Discurso durante a 171ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Repúdio às tentativas de paralisação das investigações da operação Lava Jato.

Defesa da aprovação da Proposta de Emenda à Constituição nº 10, de 2013, que altera os arts. 102, 105, 108 e 125 da Constituição Federal para extinguir o foro especial por prerrogativa de função nos casos de crimes comuns.

Registro de reportagem exibida no programa Fantástico, da Rede Globo de televisão, sobre possibilidade de fraude cometida no ENEM.

Solicitação de transcrição nos Anais do Senado de documento assinado por participantes do II Foro Internacional por la Democracia, realizado em Brasília, nas dependências do Congresso Nacional.

Autor
Alvaro Dias (PV - Partido Verde/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PUBLICA E IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA:
  • Repúdio às tentativas de paralisação das investigações da operação Lava Jato.
SISTEMA POLITICO:
  • Defesa da aprovação da Proposta de Emenda à Constituição nº 10, de 2013, que altera os arts. 102, 105, 108 e 125 da Constituição Federal para extinguir o foro especial por prerrogativa de função nos casos de crimes comuns.
EDUCAÇÃO:
  • Registro de reportagem exibida no programa Fantástico, da Rede Globo de televisão, sobre possibilidade de fraude cometida no ENEM.
CIDADANIA:
  • Solicitação de transcrição nos Anais do Senado de documento assinado por participantes do II Foro Internacional por la Democracia, realizado em Brasília, nas dependências do Congresso Nacional.
Publicação
Publicação no DSF de 15/11/2016 - Página 9
Assuntos
Outros > CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PUBLICA E IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
Outros > SISTEMA POLITICO
Outros > EDUCAÇÃO
Outros > CIDADANIA
Indexação
  • REPUDIO, TENTATIVA, PARALISAÇÃO, INVESTIGAÇÃO, OPERAÇÃO, POLICIA FEDERAL, CORRUPÇÃO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS).
  • DEFESA, APROVAÇÃO, PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO (PEC), OBJETO, EXTINÇÃO, FORO ESPECIAL, PRERROGATIVA DE FUNÇÃO.
  • REGISTRO, PROGRAMA, TELEVISÃO, REDE GLOBO, ALEGAÇÕES, FRAUDE, EXAME NACIONAL DO ENSINO MEDIO (ENEM).
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, DOCUMENTO, GRUPO, PARTICIPANTE, CONGRESSO INTERNACIONAL, REALIZAÇÃO, LOCAL, CONGRESSO NACIONAL, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF), ASSUNTO, DEMOCRACIA.

    O SR. ALVARO DIAS (Bloco Social Democrata/PV - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, é um momento de nervosismo político no Congresso e fora dele. E as especulações que dizem respeito às tentativas sorrateiras de abafar a Operação Lava Jato devem nos preocupar. Se há exageros, provavelmente eles estão presentes nessas especulações, mas, se há fundo de verdade, há que se denunciar. E o que pressentimos é que existe realmente fundo de verdade no alerta que se faz a partir de um Ministro do Supremo Tribunal Federal, por exemplo, ou nas redes sociais por movimentos que foram às ruas na esperança de mudar este País, ou da parte de procuradores e juízes federais do nosso País.

    O Congresso tem sido acusado constantemente de legislar mal, e isso depõe contra a sua credibilidade. Mas, neste momento, o que se denuncia é algo mais grave: que estariam em curso no Poder Legislativo ações com o objetivo de piorar a nossa legislação para proteger o crime e criminosos, para beneficiar corruptos e corruptores. E partem da análise de tentativas, na Câmara dos Deputados, de anistiar o caixa dois. Elas existiram, foram divulgadas. Não há como admitir essa hipótese de anistia para o crime de caixa dois, investigado agora na Operação Lava Jato pela primeira vez.

    Outra acusação é de que, também na Câmara dos Deputados, há tentativas sorrateiras de alterar a lei que diz respeito ao acordo de leniência para beneficiar infratores, beneficiar criminosos, corruptos, para beneficiar empreiteiros de obras públicas envolvidos na Operação Lava Jato.

    E a outra acusação grave diz respeito a essa tentativa de se colocar na pauta, inesperadamente, a lei de abuso de autoridade. É claro que não se abre mão do debate, ninguém condena o debate, ninguém quer excluir a hipótese de se debater, no momento adequado, uma lei moderna sobre abuso de autoridade. Mas é evidente que o que se pretende é comprometer a Operação Lava Jato com essa discussão descabida em razão das prioridades postas pela população brasileira; multidões que foram às ruas do País não apenas pedir a substituição de um presidente por outro, mas exigir uma mudança radical que possa sinalizar um futuro diferente para o povo brasileiro. Não há por que se admitir.

