Discurso durante a 183ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas às articulações políticas favoráveis à aprovação de medidas legislativas supostamente benéficas ao aumento da corrupção no País.

Autor
Lasier Martins (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RS)
Nome completo: Lasier Costa Martins
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PUBLICA E IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA:
  • Críticas às articulações políticas favoráveis à aprovação de medidas legislativas supostamente benéficas ao aumento da corrupção no País.
Aparteantes
Alvaro Dias, José Medeiros, Lindbergh Farias.
Publicação
Publicação no DSF de 29/11/2016 - Página 5
Assunto
Outros > CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PUBLICA E IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
Indexação
  • CRITICA, ARTICULAÇÃO, POLITICA, OBJETIVO, DEFESA, APROVAÇÃO, PROPOSIÇÃO, POSSIBILIDADE, AUMENTO, CORRUPÇÃO.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Muito obrigado, Srª Presidente dos trabalhos, Senadora Vanessa Grazziotin, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, ouvintes, telespectadores da TV Senado.

    Srª Presidente, a nossa classe política vem sendo muito mal avaliada, especialmente nos últimos tempos. Vem sendo alvo de lastimável desprestígio, descrédito e críticas, que não têm ocorrido por acaso, se todos nós fôssemos fazer uma sincera autocrítica de conduta no Congresso Nacional. Essa realidade deveria, por isso mesmo, fazer-nos refletir para adotarmos novas atitudes, ouvir mais o clamor da sociedade, conseguirmos novos comportamentos éticos e mais presteza no atender aos pleitos verdadeiramente importantes, ao encontro dos anseios do povo. Por isso, não é oportuno, não é devido, darmos razão a novas insatisfações, às insatisfações públicas, nesta época de tantas crises na vida do País, e as próprias crises a recomendarem bom senso, mais transparência às ações de todos nós do Congresso Nacional.

    Agora mesmo, e até ontem, Srs. Senadores, nós estávamos diante de dois projetos de lei que recebem os mais veementes protestos populares, porque não deveriam ter a prioridade que se estaria dando, e, ao mesmo tempo, ao menos um deles não mereceria a acolhida, o projeto da anistia do caixa dois, porque se constituiria em ameaças ao curso normal da Operação Lava Jato, histórica megainvestigação que tem despertado notórios entusiasmos populares e as maiores manifestações de rua. Dois projetos, agora apressados, mas de temas que estavam esquecidos há muitos anos. Poderiam agora esperar mais, até porque eles denotam segundas intenções, conforme generalizadas reações populares e da imprensa.

    Falo, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, das propostas de anistia do caixa dois e daquela proposta contra o abuso de autoridades que querem a urgência, que não conseguem disfarçar preocupações com os rumos da Operação Lava Jato e a proximidade das revelações que estão por vir das delações da Odebrecht.

    Nessas circunstâncias, os dois projetos mostravam e ainda mostram conexões, mas o primeiro, a partir de ontem à noite, deu a impressão de que estaria sendo desativado, através da televisão, em programa de grande audiência, o programa Fantástico.

    Ali estiveram, no horário nobre do domingo – procurando tornar a cerimônia bem informal na entrevista, os participantes sem gravata, situação rara de se ver o Presidente da República: Michel Temer, ao centro da mesa; Renan Calheiros, à sua direita; e Rodrigo Maia, à sua esquerda, não por coincidência, mas certamente com objetivo, como foram revelados depois, de acalmar a crise agravada pelo episódio Calero-Geddel.

    O Presidente da República esteve ali na televisão para desarmar o projeto da anistia, anunciando que iria impedir a tentativa de perdoar crimes do caixa dois nas últimas eleições, respaldado, ali naquele ato de ontem, pelo consentimento implícito nas presenças dos Presidentes das duas Casas do Congresso, justamente na antevéspera do debate marcado para amanhã na Câmara dos Deputados, onde notórias articulações pretendiam, ou talvez ainda pretendam, questionar o relatório Onyx Lorenzoni e introduzir a descriminalização do caixa dois.

