Discurso durante a 186ª Sessão de Debates Temáticos, no Senado Federal

Sessão destinada a debater o Projeto de Lei do Senado nº 280, de 2016, que define os crimes de abuso de autoridade e dá outras providências.

Autor
Humberto Costa (PT - Partido dos Trabalhadores/PE)
Nome completo: Humberto Sérgio Costa Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO PENAL:
  • Sessão destinada a debater o Projeto de Lei do Senado nº 280, de 2016, que define os crimes de abuso de autoridade e dá outras providências.
Publicação
Publicação no DSF de 02/12/2016 - Página 30
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO PENAL
Indexação
  • SESSÃO, OBJETIVO, DEBATE, PROJETO DE LEI DO SENADO (PLS), OBJETO, DEFINIÇÃO, GRUPO, CRIME, ABUSO DE AUTORIDADE.

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srs. Senadores, senhores integrantes da Mesa, debatedores, eu quero, em primeiro lugar, parabenizar todos pelo nível do debate e parabenizar, inclusive, o nosso Relator pela sua colocação inicial.

    Acho que este debate nos mostra como as coisas devem ser feitas. O Congresso Nacional é uma casa aberta ao debate, e acho que é por esse caminho que vamos construir alguma coisa que seja capaz de atender aos interesses da sociedade sem criar qualquer tipo de prejuízo a quem quer que seja. Aliás, são muitas as vezes que nós conseguimos fazer isso. Projetos polêmicos terminam se transformando num entendimento, e eu acho que é isso que temos que trabalhar aqui.

    Eu quero, inicialmente, me ater à fala do Ministro Gilmar Mendes, que é, para mim, absolutamente insuspeito quanto à sua postura em relação a todas essas operações que têm acontecido até agora. Não me parece que ele seja uma pessoa interessada em enterrar a Lava Jato ou qualquer outra operação que exista aqui.

    Parece-me muito razoável a colocação que ele faz de que nós não podemos discutir o melhor momento em que devemos debater e aprovar mudanças na legislação. Até porque a própria Lava Jato, por outro lado, interferiu, está interferindo para outras mudanças. Não sei se V. Exªs sabem, mas ontem nós votamos, na Comissão de Constituição e Justiça, o fim do foro especial – e vamos debater aqui de que forma isso vai acontecer – e isso também é reflexo do que, hoje, é repercussão da Lava Jato sobre a sociedade. Não teremos mais ministros do Supremo, membros do Ministério Público, Parlamentares, governadores ou Presidente da República com foro especial. E é natural que também os fatos que acontecem e que, por outro lado, possam representar algum tipo de desrespeito aos direitos individuais também sejam objeto de maior clarificação. É isso que nós estamos querendo fazer aqui. Aliás, do ponto de vista da maioria da população, nós estamos atrasados. Para aquilo que disseram o Senador Lindbergh e o juiz Silvio Rocha, nós estamos atrasados.

    Essas pessoas que estão lá sofrendo o abuso do guarda da esquina ou o funcionário público que tem que aguentar a carteirada do Parlamentar para ter algum tipo de benefício e privilégio ilegal precisam ser amparados pelo exercício do seu trabalho. Então, acho que essa é uma questão fundamental. Não se pode aqui fazer uma discussão que é assim: se se discute isso é porque está querendo enterrar a Lava Jato. Não, essa é uma forma equivocada de se construir um entendimento em cima de uma proposta que ajude inclusive a dar mais representatividade e legitimidade à Lava Jato e a todas as outras operações que estão aí.

    Segundo, também sou favorável à ideia de que não podemos deixar nenhum conceito vago que interfira no direito do juiz de julgar, de interpretar a lei, mas eu me dirijo inclusive ao Dr. Rocha para que ele me responda. Existem coisas que são muito objetivas. Se a lei fala que um prazo é um prazo de dez dias são dez dias. Eu posso multiplicar isso por horas para dizer de outra maneira, mas são dez dias. Está escrito na lei. Eu não tenho que interpretar. Se a lei diz que a condução coercitiva, a condução sob vara só deve acontecer quando há uma prévia convocação e não há o comparecimento daquele indicado, isso é um problema de interpretação da lei ou é um problema de não cumprimento do que a lei está prevendo?

