Discurso durante a 59ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentário sobre o início dos trabalhos da Comissão Especial do Impeachment.

Comentários sobre o julgamento, no Supremo Tribunal Federal, acerca dos juros devidos da repactuação das dívidas dos Estados e Municípios com a União.

Autor
Rose de Freitas (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Rosilda de Freitas
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO:
  • Comentário sobre o início dos trabalhos da Comissão Especial do Impeachment.
ECONOMIA:
  • Comentários sobre o julgamento, no Supremo Tribunal Federal, acerca dos juros devidos da repactuação das dívidas dos Estados e Municípios com a União.
Aparteantes
Donizeti Nogueira.
Publicação
Publicação no DSF de 27/04/2016 - Página 92
Assuntos
Outros > SENADO
Outros > ECONOMIA
Indexação
  • COMENTARIO, INICIO, ATIVIDADE, COMISSÃO ESPECIAL, IMPEACHMENT, SENADO.
  • COMENTARIO, JULGAMENTO, LOCAL, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), ASSUNTO, CALCULO, DIVIDA PUBLICA, DEVEDOR, ESTADOS, MUNICIPIOS, CREDOR, UNIÃO FEDERAL, OBJETIVO, ALTERAÇÃO, JUROS COMPOSTOS, NECESSIDADE, AGILIZAÇÃO, APRECIAÇÃO, SENADO, SOLUÇÃO, CRISE, ECONOMIA NACIONAL.

    A SRª ROSE DE FREITAS (PMDB - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vou apenas registrar o início dos trabalhos da Comissão Especial que vai analisar o impeachment. Hoje regulamentamos o trabalho porque foi empossado o Presidente e eleito o Relator.

    É evidente que, quando existem controvérsias sobre qualquer assunto, o debate se alonga e toma um tempo infinito daquilo que poderia, até pela urgência, pela necessidade e pela gravidade do momento, ser resumido numa votação que expressasse o desejo da maioria e da minoria.

    Então, há um plano de trabalho, uma meta e prazos definidos. A partir de agora, essa missão tem de ser exercida com responsabilidade, seguindo a Constituição, obedecendo ao Regimento para julgar se existe ou não a admissibilidade, se existe ou não crime de responsabilidade que justifique o afastamento da Presidente Dilma. Tem, também, por objetivo principal, ajudar o País a superar uma crise política sem precedentes na história do Brasil que paralisou a economia e compromete o nosso desenvolvimento nacional.

    Mas o objetivo de estar nesta tribuna hoje não é só o de fazer o registro do início dos trabalhos, mas de falar, principalmente, desse processo da maior relevância para o País que quero destacar hoje. É outro assunto de extrema importância e que também está em pauta esta semana, Sr. Presidente. É a definição sobre os contratos da dívida de Estados e Municípios com a União. Esse é um assunto grave para a União, para os Estados e para os Municípios.

    Nesta quarta-feira, amanhã, o Supremo Tribunal Federal decidirá sobre as taxas de juros que devem incidir sobre as dívidas dos Estados e Municípios com a União.

    Esse é um tema crucial, Senadora Lúcia Vânia, porque os governos estaduais estão com o caixa cada vez mais comprometidos e enfrentam uma crise financeira aguda, que é refletida e sentida inclusive, lá na ponta, pelo cidadão brasileiro.

    Nesta quarta-feira, o Supremo decide se aprova ou não o recálculo da dívida dos Estados, se aprova ou não um desconto na taxa de juros do endividamento. Estados e grandes Municípios questionam, a todo momento, a adoção de juros compostos, ou seja, juros sobre juros, e os Estados reivindicam juros simples, que são aplicados sobre o valor inicial.

    Com a crise que nós estamos vivendo, diante da paralisação das negociações para o alongamento do endividamento, coisa que não poderia ter acontecido, havia várias alternativas, que foram expostas ao longo da jornada de discussão. Esse alongamento da dívida é um dos aspectos. Provavelmente, por mais de vinte anos, vários governos estaduais recorreram ao STF para utilizar essa metodologia dos juros simples no pagamento dos seus débitos.