    Não vamos discutir o conteúdo dessa proposta. Nós poderíamos discutir um texto que a meu ver esconde objetivos escusos, mas na preliminar ele deve ser derrotado, pela oportunidade. Não é hora, Senador Paulo Paim, de debatermos abuso de autoridade quando o que se exige é prioridade para a operação Lava Jato, investigações, valorização das autoridades judiciárias em razão do papel preponderante que desenvolvem neste momento para a construção do Brasil do futuro. É hora, portanto, de apoiarmos, de defendermos, de valorizarmos a ação das autoridades judiciárias; investigadores e julgadores.

    Obviamente, nós teremos tempo para a discussão da modernização da legislação no que diz respeito a abuso de autoridade e certamente o faremos com a experiência adquirida nesses tempos nervosos. Faremos isso, certamente, com a inspiração de uma Operação Lava Jato, que é polêmica, sim, mas que desvenda mistérios escabrosos da corrupção no nosso País. Portanto, não é hora desse debate. Temos que repudiar. Temos que reunir forças no Senado Federal para impedir que essa proposta seja colocada como prioridade na pauta para a deliberação desta Casa.

    E nós aguardamos a proposta que virá da Câmara dos Deputados sobre as dez medidas – que agora não são só dez medidas –, inspiradas na opinião pública brasileira, formatadas pelo Ministério Público, com assinatura de mais de dois milhões de cidadãos, para o combate implacável à corrupção, modernizando a legislação e tornando-a mais rigorosa.

    Vejo a reação da magistratura a essa proposta. Socorro-me da matéria de Andre Guilherme Vieira do Valor Econômico, que diz: "Presidentes de entidades de classe do Judiciário e do Ministério Público classificaram parte dos ajustes feitos às 10 Medidas Contra a Corrupção como uma 'vingança' orquestrada pelo Legislativo contra juízes, promotores e procuradores da República empenhados no combate à corrupção".

    Não gosto da forma; generaliza. Não é o Legislativo. É possível que alguns Parlamentares estejam fazendo esse jogo, mas não há como se responsabilizar o Legislativo, como Poder, por essa iniciativa, até porque ela ainda não alcançou sucesso. Há aqui um combate, e nós teremos que aguardar a finalização do debate e a apreciação final, a deliberação, para verificarmos qual será o posicionamento definitivo do Poder Legislativo.

    O promotor José Robalinho Cavalcanti, presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, disse que isso tem o mesmo DNA do Projeto da Lei da Mordaça – proposta de 2007 do Deputado Federal Paulo Maluf.

    Na avaliação de Robalinho, ao estabelecer que juízes e promotores fiquem sujeitos à Lei dos Crimes de Responsabilidade, o Relator do projeto das dez medidas, Deputado Onyx Lorenzoni, os deixa "à mercê de atos de qualquer cidadão que se sentir prejudicado ou que buscar revanche a uma medida ou decisão".

    O presidente da Associação dos Juízes Federais também se pronuncia. Roberto Veloso também não poupou críticas às mudanças no projeto. Ele diz: "Está havendo uma clara campanha contra os juízes visando ao enfraquecimento do Judiciário." "Esse tipo de proposta é absurda, desmedida. É o mesmo que punir o Parlamentar pelo voto dele. Então, os 10 Deputados que votaram contrariamente à cassação do Eduardo Cunha cometeram quebra de decoro parlamentar e terão de ser submetidos a julgamento pelo Conselho de Ética da Câmara?", ironizou Veloso.

    Na opinião do presidente da Ajufe, está tomando corpo um movimento que visa estancar a apuração da corrupção na Administração Pública.

    "Eu só posso entender como uma retaliação. Por esse dispositivo, qualquer pessoa que perder uma causa pode representar criminalmente contra o juiz desse processo. E, veja, uma decisão de primeiro grau é provisória, está sujeita a recursos que podem chegar ao Supremo Tribunal Federal." Para Veloso, a intenção é atingir diretamente os juízes de primeira instância, que, na avaliação dele, atuam diretamente no enfrentamento à corrupção.