    Isso significa, no momento, que a ameaça foi esfriada pelo Presidente da República, mas nada autoriza a pensar que a pretensão tenha morrido, porque muita gente se elegeu com o uso do caixa dois. Bastaria lembrar que, ainda há poucos dias, na quinta-feira passada, houve uma estranha reunião de alguns Líderes na Câmara, a portas fechadas, pela madrugada, discutindo possíveis alterações do texto aprovado em plenário.

    E no dia seguinte bem observou o Deputado Federal Ivan Valente, do PSOL, dizendo que, se não houvesse outra intenção a não ser modificar o texto aprovado na Comissão Especial, não haveria motivo para ficarem reunidos à noite inteira e pela manhã inteira, na quinta e na sexta, produzindo algo explícito sobre anistia do caixa dois.

    Correta conclusão. A criminalização do caixa dois veio no pacote das dez medidas, onde permanece, mas agora, em manobra ardilosa, queriam descriminalizar este famigerado caixa dois, tornando não puníveis nas esferas penal, cível e eleitoral as doações não declaradas, aquelas omitidas ou ocultadas de bens, de valores ilícitos ou serviços no financiamento de campanhas eleitorais ou atividades político-partidárias. Agora, no entanto, a tentativa foi enfraquecida pela palavra do Presidente da República ontem à noite no Fantástico. É, portanto, hora de se aguardar o desenrolar da sessão de amanhã, na Câmara, presidida por Rodrigo Maia, que ficou comprometido com a posição adotada ontem diante de milhões de telespectadores.

    Mas, concluindo este assunto, eu queria destacar que o tema da anistia vinha crescendo, não apenas nas manifestações populares, mas também nos pareceres jurídicos. O verdadeiro subterfúgio que escondia a alteração, não estava livre em momento algum de questionamentos na esfera judicial. Seria no caso adaptável a hipótese da falsidade ideológica, art. 350 do Código Eleitoral, que define como infração – abre aspas: "omitir em documento público declaração que dele devia constar, para fins eleitorais". Então por esse texto, eventualmente, ainda não conseguiriam mudar o rumo dos acontecimentos.

    A proposta estaria fadada ao fracasso, mas inegavelmente criaria confusão, criaria controvérsia, criaria ambiguidade, na tentativa real de fulminar de morte a Operação Lava Jato, numa busca desesperada de conseguir a inocência de todos os envolvidos na Operação, inclusive os já condenados e presos. Seria no caso se ocorresse ou vier a ocorrer uma hecatombe contra a moralização da vida pública no Brasil, seria um golpe parlamentar, um projeto de autoanistia dentro do próprio Congresso, uma legislação em causa própria e uma afronta à Lei e ao Direito, quando se sabe que uma é fonte do outro. Sabe qualquer calouro do curso de Direito que os elementos técnico-jurídicos da proposta não resistiriam maior exame, porque Direito e ética têm relações afins. A lei como fonte do Direito não pode ter um nascedouro imoral ou antiético, porque a lei deve observar princípios, conter o sentido de servir ao bem comum, ao interesse social, nunca ao interesse de alguns, muito menos daqueles que estão tratando do projeto com direto interesse pessoal. A lei deve ser genérica – a gente aprende no curso de Direito –, não específica, não pessoal e, muito menos, às pressas por eventuais infratores que estão com medo da Operação Lava Jato.

    Então, por tudo isso, Srª Presidente, Srs. Senadores, nós temos responsabilidades sérias aqui, no Congresso, e, por isso, devemos rechaçar qualquer nova tentativa de reabilitar o projeto da anistia do caixa dois, ontem torpedeado pelo Presidente da República, sensível ao clamor das ruas.

