Discurso durante a 53ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Crítica à decisão, pela Câmara dos Deputados, de aceitar a admissibilidade do processo de impeachment de Dilma Rousseff, Presidente da República.

Autor
Humberto Costa (PT - Partido dos Trabalhadores/PE)
Nome completo: Humberto Sérgio Costa Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Crítica à decisão, pela Câmara dos Deputados, de aceitar a admissibilidade do processo de impeachment de Dilma Rousseff, Presidente da República.
Publicação
Publicação no DSF de 19/04/2016 - Página 27
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • APREENSÃO, DECISÃO, AUTORIA, CAMARA DOS DEPUTADOS, MOTIVO, ACEITAÇÃO, ADMISSIBILIDADE, PROCESSO, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, CRITICA, EDUARDO CUNHA, DEPUTADO FEDERAL, ATUAÇÃO, PROCEDIMENTO, DEFESA, AUSENCIA, CRIME DE RESPONSABILIDADE, REGISTRO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, PAIS ESTRANGEIRO, ESPANHA, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), FRANÇA, REINO UNIDO.

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Apoio Governo/PT - PE. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, telespectadores da TV Senado, ouvintes que nos ouvem pela Rádio Senado, o Brasil acordou com um gosto amargo de golpe na boca, acordou cansado e envergonhado.

    Na Câmara dos Deputados, em uma sessão comandada por um Presidente que deveria estar fora do cargo, respondendo por dezenas de crimes financeiros, foi aprovado o processo de impedimento de uma Presidente da República que não cometeu nenhum crime de responsabilidade, uma mulher que tem um passado limpo, que é honesta e digna.

    Durante o dia de ontem, assistimos a um espetáculo digno de um circo de horrores. O processo de impedimento foi aprovado numa sessão repleta de Parlamentares que respondem a processos civis e criminais. Foi uma sessão na qual se viu e se ouviu de tudo, menos - salvo raríssimas exceções - alguém pegar o microfone para dizer o que pensa da acusação que estava sendo feita à Presidenta. Falou-se de tudo, e se mandaram recados para todos, filhos, netos, pais, amigos, gato, cachorro, papagaio. Mas ninguém que votou no golpe do "sim" explicou o porquê de se tirar uma Presidenta da República eleita por mais de 54 milhões de brasileiros e brasileiras que não cometeu crime algum.

    Foram feitas as menções mais absurdas, como até a torturadores do regime militar. É claro que uma aberração dessas tinha de partir de alguém como Jair Bolsonaro. Foi uma citação descabida e absurda quando o tema da sessão era justamente o mandato de uma Presidenta que lutou contra a ditadura e que foi presa e torturada por algozes liderados, quem sabe, pelo "homenageado".

    Aconteceu, na sessão da Câmara, um golpe contra a Constituição. Não há outro nome para o que foi feito. Mais de 54 milhões de brasileiros tiveram desrespeitada a sua vontade expressa nas urnas, em 2014, sem justificativa. Um castigo sem crime, um assalto à democracia!

    Mas que os apressados tenham calma! A guerra não terminou. A batalha, agora, é no Senado, onde vamos atrás de provas, de consistência na denúncia. Vamos respeitar e fazer um debate amplo e exaustivo. Vamos cumprir o que apregoa a Constituição.

    No Senado, tenho certeza, não teremos um processo guiado pela vingança, pelo rancor, pela perseguição política que se viu no processo presidido pelo Presidente da Câmara. Confiamos na responsabilidade e na análise mais serena dos Srs. Senadores. Confiamos igualmente que aqui o Presidente da Casa exercerá estritamente seu papel de magistrado, não será um cabo eleitoral de um Vice-Presidente traidor e golpista, como fez vergonhosamente na Presidência da Câmara o Sr. Eduardo Cunha. O Presidente aqui não irá se perder numa aventura como aquela em que mergulhou de forma irresponsável o Presidente da Câmara. O próprio Renan Calheiros já disse que respeitará seu papel institucional e que não vai atropelar o processo. Aqui, será diferente.

