Discurso durante a 33ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas à gestão do Partido dos Trabalhadores no Governo Federal, com ênfase na utilização de medidas paliativas como forma de transformação social e na falta de atenção às reivindicações das manifestações coletivas; crítica a S. Exª. Dilma Rousseff, Presidente da República, pelo abandono dos deveres do cargo em prol da manutenção do mandato, e defesa da necessidade de criação de leis que inviabilizem definitivamente a prática da corrupção.

Apoio à realização de novas eleições gerais a fim de atender as reivindicações da população e recuperar a credibilidade do governo; comentário sobre a atual situação da economia nacional, com ênfase na forma de utilização dos “royalties” originados do petróleo, nos juros e nos gastos com Previdência Social; e defesa da atualização da CLT.

Autor
Cristovam Buarque (PPS - CIDADANIA/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Críticas à gestão do Partido dos Trabalhadores no Governo Federal, com ênfase na utilização de medidas paliativas como forma de transformação social e na falta de atenção às reivindicações das manifestações coletivas; crítica a S. Exª. Dilma Rousseff, Presidente da República, pelo abandono dos deveres do cargo em prol da manutenção do mandato, e defesa da necessidade de criação de leis que inviabilizem definitivamente a prática da corrupção.
ECONOMIA:
  • Apoio à realização de novas eleições gerais a fim de atender as reivindicações da população e recuperar a credibilidade do governo; comentário sobre a atual situação da economia nacional, com ênfase na forma de utilização dos “royalties” originados do petróleo, nos juros e nos gastos com Previdência Social; e defesa da atualização da CLT.
Aparteantes
Cássio Cunha Lima, Lindbergh Farias, Vanessa Grazziotin, Wellington Fagundes.
Publicação
Publicação no DSF de 19/03/2016 - Página 17
Assuntos
Outros > GOVERNO FEDERAL
Outros > ECONOMIA
Indexação
  • CRITICA, GESTÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), GOVERNO FEDERAL, ENFASE, AUSENCIA, REALIZAÇÃO, TRANSFORMAÇÃO, CARATER PERMANENTE, SITUAÇÃO SOCIAL, AMBITO NACIONAL, FALTA, ATENÇÃO, EXIGENCIA, AUTORIA, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, COMENTARIO, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, FOCO, SALVAMENTO, MANDATO ELETIVO, REFERENCIA, HIPOTESE, IMPEACHMENT, NEGLIGENCIA, NECESSIDADE, POPULAÇÃO, OBSERVAÇÃO, CRIAÇÃO, LEGISLAÇÃO, IMPOSSIBILIDADE, CORRUPÇÃO.
  • APOIO, REALIZAÇÃO, ELEIÇÕES, OBJETIVO, ATUALIZAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, DEFESA, NECESSIDADE, AMPLIAÇÃO, CONFIANÇA, GOVERNO, ATRAÇÃO, INVESTIMENTO, ORIGEM, PAIS ESTRANGEIRO, COMENTARIO, SITUAÇÃO, ECONOMIA NACIONAL, ENFASE, FORMA, UTILIZAÇÃO, ROYALTIES, PETROLEO, JUROS, PREVIDENCIA SOCIAL, IMPORTANCIA, CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO (CLT).

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Estou de acordo com a senhora (Fora do microfone.) Se o Governo disser: "Caramba, preciso conversar com os outros." Eu temo que, mesmo sendo 173 votos a favor dela e 350 - vamos dizer - contra, o PT escolha uma imensa festa neste País e diga: "Agora, somos os donos. Tirem o impeachment da pauta. Agora, nós somos os donos do poder." Eu tenho isso pela arrogância repetida, sistemática, apesar de todos os indicadores de que as coisas não iam bem.

    Senadora, ontem, creio que a senhora ficou aqui por sete, oito horas, sem nem ao menos almoçar - eu fui almoçar, devo dizer. Nós todos ficamos aqui debatendo os aspectos da legalidade dos atos do Juiz Moro. Não discutimos aqui a legitimidade do que o povo quer e como casar os dois, porque não basta ver o povo nas ruas e dizer: "Faz-se como o povo quer, independentemente das leis." E também não é: "As leis dizem. Então, não importa o que o povo diz." Não! Aqui, o nosso papel é casar os dois, mas está ficando difícil.

    Confesso, Senadora, que, às vezes, eu me pergunto se não estou fazendo política em um tempo diferente daquele para o qual fui preparado, porque estamos num Fla-Flu.

    Depois do meu diálogo com o Senador Lindbergh, recebi diversos comentários dizendo: "Ou se está de um lado, ou se está de outro. Não adianta refletir, porque isso é sinônimo de estar em cima do muro." Quando refletir, pensar é estar em cima do muro, acho que isso não é muito o meu tempo de fazer política. Recebi comentários sobre isso. Não, eu não... Tenho cacoete de professor, talvez, ou alguma outra deformação genética que me faz refletir e que não me deixa cair facilmente. Até no futebol, Senador Cássio, quando joga um time de Pernambuco, eu torço pelo time de Pernambuco, independentemente de ser Náutico. Os outros não conseguem esse gesto. Eu vou pela racionalidade do meu Estado, e não só pela paixão do meu time. Aqui, é o Brasil que eu ponho em primeiro lugar e, depois, o meu Partido - desculpem-me os companheiros do Partido. Primeiro, eu ponho o Brasil!

    Aí penso na história que o Senador Lindbergh trouxe aqui. Lamentavelmente, nós não estamos fazendo esse dever de casa, que é a nossa obrigação, por uma razão muito simples: nós, Parlamentares do Parlamento brasileiro - lamento isto há anos aqui e até recolhi alguns discursos em que eu falava sobre o assunto -, primeiro, ficamos impotentes, depois ficamos inoperantes e depois ficamos irrelevantes. A Justiça assumiu o controle. Aí alguns dizem: "Ela deu um golpe." Não deu um golpe! Ela ocupou o espaço de que a sociedade precisa.

    Nós fomos incapazes de definir regras que impedissem um partido no poder de destruir a Petrobras. Nós não definimos regras que impedissem que a Petrobras e outras estatais fossem aparelhadas por partido. Nós não mudamos as regras em tempo, infelizmente, recentemente, sobre financiamento de campanha. E aí veio a corrupção. Querem o que agora? Que a Justiça feche os olhos? Que a polícia não prenda? Nós não fizemos o dever de casa certo, na hora devida, para casar a legitimidade da honestidade com a legalidade das regras que impedem a corrupção e - depois, se não impediu - que prendem os corruptos. A Justiça ocupou; ficamos irrelevantes. E uma prova é como nós debatemos aqui o tempo todo se é legal ou não é legal levar o Presidente Lula para o aeroporto. Eu, pessoalmente, acho que não havia necessidade disso. Ele estava ali, sabe o endereço. Nem ele nem os outros 116, porque também só o Lula não ser levado coagidamente está errado; todos são iguais perante a lei. Não era necessário. Mas eu não sou um jurista, que se debruça sobre as leis e analisa. O que eu quero discutir aqui, Senador - e alguns dizem que, além do cacoete de querer refletir, eu tenho o defeito de me antecipar e, aí, fico falando sozinho, e quando a coisa acontece, se acontece, ninguém lembra quem falou -, é que quero dar um passo adiante, porque o Brasil vai continuar. Depois de hoje, com a passeata do PT, depois da próxima semana, depois do julgamento da Presidente Dilma, ela ganhando ou perdendo, o Brasil continua. E aí eu gostaria muito que nós refletíssemos em que nós erramos. E o "nós", Senador Cássio, tem gradação: em primeiro lugar, "nós" é o PT, que faz parte do Brasil. Eu começo com "nós brasileiros". Errou o PT. "Nós" é o Governo, de 13 anos já - 13% de um século, 10% da República foram do Governo Dilma-Lula. "Nós" somos também os que são oposição, porque, se ou por omissão ficamos quietos ou por incompetência não impedimos, também somos culpados. Em que nós erramos? E aí eu ponho aqueles que pensam progressistamente, porque se consideram de esquerda - independentemente da sigla, porque esse negócio de esquerda, hoje, não tem a ver com sigla, não. Em que nós erramos?

    O centro das manifestações do povo - e é povo, não venham dizer que porque tem uma cor e não a outra, porque usa uma roupa e não outra não é povo... O povo, Senador Cássio, se mudou do ABC para a Avenida Paulista; da frente do Sindicato dos Metalúrgicos para a frente da Fiesp. De gritar Lula lá no poder para gritar Lula lá preso.

    Onde é que nós erramos? Não vamos discutir se tem erro aí do Juiz Moro ou não - acho que, se tiver, é pequenininho. Onde é que nós erramos, que perdemos o contato com as ruas? É porque nós perdemos a sintonia com a legitimidade do que o povo quer. O primeiro momento, a meu ver, da perda, Senador Lindbergh, foi quando o PT chegou ao poder. Devia chegar junto com o PSDB, porque era o Partido Social Democrata, e não chegou porque os dois são de São Paulo, basicamente, e puseram os aspectos eleitorais na frente dos políticos, e puseram São Paulo na frente do Brasil - os dois.

    Onde é que o PT errou quando chegou ao Governo? Porque perdeu o vigor transformador. O PT preferiu medidas boas, generosas, mas paliativas. Volto a insistir: boas, generosas, mas paliativas. Ficamos, por exemplo, com as cotas, e eu fui dos pioneiros na defesa de cotas. Estava na propaganda da Dilma: colocamos o filho de um pedreiro na escola. Positivo, mas paliativo. Transformação seria dizer: nós fizemos as mudanças na educação e agora os filhos de todos os pedreiros disputam o vestibular em condições de igualdade com os filhos dos patrões. Aí seria transformação. Ou seja, não se abriu uma brecha na porta para se entrar: se deu igualdade de condições na disputa para entrar. Essa é a transformação!