    O caixa dois, todo mundo sabe, é ilegal, porque representa desigualdade na corrida eleitoral. Quem cumpre a lei, declarando as doações efetivamente recebidas, sofreu ou sofre desvantagem diante daqueles que auferiram clandestinamente altos valores para campanhas ricas, alcançando mais eleitores, sofisticando mais a propaganda, quem sabe comprando votos, por terem mais disponibilidades, muitas vezes, disponibilidades de má procedência, conforme têm revelado as inúmeras delações premiadas. Tal conduta desiguala a competição e fere os princípios constitucionais da moralidade e da impessoalidade.

    Portanto, o projeto do caixa dois seria inconstitucional. Aliás, o eminente ex-Ministro, brilhante jurista brasileiro, Carlos Ayres Britto, em entrevista, ontem, na Folha de S.Paulo, classificou a proposta da anistia dentro do projeto das dez medidas anticorrupção como um jabuti inconstitucional, porque, se pretendessem tal alteração, teriam de apresentar uma proposta autônoma, não dentro do projeto de iniciativa popular, que chegou ao Congresso carregado por mais de dois milhões de assinaturas.

    Então, essa é a situação.

    O Sr. Alvaro Dias (Bloco Social Democrata/PV - PR) – Permita-me um aparte, Senador.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) – Com muito prazer, Senador Alvaro Dias.

    O Sr. Alvaro Dias (Bloco Social Democrata/PV - PR) – Senador Lasier Martins, é muito bom ouvi-lo, sobretudo com a consciência de que é preciso defender esta instituição, o Parlamento brasileiro, que tem sido achincalhado em razão, especialmente, de algumas atitudes que não são amplas, gerais e irrestritas, mas são localizadas e existem. Por exemplo, essa questão da anistia é execrável. A impressão que fica é de que políticos não percebem que o País está mudando e que há uma mudança radical e essencial nessa passagem do Brasil de hoje para o Brasil do futuro. Não se faz a leitura correta do que se deseja à sociedade – ou nós não estamos aqui para representá-la? Eu imagino que o nosso objetivo aqui, a nossa missão é representar as aspirações da nossa sociedade. A impressão que fica é de que algumas propostas estão na contramão das aspirações da sociedade. Essa da anistia é uma vergonha, é um acinte, é um escárnio, é um desrespeito; tem que ser repudiada. E é preciso saber quem está propondo isso para que a população possa identificar os representantes dela que agem dessa maneira. Temos matérias aqui que são fundamentais, como o fim do foro privilegiado, que seria um avanço civilizatório emblemático, uma manifestação de vontade política de mudança irretocável, porque nós estaríamos eliminando os privilégios que a nós foram concedidos generosamente pela Constituição de 1988. Outra questão é discutir agora abuso de autoridade. É claro que nós temos que discutir isso, mas há o momento para este debate, e não é este. É preciso eleger prioridades; e eleger prioridades atendendo às aspirações da população. E hoje a prioridade para a população é outra. Por isso, os meus cumprimentos a V. Exª. Nesta quarta-feira, nós teremos, na Comissão de Constituição e Justiça, com o item nº 1 da pauta, a votação desse projeto que acaba com o foro privilegiado. Nós esperamos que a vontade do povo seja respeitada nessa ocasião. Muito obrigado e parabéns a V. Exª, Senador Lasier Martins.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) – Eu é que lhe agradeço, Senador Alvaro Dias, e fico muito tranquilo ao sentir que estou em perfeita sintonia com o seu pensamento, um Senador tão destacado, tão experiente nesta Casa, que – lembro sempre –, nas últimas eleições, foi o Senador eleito com o mais alto índice de votos nos respectivos Estados brasileiros. A sua palavra é sempre muito orientadora aqui, nesta Casa.

    Com relação ao projeto do abuso de autoridade, eu pretendo em seguida também falar desse tema.