    Não há dúvida de que essa é uma questão muito delicada e que tem colocado em lados opostos o Ministro da Fazenda e os entes federados. Não há dúvida também que é uma questão que provoca muitas interpretações diferenciadas. Mas, Sr. Presidente, é um tema que não pode ser mais postergado. Não há como jogar para frente uma crise que atinge Estados e Municípios, e Municípios em plena crise, sem uma resposta imediata para resolver seus problemas econômicos.

    Estados e Municípios, como é do conhecimento de todos - quem estiver ouvindo vai reconhecer -, estão estrangulados. Uma soma de erros do Executivo Federal, no passado, contribuiu para essa situação. E é muito justo que encontrem juntos uma saída, mas não é o que está acontecendo. Para os Estados, o recálculo da dívida com juros simples significa uma economia mensal expressiva, que pode salvá-los nesta quadra da economia brasileira.

    O Supremo Tribunal Federal já deu liminar ao Estado de Santa Catarina em ação que buscar garantir a aplicação dos novos parâmetros instituídos pela Lei Complementar nº 148, de 2014. O STF permitiu, em decisão liminar, que Santa Catarina utilize juros simples em vez de juros compostos para a quitação da dívida renegociada. Além de Santa Catarina, Alagoas, São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e Mato Grosso, e creio que Goiás e Pernambuco também têm processos tramitando no Supremo. E outros Estados, pelo que estou vendo na imprensa, pretendem ingressar no Supremo. A previsão é de que o Plenário do Tribunal julgue amanhã o mérito das liminares. Mas poderia ser diferente. Poderíamos ter mantido um debate, um diálogo, poderíamos ter a radiografia verdadeira, como tivemos oportunidade, na Comissão de Orçamento, para expor a situação do Brasil, examinar a situação do Estado e encontrar a saída negociada.

    Existe uma situação muito grave na União, no Estado brasileiro. O Tesouro Nacional alega que a adoção de juros simples nos contratos provocaria, como está em toda a mídia nacional, um rombo de R$300 milhões na dívida pública, que já chegou a R$2,8 trilhões.

    Estamos em um momento de queda de arrecadação. Isso nós vimos todo final de mês, naquela agonia permanente de tentar ver reagir por alguma ponta a economia brasileira. Estamos em momento de queda livre. A União alega dificuldades fiscais e, sem dúvida, nós entendemos o momento da crise nacional. Mas é crise para todos. Não há crise só da União, do Governo Federal, mas a crise do Estado repercute imediatamente nos Municípios, que sofrem para manter a mímica infraestrutura funcionando para atender socialmente a sua população.

    Entender a crise financeira dos Estados, a situação dramática e o sofrimento dos Municípios é papel desta Casa também. Há aqui mais do que uma questão de índice de juros, se simples ou compostos. Nós temos a correta aplicação de critérios legais para o cálculo do desconto a que os Estados têm direito e que foi negado a ser discutido durante anos. A Lei Complementar nº 148, aprovada em 2014, foi alterada pela Lei Complementar nº 151, de 2015.

    Essas leis fixaram as normas para reduzir os endividamentos dos Estados. Foram conhecidos novos indexadores de correção, 4% ao ano, mais IPCA, limitados pela taxa Selic, a taxa básica de juros, e, também, descontos sobre os saldos devedores. O que se questiona são os descontos concedidos para corrigir distorções provocadas no passado, como é a radiografia sincera do nosso País, a soma dos erros passados que nos trouxeram a situação grave do presente que vivemos.

    Por exemplo, a diferença entre o custo da captação dos recursos pela União e o cobrado dos entes federados. Quantas vezes denunciamos e falamos sobre esse assunto? Os descontos, todos sabem, visam também dar mais fôlego ao combalido caixa dos Estados, um cenário em que até 15% das receitas estaduais seguem para o caixa da União.

    A União se tornou dona do tesouro do faraó, a União está no topo da cadeia de arrecadação, concentra a maior parcela das receitas públicas e só repassa, gradativamente, as responsabilidades, transfere aos Municípios, cada dia mais, as responsabilidades do trabalho social que tem que exercer, dos programas sociais que tem que aplicar. Aos Estados ficam a dependência e situações de prejuízo, com renúncias da União, atributos que são inteiramente compartilhados.

