Comunicação inadiável durante a 36ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Rejeição do impeachment de S. Exª Dilma Rousseff, Presidente da República, por ausência de cometimento de crime de responsabilidade.

Autor
Ângela Portela (PT - Partido dos Trabalhadores/RR)
Nome completo: Ângela Maria Gomes Portela
Casa
Senado Federal
Tipo
Comunicação inadiável
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Rejeição do impeachment de S. Exª Dilma Rousseff, Presidente da República, por ausência de cometimento de crime de responsabilidade.
Publicação
Publicação no DSF de 23/03/2016 - Página 18
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • DEFESA, REJEIÇÃO, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, AUSENCIA, ATO, CRIME DE RESPONSABILIDADE.

    A SRª ANGELA PORTELA (Bloco Apoio Governo/PT - RR. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão da oradora.) - Obrigada, Senador Jorge Viana.

    Realmente, é inegável a crise gravíssima em que vivemos - política e econômica - em nosso País. E o clima, neste Senado, agora de manhã e ontem, foi nesse sentido. Nós precisamos ter calma, ter paciência, ter lucidez para superar esse momento difícil em que vivemos, a fim de que possamos retomar a normalidade, a legalidade e o crescimento do nosso País.

    Esse quadro criou uma forte polarização na opinião pública, o que se reflete nas manifestações de rua, as maiores desde os protestos de 2013. A partir daí, o clima político esquentou, sendo possível até vislumbrar-se um processo de ruptura. Acredito que, em tudo isso, o parâmetro a ser seguido é o da legalidade.

    Contamos, hoje, com uma Constituição moderna e justa, emanada de processo legítimo, sagrado pelas urnas. Deve ser a nossa maior referência a nossa Constituição.

    Do ponto de vista institucional, há duas frentes de profundos efeitos políticos a serem examinadas. Temos, em primeiro lugar, a Operação Lava Jato, que descortinou um grave processo de corrupção cujos contornos ainda estão se descobrindo, mas que se prende a práticas políticas tradicionais e condenáveis em nosso País.

    Não podemos transigir com a corrupção. Seu sentido último é a apropriação de recursos que pertencem à população, ao conjunto do povo brasileiro. É o dinheiro do povo que passa a mãos de particulares, de políticos. São recursos públicos, que deveriam ir para a saúde, salvando vidas, ou para a educação, formando brasileiros para sua plena realização humana, pessoal e profissional. São recursos que deveriam ir para a segurança, garantindo a tranquilidade das pessoas, ou para obras públicas, favorecendo nosso desenvolvimento econômico.

    A exata medida da violência imanente a qualquer ato corrupção está justamente nas privações decorrentes da apropriação ilegítima desses recursos que pertencem ao povo.

    A corrupção, portanto, precisa ser investigada por meio de todos os instrumentos legais e punida com a severidade prevista na legislação. Não podemos compactuar com ela. Todos os suspeitos de corrupção devem ser investigados, sejam quem forem e pertençam a que partido for.

    Sr. Presidente, sempre do ponto de vista institucional, outra frente que se abre é o processo de impeachment aberto contra a Presidenta Dilma. Encaro essa iniciativa com a maior preocupação. O impeachment de uma Presidente da República é fato gravíssimo, admissível apenas na forma estrita prevista pela Constituição.

    Todos os brasileiros sabem que essa condição não ocorre. A Constituição só prevê a abertura de processo como esse quando se configura crime de responsabilidade por parte do Presidente, no caso a Presidenta Dilma Rousseff. Sem que isso ocorra, não há a possibilidade de afastamento da Presidente mediante esse instrumento constitucional. O impeachment não é meramente um mecanismo político. Há um fundamento jurídico para qualquer iniciativa nesse sentido e esse fundamento está no art. 85 da Constituição e em seus sete incisos. Nenhum deles se aplica à Presidenta Dilma.