    Com muito prazer, recebo o aparte do Senador José Medeiros. O Sr. José Medeiros (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) – Muito obrigado, Senador Lasier. Meu aparte é simplesmente para também, na mesma linha do que V. Exª está dizendo, tranquilizar o povo brasileiro: se as pessoas que colocaram a ideia de criminalizar o caixa dois por vias transversas tentavam conseguir anistias passadas, isso é impossível de colar, não se sustenta juridicamente já que hoje o caixa dois não é crime, não está tipificado. Essas pessoas estão sendo condenadas na Lava Jato por outros tipos de crime – corrupção passiva, corrupção ativa, enfim –, e não por caixa dois. Nós temos que, em algum momento – e espero que seja rápido –, criminalizar, tipificar essa conduta no ordenamento brasileiro. No entanto, se ao tipificar a conduta eles estavam esperando o benefício da proibição da retroatividade da lei, podem tirar o cavalo da chuva, porque isso não vai acontecer. Primeiro, porque é impossível juridicamente, mas também porque as ruas estão muito atentas, e isso não passa. Parabenizo V. Exª por trazer o tema à tona.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) – Muito obrigado, Senador José Medeiros, por esse reforço a uma posição que me traz hoje à tribuna.

    Concedo a palavra, com muito prazer, ao Senador Lindbergh.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – Quero cumprimentar V. Exª. Às vezes temos posições diferentes, mas V. Exª é um dos Senadores mais atuantes aqui, no plenário, e em comissões desta Casa. Eu queria perguntar a V. Exª sobre essa crise envolvendo o Governo. Estou aqui com artigos de vários articulistas e queria ler um pequeno pedaço do Clóvis Rossi, que diz o seguinte:

O Presidente Michel Temer deveria seguir os passos de Geddel Vieira Lima e se demitir. Afinal, bem feitas as contas, praticou a mesma irregularidade de seu então auxiliar (advocacia administrativa).

Trata-se de uma expressão técnica que, desbastada do juridiquês, significa uma violação da República, da coisa pública.

Pior: trata-se de irregularidade publicamente admitida, primeiro por Geddel e depois pelo próprio Temer, pela boca de seu porta-voz.

Chega a ser revoltante a desfaçatez com que ambos tentam minimizar a gravidade dos atos praticados. Geddel negou que tivesse pressionado o então Ministro da Cultura, Marcelo Calero, para liberar um prédio em que comprara um apartamento e que havia sido embargado pelo Iphan (Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional).

Disse que fizera apenas "ponderações". Qualquer pessoa com um dedo de sentido comum sabe que, quando o ministro mais poderoso do governo, até pela proximidade com o presidente, faz "ponderações" junto a um colega, está pressionando-o a adotar a posição desejada pelo "ponderador".

Da mesma forma, Temer, segundo o porta-voz, tentou apenas "arbitrar" entre dois ministros em conflito. De novo, o mais elementar bom senso diz que não cabe a um Presidente da República intrometer-se em interesses privados de qualquer um de seus auxiliares – a não ser para demitir quem desafiasse os valores republicanos, no caso Geddel Vieira Lima. Sempre haverá, entre os defensores [...]

    E aí continua. Mas não é só ele: Janio de Freitas, editoriais... De fato, é uma crise muito grave. Eu, Senador Lasier, acompanhei aquela entrevista coletiva de ontem e fiquei pensando: parecia um velório.

(Soa a campainha.)

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – É um fim de governo. Um Presidente sem condições de se dirigir à Nação, sem conseguir responder às perguntas. Eu acho que estamos numa crise muito grave. E é por isso que, cumprimentando V. Exª, faço esse aparte e pergunto um pouco sobre essa crise envolvendo Temer, o papel do Presidente nesse caso envolvendo Geddel Vieira Lima.

