Discurso durante a 133ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Inquirição do Sr. Luiz Gonzaga Belluzzo sobre o cometimento de crime de responsabilidade pela Presidente Dilma Rousseff.

Autor
JANAINA CONCEIÇÃO PASCHOAL
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Inquirição do Sr. Luiz Gonzaga Belluzzo sobre o cometimento de crime de responsabilidade pela Presidente Dilma Rousseff.
Publicação
Publicação no DSF de 27/08/2016 - Página 50
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • INQUIRIÇÃO, INFORMANTE, LUIZ GONZAGA DE MELLO BELLUZZO, ASSUNTO, CRIME DE RESPONSABILIDADE, AUTORIA, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REFERENCIA, UTILIZAÇÃO, DECRETO FEDERAL, OBJETIVO, ABERTURA, CREDITO SUPLEMENTAR, AUSENCIA, AUTORIZAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, OBTENÇÃO, EMPRESTIMO, ORIGEM, BANCO DO BRASIL, BENEFICIARIO, GOVERNO FEDERAL, DESTINAÇÃO, FINANCIAMENTO, PLANO, SAFRA.

    A SRª JANAINA CONCEIÇÃO PASCHOAL - Muito obrigada, Sr. Presidente.

    Cumprimento o Prof. Belluzzo.

    Quero aqui só reforçar as palavras do Defensor da Presidente Dilma, no sentido de que, se o professor é ouvido como testemunha ou informante, não faz diferença, o que interessa é a palavra dada. Acho que essa frase é bastante significativa.

    Eu gostaria de saber, Professor, se o senhor leu a íntegra dos autos do processo - na verdade, os vários processos - que tiveram trâmite perante o TCU, tanto com relação a 2014 como com relação a 2015. E, se sim - o senhor falou, várias vezes, que preza pela responsabilidade fiscal -, eu gostaria de saber se o senhor entende que é coerente com o princípio da transparência o fato de o Banco do Brasil, de a Caixa Econômica Federal, de o BNDES terem lançado os valores referentes, por exemplo, ao Plano Safra, ao PSI, ao Minha Casa, Minha Vida, como crédito, diante do Tesouro Nacional, e, por sua vez, o Tesouro Nacional e o Banco Central não terem lançado esses mesmos valores bilionários, que se acumularam, por muitos meses, até por anos, como débito. Então, eu gostaria de saber se o senhor leu a íntegra desse material e se o senhor entende que isso é coerente com o princípio da transparência, que deve nortear a responsabilidade fiscal. E aqui eu não acho que seja um conceito jurídico.

    Eu gostaria de saber se o senhor poderia, na condição de economista, professor de economia - e eu sei que talvez estaria mais afeto à contabilidade, mas são duas áreas que têm muita... -, explicar o que seria essa tal contabilidade criativa, tão mencionada na imprensa. Eu sei que é um termo não técnico, como também não técnicas as pedaladas, mas eu gostaria de saber se o senhor teria como explicar o que é isso.

    Gostaria também de saber... Não sei se o senhor chegou a ler o parecer do Procurador Ivan Marx, que foi mencionado pelo Defensor, no entanto, o Procurador Ivan Marx, em mais de uma oportunidade, afirma o seguinte: que essas operações - independentemente da natureza, sejam operações de crédito, ou operações de prestação de serviço, mas ele diz textualmente - tiveram como finalidade principal maquiar as contas públicas. Elas tiveram, como finalidade principal, não um financiamento pura e simplesmente do Tesouro, porém maquiar as contas públicas. Eu gostaria de saber o que senhor entende dessa frase e se o senhor compreende que o Procurador - no caso, o Procurador Ivan Marx - estaria sendo parcial nessa sua avaliação.

    Também gostaria de saber, na hipótese de o senhor ter lido a íntegra desses autos, se o senhor pôde constatar que, em termos de porcentagem, as operações, que foram chamadas popularmente de pedaladas, favoreceram muito mais as grandes empresas, as grandes fortunas, quando comparamos com os programas chamados sociais e tão alardeados pela defesa da Senhora Presidente.

    Seriam essas as minhas indagações por enquanto.

    O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski) - Professor Belluzzo.

    O SR. LUIZ GONZAGA DE MELLO BELLUZZO - Drª Janaína, é um prazer dialogar com a senhora, já que a senhora é professora na minha querida Faculdade de Direito do Largo de São Francisco.