    É por isso que o processo de impeachment aberto na Câmara dos Deputados, mais do que indesejável ruptura institucional, surge coberto de ilegitimidade. Não há como defendê-lo, não há como adotá-lo. Representa, sim, uma quebra da legalidade, um golpe.

(Soa a campainha.)

    A SRª ANGELA PORTELA (Bloco Apoio Governo/PT - RR) - Da última vez, presenciamos uma quebra da legalidade nos termos hoje propostos, abrimos as portas para 21 anos de ditadura, com tudo o que há de ruim nos regimes de exceção: da repressão policial à tortura, do arrocho salarial à extrema concentração de renda, da supressão da vontade popular ao fechamento do Legislativo e à intimidação do Judiciário.

    Não é apenas no sentido político-institucional que essa ruptura se configura perigosa para os brasileiros. Significará também um retrocesso do ponto de vista social. Os últimos governos, dos Presidentes Lula e Dilma, caracterizaram-se antes de mais nada pela promoção da inclusão social. Retiraram da miséria mais de 27 milhões de brasileiros e proporcionaram, a pelo menos três vezes esse número, a oportunidade de ascensão social aos mais pobres. Programas como Bolsa Família, Minha Casa, Minha Vida...

(Interrupção do som.)

    A SRª ANGELA PORTELA (Bloco Apoio Governo/PT - RR) - Programas como Bolsa Família, Minha Casa, Minha Vida ou o marco do reajuste do salário mínimo que viabilizaram e turbinaram esse importantíssimo projeto de inclusão certamente estariam ameaçados.

    Não se trata aqui de bravata ou de ilusionismos. Nosso processo de inclusão é reconhecido no mundo inteiro. Não há qualquer garantia de sua manutenção caso a Presidenta Dilma seja afastada pelo processo de impeachment. Ao contrário, há todos os motivos para se duvidar da preservação das conquistas sociais obtidas ao longo dos últimos 16 anos. Essa constatação é que nos permite insistir: a remoção arbitrária do atual Governo, escolhido de forma legítima e por maioria absoluta dos eleitores brasileiros representará um retrocesso.

    A preocupação com um retrocesso institucional não é apenas minha. Existe no próprio Poder Judiciário. Gostaria de lembrar aqui que no Supremo Tribunal Federal, o Ministro Marco Aurélio de Mello tem erguido a voz contra o que considera ser um perigoso movimento de atropelo da ordem jurídica do País. Em recentes manifestações, Marco Aurélio criticou a flexibilização do princípio da não culpabilidade e também condenou o vazamento de interceptações telefônicas, o que considerou um abuso. É do Ministro Marco Aurélio também uma advertência em que devemos pensar: não se avança culturalmente atropelando a ordem jurídica, principalmente a ordem constitucional - alertou o Ministro Marco Aurélio.

    Também o Ministro Teori Zavascki alertou que o papel dos juízes é resolver conflitos, não criar conflitos, afinal - resumiu -, os juízes não são protagonistas.

(Soa a campainha.)

    A SRª ANGELA PORTELA (Bloco Apoio Governo/PT - RR) - O Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Ricardo Lewandowski, fez advertência nesse mesmo sentido. É dele a avaliação de que de um lado os juízes têm o poder de decidir sobre a vida, a liberdade, o patrimônio e a reputação das pessoas. Para isso contam com as prerrogativas constitucionais da vitaliciedade e irredutibilidade de vencimentos para que possam exercer suas funções com total independência e autonomia. Nesse sentido - alerta Lewandowski -, o Código de Ética da Magistratura determina que os juízes devem postar-se com imparcialidade, diligência, integridade, dignidade, honra, prudência e decoro.

    Como se constata, prevalece nas mais altas esferas do Judiciário o conceito de que apenas o estrito respeito às normas jurídicas em vigor garante a democracia e a liberdade. Não se pode admitir rupturas da legalidade, como não se pode admitir o retrocesso.

    Estamos numa campanha pela legalidade democrática. Vem para a democracia.

    Era isso, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/03/2016 - Página 18