    O Sr. José Medeiros (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) – Se possível o senhor poderia responder também o que o senhor achava de a Dilma nomear um ministro para ele fugir das garras do Moro.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) – Muito bem, Srs. Senadores. Eu não pretendia entrar na polêmica, mas também não posso fugir, afinal esta é uma Casa de debates.

    Senador Lindbergh, eu entendo também que o Presidente Temer facilitou a crise. Se ele tivesse decidido, logo no primeiro momento, a questão Geddel – que não poderia permanecer depois do que aconteceu, depois da pressão que exerceu sobre o Ministro da Cultura...

(Interrupção do som.)

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) – Depois da pressão que exerceu sobre o Ministro da Cultura, Geddel não poderia ter continuado – como acabou não continuando –, mas demorou demais! E essa demora se deve à indecisão do Presidente da República. E ele está pagando caro agora, porque está sob o crivo da oposição, que fala, inclusive, em impeachment. Se vai acontecer, isso por enquanto foge às nossas participações. Isso é processo que, se for o caso, deverá ser instaurado na Câmara; se lá aprovado, viria para nós. Não sei se será o caso; seria tentar adivinhar aqui precipitações desse caso, de modo que deixemos que o tempo nos mostre o caminho.

    Agora, eu concordo com o Senador Lindbergh, o Presidente ensejou a crise quando não a resolveu logo no início.

(Soa a campainha.)

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) – Prosseguindo, Srª Senadora, e pedindo a sua tolerância, afinal os apartes ilustram o nosso debate, mas também nos fazem ultrapassar o tempo, de modo que acredito estar com um crédito.

    Com relação à anistia, estamos vendo que a tentativa desse perdão do caixa dois, ao que tudo indica, está sepultada, salvo melhor juízo.

    E aí, Srs. Senadores, restaria outro tema, que acho inoportuno: o projeto da alegada necessidade de controle a abusos de autoridades. Ora, por que penso assim? Porque, no quadro atual das diligências processuais da Lava Jato, levantar suspeita sobre esse caso seria natural. Esse projeto tenta...

(Interrupção do som.)

(Soa a campainha.)

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) – Esse projeto estaria tentando inibir delegados federais, promotores e procuradores de Justiça, magistrados, com ameaças de penalizações, como perdas de cargos e multas. Esse projeto ressurge depois de anos e anos esquecido. Por que agora? Para desviar atenções e preocupar investigadores e aplicadores da lei na Lava Jato? É uma hipótese, é uma suspeita. De qualquer modo, a proposta até pode ser boa, mas desde que se preste a um debate aprofundado, sem pressa, para, como exemplo, não consolidar o que agora aconteceria. Se o projeto vier a ser votado nos termos em que está, seriam consolidadas verdadeiras barbaridades jurídicas, como aquilo que está contido no art. 30 desse projeto do abuso de autoridade.

(Soa a campainha.)

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) – Esse artigo estabelece o seguinte: "Art. 30. Dar início ou proceder à persecução penal, civil ou administrativa sem justa causa fundamentada".

    Ora, Srs. Senadores, reflitamos sobre esse preceito. Ele quer que a autoridade, antes de tomar qualquer atitude, diga que vai abrir uma instrução, uma investigação. Ora, isto é um absurdo: ele teria de apresentar um fundamento para abrir o processo sobre aquilo precisa investigar; teria que dizer o que quer fazer; teria que explicar o que só teria explicação depois da investigação iniciada ou depois de algo sentenciado. Isso fere o sistema processual vigente.

    Veja-se que, no caso do art. 30, até se o próprio juiz de primeiro grau aplicar uma condenação que depois venha a ser reformada na segunda instância para fins de absolvição...

(Interrupção do som.)

(Soa a campainha.)

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) – ...nesse caso, Senadora Vanessa, o juiz condenador em primeiro grau, depois da absolvição em segundo grau, correria riscos por haver se equivocado no seu convencimento e na sua sentença.