    Paliativo - aumentou o programa Bolsa Escola, criado no Brasil pelo Fernando Henrique Cardozo, a partir da minha experiência aqui como Governador. Mas a transformação, Senadora Vanessa, não seria aumentar o Bolsa Escola, que é uma coisa positiva e generosa. Veja que não estou chamando de populista, estou chamando de generosa. A transformação seria dizer: agora, nenhum brasileiro precisa mais de bolsa. Todos são capazes, com a produtividade que têm, do salário necessário para uma boa sobrevivência, com dignidade.

    O Sr. Cássio Cunha Lima (Bloco Oposição/PSDB - PB) - Quando possível, me concede um aparte?

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Com o maior prazer, Senador.

    Não fizemos esse trabalho - e olhe que eu pus "nós". Eu me incluí agora, porque ajudei o Governo a chegar lá, fui Ministro no primeiro ano.

    Eu tentei, aliás, fazer isso com a ideia de federalização, adotando 29 cidades. Um programa chamado Escola Ideal, parado na primeira semana em que o Ministro Tarso Genro me substituiu - 29 cidades minúsculas. Era o que o dinheiro do MEC permitia, porque o Lula - e nisso eu era a favor - foi austero, não deu dinheiro para fazer mais. Mas eu estava de acordo com ele, porque, se a inflação voltasse, quebraria tudo. Que fizéssemos devagar, mas com estabilidade monetária.

    E, para falar mais em vigor transformador, não fizemos as reformas que impedissem a corrupção. Porque uma coisa é você ser honesto e dizer: no meu governo, não há ladrão. Outra coisa é ser transformador e dizer: a partir de agora, eu criei regras tais que, mesmo que o ladrão assuma, ele não consegue roubar. Isso é transformação. Isso é revolução. Não basta você dizer que no seu governo não há desonesto, não há ladrão, e, passado o seu governo, começa a se encher de ladrão. Você não fez a transformação. A transformação são regras que impedem que corruptos cheguem ao poder, como a Lei da Ficha Limpa - ela ajuda -, ou que, mesmo que eles cheguem, fazem com que não consigam roubar. Não fizemos as transformações, não fizemos as reformas de que este Brasil precisa. Aí foi o primeiro erro.

    O segundo erro foi ter caído nas malhas da mesmíssima política. Passou-se a fazer política da mesma maneira: com arranjos espúrios, com alianças promíscuas, com financiamento de campanha indecente. Caiu-se na mesmice. Este foi o segundo erro que levou as pessoas a saírem do ABC para a Avenida Paulista; do sindicato dos metalúrgicos para a Fiesp; do Lula salvador da Pátria para o Lula vestido de prisioneiro. A mesmíssima política, não mostramos diferença.

    A Presidente Dilma caiu na mesmice quando disse: o problema é o impeachment, o problema secundário será o vírus da zika, será o saneamento. Não colocou em primeiro lugar as transformações de que o Brasil precisa. Ela poderia ter mandado para cá um conjunto de projetos de lei, dizendo: perdi, não é tempo de reformas, vou esperar outro momento. Ou até dizer: não é mais tempo de eu continuar no Governo porque o Congresso não deixa as reformas avançarem.

    Ela preferiu esquecer as reformas, concentrar-se totalmente na salvação do mandato, e não na justificativa de para que o mandato. Um mandato é para transformar o Brasil, não é apenas para ter um mandato. Este foi o segundo erro: a mesmice.

    O terceiro foi a arrogância: nós contra os outros. A história do Brasil começou em 2003, e não em 1500. Um erro isto: não reconhecer o passado nas suas qualidades e achar que todas as coisas boas começaram agora. E não reconhecer o passado nos seus erros, maldades, perversões deste País e tentar corrigi-los. Um erro a arrogância, a divisão entre nós e os outros. Vejam bem, o engraçado é que o "nós" passou a ser o próprio PT e os aliados, independente de ser ou não. Maluf passou a ser "nós" naquele momento, no Governo. E outros passaram a ser "nós".

    Um desses dias alguém me disse - e vou dizer mais, Senadora Vanessa, um ex-ministro do Lula, não vou dar o nome -, quando eu perguntei onde erramos, Senador Lindbergh, essa pergunta que eu faço todos os dias, ele disse: "Tem uma foto de onde erramos.” Eu disse: “Qual foto?” Ele disse: “A foto do Lula no jardim da mansão do Maluf para conseguir ganhar uma eleição.” Ele acha que aquela foto foi o emblema do erro.

    De certa maneira, no sentido da mesmice e da perda do vigor transformador, esses dois pontos que eu coloco como fundamentais...

    A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - V. Exª, em um momento oportuno, concede-me um aparte?

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - O Senador Cássio pediu, mas depois...

    A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Perfeitamente.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Mas terei todo o tempo.

    E também o terceiro, da arrogância. Ou seja, o povo entende, o que o Lula fizer o povo entende. Esses foram os três erros.

    O quarto - e não vou colocar nenhum mais, vou ficar no quarto - é não ouvir as ruas. Não ouve as ruas. E a gente pode dizer isso com a maior clareza quando chama todos os manifestantes de golpistas. É não ouvir as ruas. É não olhar as ruas. Não faz sentido dizer uma coisa desta. E terminou, como o senhor mesmo disse, Senador Medeiros, insuflando mais ainda. Foi um erro chamar de golpistas todos os manifestantes. Tinha que dizer: “Olha, no meio dos manifestantes de boa índole há alguns golpistas.”

    E há mesmo, não vamos negar.

    Eu até digo mais: está crescendo a proporção de golpistas, pela raiva, como os que o senhor disse que viu aqui em frente ontem. Essa raiva está levando, sim, a transformar manifestação em golpe. E, com isso, eu me preocupo muito.

    Está crescendo, Senador Lindbergh, o grupo que, como o senhor diz, tem raízes fascistas. Está crescendo, mas ainda está longe de ser a maioria. A maioria ainda é gente que está descontente.

    E falta ainda outro grupo, antes dos fascistas, que são os desesperados. Há os descontentes, há os desesperados, que são aqueles descontentes que já não têm mais esperança, aqueles que descerão dos morros para a manifestação na Avenida Paulista ou em Copacabana; isso ainda não houve. Ainda poderá haver um descontentamento, sobretudo, de classe média, mesmo baixa, mas, quando aqueles que são desesperados, que não veem alternativa mais, juntarem-se, aí vai ficar difícil.

    Quando isso acontecer... E mais uma coisa em que eu insisto aqui, há anos: manifestação todo governo aguenta, porque vai, pega o metrô ou o ônibus, e vai para casa; agora, o que nenhum governo aguenta é manifestação permanente. E vai acontecer, aliás, está acontecendo, ainda, com um grupo pequeno, Senador Lindbergh.

    Enquanto vai, e volta para casa, nenhum governo é ameaçado; agora, quando vai, e fica, nenhum governo é sobrevivente. E a História mostra isso. Faz anos que eu digo: um dia o povo vem aqui para a frente do Congresso - porque é falso dizer que os manifestantes estão com raiva apenas do Governo; os manifestantes estão com raiva de todos nós, e o senhor mesmo ainda ontem falou aqui: "Que se vayan todos!", como diziam na Argentina - "Fora todos!", e já está aí. Quando ficarem aqui, aí não haverá jeito.

    Pois bem, não ouve as ruas. E eu acho que uma das maiores provas de que não ouve as ruas, Senadora Vanessa, Senador Lindbergh, com todo o carinho e respeito, foi a nomeação do Presidente Lula. Pessoalmente, eu acho que não vai adiantar muito a nomeação do Presidente Lula. Eu não acho que ele tem mais aquela força, aquele carisma, ou, como se diz vulgarmente, aquele cacife de vir debater aqui.

    Eu ouvi Senador dizer, que não é distante do Governo, que não gostará de "aparecer na foto com o Lula", entre aspas. O que ele quis dizer é que não vai querer ficar nesse diálogo e vai preferir outro interlocutor.

    Eu não acho que foi um acerto, do ponto de vista da prática política, mas, pior ainda: pareceu, como hoje mesmo eu ouvi alguém dizendo, um tapa na cara, porque - o Senador Medeiros falou hoje aqui -, no domingo, o povo dizia uma coisa, e, na terça-feira, a Presidente fez o que o povo não queria, o oposto, 180 graus de diferença. Este é um equívoco muito grande, não ouvir as ruas. E não ouviu.

    O resultado é que estamos em uma situação em que o Governo está isolado, mas a esquerda também. As esquerdas estão isoladas. Aqueles que propunham alternativas de esquerda - eu me incluo entre esses -, nós vamos pagar um alto preço por esses 13 anos de Governo: ou por ter perdido o vigor transformador; ou por ter feito a mesmice na política; ou por ter mantido a arrogância; ou por que o Governo não ouviu as ruas.

    Isso está contaminando todos aqueles que pensam em transformação, em austeridade. E não falo em austeridade financeira, falo em austeridade do Papa Francisco ou austeridade do nosso ex-Presidente do Uruguai. Todos vão ter dificuldades daqui para frente, porque se perdeu legitimidade diante do povo.

    E, finalmente - e aí passo para os apartes -, nós políticos, isolados como estamos, vamos ter dificuldade de encontrar o caminho. E isso é o mais grave de tudo.

    Esta situação não pode demorar muito tempo. O País está parado. E ela vai ser resolvida, provavelmente, em alguns meses, seja com o impeachment, seja com a continuação da Presidente Dilma, passada a discussão do impeachment.

    Aí esta Casa tem que estar preparada para o dia seguinte, seja o dia seguinte ainda com a Presidente Dilma, seja o dia seguinte com o Presidente Temer, seja com o que começa a ganhar força, a ideia de eleições gerais. O Senador Cássio está dando apoio a isso. A ideia de eleições gerais vai crescer - vai crescer muito!

