, porque o visar ao lucro pode deixar boa parte dos brasileiros...

(Soa a campainha.)

    O Sr. José Medeiros (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - ... sem a prestação do serviço que eles esperam.

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Senador Medeiros, muito obrigado pelo aparte.

    Eu ontem conversava com um assessor da Liderança do PT que foi da Embratel, e ele falava justamente disto: da época em que a Embratel era pública. Falava que eles iam trabalhar em regiões remotas da Amazônia e que aquilo não dava lucro; mas aquilo é que era uma empresa pública com esse sentimento aí. Então, esse exemplo que V. Exª falou, para mim, é muito preciso.

    Nós estamos falando de empresas importantes. A Caixa Econômica Federal é um banco muitíssimo importante para o nosso País, que seria muito afetado com esse projeto.

    Com a palavra, o Senador Capiberibe.

    Muito obrigado, Senador Medeiros, pelo aparte.

    O Sr. João Capiberibe (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) - Muito obrigado, Senador Lindbergh. Cumprimento a todos. Estamos de volta. Nesse período de recesso, eu percorri várias comunidades do meu Estado que vivem sem energia elétrica, sem água tratada, sem estrada. Eu fico me perguntando: esse Brasil que deu certo deu certo para quem? Certamente, não é um Brasil que deu certo para a sua coletividade. É também esse Brasil organizado por poucos. V. Exª sabe que a Constituição de 1891 proibiu o voto aos analfabetos, e eles só recuperaram o direito de votar em 1985, um século depois? E o segundo censo de 1891 nos mostrava que o Brasil tinha 14% de alfabetizados - todos brancos. Desses 14%, 7% eram mulheres - não tinham direitos políticos. Então, quem organizou o Brasil foram 7% de homens brancos letrados. E organizaram muito mal esse País e insistem em continuar fazendo dano ao Brasil. Não há...

(Soa a campainha.)

    O Sr. João Capiberibe (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) - Eu percebo que nós não temos aqui, no Congresso - e, muito menos, a Presidente Dilma tem -, a dimensão exata, a dimensão geopolítica do nosso Brasil. Nós voltamos com essas surpresas. O Banco Central, com os controles que tem sobre o sistema monetário, levou o País a entregar 50% do orçamento da União para pagar serviço da dívida pública - amortização, juros -, 50% do esforço de todos nós, brasileiros e brasileiras, são para entregar aos rentistas. Agora querem entregar de vez o Banco Central para eles! Eu acho que, daqui a pouco, eles vão colocar o Brasil num leilão, para leiloar este País. Uma parte já está leiloada, não é?

(Soa a campainha.)

    O Sr. João Capiberibe (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) - Então, eu acho que está na hora de observarmos que o Brasil que dá certo é um Brasil de poucos e que nós precisamos, aqui, nesta Casa, debater, discutir projetos que incluam aqueles que ficaram historicamente fora de qualquer benefício do desenvolvimento, como as pessoas que eu encontrei ao longo da BR-156, uma estrada de terra batida, sem energia elétrica. Comunidades grandes, comunidades onde vivem 1.000, 1.500 pessoas, sem direito a eletricidade, sem direito a água tratada, sem direito a estrada, mas são brasileiros e brasileiras como todos nós. Obrigado.

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Senador Capiberibe, eu agradeço muito o aparte de V. Exª.

    Eu quero, inclusive, fazer propostas aqui, porque eu acho que nós temos que conversar com o Presidente Renan e dizer: "nós não aceitamos só esses termos. Nós queremos apresentar a nossa pauta, e essa pauta nós temos que discutir em conjunto." Há um ponto fundamental da nossa pauta: tributação progressiva, que nós temos que colocar para votar no Plenário deste Senado.

    São inúmeros os projetos. Eu, por exemplo, tenho um que acaba com a isenção tributária na distribuição de lucros e dividendos. Senador Capiberibe, é o seguinte: no Brasil, houve até uma proposta dos Deputados do PT, na Câmara dos Deputados, sobre a qual, quando vi na imprensa, eu disse: "Essa proposta tem insuficiência técnica", porque eles criavam faixas de Imposto de Renda para até quem ganha R$100 mil. Só que ninguém ganha salário neste País. Só quem ganha salário é funcionário público! Não há ninguém, no mundo privado. Quando a pessoa ganha R$100 mil, R$200 mil, geralmente ganha sobre distribuição de lucros e dividendos e não paga nada de Imposto de Renda. Isso aqui teria um acréscimo de arrecadação de R$50 bilhões. Mas não é só isso: há juros sobre capital próprio, há vários outros temas.

    Então, Presidente Renan, devem-se colocar esses pontos na nossa pauta.

(Soa a campainha.)

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - O duplo mandato do Banco Central, medidas de estímulo à economia.

    Eu queria, Senador Capiberibe, inclusive, pedir ajuda a V. Exª, pela sua liderança aqui. Nós temos aqui um grupo de Senadores progressistas que se reúnem, de vez em quando, em batalhas eventuais aqui no Plenário, mas creio que nós temos que chamar uma conversa para depois do Carnaval, para listarmos os principais pontos do nosso interesse, para irmos para uma negociação com o Senador Renan Calheiros, porque essa agenda que ele quer nos oferecer nós não vamos aceitar.

    Senador Capiberibe.

    O Sr. João Capiberibe (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) - Concordo plenamente. Uma urgência seria devolver os itens das leis que isentam os sonegadores.

(Soa a campainha.)

    O Sr. João Capiberibe (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) - A sonegação no Brasil é infinitamente maior do que a corrupção na ponta da aplicação do dinheiro. São R$518 bilhões que foram surrupiados na ponta da arrecadação em 2014, R$518 bilhões. Ora, nós vamos criar mais um imposto? Por que nós não organizamos o Fisco, para acabar com a sonegação, e devolvemos a lei que pune sonegador? No Brasil, sonegar imposto é um bom negócio. O Congresso Nacional eliminou todas as punições para crime de sonegação. Não existe, no Brasil, crime de sonegação.

(Interrupção do som.)

(Soa a campainha.)

    O Sr. João Capiberibe (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) - Basta se arrepender e devolver o do Fisco. É como um sujeito que rouba uma televisão que depois se arrepende e entrega de volta a televisão ao dono. São assim os sonegadores no Brasil. E isso não se discute aqui. Eu acho que esses são os temas. V. Exª tem inteira razão, Senador Lindberg. O tema aqui é discutir como o dinheiro público está se evadindo, para fecharmos essas torneiras.

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Muito obrigado, Senador Capiberibe.

    Acho que, na terça-feira, na volta dos nossos trabalhos, após o Carnaval, nós temos que fazer essa reunião, juntando Senadores de vários partidos.

    O recado que eu passo aqui ao Presidente, Senador Renan Calheiros, é que nós não aceitamos aquela pauta apresentada por ele no dia de ontem. Ele tem que sentar conosco também para compor uma pauta unitária para o ano de 2016 aqui no Senado Federal.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/02/2016 - Página 9