    Pois bem. Nós entendemos que é possível evitar esse tipo de especulação que enfraquece o Poder Legislativo. Nós não podemos oferecer motivos para a debacle completa desta instituição, que é essencial no Estado de direito democrático. Colocar o Poder Legislativo ao lado da corrupção e da impunidade não é bom para a democracia, mas, evidentemente, os Parlamentares não podem dar motivo a essa especulação. Se há lá na Câmara dos Deputados essa tentativa de anistiar caixa dois em relação a crimes já praticados e investigados neste momento, há razões, sim, para o achincalhe do Poder Legislativo. Da mesma forma, se há lá o propósito de alterar a legislação no que diz respeito ao acordo de leniência para beneficiar os grandes empreiteiros envolvidos na Operação Lava Jato, há razões para ataques ao Poder Legislativo.

    Portanto, é necessário esse repúdio, é necessário repelirmos, de forma veemente, qualquer tentativa, por sorrateira que seja, com o objetivo de comprometer a Operação Lava Jato, naquilo que já se chama de operação abafa.

    O que é necessário agora, Senador Paulo Paim, que preside esta sessão, é a aprovação de matérias que, na esteira das dez medidas propostas pelo Ministério Público, passem a ideia ao povo brasileiro de que estamos preocupados em combater efetivamente a corrupção. São tantas matérias aqui propostas, no Senado e na Câmara dos Deputados, e elas não andam, não caminham, ficam nas gavetas, emperradas nas gavetas.

    Saiu da gaveta agora a proposta que pretende acabar com o foro privilegiado. O Brasil comemora o nascedouro de uma nova Justiça com as medidas adotadas a partir de Curitiba, mas, para que se consolide e se consagre uma nova etapa do Poder Judiciário no País e para que possamos acreditar que realmente teremos uma nova Justiça, em que todos serão iguais perante a lei, é necessário acabar, de forma radical, com o foro privilegiado. Não se justifica a constituição de uma casta de privilegiados. Como disse o Ministro Celso de Mello, a Constituição de 1988 nasceu sob a égide da República, mas, ao adotar o foro privilegiado, transformou-se numa Constituição da aristocracia. O fim do foro privilegiado é essencial para que se possa realmente plantar uma nova Justiça.

    No Império, o Presidente da República era intocável, mas, depois, as Constituições que se sucederam não adotaram o foro privilegiado. Em 1969, a Constituição o adota parcialmente, e a mais generosa com as autoridades foi a Constituição de 1988, que introduziu, de forma ampla, o privilégio para autoridades brasileiras. São cerca – ou mais – de 22 mil autoridades neste País com os benefícios do chamado foro privilegiado.

    Nós percorremos os maiores países do mundo e não encontramos algo semelhante. Na Itália, na Alemanha, na França, em Portugal, nos Estados Unidos, não existe o foro privilegiado. Na Espanha, sim; o art. 71 da Constituição espanhola estabelece o foro, a exemplo do que ocorre no nosso País, mas é preciso que aprendamos com os bons exemplos dos países que não o adotam. Se praticamente em todo o mundo não se adota o foro privilegiado, nós é que estamos certos? Eles estão errados? Nós é que estamos agindo com correção e com justiça? Ou eles? Aqui se alega: "Ah, nós corremos o risco de uma perseguição no juizado de primeira instância". Só o juiz de primeira instância pode perseguir? Logo ele, que chegou aonde está através de concurso, portanto, em razão do estudo, da pesquisa, do aprendizado e do seu próprio talento?

    Compõem o Supremo Tribunal Federal magistrados indicados politicamente. Se há risco de perseguição política, no Supremo Tribunal Federal não haveria este risco? E não há a possibilidade do recurso! Na primeira instância, em qualquer equívoco do primeiro juiz julgador, haverá possibilidade de recurso. Portanto, esse argumento é uma falácia; ele não tem substância e não deve prevalecer. O que há é a necessidade imperiosa da extinção, de forma cabal, do foro privilegiado.

    Há aqueles que defendem uma vara especial da primeira instância para julgar autoridades. Isso seria a constituição de outro instrumento de privilégio; seria privilégio. Esses juízes seriam escolhidos por quem para essa vara especial? Por que uma vara especial? Somos especiais porque ocupamos aqui um mandato eletivo? Devemos ser iguais perante a lei, todos.