    O problema é que essa aspiração legítima do povo à eleição geral tem que casar com a legalidade de o Congresso convocar eleição geral, e aí passa por reforma constitucional.

    E, se a gente duvida que haverá voto suficiente, qualificado, dois terços, para o impeachment, imaginem para o impeachment de todo nós? Porque eleição geral é o impeachment de todos. Então, imaginem nós todos votando pelo impeachment de todos nós! Eu quero dizer aqui que eu votarei.

    O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. S/Partido - MT) - Eu também, Senador Cristovam.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Eu votarei. Eu vi que o Senador Cássio fez assim quando eu falei. Eu votarei por eleição geral, mas não acredito que isso passe.

    Mas o povo vai querer. E o que a gente vai fazer se o povo for para a rua e ficar na rua dizendo: "Eu não quero só impeachment da Dilma, eu quero o impeachment de todos"? Aliás, há até uma maneira prática de fazer isso. Vai haver eleição para prefeito, e se faria junto a eleição para todo mundo. E até aquela ideia que alguns defendem - eu nem sou tão simpático -, de coincidência da eleição municipal com nacional, seria feita, atendendo a um anseio do povo.

    Mas, tirando isso, nós temos que estar preparados para o dia seguinte ao Governo com a Dilma ou ao Governo com o Temer. Temos que estar preparados, supondo que não haverá a cassação dos dois pelo TSE. Se houver, temos que estar preparados.

    Mas aí é mais fácil. Aí nós vamos fazer uma eleição para Presidente. Teremos por 90 dias algum Presidente da Câmara.

    A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Eu creio, Senador Cristovam, que, se o TSE decidir pela cassação, assumiria o segundo colocado. Não sei.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Não, não, não. Assume o Presidente por 90 dias.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Presidente da Câmara por 90 dias e eleições.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Ou, então, teremos como Presidente o grande Deputado Cunha ou alguém que escolhido, para substituí-lo, provavelmente com apoio do Cunha, porque vai ser difícil eleger um Presidente da Câmara, Deputado, sem o apoio do Cunha.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Senador Cristovam, só para reforçar o argumento de V. Exª. Só seria, Senadora Vanessa, eleição indireta se fosse no próximo ano.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Sim, a metade.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Passado 2017, não seria eleição direta. Seria uma eleição indireta, feita aqui pelo Congresso Nacional.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - É isso mesmo.

    Então, supondo isso, nós devemos estar preparados para o dia seguinte, com a Dilma, pós-votação de impeachment; ou sem a Dilma, com o Temer, pós-impeachment. E nós não estamos nos preparando para isso.

    Por exemplo, que compromisso tem o Presidente Temer, se ganhar, de manter a Lava Jato em andamento? Ou que conchavos podem-se até estar arrumando hoje por aí, para dificultar o andamento da Lava Jato com o Governo Temer? Porque a gente sabe a quantidade de pessoas que estão dentro da malha, dentro da rede.

    Que compromisso tem de levar adiante um programa que recupere a credibilidade, que é o que mais falta hoje no Brasil, interrompendo o funcionamento da economia?

    Há tempo que falta capital, há tempo que falta recurso natural, há tempo que falta mão de obra. Embora falte mão de obra qualificada no Brasil, o resto não falta, a não ser credibilidade. Se houver um governo com credibilidade, o capital vem do mundo inteiro e faz essa economia funcionar. As máquinas estão aí, inclusive, ociosas hoje.

    Nós não estamos trabalhando para o dia seguinte. E eu sei que a maioria do povo, a imensa maioria, não quer nem saber do dia seguinte; quer saber é de hoje se livrar do Governo que está aí - a imensa maioria. E nós não estamos dando guarida aqui dentro, do ponto de vista legal, para se fazer isso.

    Felizmente, pelos menos agora, abriu-se o processo de impeachment. Eu sempre defendi que o processo fosse aberto e nunca disse, como vou votar aqui, no dia, porque eu serei juiz, e juiz se pronuncia depois de analisar os autos, as provas a favor e as defesas, mas felizmente se abriu o processo, estávamos precisando disso. A Presidente Dilma deveria ter tomado até a iniciativa, meses atrás, de pedir que seu Partido votasse pela abertura do impeachment, como, aliás, fez, porque a votação foi expressiva a favor da Comissão - houver um voto contra.

    Então, eu creio que nós estamos caminhando para consolidar a ideia de inoperantes e irrelevantes. E isso, sim, Senador Lindbergh, que é ruim para a democracia. Para a democracia, um erro ou outro de um juiz passa, agora, o que não passa é um Congresso irrelevante, é um Congresso inoperante.

    Por isso que nós é que somos os culpados; não é o Juiz Moro, sem querer dizer que ele acerta em tudo. Aliás, acho que foi um erro aquela coercitiva do Lula. Não a que disse na hora e disse aí fora, no mesmo momento.

    Aliás, agradeço ao Senador Medeiros, porque eu cheguei aqui na hora. A imprensa perguntou e disse: "Medeiros, é verdade que estão fazendo a coação ao Lula?" Ele nem sabia, entrou no computador, viu que era. Eu disse: "O que a gente fala?" O senhor me ajudou naquele momento, disse que, para fazer uma coisa dessa, o juiz tem que ter muita certeza jurídica de que isso é possível, e depois ficou comprovado que ele não tinha tanta assim.

    Mas esses são pecados muito menores. O grande pecado é do Governo, seus partidos, e nosso aqui também, como coadjuvantes que estamos sendo, na vaia ou no aplauso, mas coadjuvantes inoperantes ou irrelevantes.

    Não há democracia com Congresso irrelevante - e o nosso está sendo. E isso nós temos que resolver entre nós, e não esperar que a Justiça nos faça relevantes. A Justiça preenche o vazio que nós deixamos, por nossa inoperância e por nossa irrelevância. Esse é o desafio que a gente precisa enfrentar.

    Senador Cássio.

    O Sr. Cássio Cunha Lima (Bloco Oposição/PSDB - PB) - Agradeço o Senador Cristovam. Eu vou tentar, mesmo de maneira improvisada e com os meus limites, fazer um comentário sucinto da construção de sua fala, sempre muito lúcida. O que o senhor chama de cacoete de professor, eu identifico como a virtude do mestre. (Risos.) É a exposição lúcida, a argumentação clara, a lógica de um raciocínio e, sobretudo, a trajetória coerente, não só do seu pensar, mas do seu agir. E isso o credencia como um dos melhores oradores que ocupam essa tribuna. Tenha a certeza!

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Obrigado.

    O Sr. Cássio Cunha Lima (Bloco Oposição/PSDB - PB) - Então, começo o aparte por essa parte. E quero concordar com a análise de V. Exª em vários aspectos, quase que na totalidade do teor da sua fala. Com todo o respeito, eu vou fazer uma observação que, talvez, entre outros graves erros, o maior equívoco praticado pelo ex-Presidente Lula teria sido não inovar na forma de sustentação política que levou o Brasil a uma situação difícil. E, em vez de transformar os métodos já envelhecidos, apodrecidos, da política da altura, o Presidente Lula deixou de usar o seu imenso capital político, deixou de usar a sua extraordinária liderança popular, e terminou quedando para o caminho mais fácil, o caminho do fisiologismo, do patrimonialismo, do aparelhamento do Estado, e que talvez tenha sido, neste ponto, o erro que degenerou todo o sistema desse período de governabilidade do PT, porque o que está sendo revelado na Lava Jato e que foi descoberto e já punido no mensalão nada mais é do que a expressão mais nua, mais crua dessa forma de operar a política. E é exatamente isso que o povo brasileiro está dizendo que não quer mais, quer um basta. E esse talvez seja o primeiro grande desafio para quem está olhando para o futuro como V. Exª faz. Sim, temos de olhar para o amanhã, porque o presente já está precificado. Ontem, a Câmara dos Deputados instalou a comissão do impeachment. E é um processo irreversível, por tudo o que estamos vivendo - e não preciso entrar em detalhes. Agora, é momento de, com muita responsabilidade, o Parlamento, o Congresso Nacional, ter espírito público - uma palavra tão gasta -, deixar projetos políticos de lado e ambições pessoais de banda e pensar no Brasil. Este é um momento em que divergências ficam menores diante do desafio que nós temos para o amanhã do Brasil: conduzir uma saída legal, constitucional, para esta crise. Hoje de manhã, Cristovam - permita-me, Senador, tratá-lo assim -, eu acordei, em primeiro lugar, lembrando-me do meu pai, que hoje completaria 80 anos, sentindo uma saudade imensa. É uma saudade que sinto quase ou todos os dias, mas, hoje, por razões naturais, a lembrança do poeta Ronaldo Cunha Lima, meu pai, foi muita intensa. Prestei-lhe uma homenagem, fazendo aquilo de que ele mais gostava: distribuindo pelas redes sociais uma poesia sua. Logo ao acordar - acordei cedo, umas 5h30, e fui dormir tarde, noites indormidas nestes últimos meses -, lembrei-me de uma frase que sempre conceituou a vida dele, que foi o meu grande aprendizado. Dizia meu pai: "Política se faz como sacerdócio; jamais, como negócio". Meu pai disse isto a vida inteira: "Política se faz como sacerdócio; jamais, como negócio". Talvez tenha sido exatamente o grande pecado: confundir o sacerdócio, que é a política, com a atividade empresarial, com um negócio qualquer. E as coisas foram-se degenerando, a ponto de vivermos este instante tão conturbado, em que precisamos, agora, muito menos do que apontar culpados, encontrar saídas. Eu acho que o momento chegou a um ponto tal que o Brasil precisa de todos nós, da capacidade de fazer a política como deve ser feita, com esse espírito público, e de o Congresso Nacional voltar a ocupar o espaço que foi preenchido, como V. Exª bem analisou, por outros Poderes, que constitucionalmente estão no mesmo patamar, na mesma hierarquia. Diante do vazio, na observância do vácuo, eles foram lá e ocuparam. Erros judiciais, aqui ou ali, irão acontecer sempre! Temos erros mais graves da Justiça, que condenou à pena de morte inocentes. Isso vai acontecer sempre! Isso é da natureza do Poder Judiciário, porque é da natureza humana. Na humanidade, há célebres casos da Justiça - e Justiças sólidas, como a dos Estados Unidos -, em que juízes e tribunais inteiros, equivocadamente, condenaram à morte pessoas inocentes. Portanto, essa não é a questão central neste momento. Erros cometidos serão apurados e punidos, porque estamos construindo uma República, onde quem erra e quem comete crime são punidos, mesmo que seja um ex-Presidente da República ou um Juiz Federal. Não importa. Essa talvez seja a grande conquista do momento atual, em que o povo na rua constrói a história. E esse povo está de parabéns, é claro, porque só podemos aplaudir neste instante o povo brasileiro e fazer a defesa das instituições. Para concluir, nesse olhar do futuro, eu queria propor a V. Exª que possamos discutir talvez aquilo que seja dois desafios importantes para o amanhã - de passagem, numa pincelada rápida, com a sua clarividência, o tema já foi abordado. O primeiro é o ajuste do Estado brasileiro, com suas disfunções atuais, que precisa de uma reforma ampla. Mais do que uma reforma, que é uma palavra talvez gasta e mal-interpretada, eu acho que o Estado brasileiro precisa de uma atualização, tal qual fazemos permanentemente nesses telefones chamados de inteligentes. Nos celulares, com seus inúmeros aplicativos, de quando em vez, temos que atualizar o aplicativo, todo o tempo estamos atualizando os aplicativos. E o Estado brasileiro precisa se atualizar. Nós precisamos fazer uma atualização no Estado brasileiro, porque ele está com um software absolutamente ultrapassado. Então, a atualização do Estado brasileiro é o primeiro desafio. O segundo grande desafio é produtividade da nossa economia. E dados são muito preocupantes, porque, ao tempo em que aumentou a escolaridade do povo brasileiro, o que é extraordinário, muito bom, não cresceu na mesma proporção a produtividade da nossa economia. Então, tornar a nossa economia uma economia moderna e competitiva, para que, a partir daí, tenhamos investimentos e consequentemente desenvolvimento, gerando oportunidades para todos, é o grande desafio do amanhã. Temos que sair dessa crise atual, apontar alternativas. Encerrando, me vem à lembrança que a primeira vez que, ocupando esta tribuna, a palavra impeachment foi pronunciada foi pela minha boca, quando recebi um aparte de V. Exª.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Dizendo que não era golpe.