    Sabem V. Exªs qual é a repercussão de gente como nós, como os magistrados, como os que estão no Executivo, como os integrantes do Ministério Público, que vivem inclusive da sua credibilidade social, qual é a repercussão de ser conduzido sob vara? Qual é a repercussão para uma personalidade mundial como o Presidente Lula, personalidade mundial, ser coagido coercitivamente para prestar um depoimento? E ele já prestou vários! Por que era necessário aquele tipo de atitude? Então, eu pergunto a V. Exª se esse é um problema de interpretação ou se é um problema de entendimento que extrapola o que a lei coloca. Eu entendo dessa maneira.

    Há outra questão: a espetacularização. Eu fui vítima disso, Presidente Renan, em 2006, quando disputava a eleição para governador. Tinha toda a chance de ser eleito governador do meu Estado, tinha feito uma denúncia de um fato de corrupção no Ministério da Saúde, no inquérito sequer meu nome foi citado. Dois anos depois, não por coincidência no momento da eleição, esse critério é reaberto e eu fui indiciado pela Polícia Federal e denunciado num prazo de três semanas. O integrante do Ministério Público que fez a denúncia convocou uma entrevista coletiva nacional faltando uma semana para a realização da eleição. E dos meus adversários, uma média de 20 comerciais por dia dizendo que eu era vampiro, que eu tinha roubado, que eu ia ser preso... Três anos depois, eu fui julgado pelo TRF, o Ministério Público pediu minha absolvição e fui absolvido por unanimidade. Como se paga esse prejuízo? Então, quando nós estamos discutindo isso, temos que levar em consideração todas essas coisas.

    O Juiz Sérgio Moro hoje é uma personalidade internacional. Vive da credibilidade dele também. Então todos nós temos que pensar em situações como essa, levando tudo isso em consideração.

    Quero concluir, dizendo que nem a Magistratura, nem o Ministério Público, nem o povo brasileiro devem estar preocupados com o que vai sair daqui. E digo isso porque conheço o Relator. O Senador Roberto Requião é uma pessoa equilibrada, é uma pessoa que conhece...

(Intervenção fora do microfone.) (Risos.)

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) – Eu diria que uma certa verve, mas não significa desequilíbrio. Não, pelo contrário. Que já viveu a experiência, como Governador, de lidar inclusive com o Ministério Público, com o Poder Judiciário. Aqui é um Parlamentar altamente respeitado. Daqui vai sair uma coisa boa para a sociedade brasileira. Mas nem podemos nós aqui colocar a faca no pescoço do Ministério Público e da Magistratura, nem podemos também aceitar que uma faca seja colocada sobre nós.

    Ontem houve aquela votação em que se discutia a urgência. Não estávamos discutindo o mérito. O relator seria também o Senador Requião, e a grande maioria dos que votaram aqui votou daquele jeito porque não teve a coragem de fazer o que disse a vários de nós. A realidade é essa.

    Um Congresso intimidado não é bom para a democracia.

(Soa a campainha.)

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) – Não é bom para o País.

    Portanto, eu entendo que nós temos que discutir esse tema da espetacularização. Esse fato que eu disse foi o mesmo que aconteceu com o Presidente Lula. Como é que se pode, no final daquela coisa convocada para o mundo assistir, dizer: "Olha, eu tenho convicção absoluta de que ele é chefe de uma quadrilha, mas eu não tenho uma prova para apresentar." Como é que pode? E se depois for provado que ele não era o chefe da quadrilha, não é o chefe da quadrilha? Quem vai repor esse prejuízo à imagem de uma pessoa que vive dessa imagem?

    Por isso nós temos que construir com calma, com tranquilidade, sem exageros, mas nós temos que construir essa legislação. E mais, eu tenho certeza de que, se o Senador Roberto Requião sentir que não estamos maduros para fazer a votação de um relatório que possa o máximo possível reunir consensos, ele será o primeiro a dizer que nós precisaremos de mais tempo para aprofundar essa questão.

    Meus parabéns, Presidente Renan, por ter trazido aqui debatedores tão qualificados, que puderam nos dar as suas visões. Todos nós respeitamos. E o mais importante de tudo: todos os que aqui estão querem fazer o melhor. Todos os que aqui estão querem fazer o melhor. Não creio que o endeusamento de alguns deve servir para a desqualificação de outros.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/12/2016 - Página 30