    Segundo juristas, com a Lei Complementar nº 151/15, a União ficou obrigada a abater da dívida dos Estados a diferença entre a quantia devida em 1º de janeiro de 2013 e a quantia apurada desde a assinatura dos contratos. Para isso, o critério era a variação acumulada da Selic, ou seja, juros simples. Mas, em 2015, o Governo alterou a fórmula do cálculo do saldo devedor. Substituiu a expressão legal "variação acumulada", igual a fator simples, por "fator acumulado", que é igual a juros compostos.

    Entretanto, Sr. Presidente, o texto da Lei Complementar nº 148, que estabeleceu os descontos, já dizia que não seria necessária regulamentação para esse ponto, como está redigido no parágrafo único de seu art. 4º - entre aspas -: "independentemente de regulamentação".

    Com o decreto federal, entretanto, os descontos foram praticamente neutralizados. Estados que já pagaram muito, continuam devendo muito. Essa é a situação que eu queria abordar desta tribuna. Estados e Municípios não podem pagar uma conta que parece não ter fim.

    Por outro lado, também está claro que defendemos a necessidade de perseguir a redução do gasto público. Sem isso, não haverá um ponto de saída para o enfrentamento da crise. Como premissa, inclusive, para a retomada do crescimento do País, nós temos que abordar, em um primeiro ângulo, essa estratégia.

    Por outro lado, nós temos a Fazenda, que sustenta que os Estados mais beneficiados pela adoção de juros simples seriam os mais ricos.

    Na avaliação do Secretário-Executivo da Fazenda, Dyogo Oliveira - e aqui cito, entre aspas, o que foi proferido por ele -:

A adoção de juros simples resultaria em enorme prejuízo para o País, além de representar grande injustiça para os Estados mais pobres, que acabariam pagando pelos mais ricos. Por exemplo, cada contribuinte no Rio Grande do Norte e no Piauí pagaria [em média] R$1,5 mil para que a dívida de São Paulo fosse refinanciada.

    Pois bem, senhoras e senhores, nós estamos, então, diante de uma situação delicada e jamais enfrentada; postergada ao extremo. Chegamos agora a ter que recorrer novamente ao Supremo Tribunal Federal. Nós temos que resolver esta situação de qualquer maneira: a questão fundamental da dívida dos Estados, que verticalmente incide sobre a dívida dos Municípios.

    Por isso a resolução do impasse sobre o desconto em parcelas de refinanciamento deve ser uma prioridade, assim como a negociação do alongamento da dívida. Esse assunto é recorrente e foi objeto de debates com vários ministros. E os problemas foram se acumulando, sem que encontrássemos a saída gradativa ou uma saída que solucionasse definitivamente, custasse o tempo que custasse, mas que fosse uma saída justa.

    Este Congresso vai ser chamado, Sr. Presidente, mais uma vez, a superar divergências políticas para votar essa matéria e a alteração da meta fiscal de 2016, até agora sequer discutida, porque foi mandada no término, praticamente no último dia da nossa Presidência na Comissão de Orçamento.

    O País, este é um fato concreto, Senadora Lúcia, precisa superar o imobilismo que nos acode a todo momento, dentro desta Casa, fora dela, dentro do Poder Executivo. É uma maneira que nós temos de debater os problemas e de agir.

    Não sei por que essa sequência incomoda tanto os líderes políticos, os governadores, a Presidente da República. Nós precisamos encarar os fatos como eles são e estão na nossa frente. Não há maneira de avançar; não há maneira de falar que teremos como superar os problemas que aí estão.

    É muito comum, quando você dá uma entrevista, alguém perguntar: "Mas se este Governo for afastado, o que vocês esperam do próximo governo?". É uma incógnita, é uma incógnita. Ir ao Supremo Tribunal Federal, como fez zelosamente o Presidente Temer, é uma tentativa de assegurar, conter a crise da dívida de cerca de R$300 bilhões.