    O Sr. Cássio Cunha Lima (Bloco Oposição/PSDB - PB) - Não. Senador Cristovam, por ensejo de uma pesquisa do Datafolha que apontava uma queda vertiginosa da popularidade da Presidente Dilma, eu fui à tribuna para dizer: "Impopularidade não é motivo para impeachment."

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Isso.

    O Sr. Cássio Cunha Lima (Bloco Oposição/PSDB - PB) - O meu discurso foi exatamente nessa linha. Eu disse claramente: "Impopularidade não é razão para impeachment". E, a partir daí, o tema começou. Lembro o aparte que V. Exª fez, quando disse: "O impeachment está na boca do povo."

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Está na boca do povo.

    O Sr. Cássio Cunha Lima (Bloco Oposição/PSDB - PB) - V. Exª disse: "Eu ando, circulo, e está na boca do povo". E já, naquele instante, estava na boca do povo. E a minha fala nem foi, naquele instante, defendendo o impeachment, porque não tínhamos ainda as provas do crime de responsabilidade que foram alcançadas posteriormente, sobretudo com os decretos de suplementação orçamentária. Eu nunca usei as pedaladas como argumento central para o crime de responsabilidade, mas, sobretudo, os decretos de suplementação orçamentária sem autorização legislativa, que é crime de responsabilidade aqui e em qualquer parte do mundo - não há como fugir disso -, e agora esses fatos mais recentes. Pois bem, encontrada a saída, que será a do impeachment pelo que está sendo visto... É claro que poderíamos ter outras, como eleições, e, numa democracia doente como a nossa - a nossa democracia está num quadro infecção generalizada pela superbactéria da corrupção, do patrimonialismo, de tudo aquilo que conhecemos -, talvez o melhor remédio fossem as eleições para que o povo pudesse, com a soberania do seu voto, decidir, mas não será esse caminho, será o caminho do impeachment. O importante é que vamos ter uma alternativa de saída. Fica o desafio, a fustigação para que possamos refletir sobre esse amanhã e não só o amanhã propriamente dito, mas o depois de depois de amanhã, olhando para essas duas pilastras. É essa a sugestão que trago a V. Exª, com sua lucidez, capacidade intelectual, capacidade de formulação, para que, quem sabe, o Senado da República possa apontar caminhos também nesse sentido. Salve o povo brasileiro e viva Ronaldo Cunha Lima, que sempre foi um grande democrata e que me ensinou que política se faz como sacerdócio, jamais como negócio.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Obrigado, Senador Cássio.

    Grande brasileiro, grande paraibano, grande poeta - talvez fosse do que ele mais se orgulhasse. Ele não era só poeta, mas um apaixonado pela poesia, onde estava, falava, usava, recitava. Paraibano como Lindbergh.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Muito jovem, eu fiz campanha para o Governador Ronaldo Cunha Lima. Lembro-me de que eu, na Paraíba, muito garoto, nas ruas, fazendo campanha. Era uma eleição muito importante naquele período, a vitória do PMDB tinha um símbolo gigantesco. Eu tive muito orgulho de ter participado ativamente daquela campanha e ter convivido com essa figura extraordinária que era Ronaldo Cunha Lima, que encantava qualquer mesa que ele estivesse. Eu faço questão de compartilhar isso. A história da Paraíba de grandes homens públicos, como Antonio Mariz. Lembro-me da campanha, Senador Cássio, de Antonio Mariz. Aquela primeira campanha foi que ano?

(Intervenção fora do microfone.)

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Houve em 1982, mas houve aquela indireta ainda de... Houve uma que foi 1978. Eu me lembro dos comícios gigantescos ali de Antonio Mariz.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Quando eu vejo esses nomes de grandes paraibanos, inclusive Celso Furtado, Ariano Suassuna, eu penso que a mãe deles achava que estava em Pernambuco e deu à luz do outro lado da fronteira por descuido, Senador. (Risos.)

    Eu ainda quero falar da sua fala antes de passar para a Senadora Vanessa.

    De fato, houve erro na maneira de conduzir muitas coisas. Por exemplo, havia um mar de lama na frente da história do Brasil. E o PT foi dos Partidos que mais lutou contra esse mar de lama. Ao chegar ao poder, havia uma alternativa: barrar rio acima, com uma represa, a lama. Era o melhor drenar a lama que havia em frente e fazer uma ponte sobre a lama, mas escolheu-se o que, às vezes, não é o melhor caminho, porque é o mais fácil: atravessar para o outro lado da história pisando na lama. Foi um erro, um erro que terminou afogando tantos.

    Eu quero dizer, Senador Cássio, que, antes de V. Exª chegar aqui, tivemos um debate eu e o Lindbergh que fico muito feliz de ter feito. E surgiu dele a lembrança do que vão dizer das nossas decisões daqui a 30 anos. Eu me preocupo muito com isso, tanto me preocupo, Senador Medeiros, que eu escrevi um livro - talvez nenhum Senador conheça - sobre os debates que aconteceram aqui na Lei Áurea. Eu peguei as atas, li as atas, e estão lá os antiabolicionistas e os abolicionistas. Está lá o debate 130 anos depois mais ou menos. Então, eu acho fundamental. E surgiu, Senador Cássio, a ideia - claro que parece brincadeira, mas um dia acho que vão cumprir - de escrever aqui bem grande: lembrem-se de que daqui a 30 anos vão dizer o que vocês fizeram.

    Quando chegar aqui o impeachment, vai ser o voto mais importante de qualquer um de nós para a história. Vão nos cobrar se votamos de um jeito ou de outro. O que vai fazer com que fique um coroamento ou uma condenação no nosso voto? As bases substanciais para justificar o voto. Se existirem, votar contra vai deixar mal na história; se não existirem, vai ficar mal na história quem votar pelo impeachment.

    Como o Senador Cássio lembrou, foi ele que levantou aqui a ideia, eu estava sentado ali e disse que a ideia não é golpe, porque está na Constituição previsto, mas será ilegal se não se respeitar outro artigo que diz as razões. As razões, como o senhor mesmo disse, não é nem baixa popularidade, nem incompetência, por pior que essas duas coisas sejam isso para o Brasil. Lá está escrito exatamente que tipo de crime leva a isso. Nós vamos ter que justificar. E, aí, Senador, para os meus amigos Lindbergh e Vanessa, que são os dois mais fortemente ligados ao Governo pelo PT e pelo PCdoB, se na votação houver base suficiente para justificar e só PT e PCdoB votarem contra, não vão ficar bem, porque vai parecer corporativismo, vai parecer apego ao poder do Partido.

    Eu estou preocupado com o que a história vai dizer de nossos votos e vou votar pensando nisso e vou votar consciente da responsabilidade que é votar para derrubar um Presidente. É duro, tem que ter argumentos muito substanciais, de acordo com a lei. Eu vou votar com muito cuidado, tanto que até hoje eu não disse minha posição. Eu sou a favor que se abra o processo, mas nunca disse aqui que sou a favor do impeachment ou se não sou a favor. Todos me cobram, porque, nesse Fla-Flu de hoje, tem que se estar a favor ou contra. Eu ainda não vi os autos completos, não vi ainda a defesa da Presidente Dilma em relação àquilo de que ela é acusada. O juiz, quando senta para julgar, pode até ter no coração dele a ideia de que o cara é um criminoso, mas ele não pode sair dizendo se é ou não criminoso, antes de ouvir os jurados, antes de ver os autos, a defesa, a acusação. Eu vou votar com a consciência de que, 30 anos depois e até mais, vão olhar como é que aquela pessoa votou. Não tenham dúvidas. Eu acho, recomendo, sugiro que personalidades como vocês também faça o mesmo: pensem bem não só o que o povo na rua está dizendo, mas o que os historiadores vão registrar.