    Temos, aqui no Senado, um ex-Presidente do 11 de agosto, o Senador Aloysio Nunes Ferreira, também meu companheiro então de muitas batalhas. Não foram poucas.

    Então, eu quero dizer o seguinte: a senhora levantou uma questão que diz respeito às relações do Estado com a economia, isso está inscrito na definição das políticas econômicas. Eu vou lhe dar um exemplo: uma economia como a brasileira tem um protagonismo do Estado e dos seus bancos públicos muito importante para o seu funcionamento, isso está ligado estruturalmente ao funcionamento da economia.

    Vou lhe dar uma informação: nos anos 70, quando a economia brasileira crescia 7% ao ano, os chineses vieram aqui, depois de reatarem as relações com os Estados Unidos, para se inspirarem no modelo brasileiro de articulação das empresas públicas, sobretudo, e do setor privado. É claro que isso muda de natureza à medida que a economia avança, etc., mas eles conseguiram realizar isso com grande eficácia.

    Então, eu fico um pouco, digamos, desconfortável quando me perguntam se uma operação fiscal de subvenção, ou de aporte, por exemplo, do Governo para o BNDES é uma violação de alguma regra de comportamento do setor público. Quero lhe dizer o seguinte: nós precisamos olhar os efeitos no seu conjunto. Então, o aporte do Governo para o BNDES, por exemplo, sobretudo depois de 2008, 2010, quando a economia entrou em recessão, foi muito importante para manter a taxa de investimento da economia, certo? Então, a gente tem que olhar quais são os efeitos fiscais. Quais os efeitos fiscais? São os efeitos, na verdade, que nascem do financiamento das grandes empresas, sim. É preciso ter claro que hoje o mundo está organizado - se a senhora quiser eu passo os dados para a senhora - em grandes empresas que têm controle quase absoluto dos mercados - são poucas empresas que têm o controle dos mercados. E você não vai competir, numa economia mundial organizada assim, com entrar de velocípede quando os caras estão com carro de fórmula um; tem que entrar com empresas que tenham capacidade de competição - o Brasil não conseguiu ainda fazer isso, precisa fazer, porque esse é um dos aspectos negativos da economia brasileira.

    Então, o que nós temos que julgar, quando ocorre, se o BNDES... E o BNDES é impecável nisso, porque o BNDES tem um grupo de técnicos que impedem qualquer coisa feita fora da caixinha. O fato é que nós precisamos olhar os efeitos fiscais de que ponto de vista? Do ponto de vista de como isso afetou a renda e o emprego e como isso resultou em receita fiscal para o Estado.

    Se a senhora olhar o período em que o BNDES fez isso, em que a economia estava crescendo, a receita fiscal também cresceu. É desse ponto de vista que nós temos que avaliar as coisas. Se, na verdade, e isso é normal, se o Governo atrasou no compromisso fiscal de, na verdade, pagar os subsídios, se o Governo se atrasou, ele se atrasou, mas ele acabou pagando. Então, eu tenho a obrigação de avaliar isso do ponto de vista dos efeitos econômicos globais e do ponto de vista da articulação e da estruturação da economia.

    A senhora pode ter uma outra visão, que é a visão jurídica. Eu estou lhe expondo a visão econômica; por que eu considero que isso é uma forma já estabelecida de gestão da economia por uma articulação entre bancos públicos, setores do setor privado e o Tesouro Nacional.

    Isso é normal em todos os países. É assim que funciona. Sabia que, no programa...

    (Soa a campainha.)

    O SR. LUIZ GONZAGA DE MELLO BELLUZZO - ... agora da Hillary Clinton, está um banco nacional de investimento em infraestrutura? Por quê? O Brasil tem um dos bancos de investimento mais importantes do mundo. Ele ficou mais importante inclusive que o Banco Mundial, em matéria de ativos. Ele foi copiado pelos chineses, que têm o Banco de Desenvolvimento da China. Então, a gente precisa olhar isso, e eu estou olhando do meu ângulo, a senhora está olhando do seu ângulo, mas o meu ângulo é tão legítimo quanto o seu.

    O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski) - Drª Janaina, mais quatro minutos para a repergunta.

    A SRª JANAINA CONCEIÇÃO PASCHOAL - Obrigada, Sr. Presidente.