    Que não se pense que a tentativa de golpe que tomou forma no dia de ontem vai nos esmorecer! Estamos com a democracia e com a verdade. Não há por que não estarmos confiantes e com disposição redobrada para lutar. Vamos continuar mobilizados. Nossa militância e os movimentos sociais vão continuar nas ruas. Temos o que defender e lutamos o melhor dos combates, porque temos ao nosso lado o povo brasileiro, que não aceitará perder as conquistas obtidas durante os governos do Presidente Lula e da Presidenta Dilma. Vamos brigar até o fim contra a tentativa de retirar do trabalhador os seus direitos, de ver sumirem programas como o Bolsa Família, o Minha Casa, Minha Vida, o Pronatec e o Fies, de assistir ao desvirtuamento do atendimento básico à saúde ou ainda de terem de voltar aos gráficos as 36 milhões de pessoas que foram retiradas do mapa da miséria.

    A supressão de tudo isso está no arremedo de programa de governo que, a mando da Fiesp e, com toda certeza, do PSDB, o Vice-Presidente golpista já distribui por aí com a mesma desfaçatez com que já negocia cargos e promete benesses. É isso que está em jogo. É isso o que move os golpistas. Não é luta contra corrupção coisa nenhuma! Se assim fosse, não estariam todos mancomunados com o Presidente da Câmara dos Deputados, que deveria responder pelos seus crimes.

    Contra a corrupção quem lutou foi o Governo de Dilma, como foi o governo de Lula. O Governo deu autonomia à Polícia Federal e fortaleceu a Justiça e as instituições, bem diferente dos governos anteriores, os do PSDB, que tinham até engavetador de denúncias.

    Está em jogo o Brasil que queremos e que não é mesmo Brasil da Fiesp, de Bolsonaro, de Michel Temer e de Eduardo Cunha, mas que é o Brasil das oportunidades para todos, das vagas em escolas e em universidades para todos, do fim das desigualdades. Não é o Brasil que hoje está absolutamente envergonhado pela repercussão internacional daquela farsa grotesca que aconteceu no dia de ontem. Basta olhar o que dizem alguns jornais importantes internacionais e revistas também. A Der Spiegel já está chamando o impeachment de golpe frio. O Página/12, da Argentina, fala abertamente em golpe institucional no Brasil e dá a um de seus artigos o título de "O Golpe dos Escravocratas".

    O jornal espanhol El País traz matérias e artigos que fazem referência expressa ao ridículo da votação de ontem. "Circo e Constrangimento na Câmara" é um desses artigos. Nesse artigo, menciona-se que frases como "fora roubalheira" foram gritadas no plenário, o que não deixa de soar ironicamente já que sobre as costas de boa parte dos Parlamentares recaem acusações justamente de delitos de corrupção. Outro artigo é mais direto ainda e diz: "Cunha entrega o impeachment e deve receber anistia em troca".

    O jornal The New York Times, principal jornal norte-americano, adverte para um provável dano duradouro à democracia brasileira e fala dos fundamentos frágeis do processo de impeachment.

    O francês Le Monde, em sua principal matéria, intitulada "A descida ao inferno de Dilma Rousseff", diz que as pedaladas fiscais, praticadas por todos os governos anteriores ao de Dilma, na verdade são um pretexto e que ela, que até agora nunca foi acusada de enriquecimento pessoal, é julgada sob o comando do seu algoz principal, que, ao contrário, foi denunciado por enriquecimento ilícito.

    Mas, talvez, o mais incisivo tenha sido o jornal britânico The Guardian, o mais independente jornal do Reino Unido. Na matéria, o jornal The Guardian menciona que, na noite escura, o ponto mais baixo foi o voto de Bolsonaro, que o dedicou ao torturador de Dilma, Carlos Brilhante Ustra. O jornal menciona os votos de Maluf e é implacável ao dizer que a votação refletiu os aspectos farsescos da democracia brasileira, como o fato de o Partido das Mulheres só ter homens.

    A que ponto chegamos? Estamos sendo vistos pelo mundo inteiro como uma republiqueta de bananas. Esse golpe não está destruindo apenas a nossa democracia; está destruindo a imagem do nosso País, do nosso sistema político.

    Mas é outro Brasil que nós queremos preservar: o Brasil das oportunidades, o Brasil do respeito aos direitos humanos, o Brasil do fim da miséria e da pobreza absoluta. É este o Brasil que nós temos de preservar, o Brasil que mudou com Lula e com Dilma. E é o que nós faremos, agora mais do que nunca, agora com mais disposição ainda.

    Muito obrigado pela tolerância, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/04/2016 - Página 27