    Senadora Vanessa.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Eu também depois da Senadora Vanessa?

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Claro.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Muito obrigado.

    A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - V. Exª, Senador, tem procurado debater a crise do ponto de vista das saídas. E eu quero dizer que sempre cumprimentei V. Exª muito por isso, porque acho que V. Exª traz uma preocupação que é sincera. Quando nós votamos o pré-sal aqui, para decidir se abriríamos ou não a possibilidade de a Petrobras deixar de ser operadora única, V. Exª se absteve.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Foi.

    A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Porque não teve mais tempo para chegar a uma conclusão, para formar o próprio juízo de valor, não é? Então, eu sempre o respeito muito, eu acho que o Brasil todo o respeita por essa preocupação sincera que V. Exª sempre manifesta. V. Exª diz: "onde erramos?". Eu não vou aqui ousar responder aos seus questionamentos, porque eu acho que todos nós temos que fazer um exercício coletivo para responder a eles. Não são questionamentos fáceis de responder. Mas V. Exª - acho que foi V. Exª que ontem, ou algum dia - falou do período do Governo em que o Partido dos Trabalhadores está no poder. São 13 anos. Já estamos no 14º ano, creio, o mais longevo período da história da democracia brasileira. Então, é óbvio que muitos erros aparecem. É óbvio que muitos erros são cometidos, e muitos acertos também - do ponto de vista social, não tenho dúvida nenhuma. O senhor, Senador Cristovam, cita Lindbergh, cita a mim, dois Partidos diferentes - Senador Lindbergh é do Partido do ex-Presidente Lula, é do Partido da Presidente Dilma; eu não, eu sou do PCdoB. Neste Governo nós temos um Ministro, o Ministro Aldo Rebelo, da Defesa. Nós não estamos no Governo por cargo. Nunca estivemos. Nós estamos no Governo por uma convicção que nós temos em relação ao projeto que vem sendo adotado pelo Governo. Nós temos uma postura de apoio crítico em algumas coisas. V. Exª sabe disso: na política econômica, nós entendemos que não é possível se manter essas altas taxas de juros, essas taxas estratosféricas, que - essas sim, no nosso entendimento -, desequilibram muito a situação fiscal do nosso País, principalmente em um momento em que a arrecadação cai, a arrecadação não cresce. Só que a diferença, Senador Cristovam, é que nós não podemos pensar com lado, nós temos que pensar com o todo. E, com o todo, qual é mesmo a razão da crise? É mais ou menos o raciocínio do que eu quero falar quando subir a essa tribuna. É que tudo iria, pelo menos aparentemente, bem, o Governo com uma grande base de apoiamento aqui, quando a economia ia bem. Mas a economia do mundo também estava bem - aliás, não. De 2008 para cá, a economia mundial vive sérios problemas, e o problema que tem hoje é advindo do problema de 2008, quando os norte-americanos enfrentaram um desemprego elevadíssimo, queda no poder aquisitivo das pessoas, na qualidade de vida das pessoas. Nós enfrentamos, naquele momento, a crise, e não sofremos, não tivemos desemprego, não tivemos redução de arrecadação; diminuição, mas não a redução drástica que estamos tendo hoje. Até que o nosso País foi atingido em cheio. Se somarmos isso, Senador Cristovam, às eleições, porque estou ouvindo muito nós falarmos em eleição: "Vamos para eleição geral." Nós acabamos de sair de uma eleição geral! Nós acabamos de sair de uma eleição em que a Presidente Dilma foi eleita com 54 milhões de votos. É uma diferença muito pequena, é verdade, mas que não justificaria vivermos esse estado de disputa permanente que nós estamos vivendo. A crise se agudizou agora, mas ela não é de agora. Ela vem desde as eleições. Então, acho que primeiro temos de ter claro o que está acontecendo. Nada acontece por acaso. São ações que estão profundamente ligadas entre si e que levam à situação em que nos encontramos hoje. Então, as ruas pedem a saída da Presidente Dilma: "Fora Dilma!" As ruas que eu quero dizer são aqueles manifestantes, porque o Brasil é muito maior do que aquelas ruas. Agora, não podemos deixar de olhar para aquelas ruas também, para aquele estrato da sociedade, por mais que seja o mais privilegiado. Está aí a pesquisa do DataFolha mostrando que uma grande parte ganha acima de cinco salários mínimos. Mas não é por causa disso que nós vamos deixar de olhar, de enxergar e de ver. Temos de ver. Então, pedem a saída da Dilma. Mas por quê? Por causa da corrupção, a corrupção que foi revelada pela Lava Jato, esse problema grave, seriíssimo com a Petrobras. Aí precisamos falar a esse povo. O processo do impeachment não tem nada a ver com isso. Mas as pessoas acham que tem, que a Presidente Dilma tem de sair por conta disso. Então, Senador Cristovam, acho que nós já estamos chegando - espero, com muita esperança -, na reta final dessa longa crise. Por quê? Porque se abriu o processo de impeachment ontem. A comissão foi eleita e a comissão foi instalada. Então, a Presidente terá dez sessões para apresentar a sua defesa e seguir na análise. V. Exª diz: "Ou vai ganhar por muito ou vai ganhar por pouco ou vai ganhar muito apertado, caso não passe o impeachment." Mas o processo está aberto. Acho que, concluído o processo, se a Presidente não for impedida, aí, sim, Senador, o pacto tem que vir com todos, porque o resultado das urnas nós tivemos em outubro de 2014, há pouco mais de um ano, e o resultado do Parlamento nós também teremos nos próximos dias. Então, vamos fazer um pacto. Aí, sim, vamos discutir, como diz o Senador Cássio, o Brasil do futuro. Eu também acho que o Estado brasileiro já se exauriu. Também acho! Agora, quando falamos em reforma política, nós não conseguimos passar aqui uma reforma política verdadeira, aquela reforma que valorize o partido e não a pessoa, porque nós somos transitórios. Aqui mesmo estamos a homenagear o Senador e Governador Ronaldo Cunha Lima pelo brilhante serviço que prestou à democracia não só da Paraíba, mas também do Brasil. Mas, infelizmente, o seu pai não está mais entre nós, ele se foi. Daqui a um tempo, seremos nós que seremos lembrados ou não. Não estaremos mais aqui, mas os partidos continuarão. Podem até mudar de nome, mas eles continuarão com seus programas, com seus projetos, com suas ideologias. Mas nós não conseguimos aprovar aqui um projeto de reforma política que restabeleça, que reinaugure o Estado brasileiro. Por quê? Aí eu também pergunto, Senador Cristovam: por quê? Olha só a roda-viva em que estamos; olha o círculo, que não é virtuoso, mas vicioso, negativo, perverso. Mas também não basta discutir a questão da estrutura política do Estado, que é importante e que eu colocaria até como uma questão de princípio. É preciso discutir a economia, um Estado moderno, que garanta produtividade maior. De fato, concordo que não temos alcançado o crescimento de que precisávamos na produtividade, mas isso tudo com o quê? Com salários dignos, com direitos! Não estou dizendo, Senador Cássio, que essa seja a sua linha. Não entenda isso. Mas nós temos ouvido muito aqui e temos lido muito a respeito do assunto, como se o problema do País, da economia, fosse porque a CLT tem muito direito. A política de valorização do salário mínimo é tão responsável, Senador Lindbergh, que o aumento do salário real varia de acordo com o crescimento da economia: se a economia cresce, ele cresce; se a economia não cresce, ele cresce, mas só um pouquinho, de forma que o Estado possa suportar. Sabe a que é a crítica, Senador Cristovam? Ao piso salarial do magistério, a sua área. Eu dei aula. Quando recém-casada, com meu marido desempregado por conta da ditadura, eu nunca havia trabalhado e fui dar aula. E aí gostei, fiquei e atuei no movimento sindical. Então, veja: vamos discutir, mas nós precisamos de paz para discutir isso. Está lá, está instalado. Eu tenho muita esperança de que o processo sequer chegue ao Senado. Falo com muita convicção. Sei que muita gente lá do meu Estado, principalmente, não está exatamente entendendo minhas posições, e uma boa parcela até não concorda com as minhas posições, mas eu fico do lado do Senador Lindbergh: nós precisamos, no País, defender a democracia. E repito, Senador Cristovam: eu tenho confiança plena em V. Exª, porque, quando V. Exª diz, V. Exª faz. "Eu vou olhar o processo." Mas o povo não sabe o que é o processo da Presidente Dilma. O povo quer tirar a Presidente porque acha que a economia vai mal, porque há muita roubalheira na Petrobras e no País, e não por aquilo que está lá. E aqui nós somos políticos, mas somos também técnicos, e temos que olhar o projeto do ponto de vista da tecnicidade. Então, quero mais uma vez cumprimentá-lo, Senador Cristovam, por suas preocupações. Porque nós estamos pensando aqui, e V. Exª já está lá, anos-luz à frente de todos nós, pensando o que fazer lá na frente, como ajudar a resolver os problemas do País. Parabéns! Obrigada, Senador.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Muito obrigado. Isso aí eu tomo como o reconhecimento de um defeito na política. Isso pode ser uma qualidade no intelectual, no profeta, mas o político tem que estar no momento.