    Professor, com todo o respeito, o senhor não respondeu ao que eu perguntei. Eu fiz perguntas muito objetivas. Muito embora o senhor esteja sendo ouvido como informante e tem todo o direito de dar as opiniões nessa condição, as minhas perguntas foram bastante objetivas. Eu perguntei para o senhor se o senhor leu a documentação do TCU na íntegra. Essa pergunta é importante porque a documentação mostra que o BNDES não está impecável. Essa pergunta é importante porque a documentação mostra que aquilo é a prova cabal, independentemente do nome que se confira àquelas operações, da maior afronta ao princípio da transparência.

    Então, eu pergunto ao senhor novamente se o senhor leu na íntegra aqueles processos; se o senhor considera - eu vou terminar, por favor - que aqueles achados que estão lá documentados... Não são só opiniões dos técnicos, não é só o parecer do Dr. Júlio. São documentos, ofícios vindos da Caixa, do BNDES, do Banco do Brasil, constatações em auditorias independentes. Aliás, tudo isso veio à tona por uma auditoria do próprio BC - isso não começou com o Dr. Júlio -, demonstrando que o que estava contabilizado nos bancos como crédito simplesmente não existia nas estatísticas do Governo central, ou seja, no Tesouro e no Banco Central. Eu gostaria de saber, independentemente do nome que se dê: isso é coerente com o princípio da transparência?

    Então, são duas perguntas objetivas e tem mais uma pergunta objetiva, que é muito importante porque um dos pontos aqui de discussão que se tem estabelecido há muito tempo, já há horas, é o parecer do Dr. Ivan Marx, que a Defesa se apega a uma parte do parecer, mas a parte mais significa é aquela onde o Procurador diz com todas as letras: "Isso tudo foi feito para maquiar as contas públicas." Então, como eu sei que o senhor tem feito artigos falando do golpe e da imparcialidade do Procurador do TCU, eu gostaria de saber o seguinte: o Dr. Ivan Marx, ele é parcial nessa história? Quando ele diz que tudo isso foi feito para maquiar as contas públicas, ele é parcial nessa história?

    Com todo o respeito, eu respeito a opinião do senhor, a teoria, mas eu não estou, com todo o respeito, interessada nessa opinião agora. Eu gostaria dessas três respostas muito objetivas. Elas são muito importantes para o processo. Por favor, Professor.

    O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski) - Prof. Belluzzo.

    O SR. LUIZ GONZAGA DE MELLO BELLUZZO - Primeira, eu não li as 700 páginas...

    (Soa a campainha.)

    O SR. LUIZ GONZAGA DE MELLO BELLUZZO - ..., mas li textos, etc., sobre isso.

    Não acho que o parecer do Procurador Ivan Marx tenha esse tom, mas, de qualquer maneira, se tem, não concordo com ele. Eu tenho o direito de não concordar e já expliquei. Aliás, eu respondi a sua pergunta. É que a senhora não percebeu. Eu respondi, a senhora não percebeu.

    Então, eu quero dizer o seguinte: que isso, na gestão fiscal e monetária, é uma coisa muito mais complicada do que simplesmente essas fórmulas, esses esquemas mais formais. Na execução da política econômica, é muito mais complexo e muito mais difícil.

    Eu não tenho nenhuma restrição a que a senhora tenha a sua opinião, mas eu não vou abandonar a minha. Eu estou dizendo que, na verdade, do ponto de vista das instituições de fomento - assim se comportou a Caixa, assim se comportou o BNDES, assim se comportou o Banco do Brasil -, essas práticas são habituais em todo o mundo. E eu não acho que seja falta de transparência, eu acho que é uma forma de operação. Agora, a senhora tem todo o direito de não concordar. Esta é a minha opinião.

    Quando me perguntaram aqui... Eu acho que tentaram me impugnar porque eu não acompanhava os fatos. Eu perguntei: mas o que são os fatos? A senhora falou: "Muito objetiva a pergunta." O que é uma coisa objetiva sem que você tenha uma dimensão muito subjetiva nos seus valores e na sua apreciação, na sua forma de ver o mundo, não é?

    Então, eu, com o maior respeito, não sei se satisfiz - acho que não satisfiz - com a resposta, mas é essa a minha resposta.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/08/2016 - Página 50