    Por isso, Srs. Senadores, esse projeto do abuso de autoridade parece esconder subjetividades, coisas estranhas. E, a pretexto de corrigir casos de reais abusos que os arquivos guardam de fato, devemos agora, apressadamente, aprovar essa lei? Claro que não, porque é uma lei que irá constranger os investigadores e os julgadores da operação Lava Jato, a maior operação depuradora de velhos vícios da política brasileira.

    Tenhamos prudência, aceitemos o debate...

(Interrupção do som.)

(Soa a campainha.)

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) – ...sem pressa e sem apoiar interesses mais particulares do que públicos.

    Não podemos deixar ocorrer qualquer tentativa de perturbar ou abreviar a megainvestigação Lava Jato. Precisamos ir até o fim, não interessando sua longevidade. Lembrem-se do que ocorreu na Itália, onde conseguiram interceptar o curso da Operação Mãos Limpas. Lembremos o que houve lá para não deixarmos acontecer aqui.

    E é bom lembrar, Ministro Humberto Costa: o que aconteceu na Itália tem muita similaridade com o que está acontecendo agora no Brasil. Foi nos anos 90 uma das mais rumorosas e devastadoras ações mundiais, reunindo polícia, Ministério Público e Judiciário, com duração de quase dez anos, lutando contra a corrupção endêmica que havia naquele país.

    Também teve início lá em uma empresa petrolífera...

    A SRª PRESIDENTE (Vanessa Grazziotin. Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) – Senador, se V. Exª pudesse concluir no próximo minuto, porque já se vão quase dez minutos a mais, e eu creio que são muitos os colegas que estão aqui.

    Mais um minuto para V. Exª concluir.

(Soa a campainha.)

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) – Senadora, eu acho que V. Exª está sendo rigorosa comigo.

    A SRª PRESIDENTE (Vanessa Grazziotin. Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) – Não. São dez minutos, e V. Exª me chama de rigorosa, Senador?

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) – V. Exª, Senadora, talvez seja a pessoa que mais se demora na tribuna quando fala, e vou passar a contar o tempo, porque eu fui interrompido por dois longos apartes. Então, eu lhe pediria: dê-me cinco minutos.

    A SRª PRESIDENTE (Vanessa Grazziotin. Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) – Assim V. Exª falará mais de 40 minutos, Senador; esse é o problema.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) – Eu fui interrompido.

    A SRª PRESIDENTE (Vanessa Grazziotin. Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) – Esse é que é o problema.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) – A senhora tem a conta de que houve a interrupção?

    A SRª PRESIDENTE (Vanessa Grazziotin. Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) – Mas aparte é previsto no Regimento e conta dentro do tempo. Quando cada Senador concede o aparte, sabe que é o seu tempo que está sendo computado.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) – Senadora, a senhora é useira e vezeira em ultrapassar o tempo.

    A SRª PRESIDENTE (Vanessa Grazziotin. Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) – O senhor quer me julgar?

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) – Não.

    A SRª PRESIDENTE (Vanessa Grazziotin. Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) – O senhor está na tribuna para me julgar?

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) – A senhora está me julgando, Senadora.

    A SRª PRESIDENTE (Vanessa Grazziotin. Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) – Eu não o estou julgando.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) – A senhora está me cortando um tempo que a senhora não cumpre nunca nesta tribuna.

    A SRª PRESIDENTE (Vanessa Grazziotin. Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) – Sim. E quantas vezes sou cortada também, Senador?

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) – Eu vou contar, daqui para adiante, o seu tempo.

    A SRª PRESIDENTE (Vanessa Grazziotin. Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) – E sabe o que eu faço? Eu entrego o discurso e peço que seja incluído na íntegra; eu encurto o discurso e peço para o incluírem na íntegra.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) – Eu lhe peço que me dê cinco minutos.