    Senadora - antes de passar a palavra ao Senador Lindbergh -, veja bem: a minha preocupação é que ela ganhe com minoria, porque ela ganhará legalmente, mas não terá metade mais um pelo menos dos Deputados. Mas pode acontecer, e vamos ter que respeitar.

    O segundo ponto é que a raiva não está escrita como uma das razões para derrubar a Presidente legalmente, mas a raiva do povo derruba a Presidente passando por cima daqueles que zelam pela legalidade. Se o Congresso aqui não levar em conta a legalidade, é golpista. É golpista. Mas a raiva sozinha é capaz de derrubar governos se ela for suficientemente forte, com o povo na rua ficando aqui, na frente, parado, impedindo que funcione, ou em greve geral. Quantas vezes um governo foi derrubado pelos trabalhadores, inclusive comandados pelo Partido Comunista - seja do Brasil ou Brasileiro -, por greve geral? Pelo menos se tentou. E derruba. A raiva derruba e passa por cima do Congresso.

    Quanto à CLT, eu sou defensor, Senadora Vanessa, de aumentar os direitos dos trabalhadores e substituir direitos velhos por direitos novos. Quando a CLT foi criada, não havia máquina de escrever elétrica. Não havia; havia máquina de escrever mecânica. Hoje, você fala e o computador escreve. Mais: você fala em português e o computador escreve, lá na China, em chinês. Tem que adaptar.

    Por exemplo, não está na CLT um artigo que eu acho que deveria ser o primeiro: o filho de todo patrão tem de estudar na escola dos filhos dos seus trabalhadores. Isso é uma CLT revolucionária. Obviamente, não pode ser desse jeito, mas estou falando que essa é a intenção. Todo trabalhador tem que ter hoje não só férias, tem que ter uma licença para aperfeiçoar-se na sua profissão, porque muda todo o tempo.

    Quanto aos avanços sociais, é claro que tivemos avanços sociais - como tivemos com Itamar, com Sarney, com Fernando Henrique. Eu queria mais do que avanços sociais: eu queria transformação social. Isso a gente não teve. Avançamos, mas não saltamos como era preciso.

    Juros. É aí que eu discordo, às vezes, do Senador Lindbergh, mas não é uma discordância porque os juros estão altos - estão altíssimos, obscenos, imorais! Tem que baixar. A diferença é como baixar. Eu não vejo como baixar juros de uma maneira sustentável por vontade política. Eu acho que, para baixar juros, tem de cuidar melhor da dívida. Isso exige certa austeridade, e austeridade, muitas vezes, provoca recessão e desemprego.

    Então, como combinar isso? A economia foge da vontade política; ela depende da vontade política, mas é rebelde. A economia tem uma rebeldia como tem a gravidade: eu solto aqui, cai. Esse negócio não aceita ficar na altura da minha mão se eu não segurar. Uma rebeldia da natureza chamada Lei da Gravidade. Há uma rebeldia da economia que são as regras da Aritmética; a gente engana, mas ela se manifesta na inflação.

    Finalmente, sobre o petróleo. Eu começo a já ter posição, Senadora Vanessa, porque a abstenção foi provisória. Eu estou estudando. Veja que o preço do petróleo aumentou. O aumento do preço do petróleo está começando a justificar os que ficaram contra a lei do Serra, e que diziam que a Petrobras não poderia atender. Mas por que eu fiquei em dúvida ali? É porque eu quero mais dinheiro para a educação que venha dos royalties. E se deixarmos nas mãos da Petrobras, sendo obrigada a colocar 30% em cada poço, nas condições atuais os royalties não vêm - porque vão ficar lá enfiados debaixo da terra, sob a forma de petróleo. Eu disse e muita gente reclamou: é uma lama até você tirar, refinar. É uma lama até você tirar e refinar.

    Então, a Petrobras seria capaz, ou é capaz, de trazer esses royalties com a mesma velocidade que a gente conseguiria se liberasse a possibilidade dos poços do petróleo para outras empresas? Tenho dúvidas. Provavelmente não. Mas, ao mesmo tempo, temos que zelar pela Petrobras, não só pela educação. Como casar os dois? Por isso, defendi tanto que a gente debatesse mais, não havia por que votar aquilo, naquela tarde, apressado, mas o preço do petróleo subindo, justifica vocês que votaram contra a lei. Mas é sustentável ou não é? Isso exige tempo, mas vou dar meu voto aqui a posteriori, para mostrar que não votei, mas não vou ficar omisso, só precisava de mais tempo.

    Senador Lindbergh, hoje, vai ficar como o dia em que debati com o Lindbergh, na minha história.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Não, V. Exª sabe da minha admiração por V. Exª.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - E vice-versa.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Desde que eu era estudante, V. Exª era reitor da UnB, um reitor criativo. Até vi, no dia em que V. Exª entrou para o PPS, um bocado de gente aqui: "Venha para a oposição", mas eu disse, de cara, na hora em que falei: "Só que não é oposição conservadora".

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Exatamente.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Senador Cristovam, temos divergência muito na área da economia, mas é um Senador extremamente progressista, em todos as batalhas.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Isso.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - No campo dos direitos.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Gosto até de esquerda.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - É, exatamente.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Há gente que não gosta mais.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Exatamente. Então, eu...

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - E socialista, mesmo que mude a definição de socialismo.

    O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. S/Partido - MT) - Ele foi responsável, Senador Lindbergh, por eu encerrar a minha carreira de militância estudantil.

    Fui a um congresso da UNE, e, numa palestra em que ele fazia uma reflexão sobre a educação e sobre as críticas que fazíamos tão fortes de como a educação estava, ele começou falando para os estudantes: "Boa parte dessa responsabilidade é de vocês, que deveriam estar estudando. Vocês estão cuidando muito de política e estudando pouco." Comecei a refletir sobre aquilo e voltei para terminar meu curso.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Senador Medeiros, Senador Cristovam, acho que V. Exª faz muito bem em dizer o seguinte: "Vou votar de acordo com as provas, se há crime de responsabilidade ou não." Agora há pouco, o Senador Cássio falou dos créditos suplementares. De fato, as pedaladas fiscais são argumentos muito frágeis para pedido de impeachment. O que houve em relação aos créditos suplementares? Ele diz o seguinte: "Foi um crédito suplementar sem autorização legislativa", só que, na Lei Orçamentária de 2014/2015, há um art. 4º, que dá direito, sim, ao Governo de abrir créditos suplementares sem autorização legislativa, desde que não contrarie o superávit primário. O que é que houve em relação aos créditos suplementares? Ele diz o seguinte, que foi um crédito suplementar sem a autorização legislativa. Só que a Lei Orçamentária de 2014/2015 tem um art. 4º que dá direito, sim, ao Governo abrir créditos suplementares sem autorização legislativa, desde que não contrarie o superávit primário. O que houve no superávit primário nesses dois últimos anos? Houve uma recessão grande, houve uma desaceleração econômica, e o Governo mudou, no Congresso, a meta do superávit primário. Então, mesmo aí não há caminho legal. Se surgirem novos fatos, V. Exª fala bem. O que eu tenho dito sempre, Senador Cristovam, é que hoje, naquele pedido do impeachment, não há base jurídica. É uma situação completamente diferente da de Fernando Collor de Mello. Agora vamos falar dos erros, dos erros e dos acertos, porque eu acho, também, que nós tivemos grandes acertos. Nós fizemos um grande processo de inclusão social neste País, a vida do povo pobre, do povo trabalhador mudou. A política de valorização do salário mínimo, o impacto que teve isso na Previdência, a criação desse grande mercado de consumo de massa, algumas decisões corajosas de que V. Exª fez parte, como a políticas de cotas, que é algo fundamental, porque começamos a ver, pela primeira vez, o filho do trabalhador, negro, morador da periferia, nas nossas universidades públicas. Eu digo, inclusive, que nós temos uma elite muito raivosa neste País e preconceituosa. Eu não tenho dúvida em dizer...

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - É verdade.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - ... que existem setores, infelizmente, da nossa classe média alta que se arrepiam ao falar dessa política de cotas, como se arrepiam também com a mudança que fizemos em relação às empregadas domésticas. Houve muita rejeição em setores médios da sociedade, Senador Cristovam. Nós temos, em pleno século XXI, um regime de semiescravidão. Quando eu falo dessa parcela das elites, é interessante ver, nesse período de ódio e de intolerância, que houve uma passeata dessas aí, no final do ano passado, no Rio de Janeiro, em que havia um grupo de cem jovens da Zona Norte do Rio de Janeiro que estava andando de skate, eram jovens majoritariamente negros, eles faziam aquele passeio anualmente. Eles vinham na orla de Copacabana e, quando chegaram perto das manifestações, partiram para agredi-los, dizendo: ”Petistas, petistas!” E eles diziam: “Nós não somos do PT, é só uma turma passeando de skate.” Mas você via ali, em uma parcela de um setor das elites brasileiras, a intolerância, como se dissesse: “É negro, é petista.” E, como petista hoje é criminoso, um discurso raivoso, intolerante. Eu falo tudo isso para entrar agora nos erros, porque eu acho que nós tivemos vários. O primeiro ano de Governo do Presidente Lula, tínhamos que ter feito a reforma política, acabado com o financiamento empresarial de campanha, democratizado os meios de comunicação. Esse foi um erro. Não dá para o Senador Cássio aqui dizer o seguinte: “Ah, o PT...”. Na verdade esse é um problema do sistema político como um todo. As mesmas empreiteiras que financiaram o PT financiavam o PSDB e financiavam todos os partidos brasileiros. Aqui vale uma pergunta, quando eu falo da seletividade das investigações da Lava Jato: será que só havia propina dessas empreiteiras na Petrobras? Será que, no financiamento dos governos estaduais, a situação é diferente? Será que não havia financiamentos de campanha, por exemplo, do Governo de São Paulo, do Governo de Minas Gerais com essas empreiteiras? Então, não dá para achar que esse financiamento para o PT é um financiamento criminoso, e o deles é dinheiro da sacristia. Não. Nós temos que reformar o sistema político como um todo. Hoje nós temos um colapso do sistema político. Eu acho que nós avançamos ao propor o fim do financiamento empresarial de campanha. Eu acho que deveria ter vindo com o financiamento público, porque eu também não sei como é que se vai fazer campanha agora.