    Muito bem, contém-se o problema para assegurar um pouco de tranquilidade e iniciar um novo governo - talvez um novo governo -, mas se esquece que, diante dos seus olhos, estão os Estados e, mais adiante, os Municípios. Não há saída para um sem haver saída para todos.

    Portanto, era o que eu queria dizer, Presidente.

    Devemos preparar esta Casa para o embate, para o enfrentamento - sem tratar das divergências políticas, de que já tratei muitas vezes -, a fim de se pensar numa direção que seja comum a todos, como uma saída para enfrentarmos a crise econômica, agora tratada de maneira integral, porque atinge Estados e Municípios.

    Concedo o aparte a V. Exª, com muito prazer.

    O Sr. Donizeti Nogueira (Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Senadora Rose de Freitas, em primeiro lugar, quero parabenizá-la pela brilhante exposição, detalhada, segura, sobre um problema que este País vive e que não será resolvido, do meu ponto de vista, com medidas paliativas. Nós precisamos - eu já disse isto aqui algumas vezes, inclusive no meu primeiro discurso, quando tomei posse - responder três perguntas importantes para chegarmos a uma solução. A primeira pergunta que o Congresso, o Poder Executivo, o próprio Poder Judiciário e a sociedade precisam responder é: que País queremos construir para os próximos 30, 50 anos? Para definir que País queremos construir, precisamos também definir como vamos construir. Quanto custa construir o País que queremos? Com equilíbrio entre todos os entes federados, nas ações a serem desenvolvidas no País que queremos construir. Quanto custa, então, e quem paga a conta? Nós precisamos responder a essas perguntas e planejar um desafio, um objetivo, com metas preestabelecidas, com o papel de cada ente federado. Mas de onde vem o dinheiro para pagar as contas? Não podemos mais penalizar sobretudo as trabalhadoras e os trabalhadores assalariados e o consumidor, que é quem, em última análise, paga todos os impostos neste País. Nós precisamos ter a coragem de enfrentar este desafio: que País queremos construir para os próximos 30, 50 anos; quanto custa este País; e quem paga a conta. Digo isso porque, a cada dia, aqui no Senado, na Câmara, no Congresso Nacional, adota-se uma medida paliativa para resolver por mais alguns dias, mais um ano, superar o momento de dificuldade de um ano, mas isso não tem resolvido o problema do País. A meu ver, o desafio está colocado: que País queremos construir? Quanto custa? Quem paga a conta? Quem deve pagar a conta são aqueles que sempre ganharam muito dinheiro. O nosso País é rico, tem grandes fortunas, amealhadas com trabalho, com o desenvolvimento do País, mas que estão acumuladas. Esse acúmulo precisa fazer parte da resposta, para podermos corrigir as distorções que estão aí e construir o País que a sociedade brasileira espera. Portanto, era o desafio que eu queria deixar aqui, neste gentil aparte que V. Exª me concedeu. É a compreensão que eu tenho. As medidas paliativas ajudam em curtíssimo prazo, mas, em longo prazo, nós ainda não encontramos a solução para o País que precisamos construir para as próximas gerações. Obrigado, Senadora, pelo aparte.

    A SRª ROSE DE FREITAS (PMDB - ES) - Eu agradeço e parabenizo V. Exª.

    Na verdade, se fôssemos montar um pedacinho da história, com as crises por que já passamos e superamos, no final, nós nos lembraríamos da sua pergunta: "Quem paga a conta?", e da resposta: "Sempre paga o povo brasileiro".

(Soa a campainha.)

    A SRª ROSE DE FREITAS (PMDB - ES) - E o povo não é responsável, em absoluto, de maneira nenhuma, pelas crises geradas, por exemplo, na Previdência Social. O senhor sabe que o compromisso de vários governantes de enfrentar o problema da Previdência e equalizar os problemas internos, para fazer uma Previdência justa, nunca aconteceu.

    Portanto, agradeço a V. Exª. Estou na mesma trincheira de V. Exª, Senadora Lúcia Vânia: lutando para que a gente possa fazer as perguntas que nos cabem e tomar as iniciativas para que a gente não ajude também a postergar mais a solução desta grave crise que acontece no País.

    Muito obrigada!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/04/2016 - Página 92