    Se nós formos colocar a questão pragmática: 11 juízes julgando... Por exemplo, neste momento, 362 inquéritos estão em tramitação no Supremo Tribunal Federal. É por essa razão que ações com foro privilegiado chegam a alcançar 18 anos sem julgamento, e um terço delas prescreve. Vejam: hoje temos 22 casos que já passaram dos dez anos de tramitação no Supremo Tribunal Federal. É humanamente impossível 11 juízes julgarem 22 mil autoridades no País. É por isso que Ministros do Supremo Tribunal Federal defendem o fim do foro. E eu posso, de memória, citar Celso de Mello, que radicaliza e quer o fim do foro de forma absoluta, o Ministro Barroso, o Ministro Marco Aurélio, o ex-Ministro Velloso. São autoridades do Poder Judiciário, no exercício da função...

(Soa a campainha.)

    O SR. ALVARO DIAS (Bloco Social Democrata/PV - PR) – ... ou aposentados na função de Ministro do Supremo Tribunal Federal, que opinam sobre o fim do foro privilegiado.

    Nós teremos outras oportunidades de debater este assunto, mas é preciso, Senador Paulo Paim, que ele esteja na Ordem do Dia, para que a opinião pública pressione a votação. Eu vejo um movimento muito forte no Senado contra esse projeto, e, só com um apoio popular de força, nós teremos possibilidade de aprovar essa proposta. Por isso, o apelo que faço, da tribuna do Senado, é para que os brasileiros falem com Senadores, pressionem os Senadores, atuem nas redes sociais sobretudo. Utilizem-se de todos os instrumentos para exigirem o fim do foro privilegiado.

     Senador Paulo Paim, peço permissão para mudar de tema – sei que a Senadora Gleisi aguarda também para fazer o seu pronunciamento – e rapidamente fazer uma abordagem sobre uma reportagem, exibida ontem no Fantástico, que traz grande preocupação. Ela mostrou que investigadores da Polícia Federal acreditam que uma quadrilha que fraudou o Enem tenha conseguido, com antecedência, as respostas para a prova de ciências da natureza e suas tecnologias, cuja pontuação é decisiva para a seleção de cursos de medicina. O inquérito ainda não foi concluído, mas são fortes os indícios de que as questões foram vazadas antes do exame. Isso é muito sério, e a responsabilidade é do Ministério da Educação; a responsabilidade pelo vazamento é do Governo. Ontem, o Ministro se pronunciou dizendo que não houve contaminação, mas não temos essa segurança.

    O programa do Fantástico revelou diálogos entre membros da quadrilha e seus clientes. E o Delegado Marcelo Freitas, da Polícia Federal, ainda não sabe como os criminosos tiveram acesso ao gabarito antes do início da prova. Isto é essencial: descobrir como foi possível ter acesso a esses gabaritos e quem no Governo – no Governo ou no entorno do Governo – foi responsável pelo fornecimento desses gabaritos a uma quadrilha, o que proporcionou, evidentemente, a oportunidade desse crime.

    Ora, 8 milhões de candidatos se inscreveram. Estudantes se dedicam, estudam, preparam-se e, depois, são prejudicados pela ação criminosa de alguns, que são favorecidos pela leniência de alguém que deveria ter a responsabilidade de oferecer segurança de que haverá lisura nos procedimentos para a realização desse exame essencial nas universidades federais do País.

    Espero, Sr. Presidente, que o Ministro da Educação possa atuar com muito rigor para desvendar os mistérios desse crime, apontar os responsáveis pelo vazamento desses gabaritos e informar ao País quais as providências de responsabilização que adotará o Governo.

    Finalmente, apenas para um registro, quero destacar a realização do II Foro Internacional por la Democracia, que foi realizado, inclusive, nas dependências do Congresso Nacional. Foi formada uma comissão internacional para a democracia, para discutir, nos termos da legislação vigente, tratados internacionais, questões relevantes para a conquista e a manutenção da liberdade e a sempre violação dos direitos humanos, como as restrições aos direitos fundamentais dos cidadãos nos países membros do fórum.

    Eu peço a V. Exª que autorize a publicação, nos Anais da Casa, desse documento, que vem assinado pela Carla Zambelli, Brasil – Associação Brasil Nas Ruas; David Sejas, da Bolívia, exilado político; Maria Teresa Belandria, da Venezuela; e Zoe Martinez, ativista cubana.

    Peço a V. Exª que registre nos Anais esse documento, que relata a criação desse Foro Internacional por la Democracia e as providências adotadas em sua última reunião, realizada aqui, em Brasília, no Congresso Nacional.

    Muito obrigado, Sr. Presidente.

DOCUMENTO ENCAMINHADO PELO SR. SENADOR ALVARO DIAS EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e §2º, do Regimento Interno.)

    Matéria referida:

     – II Foro Internacional por la Democracia.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/11/2016 - Página 9