(Soa a campainha.)

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - É um dilema que nós temos daqui para frente. Mas o financiamento empresarial foi um avanço. Agora, quanto ao sistema político, nós temos trinta e tantos partidos; como é que se faz a governabilidade? Nós temos que ter coragem de mexer. Não mexemos no nosso Governo, nem eles mexeram no governo deles lá atrás. Lembra a emenda da reeleição? Compra de voto de Deputado? Hoje, infelizmente - infelizmente não, felizmente -, houve um colapso desse sistema político. Então não dá aqui para partidarizar essa discussão. "Ah, é um." Não, é o sistema político como um todo. Se nós não conseguirmos reformar esse sistema político, nós vamos cada vez mais nos distanciar. Por isso é que eu tenho dito: essas manifestações são contra nós? São contra nós. São contra a Dilma, contra o PT? São contra o PT, mas é uma manifestação também contra a política de uma forma geral, contra o sistema político. Aquela vaia do Aécio e do Alckmin é fruto desse processo também. Agora, eu queria só acabar, Senador Cristovam, entrando num ponto que pouca gente tem percebido, e V. Exª é muito atento a esse debate econômico. É que eu estou muito preocupado, porque há uma nova coalizão se formando em torno de um programa, e eu cito aqui: Uma Ponte para o Futuro, que é um programa de retirada de direitos de trabalhadores. Até o Fernando Henrique Cardoso disse que é muito radical, é um programa liberal muito radical. Veja bem: quando se faz o discurso que o Senador Cássio falou, de produtividade e tal, constrói-se uma tese - V. Exª sabe disso, e vários economistas - de que um dos problemas da nossa produtividade é que o custo do trabalho está muito alto e de que, com essa política de valorização do salário mínimo do Presidente Lula e da Presidenta Dilma, que acabou elevando muito o salário dos trabalhadores, nós estamos perdendo competitividade. Eu discordo dessa tese. Essa tese, para mim é furada. Na verdade, o que fizemos nesse último período para a economia crescer, lá atrás, no governo do Presidente Lula, foi justamente porque melhoramos a vida dos mais pobres, dos trabalhadores, e o salário mínimo teve um papel fundamental. Mas qual é o programa desse pessoal, Uma Ponte para o Futuro? Eu queria aqui levantar quatro pontos para discutirmos, porque é o programa do golpe - programa do golpe. Estão querendo afastar e têm um programa, uma nova coalizão a ser montada. O primeiro ponto, dizem: fim de todas as indexações de salários e benefícios previdenciários. Isso é concretamente o quê? O fim da política de valorização do salário mínimo. Segundo, a indexação do salário mínimo com os benefícios previdenciários: 70% dos benefícios previdenciários são pessoas que recebem um salário mínimo. Eles querem acabar com essa vinculação, ou seja, ter benefício previdenciário abaixo do salário mínimo. Está escrito no Programa Uma Ponte para o Futuro. Há um terceiro ponto, que deve arrepiar V. Exª: orçamento base zero, fim de todas as desvinculações de receita - leia-se: saúde e educação. Eu fui Prefeito. Eu tinha que investir 25% do orçamento em educação e 15% do orçamento em saúde. E eles propõem esse orçamento base zero em nível federal, estadual e municipal. Olhe o impacto lá embaixo de um prefeito irresponsável, que pode existir, que não quiser investir em saúde e preferir jogar tudo em asfalto. Então, esse é um tema impressionante, que nos preocupa muito. Outro ponto: colocar o negociado na frente do legislado. Isso aqui é rasgar a CLT. É um retrocesso à era Vargas. Eu tenho visto economistas do PSDB, inclusive, quando aqui vieram - Samuel Pessoa e outros - a um seminário do PSDB, defendendo meta de superávit primário de 3% ao ano, dizerem o seguinte: "A aprovação do PNE (Plano Nacional de Educação) foi uma irresponsabilidade." As pessoas talvez não estejam entendendo, de forma mais geral, esse movimento. Eu acho que não é um movimento só de afastar, derrubar este Governo. É um movimento que tem um projeto para implantar no País aqui a restauração do neoliberalismo, com retirada de direitos dos trabalhadores. E tenho certeza: se derem esse golpe e assumir o Michel Temer, vai ser um governo fraco, que vai tentar impor esse programa, e o povo vai se levantar. O que V. Exª acha que as ruas acham do Vice-Presidente Michel Temer? É a mudança que as ruas querem? Não. E um programa desse é um programa claramente antipovo. Então, quero chamar a atenção a esses pontos. Em relação à taxa de juros - eu encerro aqui, Senador Cristovam -, eu concordo com V. Exª quanto ao fato de não poder baixar por questões políticas. Temos de baixar por questões econômicas. Eu, inclusive, fui autor de um projeto que foi votado aqui no ano passado. Era uma lei complementar. Não tivemos os 41 votos, mas nós ganhamos: 32 a 31. Nesse projeto, eu falava do duplo mandato do Banco Central. Hoje o Banco Central do Brasil tem um só compromisso: com a estabilidade monetária, com o controle da inflação. A maior parte dos bancos centrais do mundo - o FED, que é o Banco Central norte-americano, o Banco Central europeu - tem dois objetivos: controle da inflação e o crescimento econômico e a geração de empregos. Nós temos a maior taxa de juros hoje do mundo. Não dá, num momento de uma recessão como essa, para continuarmos com essas taxas de juros que estão aí. Segundo ponto, há um impacto fiscal gigantesco. Falamos em fazer ajustes, mas como se faz ajuste fiscal sem baixar juros? Ano passado, nós pagamos R$500 bilhões. Aumentou, de 2014, de R$300 bilhões para R$500 bilhões. E eu dizia: nós estamos enxugando gelo. Estamos querendo fazer cortes aqui no primário, mas o déficit está subindo. Do déficit nominal do ano passado, que foi de dez e tanto, mais de oito pontos são taxas de juros. Aí, V. Exª me pergunta: e a inflação? Olhe, taxa de juros atinge, sim, a inflação de demanda, que está baixíssima. A inflação hoje foi muito por preços administrados, gasolina, energia e alimentos. Então, não há nesse sentido. Eu me convenço, Senador Cristovam, da mesma forma que o Bernie Sanders, que, infelizmente, não conseguiu a vaga - a Hillary vai ser a candidata do Partido Democrata -, mas acho que ele fez um belíssimo debate nos Estados Unidos, jogou os holofotes sobre Wall Street. Eu tenho dito que o nosso Wall Street aqui é o Banco Central e essa política rentista, porque, na verdade, não são só os bancos que ganham. Todas as grandes empresas, as maiores, das 250 maiores empresas, 247 têm aquele departamento financeiro e planejamento que fica ali olhando o tempo todo para ver onde investem, se investem nas atividades econômicas de produção, ou se investem nos títulos da dívida pública. Eu estou convencido de que não baixamos esses juros neste País, porque há uma grande coalizão político-empresarial que impede. É ali. Grande parte dos impostos que arrecadamos vai para aquilo. Eu estou falando isso. Eu sei das discordâncias de V. Exª comigo nessa área econômica, mas eu fiz questão de olhar um pouco mais à frente, em relação ao futuro. O que seria esse cenário no Brasil com Michel Temer na Presidência com esse programa econômico? Então, quem acha que esse caminho do impeachment vai solucionar a crise do País está muito enganado. Acho que as ruas, inclusive, vão continuar com manifestantes, com novas pautas. Então, eu só queria alertar isto: engana-se - e encerro dizendo isto - quem acha que o impeachment da Presidenta Dilma pacificaria o País. Infelizmente, não vai pacificar.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Obrigado, Senador.

    Eu vou concluir, Senador Hélio, mas respondendo. Primeiro, se Michel Temer é golpe, foi o PT que deu o golpe, porque Michel Temer foi escolhido pelo PT. Não foi nem pelo povo, o povo não votou em Michel Temer; o povo votou na Presidente Dilma, e a Presidente Dilma e o PT escolheram Michel Temer.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - O golpe é afastar sem base jurídica. Esse é o golpe.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Não, não, não. Eu estou falando do Michel Temer, porque o senhor disse.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Sim.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Michel Temer foi escolhido pelo PT.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Claro.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - E foi escolhido duas vezes.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Claro.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Ou seja, foi escolhido por oito anos, e, na natureza, oito anos é muito tempo. Qualquer um de nós morre em oito anos, possivelmente, e nós o escolhemos. Aliás, nós, não; o PT escolheu. Então, é ele. Agora, se houver impeachment!

    Segundo: nós discordamos - e eu queria um dia falar mais longamente - porque discutimos, às vezes, em um ponto e outro, mas todos eles são imbricados. Por exemplo, se mantivermos o déficit da Previdência... E há déficit; o Paim está errado quando diz que não há. Pode dizer que não há se tomar só os trabalhadores, mas é um conjunto, há também aqueles que foi um grande avanço trazer para dentro do sistema previdenciário. Se continuamos crescendo indexadamente, aumenta o déficit; aí, aumentam os juros. Não tem como baixar os juros se não resolver a questão da Previdência e outros gastos.

    É o conjunto que eu quero analisar e desvinculação. Longe de mim querer desvincular o dinheiro que a Constituição obriga para educação e saúde, mas o certo mesmo, no médio e longo prazo, é fazermos Orçamento que tenha tudo o que é preciso para a educação. No outro ano, já pode ser mesmo. Nós não só vinculamos, nós criamos uma camisa de força no Orçamento. É impossível fazer mudança sem mudar o Orçamento. E o Orçamento hoje está tão amarrado, que já não se consegue mudar.