    A SRª PRESIDENTE (Vanessa Grazziotin. Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) – Dois minutos, Senador. Dois minutos.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) – Em dois minutos eu não consigo terminar. Então, eu encerro por aqui com o meu protesto por a senhora ter interceptado a minha palavra quando a senhora não é o exemplo para isso e considerando que eu fui aqui aparteado por duas longas participações.

    É esta a proposta que eu lhe faço: conceda-me, no mínimo, quatro minutos para eu concluir.

    A SRª PRESIDENTE (Vanessa Grazziotin. Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) – Vamos fechar em três minutos. Pronto. Nem o senhor, nem eu.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) – Está bem. Então, vamos.

    A SRª PRESIDENTE (Vanessa Grazziotin. Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) – Pronto. (Risos.)

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) – Está bom.

    Aqui, nesta Casa, como é praxe, se negocia tudo...

    A SRª PRESIDENTE (Vanessa Grazziotin. Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) – Exatamente, Senador.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) – ... até o tempo de discurso.

    A SRª PRESIDENTE (Vanessa Grazziotin. Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) – Pois não, Senador.

    Vou começar de novo os seus três minutos.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) – O caso Mãos Limpas, na Itália, teve início também em uma empresa petrolífera, a ENI, sigla de Ente Nazionale Idrocarburi. Aqui, a Petrobras; lá, a ENI, financiando também políticos, com propinas e superfaturamentos. Aqui, os diretores da Petrobras foram presos; lá, o Presidente da ENI, Gabriele Cagliari, se suicidou, como procedeu igual um dos mais poderosos empresários da Itália envolvido no caso, Raul Gardini, que também se matou para evitar o longo tempo de prisão.

    Cerca de cinco mil pessoas foram investigadas na Itália na Mãos Limpas, cerca da metade recebeu condenações do Juiz Antonio di Pietro, da cidade de Milão. Lá, foi Milão o centro; aqui, Curitiba. Lá, Antonio di Pietro, aqui Sergio Moro. Muitas analogias. Lá, um Primeiro-Ministro corrupto fugiu para a Tunísia, Bettino Craxi; aqui, o líder principal, equivalente a Primeiro-Ministro, está preso até hoje, José Dirceu.

    Mas, lá, quando se encaminhava para o final, o processo passou a sofrer interferências legislativas e enfraquecimentos investigatórios, e operação Mani Pulite, Mãos Limpas, não conseguiu atingir a total conclusão desejável, mas parcial, embora com muitos avanços e depurações.

    E uma boa consequência, depois da operação Mãos Limpas, senhores telespectadores e Senadores: o custo das obras empreitadas na Itália caiu pela metade – algo que também gostaríamos muito de ver daqui por diante no Brasil com a Lava Jato.

    Encerrando, Srªs e Srs. Senadores, estejamos atentos e fiéis às aspirações dos milhões de brasileiros que nos mandaram para cá para construir leis e políticas construtivas, positivas, transparentes e prestimosas ao povo.

(Soa a campainha.)

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) – Assim o fazendo, no mínimo e imediatamente, conseguiremos recuperar a credibilidade do Congresso Nacional, hoje tão abalado na sua imagem e nos comportamentos.

    Obrigado pela tolerância, Srª Presidente.

    A SRª PRESIDENTE (Vanessa Grazziotin. Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) – V. Exª, Senador, ainda dispõe de tempo.

    Quero dizer que, apesar de tudo, acho que chegamos a um bom termo, Senador. Cumprimento-o pelo seu pronunciamento.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) – Obrigado.

    E eu gostaria, se não for pedir demais, que nós tivéssemos coerência daqui por diante com o uso do nosso tempo, porque temos percebido que há Senadores que ultrapassam o tempo, e nada acontece.

    Hoje, parece que eu estava ultrapassando o tempo, mas fui interrompido pelos apartes. Se for assim daqui para a frente, se tivermos dez apartes, é evidente que o orador vai ultrapassar o tempo. Então, isso precisa ser definido.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/11/2016 - Página 5