    Eu acho é que vamos ter que caminhar um dia para orçamentos plurianuais, durante os quais vai se investir o que for preciso em educação, em segurança e em saúde. Aí vai ser preciso deixar de lado uma porção de gastos hoje do Estado, que a esquerda, tradicionalmente estatizante, defende colocar. Tem que deixar isso para o setor privado. Aliás, a Dilma deu avanço nisso com as PPPs. E ter orçamentos de médio prazo. Passado esse tempo, é capaz de não precisar desse dinheiro, de 18%, por exemplo, que o prefeito precisa colocar na educação. E talvez hoje seja mais de 18% que precisa.

    E, finalmente, a CLT: não é questão de rasgar a CLT, mas adaptar a CLT ao tempo da robótica, ao tempo da internet, ao tempo da globalização; é preciso, sim. A CLT foi feita num tempo em que a economia era fechada e podíamos fazer uma lei ignorando o mundo. Não se pode mais! A nossa CLT, sem ser submissa ao resto do mundo, tem que levar em conta.

    É uma das coisas que estão inviabilizando a Europa hoje, porque cada uma tem sua - entre aspas - "CLT", cada uma tem sua Previdência, mas não existe mais fronteira entre eles. Hoje, as fronteiras ainda existem entre o Brasil e o resto do mundo, felizmente, mas são mais tênues do que eram naquela época.

    Finalmente, eu quero dizer - e tem a ver, um pouco, com a Senadora Vanessa, e eu não falei - que muitas das coisas que gostaríamos de fazer e que não conseguimos fazer nesses anos é porque não havia força aqui. Mas se, nos primeiros cem dias, Lula chegasse aqui com um conjunto de reformas, muito provavelmente passariam, ou seriam ajustadas um pouco, e não exatamente como ele queria, na força maior. Como todos os presidentes, em geral, que querem mudar fazem: no começo, aproveitando a lua de mel, o diálogo. Todos baixariam, não totalmente, a cabeça, mas se adaptariam. Nós perdemos aquela chance.

    E, aí, por que perdemos? Mais uma vez, a grande coisa deste debate de hoje foi a história, que o Lindbergh trouxe. Nós demos mais importância à política do que à história. O Jango perdeu na política, ficou na história. O Lula, com a habilidade, com a genialidade dele, a meu ver, preferiu vencer na política e deixou de lado o que ficaria na história, mesmo que perdesse na política - não de haver golpe e ser derrubado, mas de não ter sido o Presidente que queria. Ele cedeu muito à política, de imediato, e não fez o enfrentamento que a história exige para os heróis.

    Bem, mas esse debate vai continuar ainda muito tempo. O debate sobre o impeachment é um debate que eu lamento que, durante o meu período aqui, vai ter que haver - vai haver, mas vai ter que haver! O ideal era um país tão tranquilo em que não houvesse isso, tão consolidada a democracia que ninguém discutisse isso. Mas ainda bem que vamos discutir, porque, nas condições atuais em que o povo está na rua falando isso, não discutirmos seria ficarmos para trás.

    Sr. Presidente, era isso, agradecendo muito...

    O Sr. Wellington Fagundes (Bloco União e Força/PR - MT) - Senador Cristovam, eu estava ouvindo V. Exª no meu gabinete e gostaria, ainda, de poder estar aqui falando e fazendo uma intervenção na sua fala maravilhosa, como sempre, ...

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Obrigado.

    O Sr. Wellington Fagundes (Bloco União e Força/PR - MT) - ... sempre muito bem pontuada, inteligente, competente. Portanto, V. Exª é aqui um Senador do equilíbrio nesta Casa. O pronunciamento de V. Exª coloca, com muita cautela, este momento que vivemos. Tem sido cobrada de mim também, principalmente no meu Estado, uma posição: "Senador, V. Exª é contra ou a favor do impeachment?" Aí é o momento de reflexão que todos devemos fazer. Já tive oportunidade de participar do impeachment, no Congresso Nacional, como Deputado Federal, do Presidente Collor. Foi um momento também de muita emoção, comoção, e entendo que foi um momento de crescimento da nossa democracia. Inclusive, já tive oportunidade até de elogiar a postura do ex-Presidente Collor, quando, do processo de impeachment, ele, de forma pacífica, recebeu e aceitou a posição do Congresso Nacional, não criando problema. Poderia ele ter procurado causar uma convulsão social, um chamamento das Forças Armadas, enfim, uma alternativa. Não. Ele preferiu o caminho democrático de aceitar o processo de impeachment. Portanto, é claro que o impeachment é uma previsão constitucional, que todos nós teremos de debater. Agora, penso que não podemos atropelar. Toda lei feita na comoção, na pressão, normalmente, não é a lei ideal. V. Exª sabe disso, como legislador experiente e também como um administrador. V. Exª foi Reitor da UnB, Governador do Distrito Federal e, portanto, é um homem que tem muita experiência para contribuir neste momento que vivemos, digamos, o momento da pressão: pressão daqueles que querem o impeachment da forma mais açodada possível; pressão daqueles que querem analisar, como V. Exª está aqui fazendo; e pressão também daqueles que são contra de forma mais radical. Quero colocar-me na posição de V. Exª, porque, no Senado da República, se vier para esta Casa, teremos a oportunidade de analisar, mas não o faremos agora. O processo de impeachment tem um rito, que está previsto na Constituição brasileira. E aí não adianta muitos quererem que nós, os Senadores, tomemos posições açodadas. Nós precisamos aproveitar, quem sabe, este momento da crise. Já disse isso aqui. Em 25 anos que estou no Congresso Nacional, é a primeira vez que temos duas crises acumuladas: uma crise política e uma crise econômica. Em outros momentos, tivemos uma crise política, como foi a questão do Collor; na época do Sarney, uma crise econômica; na época do Fernando Henrique, uma crise econômica, e assim por diante, mas não as duas acumuladas. Portanto, eu penso que este momento é de, quem sabe, principalmente na maturidade desta Casa, com pessoas experientes como V. Exª, fazer como V. Exª fez há alguns meses, junto com outros companheiros, quando estiveram com a Presidente Dilma, aconselhando, sugerindo a ela que tomasse algumas posições. Mas, infelizmente, naquele momento, a Presidente Dilma não aceitou aquelas sugestões feitas, principalmente liderada por V. Exª - e sugestões sensatas. Eu penso também que, da mesma forma - e falei isso em reunião com a própria Presidente -, todos os candidatos a Presidente da República foram aos debates, às praças públicas e prometeram as reformas. A Presidente Dilma não precisava esperar a posse para promover essa reforma, poderia fazê-la num dia após o resultado eleitoral. E como V. Exª estava dizendo aqui, no seu raciocínio, perdemos a oportunidade, porque, para se fazer as reformas profundas, o Governo tem que estar respaldado pelas urnas e, claro, também com o apoio aqui do Congresso Nacional. E todos nós sabemos da necessidade dessas reformas.

(Soa a campainha.)

    O Sr. Wellington Fagundes (Bloco União e Força/PR - MT) - Por isso, eu entendo que este momento seria também uma oportunidade para que pessoas como V. Exª pudessem liderar um trabalho aqui no sentido de conclamar os partidos políticos para que busquemos a solução para o País, porque a crise, o embate é a pior situação. Mas eu digo não o embate da discussão de ideias, mas o embate de choque de pessoas. Por isso, eu quero repetir: nunca me posicionei contra o processo de impeachment. Isso é uma previsão constitucional, como já disse. Agora, entendo que temos que analisá-lo de forma madura, como V. Exª tem feito não só nesse pronunciamento, em outros tantos momentos aqui. Por isso que não vou também me curvar à pressão daqueles radicais que querem uma posição em que você tem que dizer que é contra ou a favor. Não! Precisamos analisar no momento certo e na hora certa. Agora, vamos ouvir as ruas, vamos ouvir todos os processos que aí estão. Quando o impeachment chegar aqui, nós teremos que analisá-lo, aliás, após a decisão da Câmara dos Deputados; não temos como fazê-lo antes. Por isso eu quero aqui, como Presidente da Comissão Senado do Futuro, mais uma vez, externar a minha felicidade de tê-lo como meu Vice-Presidente. Aliás, esta semana estivemos com o Presidente Renan e faremos um grande evento, no final do ano, exatamente para tratar também do futuro, do futuro da humanidade, do futuro deste País, para que possamos deixar um legado às nossas futuras gerações. E não tenho dúvida de que V. Exª é uma das pessoas que têm maior capacidade para tudo isso.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Obrigado, Senador.

    O Sr. Wellington Fagundes (Bloco União e Força/PR - MT) - Então eu quero aqui agradecer este aparte e dizer da minha felicidade de ouvir um pronunciamento, neste momento de crise, com equilíbrio, como V. Exª está fazendo.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Muito obrigado, Senador.

    Eu concluo dizendo apenas que eu sou a favor de abrir o processo.

(Interrupção do som.)

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Senador Wellington, vou mais longe: de repente, por que não termos na Constituição a abertura automática de processo de impeachment dois anos depois da posse de qualquer prefeito, governador e Presidente. Pode até ser uma avaliação para saber se continua ou não.

    Mas vou continuar sem dizer qual é o meu voto quando o processo for aberto, porque eu creio que, como os juízes, temos que analisar os detalhes.

    Além disso, Senadora Vanessa, do jeito que está a judicialização, eu não duvido que vai ter gente abrindo ação popular dizendo: "Esse Senador não pode votar, porque ele manifestou antes ser a favor." Ou outro vai abrir processo dizendo: "Ele não pode julgar, porque ele já disse que é contra." Eu não duvido nada que haja ação popular nesse sentido do jeito que está a judicialização.

(Soa a campainha.)

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - É isso, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/03/2016 - Página 17